Disputa entre Arthur Lira e Baleia Rossi esquenta a um mês da eleição na Câmara; entenda o que está em jogo

Escolhido para o comando da Casa terá importante papel sobre a agenda dos próximos dois anos; votação será secreta e marcada por incertezas

Marcos Mortari

Brasília - Plenário da Câmara dos Deputados, durante pronunciamento do Presidente Temer. Foto José Cruz/Agência Brasil

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SÃO PAULO – A pouco menos de um mês do pleito, a corrida pela sucessão de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na presidência da Câmara dos Deputados esquenta em pleno recesso parlamentar. A primeira semana útil de 2021 deve marcar uma intensificação nos esforços dos candidatos em negociações no varejo e uma ampla expectativa pela decisão do PT, maior bancada da Casa, com 52 representantes.

Há 12 dias, o deputado Baleia Rossi (SP), presidente nacional do MDB, formalizou sua candidatura, representando o grupo partidário organizado por Maia. O anúncio ocorreu após o líder da maioria na casa, Aguinaldo Ribeiro (MDB-PB), abrir mão de disputar. Ele conta com o apoio de DEM (28), MDB (34), PSDB (33), Cidadania (7), PSL (36) e PV (4), além de siglas da oposição como PDT (27), PSB (30) e PCdoB (9).

Do outro lado está Arthur Lira (PP-AL), líder do chamado “centrão” e que conta com o endosso do governo Jair Bolsonaro. O parlamentar está em campanha há muito mais tempo, embora tenha formalizado sua candidatura em 9 de dezembro, poucos dias após o Supremo Tribunal Federal (STF) impedir a reeleição de presidentes nas duas Casas em um mesma legislatura.

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O parlamentar alagoano conta com o apoio de PP (40), PL (43), PSD (35), PSC (9), Pros (10), Avante (8), Patriota (1) e Republicanos (31). Também espera-se que PTB (11) e Podemos (10) endossem formalmente sua candidatura.

Além dos dois, correm por fora na disputa os deputados Capitão Augusto (PL-SP) e Fábio Ramalho (MDB-MG). O PSOL (10) também decidiu não participar do bloco de Maia e deverá lançar candidatura própria para marcar posição. Também há discussões no Novo (8) para o lançamento de uma candidatura própria.

O escolhido para comandar a Câmara dos Deputados herda um poder político imenso e tem a responsabilidade de conduzir os trabalhos do plenário e definir as propostas que deverão ser colocadas em votação. Também é sua atribuição representar a casa legislativa na interlocução com os demais Poderes. Além disso, é o segundo na linha sucessória presidencial em caso de impedimento ou vacância.

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O presidente da Câmara dos Deputados é o único que pode colocar em pauta um pedido de impeachment contra o presidente da República e autorizar a abertura de processos contra ministros.

Para ser eleito presidente da casa legislativa pelos próximos dois anos, o candidato tem que atingir a maioria absoluta dos votos – ou seja, 257 – na sessão de 1º de fevereiro. Caso nenhum dos postulantes alcance a marca, haverá segundo turno entre os dois mais votados na mesmo data. A pulverização de candidaturas, em tese, dificulta a possibilidade de vitória em primeiro turno.

Lira e Baleia são apontados como favoritos entre os parlamentares e analistas políticos, tendo em vista as alianças até o momento construídas. Mas, como a votação para o comando da casa legislativa é secreta, há maior espaço para traições e surpresas. O líder do “centrão”, inclusive, explora a insatisfação de deputados de DEM, MDB, PSL e da oposição no adversário como trunfo para virar votos.

Embora tenha construído um arco de apoio partidário menor, Lira tem ao seu favor a simpatia do Palácio do Planalto e o Diário Oficial da União. Nos bastidores, as conversas sobre espaços no governo e liberação de emendas em troca de apoio ganham tração e podem conferir vantagem nas negociações individuais.

Nos próximos dias, o deputado deve começar a viajar o país em busca de apoio, forçando dissidências nas legendas que sinalizaram apoio ao principal adversário.

Já Baleia tem na imagem de candidato independente sua principal aposta para consolidar uma frente ampla, da centro-direita à esquerda. Aliados do emedebista têm explorado o estreitamento das relações entre o adversário e Bolsonaro (sem partido) para convencer parlamentares da oposição a apoiá-lo.

Na semana passada, o presidente declarou a apoiadores que está do lado dos adversários da chapa organizada por Maia. “Teremos eleição [na Câmara e no Senado] agora. Uma das chapas ali [na Câmara] é o Rodrigo Maia e PT, PCdoB e PSOL. E tem uma outra chapa. Eu estou nessa outra. Não vou nem discutir. Quem está de um lado: PT, PCdoB e Rodrigo Maia. Eu estou do outro lado”, disse.

O parlamentar tem boas esperanças de que a bancada do PT formalize adesão à sua candidatura. Os deputados do partido têm reunião marcada para às 15h (horário de Brasília) desta segunda-feira (4) para tratar do assunto. Fieis da balança na disputa, membros da oposição buscam vantagens na negociação por endosso.

Para Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores, a escolha de Baleia Rossi como candidato do autointitulado “bloco independente” deveu-se fundamentalmente ao risco de haver grande perda de votos no MDB. Por outro lado, diminui-se a possibilidade de abrir dissidência no PP e amplia-se o risco de perda de apoio no PT.

