Moraes torna público depoimento de Cid em que militar reafirma delação; leia íntegra

Ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, que assinou colaboração premiada, contradisse áudios vazados e afirmou não ter havido pressão da PF

Lucas Sampaio

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seu ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid (Foto: Alan dos Santos/Presidência da República)
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seu ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid (Foto: Alan dos Santos/Presidência da República)

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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tornou pública a ata de audiência do tenente-coronel Mauro Cid desta sexta-feira (22), em que o ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) confirma integralmente os termos de sua delação premiada.

“Diante da necessidade de afastar qualquer dúvida sobre a legalidade, espontaneidade e voluntariedade da colaboração de Mauro César Barbosa Cid, que confirmou integralmente os termos anteriores de suas declarações, torno pública a ata de audiência realizada para a oitiva do colaborador”, afirmou Moraes em seu despacho (leia aqui o documento e, ao final do texto, a íntegra da oitiva).

Segundo informações dos jornais Folha de S.Paulo O Globo e da CNN BrasilCid passou mal e desmaiou, ao saber que seria novamente detido, e teve de ser atendido por socorristas do Supremo. A CNN disse também que a PF fez uma nova busca e apreensão na casa do militar em Brasília.

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O tenente-coronel do Exército foi chamado para depor novamente após a revista Veja publicar áudios vazados em que o militar critica a atuação de Moraes, relator do inquérito no STF, e da Polícia Federal (PF). Durante a audiência, Cid confirmou que mandou mensagem de áudio a amigos, em tom de “desabafo”.

Mas, ao contrário do que disse nas mensagens, o militar reafirmou que decidiu delatar espontaneamente os fatos que presenciou durante o governo Bolsonaro e que não houve pressão do Judiciário ou da PF para fazer as acusações.

Após ser ouvido, Cid recebeu voz de prisão, que foi determinada por Moraes por descumprir medidas cautelares e por obstrução de Justiça (as medidas foram impostas em setembro, quando o militar foi solto após fazer a delação).

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O depoimento ocorreu às 13h de ontem na sala de audiências do STF, com a presença da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da defesa do militar. A oitiva durou cerca de uma hora e foi presidida pelo desembargador Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Moraes (leia aqui — ou logo abaixo — o termo da audiência na íntegra).

Prisão, delação e indiciamento

Cid já havia sido preso em maio do ano passado, durante uma operação da PF para investigar fraudes na carteira de vacinação do ex-presidente e de aliados. Após prestar três depoimentos, o ex-auxiliar de Bolsonaro fechou um acordo de colaboração premiada com a polícia, que foi homologado por Moraes em setembro, e deixou a prisão.

Agora, segundo o STF, a validade dos termos da delação de Cid passam por análise. O ex-ajudante de ordens já corria o risco de perder os benefícios da colaboração, após a PF constatar lacunas durante as investigações sobre a tentativa de golpe de Estado. Se delação for anulada, o militar os benefícios acordados, mas as provas serão mantidas.

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Cid e Bolsonaro foram indiciados pela polícia na terça-feira (19), junto com o deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ), pelos crimes de associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema público. Os investigadores concluíram que certificados de vacinação contra a Covid-19 foram falsificados.

Íntegra do termo da audiência

Supremo Tribunal Federal

TERMO DE AUDIÊNCIA

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Aos vinte e dois dias do mês de março de 2024, às 13h00, na sala de audiência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, sob a presidência do Magistrado Instrutor do Gabinete do Ministro ALEXANDRE DE MORAES, Desembargador Airton Vieira, comigo Escrevente ao final nomeada, foi aberta a audiência designada nos autos da PET 11767. Cumpridas as formalidades legais e apregoadas as partes, compareceram o sr. MAURO CESAR BARBOSA CID, brasileiro, CPF (trecho suprimido pela reportagem), representado pelos advogados Cezar Roberto Bittencourt (OAB/RS 11.483) e Vania Barbosa Adorno Bittencourt (OAB/DF 49.787) e a Procuradora da República, Dra Ligia Cireno Teobaldo.

O Magistrado Instrutor circunstanciou os presentes sobre a finalidade da audiência.

