Varejistas adotam ‘mensuração sem lógica econômica’ e criam trajetória ‘irracional’, diz Squadra

Para gestora, Mercado Livre - que está nos seus fundos - é exceção que venceu o jogo do marketplace no Brasil e em alguns países da América Latina

Bruna Furlani

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Em uma carta longa e detalhada, a Squadra Investimentos fez um alerta sobre os balanços de varejistas – especialmente após a divulgação de fraude no resultado da Americanas (AMER3) no começo do ano.

No documento, de 22 páginas, a gestora afirmou que o negócio de marketplace demanda um grande volume de antecipação de recebíveis, o que resulta em custo financeiro.

A gestora também chama atenção para o fato de que muitas companhias têm recorrido a gestões de curto prazo para apresentar “caixas mais robustos” e menor endividamento em relação à sua realidade patrimonial.

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“Nas véspera da divulgação de resultados, optam por negociar prazos e postergar pagamentos, além de ampliar operações de risco sacado e de antecipação de recebíveis”, alerta a casa.

A Squadra pondera que o quadro gera fatos “inusitados” – como o de empresas que se apresentam com caixa líquido ajustado, mas com resultado financeiro contábil negativo na casa dos bilhões de reais.

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“Mensurações sem lógica econômica tendem a acarretar capítulos sucessivos de destruição de capital”, avalia a gestora. “Na situação limite que envolve fraude, acompanhar números errados pode levar a trajetórias corporativas completamente ‘irracionais’, como exemplificado no caso das Lojas Americanas”, acrescentou.

Situação delicada para as varejistas

As preocupações com as varejistas não se resumem aos balanços. A casa chamou atenção também para o fenômeno recente das underdeserved sales, o que poderia ser traduzido como a “receita que a companhia não merece possuir”.

Na prática, a gestora avalia que o conceito teria como referência a parcela das vendas que nunca conseguirá oferecer suficiente retorno sobre o capital investido (ROIC).

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O questionamento da gestora surgiu da indagação sobre onde teria ido parar o volume de vendas de Americanas, após a descoberta de fraude.

Segundo a Squadra, o esperado seria que os concorrentes diretos, como Mercado Livre e Magazine Luiza, tivessem absorvido essa parcela de vendas. Mas não foi o que ocorreu.

Na carta, a gestora disse que “de forma contraintuitiva, apenas um pedaço dessa venda foi abocanhada pelos concorrentes”.

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“Nossa leitura é de que, no cenário atual, os demais players do segmento não quiseram esse faturamento que era ‘artificial’ e ‘comprado'”, destaca a casa.

Para a Squadra, uma das possíveis razões é que o “vício” em ganhar participação de mercado não fideliza o cliente e, muitas vezes, é conquistado com prejuízo.

Para exemplificar, ela explica que o acirramento da competição passou a exigir gastos “infindáveis” em custos de aquisição de clientes (CAC), logística, tecnologia, ofertas de novos serviços e prazos de recebíveis.

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Nesse sentido, as empresas começaram a tomar várias medidas para modificar a contabilidade e as métricas gerenciais, argumenta.

A grande questão é que “como nenhuma dessas medidas equacionava a queima de caixa, diversas varejistas atingiram nível de endividamento preocupante”.

Para Squadra, Mercado Livre é contraexemplo

Embora boa do setor gere preocupação para a gestora, há exceções. A carta cita as ações do Mercado Livre (MELI34) como um “contraexemplo” positivo. A Squadra possui posição na empresa.

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“Não entrou em ‘devaneios’ para inflar sua receita a qualquer custo”, diz a carta. Na visão da casa, a companhia “venceu o jogo do marketplace no Brasil e em alguns países da América Latina, colocando-se em posição que dificilmente será conquistada por outro concorrente tão cedo”.

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A gestora observa que o Mercado Livre teve melhora no resultado operacional – com ganhos significativos de margem, além do que os investimentos realizados pela empresa foram “geradores de valor de longo prazo” e não de curto prazo para “agradar o mercado”.

“Para os próximos anos, novas oportunidades tendem a ganhar relevância na empresa, como maiores receitas capturadas em anúncios e publicidade”, destaca a gestora.

Movimento que parece ir na contramão de diversas varejistas em que a casa diz ver negócios com “rentabilidade substancialmente inferior ao custo de capital”, o que poderia levar a ajustes de tamanho das companhias no futuro.

Além de Mercado Livre

A carta da Squadra também chamou a atenção para outras companhias que representam posições relevantes da casa e que apresentaram incrementos na receita e na rentabilidade nos últimos meses.

Uma delas foi o da Equatorial Energia (EQTL3), que adquiriu a Celg-D, distribuidora de energia de Goiás. “As indicações iniciais são de que a empresa deve conseguir replicar o histórico de turnaround e geração de valor”, destaca.

Outra empresa do portfólio que também teve evoluções foi a Prio (PRIO3), antiga PetroRio. A Squadra observa que os campos da petroleira superaram a expectativa inicial de volume de produção.

Da mesma forma, houve avanço em companhias como XP (XPBR31) e Rumo (RAIL3). No primeiro caso, a casa destaca que o grupo usou parte do excesso de capital e do lucro recorrente para recomprar ações a preços baixos, enquanto a segunda conseguiu manter o poder de preço com uma solução logística competitiva dentro do agronegócio do Centro-Oeste brasileiro.

Grupo Mateus (GMAT3) e Ultrapar (UGPA3) também entram na lista de evoluções. A carta da Squadra destaca que o Grupo Mateus seguiu com um “audacioso” plano de expansão pelo Nordeste – ao mesmo tempo em que obteve ganhos sólidos na gestão do capital de giro.

Já a Ultrapar, por sua vez, apresentou melhoras “sequenciais” de rentabilidade em diversas linhas de negócio, após uma ampla reestruturação de Conselho de Administração e diretoria.

O fundo long only da Squadra teve retorno de 20,7% no primeiro trimestre, enquanto o long biased entregou 18,5%. No período, o Ibovespa subiu 7,6%.