PEC dos Auxílios ganha “tramitação especial” para passar na Câmara antes do recesso

Proposta abre R$ 41,25 bilhões em créditos extraordinários para criar benefícios sociais e ampliar programas existentes a três meses das eleições

Marcos Mortari

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), durante sessão plenária (Marina Ramos/Câmara dos Deputados).
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), durante sessão plenária (Marina Ramos/Câmara dos Deputados).

Publicidade

A três meses das eleições, o governo federal corre contra o tempo para aprovar, na Câmara dos Deputados, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Auxílios, que cria benefícios sociais e amplia programas já existentes, por meio da abertura de R$ 41,25 bilhões em créditos extraordinários, e institui estado de emergência até o final do ano.

A proposta é uma das apostas do presidente Jair Bolsonaro (PL) para melhorar seus índices de aprovação, sobretudo entre o eleitorado de renda mais baixa – faixa em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera com folga –, e ganhar competitividade na disputa por mais um mandato no Palácio do Planalto.

Mas, para que os efeitos das medidas possam ser sentidos na ponta pelo eleitorado o quanto antes, o governo quer ver a PEC dos Auxílios promulgada pelo Congresso Nacional até 17 de julho, quando começa o recesso parlamentar. Isso exigirá uma tramitação diferenciada para a proposta, muito mais acelerada do que o andamento natural de matérias desta natureza.

Continua depois da publicidade

Caso a estreita janela seja perdida, a apreciação do texto ficará para a partir de 1º agosto, o que atrasaria a implementação das medidas e poderia comprometer ainda mais a percepção do eleitor sobre os impactos dos benefícios.

A PEC dos Auxílios amplia de R$ 400,00 para R$ 600,00 o valor das parcelas mensais pagas pelo Auxílio Brasil e zera a fila de beneficiários do programa, hoje estimada pelo Ministério da Cidadania em 1,6 milhão de famílias.

Ela também aumenta o valor pago com o auxílio-gás, de modo a garantir a compra de um botijão a cada dois meses para um público de 5,86 milhões de famílias. E institui o “voucher caminhoneiro” para transportadores autônomos, no valor de R$ 1.000,00 mensais.

Continua depois da publicidade

Durante a tramitação no Senado Federal, também foi incluído um auxílio emergencial destinado a taxistas devidamente registrados até 31 de maio, até o limite de R$ 2 bilhões, além de um dispositivo que assegura suplementação orçamentária de R$ 500 milhões ao programa Alimenta Brasil. Todas as medidas valem apenas até o final de 2022.

A PEC tem impacto fiscal estimado em R$ 41,25 bilhões, gastos através de crédito extraordinário, ou seja, fora do teto de gastos – regra fiscal que limita o crescimento de despesas públicas à evolução da inflação no ano anterior.

As despesas driblam a chamada regra de ouro das finanças públicas, que diz que o Tesouro Nacional não pode se endividar para financiar gastos correntes. E também escapam da legislação eleitoral, que veda concessão de benefícios não programados em ano eleitoral, salvo em situações de decretação de estado de calamidade ou emergência.

Continua depois da publicidade

O rito “natural” de uma PEC

Propostas de Emenda à Constituição (PECs) são os tipos de proposição com tramitação mais complexa no processo legislativo brasileiro.

Na Câmara dos Deputados, o fluxo natural envolve análise de admissibilidade da matéria pela Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania (CCJC), para avaliar se o texto não viola cláusulas pétreas da Carta Magna, como o pacto federativo; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais dos cidadãos.

Passada essa etapa inicial, a proposta segue para análise de mérito em uma comissão especial, que pode modificar a versão originalmente apresentada. O colegiado tem o prazo de, no mínimo, dez sessões do plenário para votar um parecer sobre o texto.

Continua depois da publicidade

Vencida a fase das comissões, a PEC é discutida e votada em plenário. Assim como no Senado Federal, a aprovação depende dos votos favoráveis de 3/5 dos deputados federais (ou seja, pelo menos 308 dos 513 membros da casa legislativa), em dois turnos de votação.

Vale lembrar que o Regimento Interno da Câmara dos Deputados também determina que haja um interstício de cinco sessões entre um turno e outro de votação, período que pode ser dispensado mediante aprovação de requerimento pelos parlamentares em plenário.

Caso o texto tenha sofrido modificações durante a discussão pelos deputados, ele precisa retornar ao Senado Federal. Pela regra, as duas casas precisam aprovar a mesma versão do texto para que ele seja promulgado e passe a valer.

Continua depois da publicidade

A PEC vai de uma casa para a outra (o chamado pingue-pongue) até que seja votada sem diferenças de mérito. Também é possível haver a promulgação “fatiada”, contemplando apenas os pontos votados em comum por deputados e senadores.

Por se tratar de PEC, o texto não é submetido a qualquer controle do Poder Executivo. Isso significa que, caso não concorde com a proposta ou com pontos específicos do texto, o presidente Jair Bolsonaro não conta com o instrumento do veto neste caso.

Estratégia do governo

A menos de duas semanas do recesso parlamentar, o governo depende de uma tramitação acelerada da PEC dos Auxílios para que os benefícios cheguem na ponta ainda em julho.

Para isso, conta com a ajuda de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, que já assinou despacho para apensar a proposta à PEC dos Biocombustíveis, que já estava com tramitação mais avançada na casa legislativa.

Ao unir as duas propostas, os parlamentares farão com que a PEC dos Benefícios pule etapas de sua tramitação regular, usando dos prazos cumpridos já pela PEC dos Biocombustíveis.

Outra estratégia para dar celeridade à matéria foi designar o mesmo relator da PEC dos Biocombustíveis para a nova proposta, o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE).

O presidente da Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, Arthur Oliveira Maia (União Brasil-BA), acredita que seria possível votar a admissibilidade da matéria já na terça-feira (5). Isso se a oposição não pedir vistas para adiar o processo.

Se não houver acordo com a oposição, Maia acredita que a proposta só poderia ser analisada na comissão na sexta-feira (8) – o que encurtaria ainda mais o calendário para as etapas de análise de mérito na tramitação da matéria.

Depois da CCJC, restariam a votação em comissão especial, que poderia ocorrer entre o meio desta semana e o início da próxima, e os dois turnos de votação em plenário, que precisariam acontecer antes da sexta-feira da semana que vem (15).

Pelo Regimento Interno da casa legislativa, uma PEC precisa ser analisada por comissão especial em no mínimo dez sessões. Parlamentares, no entanto, lembram que a PEC dos Precatórios, aprovada pelo Congresso Nacional no fim de 2021, foi direto a plenário após Arthur Lira decidir unir a proposta com outra que já havia passado em comissão especial.

Isso, porém, não significa que serão dias fáceis para o governo federal aprovar seu “pacote de bondades” no apagar das luzes dos trabalhos legislativos.

(com Agência Estado)

ACESSO GRATUITO

CARTEIRA DE BONDS

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.