Ventos do exterior derrubam fundos multimercados macro pelo segundo mês seguido; o que vem agora?

Especialistas recomendam que investidor aproveite para diversificar a alocação em várias classes de multimercados na busca por ativos pouco correlacionados

Bruna Furlani

(Getty Images)

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Não há como fugir. Quando as taxas de juros longas nos Estados Unidos sobem de tal forma a alcançar valores próximos de 5%, investidores ao redor do mundo voltam às planilhas para recalcular o preço dos ativos — o que gera um efeito em cadeia nos mercados.

“A taxa americana é a taxa básica para o valuation de todos os ativos. Houve uma mudança em seu patamar e isso levou a uma reavaliação dos níveis de juros e pegou o mercado posicionado em outra direção, o que acelerou todo o movimento”, avalia Marcos Mollica, gestor do fundo Opportunity Total.

Fundos multimercados macro não passaram ilesos a esse movimento.

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Dados apontam que a média de retorno dos multimercados macro, que possuem a possibilidade de aplicar em juros, câmbio e Bolsa, ficou em -0,12% em setembro – segundo mês consecutivo de rentabilidade negativa para a subclasse, que fechou agosto com perdas de 0,20%. Os dados são da Associação Brasileira das Entidades dos Mercado Financeiro e de Capitais (Anbima).

Mas a classe de multimercados como um todo sofreu. A média dos multimercados de gestão ativa no Brasil, medida pelo Índice de Hedge Funds Anbima (IHFA), fechou setembro em 0,01%, contra um avanço de 0,97% do CDI.

No mês passado, as consequências da abertura (alta) mais profunda dos juros nos Estados Unidos foram sentidas de forma mais explícita no mercado de juros local. A explicação, avalia Mollica, é que a “barra” para o Banco Central acelerar os juros nas reuniões do fim do ano ficou mais alta agora, com agentes precificando cortes menores do 0,5 ponto.

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Anteriormente, o mercado precificava chance de o BC incrementar o ritmo de cortes para quedas de 0,75 ponto – visão que teve que ser rapidamente alterada com a piora das taxas longas nos EUA, o que levou a uma desmontagem brusca de posições que se beneficiavam de cortes mais agressivos.

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“O mercado entrou nessa dinâmica de stop e isso forçou uma liquidação tanto nas NTN-Bs [títulos atrelados à inflação] quanto na curva de juros, o que levou a um exagero do movimento”, pondera Mollica.

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Mudanças nas carteiras

A casa está entre as gestoras que sofreram com as mudanças vistas em setembro, ainda que os retornos tenham ficado no campo positivo, em sua maioria.

Um dos principais multimercados macro da Opportunity, o Opportunity Total, terminou o mês passado com ganhos de 0,15%, acima da média da subclasse, mas abaixo dos 0,97% do CDI (taxa de referência da classe).

Após o movimento, a gestora promoveu algumas alterações na carteira e aumentou um pouco a posição em prefixados de curto prazo. “Acho que tem mais prêmio agora, mas não estamos confiantes de estar no máximo. Estamos colocando um pé apenas”, diz.

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Enquanto uma parte do mercado foi pega de surpresa com a mudança na direção dos juros americanos, outra parcela se beneficiou por estar praticamente sem posições em juros Brasil. É o caso da Kínitro Capital.

A medida parece ter trazido bons frutos. Um dos multimercados macro da casa, Kínitro 30, terminou setembro com ganhos de 1,06%, acima dos 0,97% do CDI.

A permanência de alta na curva de juros americana afeta aqui e não há prêmio suficiente no Brasil. Olhamos os outros fundos e ainda parece que tem muita gente aplicada [em juros brasileiros].

Carlos Carvalho, CIO da Kínitro

Já do lado internacional, a casa acredita que a economia americana segue resiliente e que o Federal Reserve (Fed, banco central americano) deverá manter os juros elevados por mais tempo do que prevê o mercado. “Estamos na ponta mais conservadora, com visão parecida ao que tem sido defendido pelo Fed”, diz Carvalho.

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Embora a curva de juros americana já tenha subido bastante, ambos os executivos preferem não descartar a chance de novas altas. Um dos pontos que podem pesar é a elevação nos preços de petróleo provocada pela guerra em Israel, motivada pelos ataques terroristas ao país feitos no sábado (7) pelo grupo Hamas.

O petróleo fechou em alta de 4% nesta segunda-feira (9). O conflito levanta preocupações com eventuais interrupções de oferta na região.

O barril do petróleo WTI para novembro terminou o dia com ganho de 4,33% (US$ 3,59), a US$ 86,38 o barril, na New York Mercantile Exchange (Nymex). A variação corresponde ao maior aumento nominal em seis meses, de acordo com a Dow Jones Newswire. Já o barril do Brent para dezembro subiu de 4,22% (US$ 3,57), a US$ 88,15 o barril, na Intercontinental Commodity Exchange (ICE).

A preocupação dos investidores aumenta porque uma subida nos preços da commodity, diante de uma oferta menor, poderia dificultar ainda mais o trabalho do Fed no combate à inflação, o que poderia levar a novas altas na curva futura americana.

Hora de reduzir multimercados macro?

Ainda que alguns fundos tenham sofrido mais do que outros, especialistas alertam que movimentos de aversão a risco dessa magnitude são difíceis de escapar e que não invalidam a alocação em multimercados macro.

“Multimercado tem um espaço cativo nas carteiras. Não deve ser gigante e nem ínfimo”, diz. “Eles são um veículo de operações mais táticas. Quem tende a operar o primeiro movimento é o gestor multimercado. São ágeis em perceber tendências”, destaca Rodrigo Sgavioli, chefe de alocação e fundos da XP.

Mesmo diante de um ano difícil para os multimercados macro, que acumulam ganhos de 4,91%, contra 9,97% do CDI, Sgavioli diz que é fundamental manter o produto na carteira e incrementar a alocação em multimercados pouco correlacionados.

A XP, por exemplo, reduziu um pouco a alocação em multimercados macro para 50%. Tais produtos costumam representar entre 50% e 70% do portfólio de multimercados, a depender do perfil do investidor.

Fizemos a mudança no primeiro semestre para tentar privilegiar produtos que possam se diferenciar. É melhor ter coisas descorrelacionadas do que ir atrás de uma grande aposta.

Rodrigo Sgavioli, chefe de alocação e fundos da XP

Dentro da parcela de multimercados, o especialista da XP afirma que não há uma fórmula pronta, mas diz que uma proporção de 50% alocada em multimercados macro, 30% em quantitativos e 20% em long e short neutro parece “satisfatória”.

A manutenção do otimismo com os produtos não é à toa. Sgavioli pondera que os multimercados não são os únicos a sofrer neste último mês em termos de classes de ativos. “A vida do investidor ficou mais complicada. É um recálculo de rota para muita gente. É bom esperar a poeira baixar”, diz.

Na dúvida, o profissional da XP destaca que o investidor deve optar por diversificar o portfólio multimercado que possui, ou ir para o “caixa”, aplicações de liquidez bem curta, caso do Tesouro Selic e de fundos DI. Aplicações em títulos atrelados à inflação também podem ser uma boa opção para esse momento de incerteza, diante das taxas elevadas.

“Se não se sentir seguro e for dinheiro novo, se preserva. Não fazer nada pode ser uma decisão. É um movimento que não se via nessa magnitude há muito tempo”, defende o especialista.