Como Sundar Pichai virou CEO de uma das maiores empresas do mundo

Sundar Pichai é CEO do Google e da holding Alphabet. De uma família de classe média da Índia, foi para os EUA estudar e fez carreira no Vale do Silício.

Sundar Pichai, CEO do Google (Bloomberg)
Sundar Pichai, CEO do Google (Bloomberg)
Nome completo:Pichai Sundararajan, mais conhecido como Sundar Pichai
Local de nascimento:Chennai, antiga Madras, na Índia
Data de nascimento:12 de julho de 1972
Ocupação:CEO do Google e da holding Alphabet
Fortuna:US$ 600 milhões

Quem é Sundar Pichai?

Pichai Sundararajan, mais conhecido como Sundar Pichai, é um executivo norte-americano de origem indiana, CEO do Google e de sua controladora, a holding Alphabet, sediada em Mountain View, na Califórnia, Estados Unidos. A multinacional é a quinta maior empresa de capital aberto do mundo, atrás apenas da petrolífera saudita Saudi Aramco e de outras três “big techs” dos EUA: Microsoft, Apple e Amazon, de acordo com ranking da PricewaterhouseCoopers (PWC). A companhia tem um valor de mercado de US$ 1,37 trilhão.

Da Índia para o Vale do Silício

Pichai nasceu em Madras, atual Chennai, capital do estado de Tamil Nadul, às margens do Golfo de Bengala, no Sudeste da Índia, em 12 de julho de 1972. Após se formar em Engenharia Metalúrgica no Instituto Indiano de Tecnologia Kharagpur (IIT, na sigla em inglês), em 1993, ele ganhou uma bolsa para estudar na Universidade de Stanford, nos EUA, onde obteve o título de mestre em Engenharia e Ciências de Materiais. Foi contemporâneo dos fundadores do Google, Sergey Brin e Larry Page, na instituição californiana, mas só viria a conhecê-los de fato quando começou a trabalhar na empresa, em 2004.

Segundo seu perfil na Enciclopédia Britannica, desde pequeno Pichai demonstrou interesse por tecnologia, mas o acesso a ela era outra história. “Quando eu estava no ITT, eu raramente tinha acesso ao computador, talvez três ou quatro vezes”, disse ele em entrevista ao jornal The New York Times (NYT) publicada em novembro de 2018.

Filho do engenheiro eletricista Regunatha Pichai e da estenógrafa Lakshmi, uma família indiana de classe média, Sundar passou a infância num lar modesto, onde ele e o irmão mais novo dormiam na sala. Em entrevista ao jornal britânico The Guardian, em outubro de 2017, ele contou que tinha 12 anos quando a família adquiriu seu primeiro telefone fixo.

“Nós levamos um longo tempo também para ter uma geladeira, e eu vi como isso mudou a vida de minha mãe: ela não precisava mais cozinhar todos os dias e podia passar mais tempo conosco”, afirmou. Episódios como este tiveram um grande impacto na vida do executivo. “Há um lado meu que viu de maneira visceral como a tecnologia pode fazer a diferença, e eu ainda me sinto assim. Eu sinto o otimismo e a energia, e o imperativo moral de acelerar este progresso”, declarou Pichai ao Guardian.

Vale lembrar que a falta de telefone e geladeira na casa de uma família de classe média nos anos 1980 pode parecer surreal na visão de europeus e norte-americanos, mas não é algo tão distante da realidade brasileira da época. Linhas telefônicas eram coisa rara e geladeiras não eram itens comuns em domicílios de pessoas de baixa renda.

Nesse sentido, a mudança aos EUA ampliou significativamente o acesso do jovem Pichai à tecnologia. “Ter estes laboratórios (em Stanford) onde não só havia acesso a computadores, mas era possível programá-los, para mim era uma grande coisa”, disse ele ao NYT.

Para chegar à América do Norte, porém, a bolsa não bastava. De acordo com o Guardian, seu pai ganhava o equivalente a 63 libras esterlinas por mês (R$ 492,53 pelo câmbio atual) e teve que sacar quase um ano de salário da poupança da família para pagar a passagem. “Foi a primeira vez que eu entrei num avião”, declarou ao NYT.

