Relator do Orçamento de 2023 apresenta distribuição de R$ 145 bilhões liberados pela PEC da Transição e diz que país viverá “caos” sem a medida

Senador utiliza recursos de proposta ainda não aprovada pela Câmara dos Deputados para fechar as contas do Orçamento do ano que vem

Marcos Mortari

O senador Marcelo Castro (MDB-PI) em coletiva de imprensa (Foto: Pedro França/Agência Senado)

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O senador Marcelo Castro (MDB-PI), relator-geral do Orçamento de 2023, protocolou, junto à Comissão Mista de Orçamento (CMO), na noite de segunda-feira (12), seu parecer sobre o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do ano que vem.

O texto inclui os R$ 145 bilhões liberados pela Proposta de Emenda à Constituição da Transição (PEC 32/2022) a partir da ampliação do teto de gastos – regra fiscal que limita a evolução de despesas públicas em um exercício à inflação acumulada no ano anterior.

A proposição foi aprovada, em dois turnos, na semana passada, pelo plenário do Senado Federal e ainda aguarda deliberação pela Câmara dos Deputados e somente passa a valer caso seja promulgada pelo Congresso Nacional.

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A PEC da Transição é considerada fundamental pela equipe de Lula para viabilizar o pagamento do Bolsa Família (programa que será retomado no lugar do Auxílio Brasil) em parcelas de R$ 600,00 mensais e um adicional de R$ 150,00 a famílias com crianças de até seis anos, além de outras promessas feitas durante a campanha eleitoral.

O texto aprovado pelos senadores permite a ampliação do teto de gastos em R$ 145 bilhões por dois anos. Além disso, ele abre a possibilidade de um adicional de até R$ 23 bilhões em investimentos públicos em situações de “excesso de arrecadação”, tendo referência o comparativo entre o resultado obtido pelo governo e a projeção da peça orçamentária.

Esta última medida valeria já para 2022, o que poderia ajudar o próprio presidente Jair Bolsonaro (PL) a superar os bloqueios orçamentários em áreas fundamentais e fechar as contas.

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No parecer para a peça orçamentária, o senador Marcelo Castro, que também foi o responsável formal pela autoria da PEC da Transição (já que o governo eleito não teria meios de fazê-lo), divulgou um plano de distribuição dos R$ 145 bilhões adicionais a serem liberados pela proposta.

Ao todo, 14 ministérios serão contemplados, além da Presidência da República, do Banco Central e das políticas públicas de aumento do Auxílio Brasil e de reajuste do salário mínimo.

A maior fatia, R$ 70 bilhões, vai para o pagamento do Auxílio Brasil, de modo a manter o benefício-base no valor de R$ 600 e estabelecer um adicional de R$ 150 para cada criança de até seis anos de idade nas famílias alcançadas.

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O Ministério da Cidadania, que administra o programa, receberá o dinheiro. A pasta também terá outros R$ 5 bilhões para sustentar o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que busca favorecer a agricultura familiar e combater a fome nos municípios.

Outra fatia destacada é de R$ 9,5 bilhões para o Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Trata-se da principal fonte para o programa Minha Casa Minha Vida, dedicado à construção e ao financiamento de moradias populares. O FAR fica sob o guarda-chuva do Ministério do Desenvolvimento Regional.

Há também uma previsão de R$ 6,8 bilhões destinados para assegurar a valorização real do salário mínimo. Essa verba não está destinada a nenhum ministério ou programa específico.

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Os Ministérios da Saúde e da Educação são duas das pastas mais beneficiadas, recebendo R$ 22,7 bilhões e R$ 11,2 bilhões, respectivamente, para distribuição entre diversos programas. Entre eles estão o atendimento de média e alta complexidade no SUS (R$ 7,2 bilhões), a concessão de bolsas para o ensino superior (R$ 2,3 bilhões), o Farmácia Popular (R$ 2,1 bilhões) e a merenda escolar (R$ 1,5 bilhão).

O Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) também deve ser contemplado, através de um aporte de R$ 1,3 bilhão ao Fundo Garantidor de Operações (FGO), que sustenta as operações de crédito.

“Todas as áreas da administração pública foram contempladas. Fizemos isso com o maior senso de responsabilidade, equidade e transparência”, afirmou Marcelo Castro em entrevista coletiva na manhã desta terça-feira (13).

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De acordo com o senador, a distribuição dos recursos foi feita em acordo com a equipe de transição de governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Neste entendimento, a decisão foi priorizar a área social.

