O que os países têm feito para amenizar a alta nos preços dos combustíveis

Política de subsídios, redução de impostos e ampliação de benefícios sociais estão entre as medidas adotadas no Brasil e em diversas nações

Fábio Matos

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O projeto sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro que limita o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo é mais uma das apostas do governo federal e do Congresso para enfrentar a alta dos preços em ano eleitoral. 

No início da semana, os governos de São Paulo e Goiás foram os primeiros do país a anunciar a redução do ICMS da gasolina para 18% e 17%, respectivamente. Os governadores Rodrigo Garcia (PSDB) e Ronaldo Caiado (União Brasil) alertaram para o impacto da perda de arrecadação – que pode superar R$ 4 bilhões em São Paulo e R$ 3 bilhões em Goiás – e cobraram compensações por parte do governo federal. Em seguida, Rio de Janeiro, Santa Cataria e Minas Gerais fizeram o mesmo.

Os impostos representam cerca de 37% do preço final da gasolina no país. Quatro tributos incidem sobre o valor cobrado na bomba: três federais (Cide, PIS/Pasep e Cofins) e um estadual (ICMS). Ainda há o custo do etanol presente na mistura e o percentual correspondente à distribuição e revenda do combustível. 

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Com as novas regras, os combustíveis passam a ser considerados, para fins de tributação, itens essenciais e indispensáveis – o que impede os estados de cobrarem mais do que a alíquota geral do tributo, entre 17% e 18%. Até então, as categorias eram equiparadas aos produtos e serviços apontados como supérfluos, sujeitos a uma tributação maior que chegava a até 30% em algumas unidades da federação. 

Além da limitação de cobrança do ICMS, o Executivo conseguiu a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Auxílios. O projeto trata do aumento do valor mínimo do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 até o fim do ano, da ampliação do vale-gás e da criação de um “voucher” de R$ 1 mil para caminhoneiros autônomos. 

A preocupação com o efeito da inflação sobre os combustíveis, no entanto, está longe de ser exclusividade brasileira. Em um momento no qual o mundo ainda sente o baque econômico pela pandemia de Covid-19 e sofre as duras consequências da guerra na Ucrânia – com a explosão do preço do petróleo –, vários países vêm adotando medidas que buscam mitigar o peso sobre o bolso do consumidor.

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O InfoMoney mapeou as principais ações levadas a cabo em diversas partes do planeta e conversou com especialistas para repercutir seus potenciais efeitos sobre a economia global. Subsídios ao setor petrolífero, corte de impostos, criação de fundos e de reservas de controle estão entre os principais itens.

Veja alguns exemplos:

Estados Unidos

Na semana passada, o presidente Joe Biden defendeu a suspensão por 90 dias do imposto federal sobre os combustíveis. O país planeja liberar um milhão de barris de petróleo por dia de reservas estratégicas ao longo de seis meses e suspender a regra ambiental que impede a venda de gás com mistura mais alta de etanol no verão. Alguns estados aumentaram sua produção de petróleo e instituíram programas de venda de barris excedentes.

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China

O governo chinês proibiu reajustes significativos de preços que não sejam sustentados por aumentos nos custos de produção ou de compra e prometeu endurecer a fiscalização e punir eventuais “manipulações”. 

Reino Unido

O governo britânico anunciou que mais de 28 milhões de famílias devem ser beneficiadas por descontos de até 350 libras nas contas de energia a partir de outubro. Além disso, houve uma redução no imposto sobre os combustíveis. 

Alemanha

Foi abolida uma sobretaxa na conta de eletricidade que os consumidores pagavam para promover energia limpa. 

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Itália

Ainda no fim de 2021, o governo italiano editou um decreto com medidas emergenciais para conter os preços no setor de eletricidade e de gás natural. Houve uma redução para 5% no imposto sobre o gás de uso civil e industrial. O bônus social para famílias de baixa renda aumentou.