Antes do Google, Pichai trabalhou por pouco tempo na Apllied Materials, companhia que fornece produtos e serviços para a indústria de semicondutores; obteve um MBA pela Wharton School, da Universidade da Pensilvânia, em 2002; e ainda atuou por um curto período na consultoria McKinsey & Co.

Ascensão

Entrou no Google como responsável por gerenciamento e desenvolvimento de produtos, e teve como primeira missão chefiar a produção da “Google Toolbar”, ferramenta que permitia acesso rápido ao mecanismo de busca aos usuários dos navegadores Internet Explorer, da Microsoft, e Mozilla Firefox.

Posteriormente, ele foi responsável por liderar o processo de criação do Google Chrome, lançado em 2008, que viria a se tornar o navegador de internet mais popular do mundo, desbancando o então onipresente Explorer. É um de seus grandes feitos na empresa. No mesmo ano, Pichai foi promovido a vice-presidente de Desenvolvimento de Produtos.

O executivo continuou a galgar degraus dentro da companhia, sendo nomeado vice-presidente sênior em 2012. Dois anos depois, Pichai passou ser o responsável pela engenharia e pesquisa dos principais produtos e plataformas tanto do Google como da divisão responsável pelo sistema móvel Android. Ele substituiu o criador do Android, Andy Rubin. É creditada a Pichai a integração dos serviços do Google ao sistema móvel, também o mais difundido do mundo.

O conglomerado californiano havia comprado a empesa de Rubin em 2005, mas as duas marcas ainda funcionavam muito separadas. “Ele (Pichai) trouxe consigo o resto do Google, ou ele levou o Android para o resto do Google”, contou Hiroshi Lockheimer, vice-presidente sênior, hoje responsável pela plataforma para celulares, ao BuzzFeed News em 2016.

Resultados como estes pavimentaram a ascensão do indiano ao cargo mais alto da empresa, quando os fundadores Brin e Page se afastaram do comando direto para fundar a holding Alphabet, em 2015.

De lá para cá, Pichai levou a companhia a adotar novas prioridades. Na entrevista ao Guardian, em 2017, ele disse que o Google passaria a se dedicar à inteligência artificial (IA) em primeiro lugar, patamar até então ocupado pelos produtos e serviços para dispositivos móveis.

“Sob sua liderança como CEO, o Google tem se dedicado a desenvolver produtos e serviços impulsionados pelos mais recentes avanços em IA, que auxiliam em grandes e pequenas ocasiões. [A empresa] investiu em novas oportunidades como a Google Cloud e o YouTube, e continua a ser líder em tecnologias avançadas, incluindo ‘machine learning’ e computação quântica”, informa o perfil oficial de Pichai no Google.

“Machine learning”, ou “aprendizado de máquina”, é um ramo da inteligência artificial dedicado ao desenvolvimento de sistemas que aprendem a tomar decisões de forma autônoma. Inteligência artificial e “machine learning” têm sido dois dos principais focos da empresa.

Já a computação quântica é um objetivo mais recente, mas a companhia anunciou em 2019 ter atingido “supremacia quântica”, divulgando que seu dispositivo quântico realizou em 3 minutos e 20 segundos cálculos matemáticos que supercomputadores levariam mais de 10 mil anos para concluir.

Antes da promoção a CEO, Pichai teve o nome cogitado para assumir outras duas “big techs”, o Twitter e a Microsoft. O Google, no entanto, o reteve.

Big boss

Em dezembro de 2019, o executivo foi alçado também ao posto de CEO Alphabet, assumindo a direção do grupo como um todo. Na ocasião, os fundadores Brin e Page, então presidente e CEO da holding, respectivamente, deixaram o comando direto e passaram a integrar o conselho, mantendo a maioria das ações com direito a voto da companhia.

“Sundar traz humildade e uma profunda paixão por tecnologia para o dia a dia de nossos usuários, parceiros e funcionários”, disseram Brin e Page em carta divulgada na época da troca de guarda.

De fato, Pichai é descrito como um sujeito de “fala mansa”, um “zelador cuidadoso”, “conciliador”, popular entre os funcionários, “um homem alto e magro cuja voz é uma suave harmonia dos sotaques indiano e americano”, e “um cara legal”. Ele é considerado modesto e discreto em comparação com seus antecessores e outros figurões do setor. Não é dado a grandes aparições públicas. “Eu não dou muitas entrevistas”, reconheceu o executivo quando conversou com o britânico Guardian.

