Câmara aprova texto-base da PEC dos Precatórios em primeiro turno, com mudanças feitas pelo Senado

Proposta abre espaço fiscal superior a R$ 100 bilhões no Orçamento de 2022, com limitação do pagamento de precatórios e mudança no teto de gastos

Marcos Mortari

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), comanda sessão no plenário (Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados)

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O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (14), em primeiro turno, por 327 votos a 147 e uma abstenção, o texto-base da PEC dos Precatórios no mesmo teor que veio do Senado Federal.

A proposta abre espaço fiscal superior a R$ 100 bilhões no Orçamento de 2022, a partir da limitação do pagamento de precatórios – que são dívidas da União reconhecidas pelo Poder Judiciário e sem possibilidade de recurso – e de uma mudança na metodologia de cálculo da regra do teto de gastos.

Os deputados ainda precisam analisar os destaques apresentados pelas bancadas ao texto – ou seja, sugestões de modificação à versão aprovada. Depois disso, a PEC ainda precisa ser votada em segundo turno antes de seguir para promulgação.

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Com o avançar da noite e o quórum mais baixo, o presidente da casa legislativa, Arthur Lira (PP-AL), decidiu suspender a sessão e marcar a retomada da análise da matéria para quarta-feira (15), às 10h (horário de Brasília).

Entre os destaques sobre a mesa, há um do PT que pode acabar com o “subteto” de precatórios, o que obrigaria o pagamento integral das dívidas expedidas pelo Poder Judiciário contra o governo federal em 2022, reduzindo o espaço fiscal para outras despesas no período. Para manter o texto, cabe aos aliados do Palácio do Planalto garantir 308 votos.

O partido também protocolou destaque para excluir a aplicação de restrições orçamentárias e fiscais ao direito de todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social de ter uma renda básica familiar, incluído na Constituição Federal pela PEC.

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O PL, nova sigla de Jair Bolsonaro, havia apresentado destaque para suprimir apenas a parte que acabaria com o subteto de precatórios em 2026. No entanto, retirou o destaque, diante dos alertas de que essa mudança poderia dificultar a promulgação da PEC.

O texto aprovado inicialmente pelos deputados estabelecia duração do limite até 2036, coincidindo com o prazo do teto de gastos, mas os senadores decidiram modificar a proposta e encurtar o período em dez anos.

A bancada do Novo, por sua vez, apresentou destaque para retirar do texto dispositivo que dispensa, exclusivamente para 2022, a obediência a limites legais para aumento de despesa feito para pagar programas de transferência de renda.

Em outro dispositivo, o DEM pretende retirar do texto dispositivo que dispensa, exclusivamente para 2022, a obediência a limites legais para aumento de despesa feito para pagar programas de transferência de renda

Caso haja novas alterações em relação ao que foi aprovado pelos senadores, ela retorna para a outra casa legislativa. Pela regra, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal precisam aprovar a mesma versão de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para que ela possa passar a valer. Por isso, apenas entraram em vigor as regras em comum aprovadas pelas duas casas legislativas.

As modificações vão de uma casa para a outra (o chamado pingue-pongue) até que seja votada sem diferenças de mérito. A cada ida e vinda, é necessário o apoio de 3/5 da respectiva casa (ou seja, 308 dos 513 deputados ou 49 dos 81 senadores).

Para dar celeridade à tramitação das modificações aprovadas pelos senadores na semana passada e evitar que elas precisassem passar pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) e por uma comissão especial, os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), firmaram um acordo.

Pelo entendimento, as modificações foram apensadas a uma PEC já em tramitação na Câmara dos Deputados, pronta para ser votada em plenário. Foi o que aconteceu. Desta forma, lideranças políticas acreditam que seja possível concluir a promulgação da proposta antes do recesso parlamentar, que começa nesta sexta-feira (17).

Pelos cálculos feitos pelo Ministério da Economia, a versão antes aprovada pelos deputados liberava R$ 106,1 bilhões no Orçamento de 2022. E pode ser ainda mais. A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, está revisando suas estimativas para a casa de R$ 116 bilhões.

Com isso, o mundo político espera ter recursos para aplicar não apenas no Auxílio Brasil – programa social substituto do Bolsa Família –, mas em medidas como o aumento do fundo eleitoral de R$ 2 bilhões para R$ 5,7 bilhões, a prorrogação da desoneração da folha para 17 setores da economia o repasse de R$ 16,2 bilhões na forma das polêmicas emendas do relator-geral da peça orçamentária (as chamadas RP9).

O presidente Jair Bolsonaro (PL) também quer pagar um benefício aos caminhoneiros para compensar o aumento do preço dos combustíveis – medida com impacto estimado em R$ 4 bilhões pelo governo. E ainda está na mesa a possibilidade de aumento salarial a servidores públicos.

O espaço fiscal é gerado pela PEC dos Precatórios a partir de dois movimentos fundamentais. O primeiro consiste na limitação do pagamento de precatórios (que são dívidas judiciais do poder público em que não cabem mais recursos, ou seja, precisam ser honradas) em um exercício à mesma regra do teto de gastos.

