Senadores apresentam alternativa à PEC dos Precatórios com espaço fiscal de R$ 99 bilhões para Auxílio Brasil

Emenda substitutiva propõe a retirada das despesas com precatórios do teto de gastos excepcionalmente em 2022 e desfaz mudanças no teto de gastos

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Os senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE), José Aníbal (PSDB-SP) e Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) elaboraram, nesta quarta-feira (17), uma emenda com texto alternativo à Proposta de Emenda à Constituição dos Precatórios (PEC 23/2021), aprovada na semana passada pela Câmara dos Deputados.

O substitutivo foi entregue ao líder do governo na casa legislativa, o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que também é relator da proposta. Leia o texto na íntegra clicando aqui.

Os três parlamentares já haviam apresentado PECs alternativas à PEC dos Precatórios para viabilizar o pagamento de um Auxílio Brasil – programa de transferência de renda que substituiu o Bolsa Família – mais robusto, como também deseja o governo federal, mas com efeitos colaterais menores para as contas públicas do que o caminho patrocinado pelo Palácio do Planalto no Congresso Nacional.

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A ideia é oferecer uma construção que agregue o sentimento da maioria do Senado Federal e alie responsabilidade fiscal – com a manutenção do teto de gastos – com segurança jurídica – honrando os compromissos determinados pelo Poder Judiciário a título de precatórios – e responsabilidade social, diante da piora dos indicadores socioeconômicos do país com a pandemia de Covid-19.

O texto alternativo funde itens presentes nas três PECs protocoladas e pretende abrir espaço fiscal de cerca de R$ 99 bilhões para assistência social exclusivamente no Orçamento de 2022 – montante que pode superar inclusive o calculado pelo governo para a atual versão da PEC dos Precatórios, de R$ 91,6 bilhões. Com isso, seria possível bancar um auxílio de R$ 400,00 por mês para 21 milhões de brasileiros.

Atualmente, 14,6 milhões de famílias são atendidas pelo programa permanente de transferência de renda e o objetivo inicial do governo Jair Bolsonaro era ampliar a base para 17 milhões com o “folego” gerado pela PEC dos Precatórios.

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O Palácio do Planalto corre contra o relógio para construir o apoio necessário e avançar com a proposta para que o Auxílio Brasil “turbinado” possa ser implementado em dezembro, já que a Lei Eleitoral impede o movimento em 2022.

Por se tratar de PEC, o texto precisa de apoio de 3/5 dos senadores (ou seja, 49 dos 81 votos disponíveis) em dois turnos de votação. Caso haja modificações de mérito em relação ao que foi aprovado pelos deputados, a proposta precisa voltar para a Câmara dos Deputados. Pela regra, as duas casas legislativas precisam aprovar o mesmo texto para que ele seja promulgado. A PEC vai de uma casa para a outra (o chamado pingue-pongue) até que seja votada sem diferenças.

A versão da PEC dos Precatórios que saiu da Câmara dos Deputados vem enfrentando resistências entre os senadores. A proposta é considerada polêmica por limitar o pagamento de precatórios – que são dívidas judiciais do poder público sem nova possibilidade de recurso e que precisam ser pagas – à mesma lógica imposta do teto de gastos.

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Ou seja, o valor despendido pela União com tais pagamentos em um exercício poderia crescer apenas na mesma proporção que a inflação do ano anterior, com aplicação retroativa desde 2016, ano em que a regra fiscal foi promulgada. Apenas essa mudança liberaria R$ 44,6 bilhões para novas despesas em 2022.

A PEC dos Precatórios também revoga dispositivo do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal e antecipa a revisão da metodologia do teto de gastos ‒ inicialmente prevista apenas para 2026, quando a regra fiscal completaria dez anos de vigência.

Hoje, o teto de gastos permite a atualização dos gastos públicos pela inflação, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acumulada em 12 meses até junho do ano anterior. Pela PEC dos Precatórios, o período de aferição passaria para janeiro a dezembro do ano anterior ao exercício. Na prática, seriam mais R$ 54,147 bilhões de “folga”, em um movimento criticado por agentes econômicos.

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Críticos à PEC pela fragilização das regras fiscais e pelo entendimento de que a limitação do pagamento de precatórios seria na prática um “calote”, mas defensores de um programa de transferência de renda mais robusto em razão da desigualdade social aprofundada pela pandemia da Covid-19, Alessandro Vieira, José Aníbal e Oriovisto Guimarães têm feito articulações em torno de alternativas.

A emenda substitutiva apresentada nesta quarta-feira (17) propõe a retirada de todas as despesas com precatórios do teto de gastos excepcionalmente em 2022 (em um total de R$ 89,1 bilhões), mas estabelece que no mínimo R$ 64 bilhões sejam destinados no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) ao Auxílio Brasil e o remanescente em despesas decorrentes de recomposição orçamentária ao pagamento de benefícios da Seguridade Social.