Exposição pública e contatos com a imprensa, porém, são inevitáveis para o homem que está à frente de uma das empresas de maior alcance no mundo. Plataformas como a de Buscas, Maps, Andoid, YouTube, Gmail e Chrome têm mais de 1 bilhão de usuários cada. Fundado em 1998, o Google emprega mais de 135 mil pessoas ao redor do mundo, de acordo com a Bloomberg.

Só no Brasil, a companhia tem 1,2 mil colaboradores, e instalações em São Paulo e Belo Horizonte. O País está entre os cinco maiores mercados da marca na lista de nove produtos do Google com mais de 1 bilhão de usuários, que inclui ainda Play Store, Fotos e Drive.

Dando a cara para bater

Como outras grandes do ramo, a companhia está sempre sob o escrutínio do público, instituições, governos, imprensa e até dos próprios funcionários, em temas como concorrência, disseminação de desinformação, direito à privacidade, liberdade de expressão, assédio sexual e diversidade.

Em intervenções recentes, Pichai deu mostras que responde a assuntos espinhosos também com parcimônia. Numa audiência no Senado norte-americano em outubro de 2020, a terceira a que compareceu, ele foi muito menos questionado pelos parlamentares do que seus colegas Jack Dorsey, do Twitter, e Mark Zuckerberg, do Facebook.

Enquanto os dois últimos foram exaustivamente questionados sobre censura de postagens políticas e interferência nas eleições, o CEO do Google foi pouco incomodado. Vale lembrar que a sessão ocorreu às vésperas da eleição presidencial nos EUA.

Pichai, no entanto, teve que dar explicações sobre o virtual domínio do Google no mercado. “Nós vemos uma concorrência robusta em várias categorias de informação”, respondeu ele, segundo o NYT.

Em dezembro de 2020, o executivo pediu desculpas pela demissão da pesquisadora Timnit Gebru, uma das chefes da equipe de Inteligência Artificial Ética do Google e uma das mais conhecidas funcionárias negras da companhia. Gebru disse ter sido demitida após ter enviado um e-mail cobrando respostas da empresa sobre fata de progresso na contratação de mais mulheres e minorias, e sobre preconceitos supostamente embutidos em sua tecnologia de IA. Seus colegas a defenderam.

“Eu ouvi a reação à saída da Dra. Gebru em alto e bom som: gerou dúvidas e levou alguns de nossa comunidade a questionar seu lugar no Google. Eu quero dizer o quanto lamento por isso, e eu aceito a reponsabilidade de trabalhar para restaurar sua confiança”, declarou Pichai em e-mail, de acordo com reportagem do NYT.

Ele já se posicionou politicamente também. Questionado sobre a política anti-imigração do então presidente dos EUA, Donald Trump, disse que “é claro para mim que, nos últimos 100 anos, nós, imigrantes, fomos determinantes para o progresso americano”, em entrevista à revista Veja publicada em março de 2017. O executivo tem orgulho de sua origem indiana.

Resultados

Em reportagem recente, o Wall Street Journal questionou se basta para Pichai ser “boa praça” para enfrentar os desafios legais, financeiros e empresariais do Google. Os resultado da Alphabet em seu primeiro ano completo no comando dão uma pista. A holding teve um faturamento de US$ 182,5 bilhões em 2020, um aumento de 13% sobre 2019, mesmo durante a pandemia.

Os números foram especialmente fortes no último trimestre, com receitas de US$ 56,9 bilhões, um crescimento de 23,5% em relação ao quatro trimestre de 2019. O lucro operacional somou US$ 41,2 bilhões em 2020, um avanço de 20,4% frente ao ano anterior. No quatro trimestre, o resultado atingiu US$ 15,16 bilhões, um acréscimo de 68,9% ante o mesmo período de 2019.

“Nossa performance robusta no quarto trimestre foi puxada pela [área de] Buscas e pelo YouTube, na medida em que as atividades de consumo e os negócios se recuperaram em relação aos períodos anteriores do ano”, comentou a executiva chefe de Finanças do Google e da Alphabet, Ruth Porat, em comunicado divulgado pelo grupo. “Nossos resultados significativos neste trimestre refletem a utilidade de nossos produtos e serviços para as pessoas e empresas, assim como a acelerada transição para os serviços online e a nuvem”, acrescentou Pichai, segundo a mesma nota.

