TSE julga pedido que pode afetar novo partido de Bolsonaro

Correndo contra o tempo para criar o Aliança pelo Brasil, presidente deve ficar de olho na decisão do tribunal sobre assinaturas eletrônicas

Marcos Mortari

(Foto: José Dias/PR)

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SÃO PAULO – O plenário Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começa a discutir, nesta terça-feira (26), a possibilidade do uso de assinaturas eletrônicas para a criação de um partido político. Os ministros vão decidir sobre uma consulta formulada pelo deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) no ano passado, mas o resultado é de amplo interesse do presidente Jair Bolsonaro.

Na semana passada, Bolsonaro participou da primeira convenção nacional do Aliança pelo Brasil — o partido que ele tenta criar desde que deixou o PSL, há uma semana, em meio a uma interminável disputa com o comandante da sigla, o deputado federal Luciano Bivar (PE).

O objetivo é oferecer ao eleitorado uma opção que ocupe o vácuo do conservadorismo no sistema partidário brasileiro e agregue as bandeiras defendidas por Bolsonaro durante a campanha presidencial.

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O primeiro documento da sigla, lido no evento, já faz fortes referências à religião e defesa ao porte de armas, além do repúdio ao que seus fundadores apontam como socialismo, comunismo e “globalismo”.

Mas o processo para formalização do novo partido ainda é longo. A Lei dos Partidos Políticos (9.096/1995) determina que o requerimento de registro de um partido político deve ser subscrito por um grupo de pelo menos 101 fundadores, com domicílio eleitoral em no mínimo um terço das unidades da federação.

Depois disso, o partido precisa registrar estatuto no Tribunal Superior Eleitoral – o que só é admitido com a comprovação do correspondente a pelo menos 0,5% dos votos válidos dados na última eleição para a Câmara dos Deputados (o equivalente a 492.015 assinaturas), distribuídos por ao menos um terço dos estados, com um mínimo de 0,1% do eleitorado que tenha votado em cada.

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Para ampliar a dificuldade do processo, Bolsonaro quer que o Aliança pelo Brasil já esteja funcionando como partido político até abril de 2020, o que tornaria a legenda apta a participar das próximas eleições municipais. Normalmente, partidos levam mais tempo para cumprir os requisitos necessários. Vale ressaltar que os assinantes não podem ter filiação partidária.

O caso mais rápido de criação de uma sigla é o do PSD, em 2011, por Gilberto Kassab, então prefeito de São Paulo. Na época, foram necessários cerca de 200 dias entre o início do recolhimento de assinaturas e a homologação no TSE. Bolsonaro terá cerca de 130 dias.

O presidente tem ao seu lado os advogados eleitorais Admar Gonzaga, que participou da criação do PSD e já atuou como ministro do TSE, e Karina Kufa. Uma das ideias seria o uso de assinaturas eletrônicas para dar celeridade ao processo — justamente o que deverá ser esclarecido pela Justiça Eleitoral na discussão desta terça. Outro caminho seria o uso de registros biométricos.

Na avaliação de Bolsonaro, caso o TSE não autorize a coleta de assinaturas eletrônicas, o Aliança pelo Brasil não vai disputar as eleições municipais de 2020. “Se for possível a eletrônica, a gente forma um partido para março. Se não for possível, eu não vou entrar em disputas municipais no ano que vem, estou fora”, disse na última quinta.

A legislação eleitoral vigente não determina que seja necessário realizar a coleta de assinaturas de forma física, como até hoje os partidos fizeram. Em abril deste ano, a assessoria do TSE emitiu um parecer, em resposta a questionamento feito pelo Movimento Brasil Livre (MBL), admitindo a possibilidade do uso da assinatura eletrônica certificada digitalmente.

Na semana passada, o Ministério Público Eleitoral se manifestou contra a coleta de assinaturas digitais, que alegou ser lícito o uso das assinaturas eletrônicas, mas não possível de ser executado no momento. “Torná-lo uma possibilidade, porém, no ambiente de prioridades e escassez é um equívoco, pois não é nem uma via universal nem igualitária, nem uma via que simplifica e encurta os fluxos de trabalho como a biometria”, escreveu o vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques.

Na avaliação do advogado eleitoral Alberto Rollo, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, existe a possibilidade de dois caminhos alternativos à tradicional assinatura física serem permitidos pela Justiça Eleitoral: 1) o comparecimento de eleitores em seus cartórios eleitorais para registro direto de assinatura (o que é considerado menos prático); 2) a assinatura eletrônica via Token (o que também pode ser inviável pelo baixo número de pessoas com certificação digital).

