Guedes apoia sugestão para CNJ encaminhar regras para precatórios

Na prática, saída sugerida por Fux exige menor esforço político em comparação com a PEC defendida pelo governo

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – O ministro Paulo Guedes (Economia) afirmou, nesta quinta-feira (26), que o governo está trabalhando com os demais Poderes em uma saída alternativa para o impasse envolvendo o pagamento de precatórios – valores devidos pelo governo federal após sentença definitiva na Justiça.

Em painel pela Expert XP 2021, ele confirmou o que havia sido sinalizado mais cedo pelo ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).

A ideia, ainda em fase “embrionária”, seria a edição de uma resolução pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para limitar a despesa anual com pagamento dos precatórios.

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A resolução, que deverá ser construída em acordo com o parlamento, estabeleceria regras aplicáveis à União, aos estados e municípios. No caso do governo federal, isso poderia significar o pagamento de R$ 40 bilhões em 2022 e o saldo restante (R$ 49 bilhões) seria pago no Orçamento dos anos seguintes.

A solução proposta deverá partir do valor da despesa com precatórios em 2016 (ano em que foi instituído o teto de gastos): R$ 30,3 bilhões. A partir daí, seria aplicada a mesma lógica da regra fiscal, com a correção dos valores pela inflação de 12 meses.

Na prática, esta seria uma saída politicamente muito mais simples, já que não demandaria o esforço de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), como o governo havia encaminhado no início do mês. Para prosperarem, PECs precisam do apoio de 3/5 dos deputados e senadores em dois turnos de votação em cada casa legislativa.

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Para Guedes, a solução via CNJ é “muito interessante” e atacaria o que ele entende ser um “vício de origem” na emenda constitucional que instituiu o teto de gastos – regra fiscal que limita o crescimento das despesas do governo em um ano à inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior.

“Quando saiu o texto [da emenda do teto de gastos], deveria haver o reconhecimento que o Executivo não controla essas despesas. Então, se o Judiciário legislar acima da capacidade de execução daquele ano, aquilo deveria, também, estar sujeito ao teto. Isso é uma medida de extraordinária lucidez”, elogiou.

Segundo o ministro, a construção envolve, além de Fux, os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL); do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG); o ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU); e ministros do próprio Supremo, como o decano Gilmar Mendes.

A expectativa de Guedes é que a solução seja encaminhada “nas próximas duas semanas”.

Durante o painel, o ministro disse que não há interesse eleitoral no movimento de parcelar precatórios e abrir espaço orçamentário (que originalmente seria usado para tais despesas) no ano que vem. “Nós estamos sendo absolutamente republicanos”, afirmou.

“Quando vem uma despesa obrigatória de R$ 90 bilhões – um salto de R$ 40 bilhões acima da nossa provisão –, ele na verdade inviabiliza os aumentos de políticas sociais em geral, seja vacina de um lado, Bolsa Família de outro lado, aumento de salário mínimo. Todos esses aumentos, que seriam normais e já estavam orçados, são abalados exatamente pelo descontrole sobre uma despesa pública”, disse.

“Por isso que, em vez de fazer uma negociação de precatório – como o ministro [Pedro] Malan fez, o ministro [Guido] Mantega, o ministro [Henrique] Meirelles fez… Em vez de resolver o problema do nosso governo, de um ano que falta para terminar, nós resolvemos fazer algo republicano”, complementou.

Guedes também voltou a negar que o parcelamento das despesas com ações transitadas em julgado represente um “calote”. “Isso é a mesma coisa que dizer que alguém que faz um Refis deu calote. Não deu calote, ele está dizendo: ‘vou pagar. Por favor, faça uma modulação nos pagamentos'”, disse.

“É engraçado que os economistas não falam que os estados e municípios deram calote, nem que o Supremo promoveu um calote. Só que o Supremo criou essa jurisprudência. O Supremo permitiu que estados e municípios tivessem um parcelamento de seus precatórios. Exatamente porque senão ia parar a máquina de estados e municípios para saúde, saneamento, segurança pública”, complementou.

O ministro também ironizou, no evento, integrantes do mercado financeiro que defendem a flexibilização do teto de gastos para pagamento de precatórios e criticam movimento similar para eventual ampliação do Bolsa Família.

“É tão simples essa conclusão que só posso atribuir a má intenção de um lado ou, naturalmente, jogo de interesse. Se tem muita gente no mercado com fundo de precatório, é natural que eles achem que R$ 30 bilhões a mais de precatório pode, mesmo que fora do teto. Agora, R$ 30 bilhões para Bolsa Família não pode”, afirmou.

