Do “céu ao inferno” após o decreto de Bolsonaro: afinal, a Taurus é oportunidade ou “cilada” na Bolsa?

As ações preferenciais da empresa subiram até 11% e derreteram até 22,4% - tudo em apenas um pregão 

Weruska Goeking

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SÃO PAULO – “Sobe no boato, cai no fato”. A ação da Taurus Armas (FJTA3; FJTA4), a que mais celebrou a chegada de Jair Bolsonaro ao poder por conta da expectativa pela flexibilização do acesso da população às armas, despencou na Bolsa na última terça-feira (15) em uma sessão bastante marcante para a empresa. E isso fez com que os investidores passassem a ter muitas dúvidas sobre o quanto a empresa pode ser beneficiada no novo governo. 

No dia em que o presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto que flexibiliza as regras para posse de armas e permite que pessoas com mais de 25 anos tenham até quatro armas em casa, as ações PN da empresa tiveram forte volatilidade: elas chegaram a subir até 11%, mas foram diminuindo os ganhos durante a sessão e, após a divulgação do decreto, amenizaram ainda mais, fechando em queda de 22%.

Além da forte volatilidade em apenas um pregão, o volume financeiro foi de R$ 185,8 milhões no caso das ações PN, montante superior ao valor de mercado da empresa (R$ 129,9 milhões). Ou seja, todas as ações preferenciais trocaram de mão em apenas um pregão em meio a uma montanha russa de emoções dos investidores. Nesta quarta, os papéis seguiram o movimento de derrocada e caíram mais 21%, acumulando perdas de quase 39% em apenas duas sessões. 

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Uma explicação para esse movimento poderia ser uma simples realização após os papéis saltarem 136% desde o último dia 20 de dezembro. Somente em 2018, os ativos da Taurus Armas – novo nome da Forjas Taurus – avançaram 180%, tendo o melhor desempenho da Bolsa no período. 

Contudo, além dos investidores estarem embolsando os lucros, há muitas questões sobre o quanto a empresa pode ser realmente beneficiada com as novas medidas do governo. O próprio decreto levou a uma certa decepção por parte do mercado, que esperava maior flexibilização. Pelo menos em um primeiro momento, não haverá grandes mudanças e o acesso a armas seguirá sendo um processo burocrático. 

De qualquer forma, conforme destaca Ricardo Schweitzer, analista da Nord Research, não há qualquer fundamento que justifique o preço atual da ação em meio aos desafios que a empresa enfrenta.

“Não acredito que alterações na legislação brasileira, por si só, sejam suficientes para produzir mudança drástica na empresa”, diz Schweitzer.

O próprio presidente da Taurus, Salesio Nuhs, em entrevista para o InfoMoney, chegou a destacar em novembro que o afrouxamento para a compra de armas não levaria a grandes mudanças para o case da companhia. Mas apontou uma visão construtiva, ao afirmar que a empresa apresentaria “resultados positivos independente do governo”. Isso em meio à reestruturação feita recentemente com renegociações de dívidas e mudanças na produção. 

O problema, segundo Schweitzer, está no fato de que as melhorias comprovadamente alcançadas pela empresa ao longo de 2018 não justificam a forte valorização dos papéis até aqui. Não obstante, houve melhora, mas ainda não há solução definitiva para o principal problema da Taurus: um endividamento gigante que vem comprometendo o resultado da companhia há cinco anos.

“Criou-se todo um frisson em cima da Taurus, mas o fato concreto é que a empresa precisa entregar melhora de origem financeira”, diz. 

Mais vendas?
Embora tenha modernizado sua linha de produção no ano passado, o alto endividamento deixa pouca margem para investimentos que ampliem sua capacidade produtiva para atender um eventual aumento na demanda por armas e munições diante das novas regras. 

Outro ponto é que a flexibilização da posse de armas não as tornará mais baratas, limitando ainda o mercado de atuação da Taurus no País. 

Schweitzer explica que a empresa pode reduzir a parcela de produtos enviados ao exterior, mas isso pode afetar negativamente as finanças da empresa, que tem 80% de sua receita atual em dólar, mesma moeda de suas dívidas. Não parece um bom negócio: a Taurus tinha R$ 887,5 milhões em dívidas em setembro de 2018. 

Aproveitando a onda

Com a forte valorização da empresa em 2018, de 88,4% para as ações preferenciais, a Taurus aprovou ainda a emissão de 74 milhões de bônus de subscrição para reduzir seu endividamento, que era de R$ 887,5 milhões em setembro de 2018.