No início de 2021, o conglomerado ultrapassou a marca de US$ 1 trilhão em valor de mercado. Em 18 de março, Pichai anunciou que a companhia planeja investir mais de US$ 7 bilhões nos EUA em 2021, principalmente em escritórios e data centers, o que deve gerar pelo menos 10 mil empregos, auxiliando na recuperação econômica pós pandemia.

Outra novidade recente é o Google News Showcase, programa de pagamentos para empresas de jornalismo pela publicação de notícias. O grupo assinou até agora acordos com mais de 500 publicações do mundo todo, segundo a Folha de S. Paulo.

O CEO da Alphabet foi apontado pela revista norte-americana Time como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo de 2020. “Os desafios que Sundar enfrenta em sua função estão entre os mais importantes de nosso tempo”, escreveu o presidente e CEO do banco norte-americano JPMorgan Chase, Jamie Dimon, em artigo para a Time. “Mas sua liderança analítica, humilde e inclusiva irá posicionar o Google para enfrentar o momento. Estas são características que o mundo poderia usar muito mais atualmente”, concluiu.

Pé no chão

Apesar de ser um entusiasta da tecnologia e estar à frente de um dos maiores conglomerados da área, Pichai já questionou a rapidez com que inovações são apresentadas ao público e o alcance que a tecnologia pode ter na resolução dos grandes problemas mundiais.

“No Vale [do Silício], as pessoas são obcecadas com o ritmo das mudanças tecnológicas. É difícil acertar nisso… Nós nos apressamos e isso pode falhar para uma pessoa comum. Como humanos, eu não sei se nós queremos mudanças tão rápidas. Eu acho que não”, disse ao Guardian. “A tecnologia não resolve os problemas da humanidade, sempre foi ingênuo pensar assim. A tecnologia é um facilitador, mas a humanidade tem que lidar com seus problemas. Eu creio que atualmente nós dependemos demais da tecnologia para resolver as coisas. Provavelmente, e ao mesmo tempo, nós superestimamos a tecnologia como fonte de todos os problemas também”, afirmou ele ao NYT.

Em casa

Pichai é um homem de família, fã de críquete, esporte nacional da Índia, e de futebol. Casado com a colega de faculdade Anjali Pichai, ele é pai de uma filha, Kavya, e de um filho, Kiran. O próprio executivo se descreve como “viciado em notícias”, costuma começar seu dia com uma xícara de chá e a leitura da edição impressa do Wall Street Journal. Desde criança é um leitor voraz.

Nos finais de semana, Pichai gostaria de poder relaxar. “Quando eu chego em casa na sexta-feira à noite, minha vontade é deixar meus dispositivos [tecnológicos] de lado por dois dias, mas eu ainda não fui muito bem sucedido nisso”, contou ao NYT. Em mais de uma ocasião, ele comentou que se sente dividido entre limitar ou não o “tempo de tela” dos filhos.

Cercado por tecnologia por todos os lados e todos os dias, Pichai lembra com nostalgia de sua infância na Índia. “Havia uma certa simplicidade em minha vida, o que era muito legal em comparação com o mundo de hoje”, afirmou ao NYT.

Embora discreto, na Índia ele foi alçado à condição de celebridade e costuma ser abordado por admiradores quando visita seu país natal. “Eu gostaria de voltar à Índia e retribuir. Eu sinto um apoio incrível quando vou lá, é embaraçoso”, disse ao Guardian.

Fortuna

Pichai é um homem rico, afinal é um dos executivos mais bem pagos do mundo. Quando ele assumiu a chefia da Alphabet, sua fortuna era avaliada em US$ 600 milhões. O salario básico dele passou a ser de US$ 2 milhões ao ano a partir da promoção, contra US$ 650 mil até 2019. Na verdade, ele ganha muito mais. A companhia anunciou o pagamento de US$ 281 milhões em ações em 2019, parte deste total atrelado a metas de desempenho.

É muito dinheiro, mas pouco se comparado ao patrimônio estimado de seus antecessores, Brin e Page, de US$ 86 bilhões e US$ 88,6 bilhões, respectivamente, segundo ranking da revista norte-americana Forbes. Afinal, ele não é o “dono”, mas um funcionário de carreira.

Para saber mais

Perfis e entrevistas de Sundar Pichai, e reportagens sobre o Google publicadas pela imprensa internacional.