“O que estamos dizendo é que não queremos furar o teto nem com um nem com outro. Nós queremos, justamente, criar um algoritmo de controle das despesas públicas para que futuros governos não tenham esse mesmo problema”, argumentou.

Durante o painel, Guedes também alegou que o movimento com os precatórios não tem como objetivo a acomodação do Auxílio Brasil – novo programa de transferência que o governo pretende criar para substituir o Bolsa Família, ampliando o número de beneficiários e o valor médio dos repasses mensais.

“A coisa dos precatórios não é para o Bolsa Família. A coisa dos precatórios é para abrir o espaço do funcionamento do governo”, disse. “Nunca foi para o Bolsa Família especificamente, porque ele já estava orçado com os recursos que tínhamos”.

“Essas iniciativas não têm absolutamente nada de populismo. Se visse até um pouco mais de recurso, o Bolsa Família não seria maior. Estava combinado. É acima de 50% de aumento, e não passa de R$ 300”, concluiu.

Entenda a PEC dos Precatórios

Há 17 dias, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi pessoalmente ao Congresso Nacional entregar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) estabelecendo regras de parcelamento dos precatórios. O texto, porém, tem enfrentado muitas resistências de parlamentares e técnicos.

A Constituição Federal já prevê a possibilidade de parcelamento de dívidas judiciais da União. Tal possibilidade, no entanto, está condicionada a precatórios com valores superiores a 15% do montante de precatórios apresentados.

Neste caso, 15% do valor desses precatórios poderá ser pago até o final do exercício seguinte e o restante em parcelas iguais nos cinco exercícios subsequentes, acrescidas de juros de mora e correção monetária, ou mediante acordos diretos, com redução máxima de 40% do valor do crédito atualizado.

Os técnicos da equipe econômica argumentam que tal regra é hoje “inócua” pela ótica das contas públicas, já que hoje enquadraria apenas dois precatórios e pouco mitigaria os efeitos de uma despesa que deve crescer R$ 34,4 bilhões no ano que vem, para R$ 89,1 bilhões.

A PEC apresentada pelo governo preserva precatórios considerados de pequeno valor, que sempre estarão fora do parcelamento e serão pagos à vista de forma integral. Integram o grupo peças que não ultrapassem 60 salários mínimos (ou seja, R$ 66 mil).

Na outra ponta, os chamados “superprecatórios” poderão ser pagos em dez parcelas, sendo 15% à vista e o restante em parcelas anuais. O montante será corrigido pela taxa Selic. Integram este grupo peças com valor superior a 1.000 vezes 60 salários mínimos (ou seja, R$ 66 milhões).

O restante dos precatórios, localizados na faixa intermediária entre os de pequeno valor e os “superprecatórios”, estarão sujeitos a uma regra temporária, que irá até 2029. Neste caso, seria permitido o parcelamento quando a soma desses precatórios superar 2,6% da receita corrente líquida da União nos 12 meses anteriores à apresentação pelo Judiciário.

O critério seria pelo parcelamento em ordem decrescente em relação ao valor das peças, com a mesma regra de correção anual pela Selic. O percentual de 2,6% foi obtido a partir da média de despesas com precatórios em relação à receita corrente líquida entre os anos de 2015 e 2019.

A PEC também prevê a criação de um fundo de Liquidação de Passivos da União, cujos recursos poderão ser utilizados para pagamento da dívida pública federal interna e externa e o pagamento antecipado de precatórios parcelados.

O fundo, que ficaria fora das regras da emenda do teto de gastos, teria seis fontes de receita:

1) Alienação de imóveis da União;

2) Alienação de participação societária de empresas;

3) Dividendos recebidos de empresas estatais deduzidas as despesas de empresas estatais dependentes;

4) Outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial;

5) Antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo; e

6) Arrecadação decorrente do primeiro ano de redução de benefícios tributários.

Da lista apresentada, os recursos de venda de estatais e de imóveis seriam destinados integralmente ao fundo. Já no caso dos dividendos, seriam direcionados somente os valores que excederem a despesa com custeio e pessoal de estatais dependentes.

O texto propõe, ainda, a instituição possibilidade de um chamado “encontro de contas” com os estados e municípios, o que permitiria um abatimento nos precatórios dos valores devidos pelos entes da federação.

Caso o caminho adotado seja a resolução do CNJ, a ideia da criação do fundo de liquidação de passivos poderia ser descartada pelo governo.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.