Espanha

No ano passado, o país cortou tributos relacionados à energia. O Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) baixou de 21% para 10%, enquanto o imposto sobre geração de energia foi suspenso temporariamente. Inicialmente, as medidas durariam até o fim de 2021, mas foram prorrogadas até julho. A expectativa é que continuem pelo menos até dezembro. 

Portugal

O Parlamento português aprovou, em outubro do ano passado, o chamado “autovoucher” – por meio do qual é concedido um desconto de dez centavos por litro de combustível para os motoristas. O limite para o uso do benefício é de 20 euros por mês para cada cidadão. 

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França

Foi aprovada a limitação do preço da energia elétrica e do gás natural, além de descontos na gasolina e no diesel para os motoristas e subsídios para os pescadores. 

Bélgica

Em fevereiro, o governo belga aprovou um pacote de mais de 1 bilhão de euros para enfrentar a elevação dos preços no país. O imposto sobre eletricidade caiu de 21% para 6%. Entre as medidas adotadas, estão subsídios e benefícios sociais de até 100 euros para a população. 

México

O governo do presidente Andrés Manuel López Obrador determinou limites de preços para o gás no país. Semanalmente, a Comissão Reguladora de Energia fixa o valor máximo de acordo com os custos de cada estado. O imposto de consumo sobre combustíveis foi reduzido para minimizar o impacto da alta da energia para os motoristas.  

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Argentina

O governo argentino decidiu adotar um ritmo mais lento de redução dos subsídios de energia para serviços públicos.

Peru

O país adotou um imposto regulatório e um fundo de subsídios. Sempre que o petróleo cai abaixo de certo nível, o preço dos combustíveis sobe. Com esses recursos, forma-se uma reserva – utilizada justamente para baixar o preço quando o petróleo tem alta. 

Japão

O primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, anunciou um megapacote de US$ 48 bilhões a serem desembolsados, de forma escalonada, para o aumento do limite dos subsídios à gasolina para refinarias de petróleo. O teto do subsídio para gasolina, diesel e querosene foi elevado para 25 ienes (pouco mais de um real) por litro. 

Coreia do Sul

O governo sul-coreano oferece subsídios a caminhoneiros e motoristas de táxi, diretamente atingidos pela alta no preço dos combustíveis. No início de junho, os sindicatos dos motoristas de carga e trabalhadores do transporte público entraram em greve. 

Indonésia

Só neste ano, o governo desembolsou mais de US$ 27 bilhões para financiar subsídios às empresas estatais de energia. 

Tailândia

O imposto sobre o diesel sofreu redução de 5,99 baht para 2,99 baht (R$ 0,46) por litro durante três meses. Também foi fixado limite para o preço do combustível na bomba. 

Índia

O país reduziu o imposto especial sobre o consumo de combustível. Alguns estados cortaram o imposto sobre o valor agregado da gasolina e do diesel. O governo indiano segurou os preços dos combustíveis até as eleições estaduais. 

Emirados Árabes

Há sete anos, cabe a um comitê de autoridades locais a definição do preço do combustível. O grupo se reúne uma vez por mês para estipular os valores. 

África do Sul

As autoridades sul-africanas reduziram o imposto geral sobre os combustíveis. O governo local anunciou que pretende cortar US$ 0,75 por litro no preço da bomba. 

Austrália

Houve um corte no imposto sobre a gasolina, que passou de 44 centavos de dólar australiano para 22 centavos por litro. 

O preço da gasolina no Brasil e no mundo

Segundo os dados mais recentes da consultoria Global Petrol Prices, que monitora 170 países, o preço mundial médio da gasolina atingiu US$ 1,47 por litro (cerca de R$ 7,66). O levantamento considera os valores praticados até o dia 27 de junho. A tarifa média no Brasil está ligeiramente abaixo desse índice, alcançando US$ 1,403 por litro (aproximadamente R$ 7,30).

Em números absolutos, 75 países têm uma gasolina mais barata que a brasileira. Em 92 países, o preço é mais caro. Entretanto, os dados não levam em conta a paridade de poder de compra e, com isso, acabam não refletindo o custo de vida em cada país. 