(As perguntas e respostas estão sendo gravadas e a íntegra da audiência será juntada aos autos ao final da audiência)

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Pelo(a) MM. Magistrado Instrutor foi perguntado: – O senhor participou de audiência nesta CORTE, no dia 06/09/23, sob a condução do então Juiz Auxiliar Marco Vargas. Na ocasião, o senhor confirmou a presença dos requisitos previstos no § 7º do artigo 4º da Lei 12850/13. O senhor se recorda da audiência? Resp: sim, se recorda da audiência e das circunstâncias onde ela foi realizada e dos participantes. O senhor foi acompanhado por seus defensores na audiência realizada m 06/09/23, aqui no STF? Resp: sim, estava acompanhado do Dr. Cezar e da Dra. Vania. O senhor esteve sempre acompanhado por seus defensores nas oitivas realizadas pela autoridade policial? Resp: sempre esteve acompanhado por advogados, na maioria das vezes com mais de um advogado. O senhor reafirma a voluntariedade da manifestação de vontade exteriorizada na audiência realizada no dia 06/09 p.p.? Resp: sim, confirma e reafirma; a vontade continua sendo a mesma. De forma espontânea e voluntária. Ciente de que seria feita a colaboração. Afirma não ter havido pressão do judiciário ou da policia. Conversou previamente com os advogados sobre a colaboração. O senhor foi coagido em algum momento, por qualquer pessoa ou instituição, a firmar o acordo de colaboração? Resp: A decisão foi própria, de livre e espontânea vontade. O senhor tem ciência dos termos da colaboração, inclusive das cláusulas relacionadas às suas obrigações? Resp: sim, tenho ciência dos termos e concordei com todas elas.

Pelo(a) MM. Magistrado Instrutor foi perguntado: – O senhor tem ciência dos
áudios divulgados pela revista veja, na data de ontem, 21/03/2024 ? Resp: teve
ciência através da revista. A conversa era privada, informal, privada, particular,
sem intuito de ser exposta em revista de grande circulação.
O senhor reconhece
os áudios divulgados? O senhor proferiu as mensagens? Resp: que ouviu todos os
áudios. Reconhece as falas, foram proferidas por mim, em conversa privada.

Quem é o interlocutor das mensagens divulgadas na reportagem? Resp: está
recluso, praticamente em casa, não tem vida social e não trabalha. Não lembra
para quem falou essas frases de desabafo, num momento ruim. Não conseguiu
ainda identificar quem foi essa pessoa. Não acredita que alguém do núcleo
próximo tenha contato com a imprensa. Possivelmente a conversa teria
ocorrido por telefone. Provavelmente celular. O círculo próximo é composto por
amigos, amigos militares, amigos da equitação. Não tem ideia de quando
aconteceu. Está sofrendo exposição midiática muito grande que prejudica as
relações. Está com problemas financeiros e familiares. Está prestes a ser
promovido. Esse mês de março, por causa da promoção, está mais sensível.
Tudo que falou foi um desabafo. Não sabe se os áudios estão em ordem correta.
Que perdeu tudo que tinha. Foi apenas um desabafo. Uma forma de expressar.

