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O PL da Dosimetria, aprovado pela Câmara e agora sob análise do Senado, prevê uma redução nas penas totais de condenados pelo 8 de Janeiro e acelera de maneira significativa o tempo necessário para deixar o regime fechado.
O projeto altera o enquadramento de dois crimes — golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito — e modifica regras de execução que determinam quanto tempo cada réu permanece em regime fechado. Com isso, condenados podem deixar o regime fechado antes do prazo atualmente previsto.
É o caso de três personagens emblemáticos dos julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF): Fátima Mendonça, Antônio Cláudio Alves Ferreira e Débora Rodrigues dos Santos, conhecida como “Débora do Batom”.
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PL da Dosimetria: como votou cada deputado no projeto que reduz pena de Bolsonaro
Texto agora segue para apreciação no Senado Federal

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Como as penas são recalculadas
O PL impede a soma das penas por golpe de Estado e abolição violenta quando praticadas no mesmo contexto. Nesse caso, aplica-se apenas a pena do crime mais grave, com acréscimo de um sexto. Em seguida, o texto prevê redução adicional de um terço quando o condenado tiver atuado em meio a multidão, desde que não haja elementos de liderança ou financiamento.
Crimes como associação criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado não são afetados pelo PL. Eles seguem sendo somados integralmente.
Fátima de Tubarão
Fátima Mendonça foi condenada pelo Supremo Tribunal Federal a 17 anos de prisão, após ser enquadrada em cinco crimes: abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e associação criminosa armada. A sentença a colocou entre os réus com penas mais altas no grupo classificado como participantes de “núcleos de execução” dos atos de 8 de Janeiro.
Com o PL da Dosimetria, a estrutura de cálculo de sua pena é reorganizada. Os dois crimes do Estado Democrático — que hoje são somados integralmente na dosimetria — passam a ser tratados como um único bloco, com aplicação apenas da pena do crime mais grave (golpe de Estado), aumento de um sexto e redução prevista para casos de envolvimento em contexto de multidão.
Esse grupo de crimes, que atualmente representa o maior peso na condenação de Fátima, cai para 61 meses após o novo cálculo.
Os demais crimes, que não são alterados pelo projeto — dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e associação criminosa armada — continuam sendo somados integralmente, totalizando 60 meses. Assim, a pena final passa a 10 anos e 1 mês.
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O impacto mais imediato está na execução penal. Com a progressão restabelecida em 1/6 da pena total, Fátima, que hoje teria de cumprir mais de quatro anos antes de deixar o regime fechado, poderia avançar para o semiaberto após aproximadamente 20 meses.
A mudança reduz o tempo de encarceramento efetivo e altera substancialmente o horizonte de cumprimento de pena da condenada.
Flagrado destruindo relógio
O caso de Antônio Cláudio Alves Ferreira, flagrado em vídeos de segurança destruindo um relógio, produzido pelo francês Balthazar Martinot, dado de presente ao imperador Dom João VI, replica matematicamente a situação de Fátima Mendonça.
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Condenado pelos mesmos cinco crimes e com os mesmos valores atribuídos pelo STF, ele também recebeu sentença de 17 anos de prisão. Sua atuação no 8 de Janeiro foi classificada dentro do núcleo de participação direta nas ações que resultaram na depredação das sedes dos Três Poderes.
Com o PL da Dosimetria, a reestruturação do cálculo penal produz o mesmo efeito observado no caso de Fátima. O bloco formado por golpe de Estado e abolição violenta passa por redução após a nova regra do concurso formal próprio, chegando aos mesmos 61 meses. Somados aos demais crimes, a pena final também fica em 10 anos e 1 mês.
A progressão em um sexto, prevista de forma clara no texto, abre a possibilidade de que Antônio Cláudio deixe o regime fechado em período semelhante ao de Fátima: cerca de um ano e oito meses.
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O novo marco de remição — válido também para atividades exercidas em prisão domiciliar, caso venha a obtê-la futuramente — reforça a tendência de diminuição do tempo total de encarceramento efetivo.
“Débora do Batom”
Débora Rodrigues dos Santos tornou-se uma das personagens mais citadas dos julgamentos em razão do episódio em que aparece danificando a estátua da Justiça no STF. Ela foi condenada a 14 anos de prisão por cinco crimes: abolição violenta, golpe de Estado, dano qualificado, deterioração de patrimônio e associação criminosa armada.
O PL aplica a ela o mesmo recálculo do bloco democrático: golpe e abolição deixam de ser somados, passando a gerar 47 meses após o concurso formal com aumento de um sexto e redução de um terço. Os outros três crimes totalizam 54 meses, levando a pena final para 8 anos e 5 meses.
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Débora cumpre prisão domiciliar por ser mãe de crianças pequenas, o que a coloca entre as condenadas diretamente afetadas pela previsão expressa de remição em regime domiciliar — ponto que o STF vinha aplicando de forma restrita.
Ela poderá abater um dia de pena a cada três dias trabalhados e um dia a cada seis dias estudados, mecanismo que acelera a transição para regimes mais brandos.
Com a progressão em um sexto, Débora poderia avançar para o semiaberto após aproximadamente 16 meses, embora, na prática, sua situação domiciliar já antecipe parte dos efeitos do novo modelo de execução penal.
Próximos passos no Senado
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), indicou que pretende votar o texto ainda este ano, caso haja acordo entre as bancadas. Lideranças do PSD e do MDB pedem mais tempo de análise, enquanto a oposição pressiona por votação rápida.
Caso aprovado, o PL provocará uma das mudanças mais relevantes na política penal aplicada aos condenados do 8 de Janeiro desde o início dos julgamentos.