Tokens de renda fixa que oferecem 1,5% ao mês precisam de aval regulatório formal, reforça CVM

No entendimento da CVM, empresas do setor têm flexibilização suficiente já prevista na norma para buscarem adequação

Paulo Barros

(Divulgação)

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Os tokens de renda fixa, ou de recebíveis, só podem ser comercializados no Brasil mediante aval regulatório, reforçou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em novo Ofício Circular publicado nesta quarta-feira (5).

A CVM recomenda que os tokens de renda fixa sejam viabilizados por meio da licença de crowdfunding, que prevê emissões de até R$ 15 milhões realizadas por emissores com patrimônio de até R$ 40 milhões (em alguns casos, podendo chegar a R$ 80 milhões).

Na maior parte dos casos, no entanto, será necessário também integrar no arranjo uma empresa securitizadora, seja parceira ou a própria tokenizadora, desde que obtenha o registro junto a CVM. Para a área técnica da autarquia, o simples fato de haver intermediação de uma empresa de tokenização, em geral, exige o processo de securitização, segundo previsto na Lei 14.430, de 2022.

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“Se cair nesse conceito, temos que seguir o que está na lei. Não temos competência para interpretar isso de forma diferente”, explica Luis Lobianco, gerente de supervisão de securitização. “Sendo uma operação de securitização, havendo captação pública de recursos da poupança popular junto a investidores, precisamos seguir o que está na lei e não podemos dispensar”.

Segundo Bruno de Freitas Gomes, superintendente de supervisão de securitização, a única forma de um token não precisar de securitização é haver uma interferência mínima da tokenizadora, como, por exemplo, apenas no repasse do fluxo. Se houver a adição de alguma cobrança ou serviço, a operação deve passar por securitização.

A exigência de passar tokens de renda fixa pelo regime de crowdfunding e pelo processo de securitização era uma crítica do mercado, que enxergou travas para continuar oferecendo rendimentos altos.

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No entendimento da CVM, no entanto, não há motivo para alarde: os limites de oferta de R$ 15 milhões valem para patrimônios apartados, podendo existir múltiplos de um mesmo emissor; e a securitização poderá ser feita pela própria empresa, portanto minimizando o impacto na operação.

Tokens de renda fixa são produtos de investimento que começaram a atrair a atenção dos brasileiros pela alta rentabilidade, acima da Selic (cerca de 1,5% ao mês), e com aporte mínimo reduzido e prazos curtos. Segundo a autarquia, no entanto, esses ativos se configuram em sua maioria como contratos de investimento coletivo e, por isso, estão sob seu guarda-chuva.

Empresas precisam se adequar

A nova orientação vem três meses após a primeira manifestação da CVM sobre a natureza dos tokens de renda fixa. Em abril, a autarquia afirmou que esses ativos poderiam ser caracterizados como valores mobiliários — a afirmação, diz a CVM nesta quarta, foi “propositalmente genérica”.

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“Entende-se que tais modalidades de investimento oferecem possibilidades de remuneração aos investidores, seja por meio do rendimento com juros ou pela aplicação de uma taxa de desconto com objetivo de proporcionar um ganho de capital”, afirma documento assinado por Gomes e Lobianco.

Para a área técnica da CVM, o que dita a natureza dos ativos não é a tecnologia utilizada no processo de tokenização (digitalização via blockchain), mas sim o produto de investimento subjacente. “Portanto, quando é ofertado publicamente um token que represente contrato de investimento coletivo em recebíveis, ele poderá ser considerado um valor mobiliário lastreado no crédito ou no direito creditório”.

O documento divulgado pela CVM não tem caráter de norma, portanto não leva para a ilegalidade as empresas que trabalham no segmento de tokens de recebíveis, a exemplo de Mercado Bitcoin e Liqi (esta interrompeu novas emissões desde abril). No entanto, o regulador ressalta que as operações de tokenização devem buscar adequação e levar em conta os intermediários previstos nas normativas já existentes.

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“Os intermediários do mercado de capitais não existem à toa. Se esse modelo que está sendo colocado para o público investidor é de valor mobiliário, não é possível eliminar os intermediários. Devemos trazer esse modelo para dentro da lei — ou, se for o caso, mudar a lei em algum momento”, explica Gomes.

Enquanto não há nenhuma mudança nas normas, a orientação da CVM indica que as companhias que atuam no setor deverão se enquadrar no entendimento vigente.

Paulo Barros

Editor de Investimentos