Tesouro Direto: após 2 suspensões, juros de prefixados ultrapassam 13%; discurso de Lula deixa mercado em alerta

Entre os títulos atrelados à inflação, taxas ultrapassaram os 6%; destaque é o Tesouro 2045, com 6,15% ao ano

Bruna Furlani Neide Martingo

(Gustavo Mellossa/Getty Images)

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As negociações de títulos públicos no Tesouro Direto foram retomadas, por volta das 16h50 desta quinta-feira (10). A sessão foi marcada por duas suspensões nos negócios: uma perto do meio-dia e outra agora à tarde. O dia foi de forte turbulência, com a alta do dólar e queda da Bolsa brasileira.

Quando há forte oscilação de preços e taxas, o Tesouro suspende temporariamente as vendas e compras para evitar que o investidor feche temporariamente as transações a um preço que possa ficar rapidamente defasado.

Do lado fiscal, soluções acima do teto de gastos para viabilizar o antigo Bolsa Família de R$ 600 por mês ganham força e preocupam. Junto a isso, repercutiu mal a fala de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), presidente eleito, a jornalistas. Na ocasião, Lula defendeu uma discussão econômica mais ampla, que não leve apenas a questão fiscal em consideração, mas a dignidade da população e a igualdade de oportunidades para os cidadãos.

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“O mercado está estressado e inseguro com relação aos rumos do governo Lula e da política fiscal. Quando um governo assume, é normal fazer um freio de arrumação na política econômica, com alguns ajustes. Mas o presidente eleito está fazendo ao contrário e gerando pânico no mercado”, diz Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset.

Para Luciano Costa, economista-chefe e sócio da Monte Bravo Investimentos, o governo deveria agora agir em duas frentes, para que o mercado tenha tranquilidade: definir o nome de quem vai ocupar o ministério da Fazenda e criar uma PEC, que garanta a continuidade do benefício mínimo de R$ 600 do Auxílio Brasil, dentro dos parâmetros fiscais.

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Os dados de Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) também estão no radar. A inflação teve alta de 0,59% em outubro na base mensal. O número ficou bem acima do esperado pelo mercado, que previa variação mensal positiva de 0,48%, segundo consenso Refinitiv.

Na volta dos negócios, pouco antes das 17 horas, o mercado de títulos públicos opera com alta expressiva das taxas. Nesse horário, o destaque estava nos papéis do Tesouro Prefixado 2033, com cupom semestral, que viam o juro subiu de 12,17% na sessão anterior para 13,17% ao ano hoje.

Já entre os papéis atrelados à inflação, todas as taxas estavam acima dos 6% ao ano. A maior remuneração real era oferecida pelo Tesouro IPCA+ 2045, no valor de 6,15% ao ano. O valor está acima dos 5,92% vistos na véspera, mas está abaixo dos 6,27% registrados no início dos negócios.

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As negociações do Tesouro IPCA+ 2055 estão suspensas desde ontem. A interrupção é fruto do pagamento do cupom semestral, previsto para a próxima quarta-feira (16).

O Tesouro Direto costuma proibir a compra do título quatro dias úteis antes do pagamento de cupom de juros. Além disso, também ficará suspensa, a partir dos dois dias úteis anteriores ao pagamento do cupom, a recompra desses títulos.

Confira os preços e as taxas dos títulos públicos disponíveis para a compra na volta dos negócios no Tesouro Direto nesta quinta-feira (10): 

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Tesouro Direto

Transição

O vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), anunciou, na tarde desta quinta-feira (10), novos nomes que participarão da equipe de transição de governo.

Foram indicados 36 integrantes de sete grupos temáticos: Comunicação; Direitos Humanos; Igualdade Racial; Planejamento, orçamento e gestão; Indústria, Comércio e Serviços; Pequenas Empresas e Mulheres.

Dos nomes anunciados, chamou atenção a figura de Guido Mantega, que foi o mais longevo ministro da Fazenda (2006-2014) do país e que também comandou o Ministério do Planejamento (2003-2004). O economista deverá integrar a equipe que se debruçará sobre o debate orçamentário.

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Alckmin já disse anteriormente que os nomes que vão compor a equipe de transição não necessariamente serão ministros, mas o mercado tenta buscar pistas sobre o comando da Fazenda no próximo governo.

Agentes financeiros renovaram preocupações com promessas de campanha que podem ficar fora do teto de gastos, como o Bolsa Família de R$ 600, a partir de janeiro. As despesas previstas ficariam em torno de R$ 175 bilhões no ano que vem, o que abriria espaço para que os R$ 105 bilhões reservados ao programa no Orçamento de 2023 fossem remanejados para cobrir outros gastos defendidos pela candidatura petista durante a campanha.