Além de Lula, participaram das discussões o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), coordenador da equipe de transição; Fernando Haddad (PT), indicado para o Ministério da Fazenda do próximo governo; o ex-ministro Aloizio Mercadante (PT), coordenador dos grupos temáticos da equipe de transição; a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente nacional do PT; o governador da Bahia, Rui Costa (PT), escolhido futuro ministro da Casa Civil; e a ex-ministra do Planejamento Miriam Belchior, assessora especial da equipe de transição.

Veja os detalhes da distribuição na tabela abaixo:

MINISTÉRIOS

Cidadania

R$ 75 bi

Saúde

R$ 22,7 bi

Educação

R$ 11,2 bi

Desenvolvimento Regional

R$ 9,5 bi

Ciência e Tecnologia

R$ 4,9 bi

Turismo

R$ 3,7 bi

Economia

R$ 1,8 bi

Agricultura

R$ 934 mi

Justiça

R$ 800 mi

Meio Ambiente

R$ 536 mi

Defesa

R$ 500 mi

Trabalho

R$ 400,6 mi

Mulher, Família e Direitos Humanos

R$ 250 mi

Comunicações

R$ 126,5 mi

OUTROS ÓRGÃOS

Presidência da República

R$ 35 mi

Banco Central

R$ 10 mi

OUTROS FINS

Valorização do salário mínimo

R$ 6,8 bi

Encargos financeiros (fundo garantidor do Pronampe, Seguro de Crédito à Exportação, reserva de contingência, contribuição a organismos internacionais)

R$ 5,7 bi

Esta semana será decisiva para a tramitação do Orçamento de 2023 – o primeiro a ser cumprido pelo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que retorna ao Palácio do Planalto após um hiato de 12 anos.

Além da votação da PEC da Transição na Câmara dos Deputados, a Comissão Mista de Orçamento deve se reunir todos os dias até quinta-feira (15) para discutir a LOA. A previsão é que a votação na comissão aconteça na quinta. Depois disso, o Orçamento precisa ser aprovado por deputados e senadores em sessão conjunta do Congresso Nacional.

Mas, para a peça ter validade, é necessário antes que o parlamento conclua a deliberação sobre a PEC da Transição. Do contrário, os recursos adicionais com os quais o relator contou para o fechamento do texto não estarão disponíveis e todo o texto precisará ser revisto.

“Sem a aprovação da PEC, que foi aprovada por ampla maioria do Senado Federal e que nós esperamos que seja aprovada de hoje para amanhã na Câmara dos Deputados, nós não teríamos um Orçamento que deixasse o país funcionando”, alertou Castro.

“Qualquer que fosse o presidente eleito, se chamasse Lula, Bolsonaro, Simone Tebet, Ciro Gomes ou Soraya Thronicke − isso não é uma questão de governo e nem de presidente, é uma questão de Estado − o Brasil não funcionaria com o Orçamento que foi mandado pela Economia ao Congresso Nacional. É um Orçamento absolutamente inexequível”, continuou.

O relator reconhecer não ter segurança de aprovação da PEC sem alterações pela Câmara dos Deputados, mas disse que precisava fazer seu trabalho diante do esgotamento do prazo para entrega do parecer para peça orçamentária.

“Eu fiz sob a condição de a PEC ser aprovada. Se ela não for, seria o caos, do ponto de vista orçamentário. Já no primeiro mês de governo Lula, nós já estaríamos com dificuldade de o país continuar rodando”, disse.

Castro disse que, sob a vigência do teto de gastos, as despesas orçamentárias obrigatórias cresceram acima da inflação, o que comprimiu, ano após ano, o espaço para gastos discricionários. Isso levou os investimentos públicos a patamares inéditos na história do país.

“As despesas obrigatórias vêm comprimindo as discricionárias, onde estão os investimentos. Neste ano, o Brasil está prevendo investir apenas R$ 22 bilhões. Isso é absolutamente insuficiente para um país da economia do Brasil. Só para comparar, São Paulo vai investir o mesmo valor. A Petrobras vai investir mais de cinco vezes o que o Brasil vai investir. Chegamos a uma situação insustentável”, argumentou.

Na avaliação do parlamentar, o ideal seria o plenário da Câmara dos Deputados aprovar a proposta até quarta-feira (14). Neste caso, a CMO poderia deliberar sobre o relatório da LOA no dia seguinte pela manhã, abrindo espaço para o Congresso Nacional analisar a peça até a próxima semana.

(com Agência Senado)

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.