Em entrevista ao InfoMoney, o senador Oriovisto Guimarães explicou que os R$ 64 bilhões representam valor adicional aos R$ 34 bilhões já previstos no na LOA de 2022 para o pagamento do Bolsa Família, considerando o incremento no valor das parcelas e aumento no número de beneficiários em discussão. Os recursos que sobrarem seriam utilizados para cobrir outros déficits previstos pelo Ministério da Economia.

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“No ano passado, em plena pandemia, nós abrimos uma despesa extrateto que foi de R$ 600 bilhões e estamos recuperando isso aos poucos. O mercado aceitou bem, porque era pandemia e precisava fazer. Nós estamos saindo da pandemia. A nova pandemia hoje no Brasil se chama fome, e não tem como não atender esses milhões de brasileiros que estão nas esquinas e estão passando fome, crianças que não comem”, argumentou.

“Essa foi a solução mais simples que encontramos. Foi uma tentativa de negociação. Está tudo amarrado ao social. Nós não deixamos nenhuma brecha para o governo fazer política, para pagar emendas, para fazer ‘tratoraço’, para dar aumento para o funcionalismo”, pontuou.

“Eu acho que dos males o menor: pelo menos o mercado sabe que é um valor fixo, em função desta saída da pandemia, e ponto final. E que isso não vai se repetir. Agora, se você alterar a regra, isso vai no ano que vem, no outro, não tem fim”, avaliou. Para o senador, o governo ainda tem a PEC dos Precatórios como seu “Plano A” e deverá insistir nele caso perceba ter votos para aprovar a matéria.

Na PEC que apresentou na semana passada, Oriovisto Guimarães não propunha a retirada dos precatórios do teto de gastos e construía alternativas reduzindo drasticamente o valor destinado às chamadas “emendas de relator” do Orçamento (RP 9) e estabelecendo que metade dos valores das emendas impositivas individuais e de bancadas fossem obrigatoriamente destinadas ao novo programa social.

O texto também definia que precatórios de despesas excluídas do Teto de Gastos, especialmente do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), estariam excluídos do próprio limite. Juntas, as medidas liberariam pouco mais de R$ 30 bilhões de espaço no Orçamento – valor muito abaixo do agora proposto.

Para Alessandro Vieira, “é preciso pensar em alternativas que encerrem de vez com o absurdo aprovado pela Câmara dos Deputados, focando nos problemas que o Brasil enfrenta, de verdade, no Orçamento”. “Nossa ideia é trabalhar em conjunto com os outros senadores para que o texto apresentado e aprovado pelo Senado Federal faça jus à realidade do que enfrentamos no país”, disse.

“O Brasil enfrenta uma situação dramática com elevada taxas de desemprego e inflação. A nossa proposta avança no sentido de destinar recursos para a área social sem abandonar a responsabilidade fiscal. A proposta garante também o pagamento total dos precatórios previstos para 2022 e não altera a regra do teto de gastos”, ressaltou o senador José Aníbal.

Na emenda substitutiva apresentada, os três senadores propõem, ainda, o fim da distribuição das polêmicas “emendas de relator” (as chamadas RP9) da forma como elas hoje são conhecidas, ficando restritas a ajustes de erros e omissões na peça orçamentária. “Isso dá uma moralizada fantástica na política. Acaba aquela confusão toda”, afirma Oriovisto.

Relator da PEC dos Precatórios e líder do governo na casa legislativa, o senador Fernando Bezerra Coelho prevê apreciação do texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na próxima quarta-feira (24) e acredita na possibilidade de o texto ser votado em plenário na mesma data ou na semana seguinte.

O parlamentar acredita que dispõe de “51 ou 52” votos favoráveis à matéria, mas diz que o desejo do governo é ter “um apoio mais expressivo”. Em outro flanco, Vieira, Aníbal e Guimarães contam com votos no Podemos (9) e no PT (6), além de parte das bancadas de PSDB (6), Cidadania (3) e MDB (15).

Guedes rebate

Durante a participação em um evento no mercado financeiro, o ministro Paulo Guedes (Economia) considerou um “grande erro”, capaz de comprometer o crescimento previsto pelo governo para o ano que vem, a ideia de retirar o pagamento dos precatórios do teto de gastos.

Para ele, a proposta colocaria em risco a arquitetura fiscal, já que os precatórios são uma despesa “incontrolável”, tendo como consequência provável a elevação dos prêmios de risco cobrados por investidores para financiar a dívida pública.

“Alguns senadores falam em tirar os precatórios do teto. É um grande erro por deixar as ordens judiciais como gastos incontroláveis. Os prêmios de risco subirão”, afirmou.

“Estou preocupado que não conseguiremos crescer se ameaçarmos a arquitetura fiscal. Mas ainda tenho esperança que vão aprovar as propostas originais da PEC”, continuou.

(com Agência Estado)

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.