Em relatório, analistas da XP destacaram que a proposta “superou” desenhos alternativos que estavam em discussão logo à saída do segundo turno. Para o ano que vem, a recomendação de técnicos da equipe de transição é que o texto preveja a necessidade de compensação de receitas caso haja aumento nas despesas com o programa e volte a entrar na meta.

“A proposta tem forte apelo junto ao Congresso por ser de simples compreensão e com um argumento de difícil enfrentamento pelos parlamentares (retirar limites para os gastos com transferência de renda)”, acrescentam os especialistas da XP em nota, embora ponderem que há certa resistência de parte do Centrão em dar um “cheque em branco” ao novo governo.

Os profissionais da corretora destacam que o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), fará, nesta quinta-feira, a primeira reunião com líderes das bancadas no Congresso para testar a aceitação dessa proposta.

“É possível que ajustes sejam feitos, mas será preciso reações rápidas e contundentes para mostrar que a retirada total do programa social do teto de gastos pode não ser o melhor caminho”, ponderam os especialistas.

Em entrevista a jornalistas, Lula defendeu uma discussão econômica mais ampla, que não leve apenas a questão fiscal em consideração, mas a dignidade da população e a igualdade de oportunidades para os cidadãos.

“Por que as pessoas são levadas a sofrerem por conta de garantir a tal da estabilidade fiscal nesse país? Por que toda hora as pessoas falam ‘é preciso cortar gasto, é preciso fazer superávit, é preciso fazer teto de gastos’?”, indagou.

Emendou: Por que as mesmas pessoas que discutem com seriedade o teto de gastos não discutem a questão social deste país? Por que o povo pobre não está na planilha da discussão da macroeconomia? Por que a gente tem meta de inflação e não tem meta de crescimento? Por que não estabelecemos um novo paradigma de funcionamento deste país?”.

IPCA

Na cena doméstica, o destaque está nos números de inflação em outubro. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o IPCA acumulado em 12 meses foi a 6,47%. No ano, o indicador está em 4,70%.

A alta mensal veio acima da expectativa do mercado, que era de uma deflação de 0,48% em outubro e de 6,34% em 12 meses, segundo o consenso Refinitiv.

Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, oito mostraram alta em outubro. A maior contribuição do mês, de 0,16 ponto porcentual (p.p.), veio de Alimentação e bebidas (+0,72%), que havia recuado 0,51% em setembro.

Os Transportes, que passaram de uma deflação de 1,98% em setembro para uma alta de 0,58% em outubro, tiveram como destaque o recuo dos preços dos combustíveis (-1,27%) bem menos intenso foi menos intenso que no mês anterior (-8,50%).

Gasolina (-1,56%), óleo diesel (-2,19%) e gás veicular (-1,21%) seguiram em queda, enquanto o etanol registrou alta de 1,34%. Além disso, houve aumento expressivo nos preços das passagens aéreas (+27,38%), maior contribuição individual no IPCA de outubro (0,16 p.p.).

Embora o indicador tenha apresentado algumas surpresas mais negativas, Oliveira, da MAG Investimentos, destaca que as medidas subjacentes de inflação mantiveram tendência de desaceleração no dado interanual e que a inflação de serviços veio abaixo do esperado (+0,67%), o que indica que o aperto monetário está fazendo efeito nos preços.

“Para os próximos meses, a perspectiva aponta para um movimento de inflação de bens industriais e serviços desacelerando, o que deve permitir a manutenção do movimento de recuo do IPCA no acumulado em 12 meses”, destaca o economista.

Estados Unidos

O destaque na cena americana está no CPI, que subiu 0,4% em outubro, na comparação com setembro, segundo dados com ajuste sazonal divulgados nesta quinta-feira (10) pelo Departamento do Trabalho americano.

Com isso, a inflação para o consumidor atingiu alta de 7,7% no acumulado em 12 meses. Este foi o menor aumento de 12 meses desde o período encerrado em janeiro de 2022.

Tanto a medição mensal como a anual vieram abaixo da expectativa do mercado. O consenso Refinitiv apontava para alta de 0,6% ante setembro e de 8,0% em 12 meses.

O núcleo da inflação, que exclui a variação dos preços de alimentos e energia subiu 0,3% em outubro, após alta de 0,6% em setembro. Em 12 meses, subiu 6,3%.

O índice de energia aumentou 17,6% nos 12 meses terminando em outubro, e o índice de alimentos aumentou 10,9% em relação ao ano passado. Esses aumentos foram menores do que no período encerrado em setembro.