Semipresidencialismo – um novo golpe parlamentar em andamento

Ponderando riscos, vantagens e desvantagens, é óbvio que, no modelo de República, o Presidencialismo é mais seguro para o povo, sendo que o Parlamentarismo (ou sua variante, o Semipresidencialismo) é mais seguro para a classe política dirigente – o que no Brasil é particularmente problemático, pela ficha corrida dessa categoria de gente.
Por  Alexandre Pacheco
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A proposta de Parlamentarismo avança, no Brasil, quando temos crises de lideranças. Quando da renúncia de Jânio Quadros, foi uma solução adotada para dar posse ao então vice-presidente João Goulart, figura controvertida pelos seus atos, hábitos, ideias, amigas e amigos extravagantes.

O Parlamentarismo, então, foi adotado no Brasil, pela primeira e única vez na história da República, em 1961, como uma espécie de golpe parlamentar para evitar um mal maior, que seria um golpe militar, que estava em gestação. Durou apenas 1 ano e meio.

Não faz parte da nossa cultura republicana admitir um governo parlamentar, administrado por um gabinete. Esse sistema de governo foi até mesmo rejeitado no plebiscito realizado em 1993. Ninguém, do povo, cogita disso como uma hipótese para melhoria da gestão do governo. Não há legitimidade popular para essa proposta.

Eis que, novamente, estamos em crise de lideranças, pois a atual classe política que está no poder vem sendo progressivamente destruída pela Lava Jato. Mas ainda resta parcela expressiva dessa gente no poder.

No final das contas, a prioridade para essa classe política dirigente, nesse exato momento, não é contornar a crise de liderança. É, pura e simplesmente, fugir da cadeia. Para isso, o plano é simples: garantir seus cargos a qualquer custo melando a Lava Jato e manter o poder dentro desse círculo de condenados e de investigados pela Justiça.

O Semipresidencialismo, sobre o qual tanto vem falando o Presidente Michel Temer (veja aqui, aqui, aqui e aqui), e que vem sendo discutido em Brasília, nada mais é do que um sistema de governo que mantém o Presidente, mas que transfere a maior parcela do seu poder para um gabinete de Parlamentares escolhido por eles mesmos.

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A bem da verdade, é muito mais um Semiparlamentarismo do que um Semipresidencialismo. A questão de nomenclatura tem propósito evidente: contornar a rejeição popular do Parlamentarismo pelo Plebiscito de 1993 e tentar afastar possíveis discussões no Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de sua adoção por meio de Emenda Constitucional, sem novo Plebiscito. Ou seja, trata-se de um golpe a começar pelo nome.

Um parênteses: você consegue imaginar um governo administrado por esses parlamentares que temos hoje? Outra questão: se esses parlamentares que estão aí assumirem o Executivo, alguém acredita que eles sairão do poder um dia?

A proposta de Semipresidencialismo nada mais é do que um novo golpe parlamentar. Só que dessa vez, a crise de liderança é pretexto – o que se quer, agora, é controlar os poderes do próximo Presidente da República, que pode ser um não-condenado pela Justiça (um outsider, nesse sentido), para que a classe política dirigente atual não vá para a cadeia.

Na perspectiva do povo, a maior vantagem do Presidencialismo é que as eleições podem virar a mesa de 4 em 4 anos, com a escolha de um novo Presidente capaz de alterar significativamente os rumos do governo. A principal desvantagem do Parlamentarismo para o povo é justamente ser praticamente impossível alterar significativamente os governantes, pois as escolhas do gabinete ficam limitadas aos próprios parlamentares, que se revezam no poder.

Ponderando riscos, vantagens e desvantagens, é óbvio que, no modelo de República, o Presidencialismo é mais seguro para o povo, sendo que o Parlamentarismo (ou sua variante, o Semipresidencialismo) é mais seguro para a classe política dirigente – o que no Brasil é particularmente problemático, pela ficha corrida dessa categoria de gente.

Que me perdoem os intelectuais, os juristas e os políticos honestos que restam no Brasil – defender essa proposta é ajudar a atual classe política dirigente a se perpetuar no poder, quando o lugar da maior parte dela é a cadeia.

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Alexandre Pacheco é Advogado, Professor de Direito Empresarial e Tributário da Fundação Getúlio Vargas, da FIA, do Mackenzie e da Saint Paul e Doutorando/Mestre em Direito pela PUC.

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Alexandre Pacheco Professor de Direito Empresarial e Tributário da FGV/SP, da FIA e do Mackenzie, Doutor em Direito pela PUC/SP e Consultor Empresarial em São Paulo.

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