O advogado eleitoral Cristiano Vilela também vê uma tendência de o TSE abrir caminhos alternativos às assinaturas físicas, como a biometria, o que poderia trazer ganho de agilidade aos partidos em formação. No caso da Aliança pelo Brasil, porém, ele não acredita que os benefícios serão suficientes para que o objetivo da criação da sigla até abril seja atingido.

Nos bastidores, há um entendimento de que os ministros do TSE podem autorizar o uso de assinaturas por assinatura eletrônica, mediante certificação digital. Porém, nos últimos dias, aliados de Bolsonaro recuaram da estratégia de defender tal caminho, após constatarem altos custos implícitos e a burocracia envolvida no processo de adesão de eleitores à tecnologia.

A bola da vez passou a ser a defesa de registros biométricos, que poderá ser alvo de pedido dos advogados do presidente junto ao tribunal em breve. Essa tecnologia é usada juntamente com as identidades dos eleitores pelas urnas eletrônicas, tão criticadas por Bolsonaro durante seus mandatos como deputado federal e mesmo na campanha presidencial. Isso tem sido apontado como contradição no discurso do mandatário por críticos.

Bolsonaro é um franco defensor de meios analógicos em processos eleitorais, como o uso do voto impresso, que foi aprovado por Proposta de Emenda à Constituição (PEC) no Congresso Nacional em 2015, mas posteriormente derrubado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O presidente voltou a defender o voto impresso em meio à crise política na Bolívia, que culminou na renúncia do presidente Evo Morales, em meio a suspeitas de fraude no processo.

Desafios

A Lei dos Partidos prevê que a prova do apoiamento mínimo de eleitores é feita por meio de assinaturas, com menção ao número do respectivo título eleitoral, sendo a veracidade atestados por escrivão eleitoral, que lavra atestado em um prazo de 15 dias.

Os especialistas também chamam atenção para o fato de ser normal, ao longo do processo de validação, que várias assinaturas sejam desconsideradas por qualquer justificativa técnica, que pode ir do número da inscrição eleitoral que não bate com ou nome ou até mesmo problemas na assinatura feita no documento.

Depois disso, o pedido de registro, com todos os documentos produzidos pelo TRE, é distribuído a um relator em até 48 horas. Cabe a ele ouvir a Procuradoria-Geral em dez dias e determinar diligências em igual prazo. O último ato seria a votação do pedido em sessão no TSE. Para que a Aliança pelo Brasil esteja apta a disputar as eleições de 2020, esta última etapa precisa ser superada 6 meses antes do pleito.

Hoje, há 76 partidos com status “em formação” no sistema do TSE. O tamanho da fila indica as dificuldades que Bolsonaro enfrentará para criar um partido do zero em menos de cinco meses.

“Tem mais de 70 partidos na fila. Não sei por que passaria o do Bolsonaro na frente”, afirma Rollo. O advogado, que também participou do processo de criação do recordista PSD, estima que a Aliança pelo Brasil levaria pelo menos 18 meses para sair do papel, tempo suficiente apenas para participar do pleito de 2022.

“É um número muito grande de atividades a serem cumpridas pelo partido. Politicamente, Bolsonaro está com um tempo muito curto. Não tenho dúvida de que ele vai conseguir montar o partido, mas acho totalmente inviável colocá-lo em pé até março”, observa Vilela.

Além das dificuldades com os prazos, Bolsonaro tem o desafio de convencer políticos a deixar suas atuais siglas para embarcarem em outra sem estrutura, recursos públicos e pouco tempo de televisão.

Já ao mercado, fica a preocupação com como a cruzada de Bolsonaro para criar um partido para chamar de seu pode influenciar a tramitação da agenda de reformas econômicas em curso.

De um lado, a saída dos bolsonaristas do PSL pode culminar em uma posição mais independente da sigla em relação ao governo, embora a defesa à pauta econômica deva ser mantida, em linhas gerais.

Há também uma preocupação com os esforços de Bolsonaro para tirar do papel a Aliança pelo Brasil. A inclusão de um novo tema no debate para inevitavelmente disputar espaço com outras pautas, sobretudo em um momento de maior cautela do governo com medidas de ajuste econômico.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.