Para o ano que vem, o Poder Judiciário havia expedido R$ 89,1 bilhões em precatórios – um salto de 64% em comparação com o corrente ano. Com as novas regras, haveria um “subteto” de aproximadamente R$ 45,3 bilhões (montante que pode sofrer ajuste a depender da inflação de dezembro) para tais despesas no próximo exercício, rolando boa parte do volume excedente para os anos seguintes. O que críticos têm associado ao risco de um efeito “bola de neve”.

Na prática, porém, apenas essa medida poderia garantir R$ 43,8 bilhões para novas despesas para o governo federal no ano em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) deverá disputar a reeleição.

O segundo dispositivo consiste na mudança da metodologia de cálculo da regra do teto de gastos. Hoje, a regra fiscal permite a atualização dos gastos públicos pela inflação, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acumulada em 12 meses até junho do ano anterior ao exercício.

Pelo texto, o período de aferição passaria para janeiro a dezembro ‒ o que permitirá abertura adicional de espaço fiscal a partir da diferença do índice nos períodos. Como ainda falta saber a inflação do último mês de 2021, ainda não está definido o fator de correção da regra fiscal para o ano que vem. Na prática, quanto mais alto o índice, mais recursos o governo terá para gastar em 2022.

Confira as principais modificações aprovadas pelos senadores e que foram votadas pelos deputados nesta noite:

1. Renda básica familiar
O texto aprovado pelos senadores introduz dois artigos prevendo a existência de um programa permanente de transferência de renda como garantia ao direito de uma renda básica familiar aos brasileiros.

“Art. 6º …………………………………………………………
Parágrafo único. Todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda, cujas normas e requisitos de acesso serão determinados em lei, observada a legislação fiscal e orçamentária.”

“Art. 203. ……………………………………………………………………………………………………………………………
VI – a redução da vulnerabilidade socioeconômica de famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza.”

2. Mudança na data para os precatórios
Os senadores também passaram para 2 abril o limite para expedição, pelo Poder Judiciário, dos precatórios que serão considerados no exercício financeiro seguinte, com a devida atualização monetária.

“Art. 100. …………………………………………………………………..
§ 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado constantes de precatórios judiciários apresentados até 2 de abril, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente”.

3. Recursos carimbados
Outra preocupação dos senadores foi explicitar no texto constitucional a destinação dos recursos orçamentários liberados com a limitação dos precatórios e a mudança na metodologia do teto de gastos. Na versão aprovada na casa legislativa, o espaço fiscal decorrente das alterações deverá ser usado no pagamento do novo programa social e em gastos relacionados à seguridade social. O texto também estabelece uma ordem mais clara para o pagamento das dívidas judiciais.

“Art. 107-A. Até o fim de 2026, fica estabelecido, para cada exercício financeiro, limite para alocação na proposta orçamentária das despesas com pagamentos em virtude de sentença judiciária de que trata o art. 100 da Constituição Federal, equivalente ao valor da despesa paga no exercício de 2016, incluídos os restos a pagar pagos, corrigido na forma do § 1º do art. 107 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, devendo o espaço fiscal decorrente da diferença entre o valor dos precatórios expedidos e o respectivo limite ser destinado ao programa previsto no parágrafo único do art. 6º e à seguridade social, nos termos do art. 194, ambos da Constituição Federal, a ser calculado da seguinte forma:
I – no exercício de 2022, o espaço fiscal decorrente da diferença entre o valor dos precatórios expedidos e o limite estabelecido no caput deverá ser destinado ao programa previsto no parágrafo único do art. 6º e à seguridade social, nos termos do art. 194, ambos da Constituição Federal;
II – no exercício de 2023, pela diferença entre o total de precatórios expedidos entre 2 de julho de 2021 e 2 de abril de 2022 e o limite de que trata o caput válido para o exercício de 2023; e
III – nos exercícios de 2024 a 2026, pela diferença entre o total de precatórios expedidos entre 3 de abril de dois anos anteriores e 2 de abril do ano anterior ao exercício e o limite de que trata o caput válido para o mesmo exercício.

§ 1º O limite para o pagamento de precatórios corresponderá, em cada exercício, ao limite previsto no caput deste artigo, reduzido da projeção para a despesa com o pagamento de requisições de pequeno valor para o mesmo exercício, que terão prioridade no pagamento.

§ 2º Os precatórios que não forem pagos em razão do previsto neste artigo terão prioridade para pagamento em exercícios seguintes, observada a ordem cronológica e o disposto no 8º deste artigo.

§ 3º É facultado ao credor de precatório que não tenha sido pago em razão do disposto neste artigo, além das hipóteses previstas no § 11 do art. 100 da Constituição Federal e sem prejuízo dos procedimentos previstos nos §§ 9º e 21 do referido artigo, optar pelo recebimento, mediante acordos diretos perante Juízos Auxiliares de Conciliação de Pagamento de Condenações Judiciais contra a Fazenda Pública Federal, em parcela única, até o final do exercício seguinte, com renúncia de 40% (quarenta por cento) do valor desse crédito.