Poderia nominar as pessoas com as quais tem conversado regularmente? Resp:
meu irmão Daniel Cid, meu cunhado, minha prima, meu amigo Rafael Maciel, os
coronéis Sobral, Lessa que são mais próximos, eram da minha turma, e o
sargento Tiago. Não tenho contato com nenhum político, ninguém do judiciário,
ninguém de núcleo/esfera política.
Quem são os “policiais” que queriam que o
senhor falasse coisas que não sabia ou não teriam acontecido? Resp: ninguém o
teria forçado. Eles tem a tese investigativa e ele tem a versão dela. Muitas vezes
as versões eram contrárias. Nunca houve induzimento às respostas. Nenhum
membro da polícia federal o coagiu a falar algo que não teria acontecido.
Qual
a suposta versão “verdadeira” e de qual fato o senhor se refere, quando afirma no
áudio ter contado aos policiais e eles não teriam acreditado? Resp: eles tinham
outra linha investigativa e a versão dos fatos era outra. Ele explicava como tinha
ocorrido. Os policiais traziam os fatos na forma que estavam investigando.
O
que o senhor quis dizer com “narrativa pronta”? Quem tinha essa narrativa pronta ?
Sobre qual fato ?
Resp: já tinham uma linha de investigação. O delegado disse que ouviu por último para fechar o quebra-cabeça. Entrou para corroborar. Refere-se ao depoimento do dia 11/03. Todos foram presos, ouvidos e por último ele foi ouvido. Ele foi “fechar” os buracos naquela linha de investigação. Qual a “sentença pronta” que o senhor afirma que o Ministro relator possui ? Quem é “todo mundo”? Denúncia e prende todo mundo quem? Resp: é um desabafo, quer chutar a porta e acaba falando besteira. Genérico, todo mundo, acaba dizendo coisas que não eram para serem ditas. Em razão da situação que está vivendo, foi um desabafo. É um desserviço que a Veja faz ao inquérito, a minha família, ás minhas filhas. O senhor afirma que todos se deram bem, ficaram milionários. Quem são essas pessoas ? Resp: estava falando do presidente Bolsonaro que ganhou pix, aos generais que estão envolvidos na onvestigação e estão na reserva. E no caso próprio perdeu tudo. A carreira está desabando. Os amigos o tratam como um leproso, com medo de se prejudicar. Não é político, não é militar, quer ter a vida de volta. Está enclausurado. A imprensa sempre fica indo atrás. Está agoniado. Engordou mais de 10 quilos. O áudio é um desabafo. Acredita que as pessoas deviam o estar apoiando e dando sustentação. “A cama está toda armada”.. Os “bagrinhos” estão pegando 17 anos… Os mais altos vão pegar quanto ? quem são esses mais altos? A quem o senhor se referia? Resp: reclamação genérica do que está acontecendo. Se assusta com as penas. Imagina qual a pena que os mais altos vão pegar. É um desabafo e preocupação com o futuro. Foi o único que teve a família exposta pela imprensa. Toda a família está sofrendo. O senhor confirma integralmente o ultimo depoimento que foi prestado à autoridade policial em 11/03/2024? O senhor estava acompanhado por seus defensores ? Resp: confirma integralmente, não foi pressionado e respondeu a todas as perguntas. Estava acompanhado do Dr. Cezar e da Dra. Vania. O senhor está mantendo contato, por qualquer meio, com outros investigados ou interlocutores desses investigados ? Resp: não tem mantido nenhum contato com os investigados ou interlocutores. O senhor deseja manter o acordo de colaboração ou pretende rompê-lo ? Resp: deseja manter o acordo de colaboração premiada. Deseja manter nos exatos termos que foi celebrado.

Dada a palavra para a Procuradoria da República, foi perguntado: (as perguntas
formuladas pela Procuradora da República e respostas fornecidas pelo colaborador
estão sendo gravadas e a íntegra da audiência será juntada aos autos ao final da
audiência)

Dada a palavra para a defesa, assim foi dito: (as perguntas formuladas pela defesa
e respostas fornecidas pelo colaborador estão sendo gravadas e a íntegra da
audiência será juntada aos autos ao final da audiência)

Pelo(a) MM. Magistrado Instrutor foi dito: Vistos. Após perguntado, o colaborador
respondeu às perguntas. Sendo assim, nada havendo para ser decidido, dou por
encerrada a presente audiência. Nada mais.

Pelo MM. Magistrado Instrutor foi encerrada a audiência.

Determino à Secretaria Judicial, a juntada aos autos da gravação da presente audiência. Após, retornem os autos conclusos. E, para constar, determinou-se a lavratura do presente termo, que vai devidamente assinado. Eu, (Cristina Yukiko Kusahara Gomes), assessora, matrícula 3430, o digitei e o subscrevi.

Magistrado Instrutor Des. Airton Vieira:

Procuradora da República Dra. Ligia Cireno Teobaldo

Depoente Mauro Cesar Barbosa Cid

Defesa Constituída

Lucas Sampaio

Jornalista com 12 anos de experiência nos principais grupos de comunicação do Brasil (TV Globo, Folha, Estadão e Grupo Abril), em diversas funções (editor, repórter, produtor e redator) e editorias (economia, internacional, tecnologia, política e cidades). Graduado pela UFSC com intercâmbio na Universidade Nova de Lisboa.