MPF vê fraude na compra de blindados pela PRF no governo Bolsonaro

Empresa investigada foi citada na CPMI do 8 de Janeiro; procuradores investigam corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa

Agência Brasil

Blindado da PRF (Foto: Combat Armor/Divulgação)

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Uma investigação do Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF) apura possíveis práticas como corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e formação de associação criminosa na compra de veículos blindados por parte da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

O volume financeiro dos contratos fechados no governo Jair Bolsonaro (PL), entre 2019 e 2022, chega a R$ 94 milhões e envolvem a empresa Combat Armor Defense do Brasil Ltda. “As descobertas desta investigação são de importância crítica”, afirma o MPF.

As compras suspeitas dos chamados “caveirões” também são investigadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), após a empresa ter sido citada no relatório final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro.

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O MPF convocou entrevista coletiva para apresentar formalmente as descobertas e ações subsequentes da investigação, iniciada em agosto de 2023. O procedimento investigatório é conduzido pelo procurador da República Eduardo Benones.

Os investigadores explicaram que as apurações foram desencadeadas por um “conjunto substancial de evidências”, sendo direcionadas para desvendar “uma complexa rede de atividades ilícitas, incluindo fraudes em licitações, possíveis práticas de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e formação de associação criminosa”.

A Combat Armor é uma empresa que tem sede nos Estados Unidos. O MPF destaca que o proprietário, Daniel Beck, é apoiador do ex-presidente Donald Trump, que governou o país entre 2017 e 2021, e esteve em Washington durante a invasão ao Capitólio, em 6 de janeiro de 2021.

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“As descobertas desta investigação são de importância crítica, não apenas devido ao volume financeiro envolvido, apurado até o momento em R$ 94.096.361,52, mas também pelo curto intervalo de tempo e coincidência ao quadriênio 2019-2022, bem como pela maneira como essas práticas ilícitas comprometeram a transparência e a justiça no uso dos recursos públicos”, aponta o MPF.

O procedimento investigatório criminal foi instaurado em agosto, mas o MPF já tinha apurações iniciais do caso desde maio, quando 14 veículos blindados novos e inutilizados, por inadequações técnicas e com indícios de fraudes nas compras, foram identificados na superintendência da Polícia Federal (PF) no Rio de Janeiro.

Havia, também, suspeita de conflito de interesses na confecção do atestado de capacidade técnica apresentado pela Combat Armor. Requisito indispensável para verificar a adequação dos veículos fornecidos, o documento foi emitido por sociedade empresarial controlada pelo presidente da Combat Armor.

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Procuradas pela Agência Brasil, a PRF e a Combat Armor não se pronunciaram.

CPMI do 8 de Janeiro

A Combat é administrada por Maurício Junot, e ambos foram citados no relatório final da CPMI de 8 de Janeiro. “O sr. Maurício Junot, que gozaria de dupla nacionalidade, brasileira e americana, teria sido condenado por fraude em Dubai, figurando, inclusive, em lista de procurados pela Interpol”, cita o texto da relatora, senadora Eliziane Gama (PSD-MA).

Pelo relatório, a matriz americana seria uma empresa de fachada, que se utilizaria da filial brasileira para fazer negócios. “Há fortes indicativos de que se trata de uma empresa ‘de papel’, sem qualquer atuação no ramo de blindados, cujo propósito de reativação e alteração do seu contrato social foi viabilizar negócios no Brasil, por meio do sr. Maurício Junot”, menciona o documento.

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A investigação de parlamentares cita, ainda, suposto envolvimento de Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da PRF. Vasques foi preso pela PF em agosto do ano passado, em uma investigação sobre a possível interferência da PRF no segundo turno das eleições de 2022.

A análise dos valores pagos à Combat Armor, de acordo com a CPMI, coincide com a atuação de Vasques. As três unidades gestoras com maior valor despendido à Combat foram a superintendência do Rio, onde ele foi superintendente até abril de 2021, o departamento de PRF em Brasília (quando Silvinei já era diretor-geral) e a superintendência em Santa Catarina, onde também foi superintendente.

“Da análise da quebra de sigilo fiscal da Combat Armor identificaram-se os seguintes fortes indícios que reforçam o entendimento de favorecimento à empresa Combat Armor por agentes da PRF, do Ministério da Justiça e pelo sr. Silvinei Vasques, inclusive com pagamento de vantagens indevidas”, diz trecho do relatório final da CPMI, aprovado em 18 de outubro de 2023.

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O documento destaca ainda que “a empresa fechou as portas no Brasil no primeiro semestre de 2023, ou seja, logo após a mudança do governo federal, deixando de cumprir contratos firmados com a Polícia Rodoviária Federal e outros órgãos”.