§ 4º O Conselho Nacional de Justiça regulamentará a atuação dos Presidentes dos Tribunais competentes para o cumprimento deste artigo.

§ 5º Não se incluem no limite estabelecido neste artigo as despesas para fins de cumprimento do disposto nos §§ 11, 20 e 21 do art. 100 da Constituição Federal e no § 3º deste artigo, bem como a atualização monetária dos precatórios inscritos no exercício.

§ 6º Não se incluem nos limites estabelecidos no art. 107 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias o previsto nos §§ 11, 20 e 21 do art. 100 da Constituição Federal e no § 3º deste artigo.

§ 7º Na situação prevista no § 3º deste artigo, para os precatórios não incluídos na proposta orçamentária de 2022, os valores necessários à sua quitação serão providenciados pela abertura de créditos adicionais durante o exercício de 2022.

§ 8º Os pagamentos em virtude de sentença judiciária de que trata o art. 100 da Constituição Federal serão realizados na seguinte ordem:
I – obrigações definidas em lei como de pequeno valor, previstas no § 3º do art. 100 da Constituição Federal;
II – precatórios de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham a partir de 60 (sessenta) anos de idade, ou sejam portadores de doença grave ou pessoas com deficiência, assim definidos na forma da lei, até o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação de pequeno valor;
III – demais precatórios de natureza alimentícia até o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação de pequeno valor;
IV – demais precatórios de natureza alimentícia além do valor previsto no inciso III;
V – demais precatórios.”

4. Precatórios do Fundef
O texto aprovado pelos senadores também traz orientações mais claras para o pagamento de precatórios decorrentes do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). Dispositivo introduzido pelos parlamentares autoriza o parcelamento das dívidas em três anos e garante o pagamento fora da regra do teto de gastos. Também está prevista a distribuição do pagamento ao longo de cada ano e como os recursos precisarão ser empenhados por estados e municípios.

“Art. 6º Os precatórios decorrentes de demandas relativas à complementação da União aos Estados e aos Municípios por conta do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) serão pagos em 3 (três) parcelas anuais e sucessivas, da seguinte forma:
I – 40% (quarenta por cento) no primeiro ano;
II – 30% (trinta por cento) no segundo ano;
III – 30% (trinta por cento) no terceiro ano.

§ 1º O pagamento das parcelas dos precatórios a que se refere o caput deste artigo será feito, a cada ano, em 3 (três) parcelas, da seguinte forma:
I – 40% (quarenta por cento) do montante até 30 de abril;
II – 30% (trinta por cento) do montante até 31 de agosto;
III – 30% (trinta por cento) do montante até 31 de dezembro.

§ 2º Não se incluem nos limites estabelecidos nos arts. 107 e 107-A, ambos do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a partir de 2022, as despesas para os fins de que trata este artigo”.

“Art. 7º As receitas que os Estados e Municípios receberem a título de pagamentos da União por força de ações judiciais que tenham por objeto a complementação de parcela desta no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) deverão ser aplicadas na manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental público e na valorização de seu magistério, conforme destinação originária do Fundo.

Parágrafo único. Da aplicação de que trata o caput, no mínimo 60% (sessenta por cento deverão ser repassados aos profissionais do magistério, inclusive aposentados e pensionistas, na forma de abono, vedada a incorporação na remuneração, aposentadoria ou pensão”.

5. Comissão de monitoramento dos precatórios
Outra modificação introduzida durante a tramitação da PEC no Senado Federal foi a previsão para criação de uma comissão mista para fazer um exame analítico dos atos, fatos e políticas públicas com maior potencial gerador de precatórios e sentenças judiciais contrárias à Fazenda Pública da União. O colegiado terá como missão entender melhor a explosão em tais despesas nos últimos anos e evitar que o poder público seja novamente pego de surpresa no futuro.

“Art. 8º No prazo de 1 (um) ano a contar da promulgação desta Emenda Constitucional, o Congresso Nacional promoverá, por meio de comissão mista, exame analítico dos atos, fatos e políticas públicas com maior potencial gerador de precatórios e sentenças judiciais contrárias à Fazenda Pública da União.

§ 1º A comissão atuará em cooperação com o Conselho Nacional de Justiça e com o auxílio do Tribunal de Contas da União, podendo requisitar informações e documentos de órgãos e entidades da administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, buscando identificar medidas legislativas a serem adotadas com vistas a trazer maior segurança jurídica no âmbito federal.

§ 2º O exame de que trata o caput analisará os mecanismos de aferição de risco fiscal e de prognóstico de efetivo pagamento de valores decorrentes de decisão judicial, segregando esses pagamentos por tipo de risco, priorizando os temas que possuam maior impacto financeiro.

§ 3º Apurados os resultados, o Congresso Nacional encaminhará suas conclusões aos presidentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, para a adoção de medidas de sua competência”.

Clique aqui para ver o quadro comparativo com as mudanças sofridas pela proposta desde o envio do texto pelo governo.

(com Agência Câmara)

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.