Reajuste da Petrobras sobre combustíveis aumenta pressão da Política e reabre discussão sobre alternativas

Como o desconforto pode unir governistas e opositores a 4 meses das eleições, cresce a possibilidade de mais medidas serem tomadas pela classe política

Marcos Mortari

O presidente Jair Bolsonaro (PL) participa de reunião com ministros e Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados (Foto: Marcos Corrêa/PR)

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O anúncio da Petrobras de um novo reajuste nos preços de venda da gasolina, de R$ 3,86 para R$ 4,06 por litro (aumento de 5,18%), e do diesel, de R$ 4,91 para R$ 5,61 por litro (aumento de 14,26%), para as distribuidoras colocou mais fervura na relação entre o comando da estatal e a classe política a menos de quatro meses das eleições gerais.

Poucos minutos após a notícia, o presidente Jair Bolsonaro (PL) disse que vai propor uma CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito] para investigar a Petrobras”.

“Conversei agora há pouco com o Arthur Lira [presidente da Câmara dos Deputados], reunido com com líderes partidários e nossa ideia é propor uma CPI para investigar a Petrobras, seus diretores e os membros do Conselho”, disse em entrevista à Rádio 96 FM, de Natal, no Rio Grande do Norte.

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O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), voltou a atacar a gestão da estatal, reverberando o incômodo de parlamentares dos mais distintos campos ideológicos com a alta dos preços dos combustíveis.

Pelas redes sociais, ele criticou os “lucros bilionários” da companhia e exigiu, mais uma vez, a demissão de seu presidente, José Mauro Ferreira Coelho.

“O presidente da Petrobras tem que renunciar imediatamente. Não por vontade pessoal minha, mas porque não representa o acionista majoritário da empresa – o Brasil – e, pior, trabalha sistematicamente contra o povo brasileiro na pior crise do país”, disse pelo Twitter.

“Ele só representa a si mesmo e o que faz deixará um legado de destruição para a empresa, para o país e para o povo. Saia!!! Pois sua gestão é um ato de terrorismo corporativo”, continuou.

Também no Twitter, Lira compartilhou notícia sobre a queda das ações da Petrobras no pregão desta sexta-feira (17), e comentou: “As ações da Petrobras desabam em Nova Iorque no dia em que aumenta o seus produtos (sic). Prova maior da inconsequência corporativa de agir contra todo um país e o acionista controlador? Esse é um dos números do desastre provocado pela atual gestão contra o Brasil, os brasileiros e a própria Petrobras. Saia daí, saia já! Esse lugar não é seu. É do Brasil”.

Ontem (16), Lira já havia se referido à empresa como “República Federativa da Petrobras, um país independente e em declarado estado de guerra em relação ao Brasil e ao povo brasileiro” e que, apesar de “possuir função social”, “como amiga dos lucros bilionários e inimiga do Brasil”.

Ele já prometeu uma reunião com os líderes das bancadas para discutir a política de preços da Petrobras. O chamado Preço de Paridade Internacional (PPI) há tempos tem sido criticado por atores política – muitas vezes à esquerda e à direita.

Em entrevista à GloboNews, Lira disse que há “toda possibilidade” de que uma eventual mudança na taxação dos lucros da Petrobras seja enfrentada pelo Congresso Nacional.

“Há uma proposta similar a essa nos Estados Unidos, feita pelo presidente [Joe] Biden com um senador democrata. As petrolíferas privadas, lá, pagam 21% de impostos sobre os lucros. Eles estão discutindo dobrar para 42%”, citou.

“Aqui, a Petrobras paga de CSLL, por exemplo, ‘xis %’ sobre o lucro. Nós vamos, por exemplo, dobrar essa taxação e tentar reverter isso diretamente para a população, para que também entre no caixa do governo, não vá para o Tesouro e não esteja sujeito à lei do teto de gastos. E que a gente possa reverter isso para diminuir a compensação da diferença do custo do diesel no exterior para cá”, continuou.

A decisão da Petrobras por uma nova rodada de reajustes ocorre depois de quase 100 dias com o preço da gasolina congelado nas refinarias – no caso do diesel, foram 38 dias – e logo após o Congresso Nacional concluir a votação do PLP 18/2022.

O texto aprovado estabelece um teto entre 17% e 18% para a cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis, energia elétrica e serviços de telecomunicações e de transporte público pelos governos estaduais. A matéria também reduz a zero as alíquotas da Cide-Combustíveis e PIS/Cofins incidentes sobre a gasolina até o fim de 2022 – medida que já havia sido tomada sobre diesel e gás de cozinha.

Os parlamentares também discutem uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 16/2022) para aprofundar o alívio tributário sobre os combustíveis, com a expectativa de redução de preços para o consumidor final na bomba.