Os bônus de subscrição são obrigações negociáveis emitidas por uma companhia, que conferem ao acionista o direito à subscrição de novas ações desta mesma empresa, ou seja, o direito de aquisição de ações por aumento de capital, com preços e prazo determinados, mas de acordo com o limite do aumento de capital autorizado em seu estatuto.

Na prática, a emissão de novas ações podem trazer até R$ 383 milhões ao caixa da empresa e ajudar a reduzir a dívida. 

 “É um valuation que não é compatível com o que a empresa consegue fazer, mesmo com a melhora operacional. Eles viram uma chance de tentar capturar a empolgação do mercado para levantar dinheiro que, na minha opinião, é caro”, diz o analista da Nord. 

Abertura do mercado atrapalha?
Além da flexibilização do posse de armas, o mercado também espera pelo cumprimento da promessa de campanha de Bolsonaro da liberação do porte e da abertura do mercado de armas para empresas estrangeiras. 

Segundo o ministro-chefe da Casa Civil Onyx Lorenzoni, essas medidas estão em estudo e serão discutidas nos próximos meses. Se, de um lado, o afrouxamento da posse não tem efeitos positivos diretos para a ação da Taurus, a abertura do mercado também não impactaria negativamente. 

A empresa já compete com as maiores empresas de armamento no mundo ao exportar 80% de sua produção, sendo a maior parte para um dos mercados mais competitivos globalmente: os Estados Unidos. Além disso, a empresa é uma das maiores fabricante de revólveres do mundo. “Não enxergo razões para pensar que a empresa enfrentaria problemas nesse caso”, avalia Schweitzer, reforçando que o grande entrave para a companhia se beneficiar seria o de aumentar a sua produção. 

Uma crise de mais de 10 anos
A Taurus enfrentou uma série de problemas operacionais, societários e financeiros desde meados da década de 2000, após a morte de um de seus sócio-controladores, e a partir de 2008 tentou diversificar seu negócios apostando em bens de capital e ferramentas manuais, entre outros. 

As falhas administrativas chegaram às fábricas e acidentes com algumas de suas armas mancharam a reputação da marca. Em 2015, o controle da Taurus foi adquirido pela empresa de munições CBC (Companhia Brasileira de Cartuchos). Uma nova fase parecia surgir, com o desenvolvimento de novos produtos e o início de sua restruturação financeira.

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A vitória de Donald Trump, um entusiasta do armamento civil, assim como Bolsonaro, elevou as expectativas de vendas nos Estados Unidos em 2017, mas elas não se confirmaram. O mercado por lá desaqueceu e a entrega de novos modelos de pistolas da empresa atrapalhou os planos da Taurus. Vale lembrar que quase 80% da receita da Taurus vêm de exportações, em sua maior parte dos Estados Unidos.

O mercado doméstico também não colaborou em 2017 e as vendas por aqui também desaceleraram. Do outro lado, as dívidas continuaram a acumular juros e, no quarto trimestre daquele ano, a Taurus reabriu as negociações com os bancos credores.

O ano passado abriu as cortinas para uma nova fase. Com uma nova gestão desde janeiro de 2018, a fabricante de armas quer deixar as falhas do comando anterior no passado com renegociações de dívidas e mudanças na produção. O objetivo é conquistar a credibilidade de clientes e de acionistas para, finalmente, sair do vermelho. 

Para isso, Salesio Nuhs, presidente da Taurus, aponta que a empresa trabalha com um “tripé estratégico” que envolve rentabilidade sustentável, qualidade dos produtos e melhora dos indicadores financeiros e operacionais.

Alguns indicadores já apontaram melhora no terceiro trimestre. A Taurus informou lucro líquido de R$ 48 milhões, ante prejuízo de R$ 18,5 milhões no mesmo período de 2017. Contudo, no acumulado do ano, a companhia amargava prejuízo de R$ 44,6 milhões, ligeira melhora ante o resultado negativo em R$ 50,4 milhões no intervalo de janeiro a setembro de 2017.

A Taurus registra prejuízo há cinco anos consecutivos e, na avaliação de Schweitzer, a empresa ainda está longe de demonstrar resultados suficientemente satisfatórios que valham o risco de comprar suas ações.

Desta forma, os papéis são para investidores com perfil altamente especulativo. Além disso, quando colocados na mesa os desafios que têm para a expansão do seu mercado no Brasil, é preciso ficar alerta. Quem comprar os ativos de olho apenas nos potenciais benefícios com o governo Bolsonaro, podem sofrer um forte revés em meio à montanha russa que os ativos vêm registrando na Bolsa. 

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