De acordo com a Global Petrol Prices, a gasolina no Brasil é mais cara do que em países como EUA, Chile, Índia, México, Japão, Argentina, Colômbia e Rússia; e mais barata que a de China, Paraguai, África do Sul, Costa Rica, Coreia do Sul, Canadá, Peru, França, Itália, Portugal, Espanha e Reino Unido.

Em linhas gerais, os países mais ricos têm a gasolina mais cara, enquanto os mais pobres, em desenvolvimento ou exportadores de petróleo registram preços mais baixos, com algumas exceções. Os sete países com a gasolina mais cara do mundo são Hong Kong (US$ 3,025 por litro), Noruega, Finlândia, Islândia, Dinamarca, Grécia e Holanda. Os que têm os menores preços são Venezuela (US$ 0,022 por litro), Líbia, Irã, Síria, Argélia, Kuwait e Angola.

No Brasil, a política de preços dos combustíveis executada pela Petrobras está vinculada à flutuação do valor praticado no mercado internacional, o que desagrada o governo. No fim de maio, houve mais uma troca no comando da companhia, com a saída de José Mauro Coelho e a indicação de Caio Paes de Andrade para o cargo – ele tomou posse na última terça-feira (28), depois de ser eleito na véspera pelo Conselho de Administração.

No mandato de Bolsonaro, além de Coelho, já haviam passado pela presidência da empresa o economista Roberto Castello Branco e o general Joaquim Silva e Luna.

Efeito imediato e preocupação eleitoral

Para Gabriel Barros, sócio e economista-chefe da Ryo Asset, as medidas adotadas para conter a alta dos combustíveis no país devem funcionar no curto prazo, mas não são sustentáveis. “A situação é bem mais complicada. Essa redução de tributo é temporária. Os estados não têm como absorver a perda fiscal. Para que isso não gere um desequilíbrio estrutural em suas contas, eles terão de ser compensados de alguma forma”, afirma em entrevista ao InfoMoney. “Haverá uma redução dos preços neste ano, mas no ano que vem isso deve ser revertido.”

Segundo Barros, o “Pix Caminhoneiro” e o aumento do Auxílio Brasil e do vale-gás fazem parte de um “conjunto de medidas visando ao calendário eleitoral”. “É como se o Congresso estivesse pisando no acelerador da política fiscal, e o Banco Central ficasse sozinho do outro lado, tentando segurar a inflação”, alerta.  

“Como tudo vai ser feito através de uma nova flexibilização do teto de gastos, é muito ruim para as expectativas dos índices econômicos. Não há mais credibilidade da regra de gastos”, critica Barros. “Estamos mudando o teto a cada seis meses, aprovando emendas constitucionais e banalizando todo o arcabouço fiscal que foi construído. Isso é ruim e aumenta a percepção de risco do mercado.”

Nilson Teixeira, sócio da Macro Capital Gestão de Recursos, se mostra cauteloso em relação às avaliações do Banco Central de que a fase mais aguda da inflação já teria ficado para trás. “Desde meados do ano passado, achava-se que o pior já tivesse passado. No início deste ano, pensava-se que o pior seria por volta de abril, com a inflação alcançando 8%, e nós já estamos terminando junho próximos a 12%”, aponta.

“A questão é quão rápido será esse recuo dos preços e se não haverá outros choques, além do impacto da aproximação das eleições e o grau de incerteza sobre a moeda. O pior provavelmente já passou, mas isso não quer dizer que já estamos no melhor.”

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Fábio Matos

Jornalista formado pela Cásper Líbero, é pós-graduado em marketing político e propaganda eleitoral pela USP. Trabalhou no site da ESPN, pelo qual foi à China para cobrir a Olimpíada de Pequim, em 2008. Além do InfoMoney, teve passagens por Metrópoles, O Antagonista, iG e Terra, cobrindo política e economia. Como assessor de imprensa, atuou na Câmara dos Deputados e no Ministério da Cultura. É autor dos livros “Dias: a Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960” e “20 Jogos Eternos do São Paulo”.