A PEC, gestada no Palácio do Planalto e que leva a assinatura do senador Carlos Portinho (PL-RJ), novo líder do governo no Senado Federal, prevê um auxílio financeiro de até R$ 29 bilhões pela União aos Estados e Distrito Federal que aceitarem:1) zerar o ICMS incidente sobre o diesel e gás liquefeito de petróleo, derivado de petróleo e de gás natural; e 2) estabelecer alíquota de 12% para o ICMS incidente sobre o etanol hidratado comercializado em seu território. As novas alíquotas deverão vigorar de 1º de julho de 2022 a 31 de dezembro de 2022.

Mas a percepção no mundo político é de que reajustes nos preços dos combustíveis promovidos pela Petrobras podem jogar por água abaixo os esforços do Congresso Nacional com a aprovação do PLP 18/2022 e até mesmo com o possível avanço da PEC dos Combustíveis.

Relator do PLP 18/2022 no Senado Federal, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) estimou que a medida pode provocar uma queda de R$ 1,65 no preço do litro da gasolina e de R$ 0,76 no litro do diesel.

Outros cálculos, no entanto, mostram cenário menos favorável ao governo. O consultor Dietmar Schupp, por exemplo, estima que o teto do ICMS possa reduzir o preço médio da gasolina em R$ 0,675 por litro, conforme noticiou o jornal Folha de S.Paulo.

A avaliação de parlamentares é que os reajustes podem prejudicar projetos eleitorais, como a própria candidatura do presidente Jair Bolsonaro (PL), que declarou guerra aos preços dos combustíveis para tentar conter a inflação e melhorar seus índices de aprovação.

Poucas horas antes do anúncio de reajuste pela Petrobras, Bolsonaro já tinha ido às redes sociais manifestar seu repúdio a aumentos nos preços dos combustíveis praticados pela estatal, e disse que a companhia “pode mergulhar o Brasil num caos”.

“O Governo Federal como acionista é contra qualquer reajuste nos combustíveis, não só pelo exagerado lucro da Petrobrás em plena crise mundial, bem como pelo interesse público previsto na Lei das Estatais”, afirmou pelo Twitter.

“A Petrobrás pode mergulhar o Brasil num caos. Seus presidente, diretores e conselheiros bem sabem do que aconteceu com a greve dos caminhoneiros em 2018, e as consequências nefastas para a economia do Brasil e a vida do nosso povo”, criticou.

O tom foi similar ao adotado antes por Ciro Nogueira (PP), ministro-chefe da Casa Civil, que, pela mesma rede social, disse: “Basta! Chegou a hora. A Petrobras não é de seus diretores. É do Brasil. E não pode, por isso, continuar com tanta insensibilidade, ignorar sua função social e abandonar os brasileiros na maior crise do último século”.

“O governo, Congresso e todos com responsabilidade temos que acabar de vez com esse abuso dos lucros bilionários na hora em que a empresa não pode virar as costas para o Brasil e os brasileiros. Responsabilidade, sim. Falta de visão de país e de solidariedade com a nação, jamais”, continuou.

Possíveis consequências

Com o encurtamento do calendário eleitoral e a crescente pressão dos combustíveis sobre a inflação, analistas políticos veem um aumento no desejo de parlamentares e integrantes do governo em pressionar a Petrobras.

Como o desconforto pode unir governistas e opositores, cresce a possibilidade de mais medidas serem tomadas, mesmo após a aprovação das matérias em tramitação no parlamento.

“Vontade de interferir na política de preços existe, mas ainda não há um caminho definido”, observam os analistas políticos da XP Investimentos em nota a clientes.

“O mais provável parece ser a opção de se fazer política social com a Petrobras, por meio da destinação de parte dos lucros da empresa à área, mas antes disso seria preciso executar a mudança na diretoria que está em curso”, avaliam.

Na avaliação dos especialistas, apesar de subirem o tom contra a estatal, integrantes do governo federal mantêm preocupação sobre os impactos que “medidas mais ousadas” tomadas no Congresso Nacional possam ter sobre o mercado.

Nesse sentido, uma das propostas que pode ganhar força seria a de criar uma compensação da União para que a empresa cumpra sua função social, por meio da destinação de parte dos lucros e dividendos. Integrantes do “centrão” acreditam que essa alternativa pode ser adotada com uma diretoria mais disposta a discutir além dos preços dos combustíveis.

Para os analistas da XP, uma mudança no PPI ou alguma nova legislação ainda não são o cenário principal. O mesmo vale para mais uma troca no comando do Ministério de Minas e Energia, apesar das resistências em se adotar medidas heterodoxas para enfrentar o problema. Mas alternativas podem ganhar força se persistir a avaliação de que a guerra está sendo perdida.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.