“O teste agora é saber quanto esse nome acarretará de perdas na aliança que Rodrigo Maia construiu. A principal preocupação para o grupo é o PT, mas acredito que o partido não conseguirá votar a favor de Arthur Lira, candidato favorito do Palácio do Planalto. Todo mundo sabe que o voto é secreto, talvez alguns petistas votem em Lira, mas a dissidência não tende a ser relevante para tirar tantos votos do Baleia”, diz.

Hoje, o cenário do especialista é de leve vantagem para Baleia Rossi – salvo se a bancada petista decidir não votar no emedebista. “No essencial, está aberto, porque Lira está trabalhando há muito tempo e o governo está liberando muito recurso. Isso pode fazer com que no varejo ele equilibre o jogo, porque na soma das bancadas o grupo do Maia é maior. Hoje eu veria um ligeiro favoritismo para Baleia”, avalia.

Avaliação similar tem o cientista político Rafael Cortez, sócio da Tendências Consultoria Integrada e professor do IDP. Para ele, além dos desafios em atrair parlamentares da oposição, Baleia Rossi terá como obstáculo uma resistência à possibilidade de o MDB retomar o comando das duas casas legislativas.

Como Davi Alcolumbre (DEM-AP) está impedido de tentar a reeleição para o comando do Senado Federal, a bancada emedebista tem reivindicado o posto como maior bancada da Casa. O partido tem 13 senadores – oito a mais que o DEM, de Rodrigo Pacheco (MG), hoje o principal adversário na disputa.

“Ao trazer nome do MDB, essas disputas ficam inter-relacionados. Acho menos provável um cenário em que o partido vença as duas disputas”, aposta o especialista.

Para Cortez, a campanha de distanciamento em relação ao governo federal foi acertada, e agora o desafio do emedebista passa a ser evitar perda das negociações no varejo, diante do voto secreto. “O peso do governo na disputa é significativo e o voto secreto envolve um cuidado”, pontua.

A posição de fiel da balança dos partidos de esquerda, dizem os analistas, pode influenciar na agenda legislativa dependendo do resultado da disputa pelo comando da Câmara dos Deputados.

“A ideia de que a agenda de privatização não avançou por conta de acordo de Maia parece fantasioso. A oposição à esquerda não tinha essa força. Maia não precisava fazer acordo em termos de conteúdo e proposta. Desta vez, pode ser que tenha algo, sim. Não acho que haverá compromisso de travar agenda de reformas, mas alguns aspectos podem ficar mais difíceis. Talvez privatizações sejam um deles”, diz Ribeiro.

“A vantagem eventual do grupo Maia é muito estreita, isso assumindo o comportamento disciplinado da bancada. Nesse sentido, cada voto da esquerda vai ter um peso muito importante. Algumas agendas que poderiam aparecer em vitória de Lira talvez fiquem bloqueadas. Muito tem a ver com a agenda econômica. Encontrar um espaço para a esquerda na agenda econômica parece muito desafiador”, observa Cortez.

Na avaliação do analista, a eleição para o comando da casa legislativa pelos próximos dois anos terá ingredientes de uma antecipação da corrida presidencial de 2022 e poderá provocar cicatrizes entre partidos e influenciar no futuro de agendas fiscais e reformistas.

Analistas da consultoria de risco político Eurasia Group lembram que parlamentares petistas têm resistências ao nome de Baleia Rossi, seja pelo papel desempenhado pelo MDB no impeachment de Dilma Rousseff (PT), seja na proximidade da bancada de senadores com o presidente Jair Bolsonaro ou sua postura favorável a uma agenda de reformas econômicas.

“Rossi provavelmente terá de fazer concessões à esquerda, como obstruir privatizações, para conseguir essa aliança. O outro nome na lista de candidatos Maia era Aguinaldo Ribeiro, do partido de Lira (PP), que tem laços mais fortes com a esquerda e parecia um pouco mais competitivo. Se o PT ou outros partidos de esquerda rejeitarem a indicação de Rossi, eles provavelmente terão seus próprios candidatos, apontando para uma disputa mais fragmentada – o que deve beneficiar Lira”, avaliam.

Ainda assim, é pouco provável que tais concessões atrapalhem o andamento de reformas fiscais, apostam. “Independentemente de quem vença, os líderes da casa vão continuar defendendo o teto de gastos e as medidas de controle orçamentário, especialmente se uma segunda onda de covid-19 aumentar a pressão dos investidores por mais disciplina fiscal”, dizem.

Para eles, Baleia Rossi larga em desvantagem e Lira seria hoje o favorito para suceder Rodrigo Maia. “Lira é o favorito para vencer, mas Rossi pode virar a corrida a seu favor se conseguir o apoio unificado do centro independente de Maia e de parlamentares da esquerda”, observam.

Em termos de pauta, os analistas da Eurasia acreditam que Baleia teria melhores condições de avançar com a reforma tributária – o parlamentar, inclusive é autor da PEC 45/2019, uma das principais propostas em tramitação sobre o assunto. Mas temas que enfrentam mais resistência da esquerda, como privatizações e autonomia do Banco Central, poderiam sofrer obstrução.

A quatro semanas do pleito, embora o quadro de candidaturas esteja um pouco mais claro, a disputa segue acirrada. O voto secreto reduz o controle de líderes partidários sobre suas bancadas e amplia o nível de incerteza na corrida, assim como a possibilidade do surgimento de novas candidaturas até o dia da votação.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.