No país das “bets”, brasileiro pega gosto por memecoins: “É um cassino”

Entre as 10 criptomoedas mais populares no Brasil, oito são memecoins

Lucas Gabriel Marins

(Clifford Photography/Unsplash)

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Se há uma coisa que brasileiro gosta é de aposta. Entre “fazer uma fezinha” no jogo do bicho e jogar nas bets online, o comportamento de brincar com a sorte inundou recentemente o mercado de criptomoedas, que já é bem arriscado por natureza. Entre os 10 tokens mais procuradas no país, segundo dados do agregador CoinGecko, oito são memecoins, criptomoedas inspiradas em memes ou piadas da internet.

Enquanto investir em criptos famosas como Bitcoin (BTC) e Ethereum (ETH) já exige uma boa dose de cautela, o cuidado deve ser redobrado ao colocar dinheiro em memecoins como Dogecoin (DOGE), Shiba (SHIB), Floki (FLOKI) e Pepe Coin (PEPE), entre outras ainda mais novas e desconhecidas – e com ainda mais riscos envolvidos.

“É quase um cassino. Ao entrar em uma memecoin, é bom saber que você eventualmente pode perder tudo e que a balança está favorável para o lado da perda”, disse Vinícius Terranova, fundador da Fund Research.

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Mas tem gente ganhando dinheiro com isso. “Investi em Shiba [Inu, uma criptomoeda com tema de cachorro] cerca de R$ 3.500 em 2022. Transformei em R$ 30 mil. Também coloquei R$ 3 mil em Baby Dogecoin e fiquei com R$ 15 mil. Mas é importante deixar claro que foi tudo muito arriscado, foi uma aposta”, conta Alex Junior Guimarães, 24, que começou a investir em memecoins há cerca de cinco anos. Além de SHIB e BABYDOGE, disse também já ter comprado DOGE e PEPE.

“Quem quer começar deve arriscar pouco, no máximo US$ 10, para tentar valorizar 10 ou 1000 vezes o valor. Mas não existe garantia”, conta Conrado Magalhães, 35, ex-analista político que trabalha atualmente em uma empresa do setor financeiro. Ele garante que suas apostas em memecoins são pequenas, e vão de 2% ou 5% do seu portfólio de criptoativos. Outro investidor que conversou com a reportagem e preferiu não se identificar disse que aloca apenas 1% nos ativos baseados em memes.

O que são memecoins e por que são perigosas?

As memecoins são criptomoedas que surgem motivadas por brincadeiras na internet, e seu principal problema também vem daí: elas são mantidas apenas pela repercussão que ganham nas redes sociais. A receita faz delas muito mais voláteis que o já especulativo mercado de Bitcoin.

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Um exemplo recente é o da memecoin StarShip (STSHIP), inspirada no foguete da SpaceX, de Elon Musk. O preço despencou 80% no dia no lançamento da aeronave, que voou no espaço, mas caiu e explodiu na Terra. Algo similar aconteceu com uma cripto baseada no cantor Kanye West: um desconhecido teria comprado a conta de Instagram de uma brasileira que era seguida pelo rapper, e usado o perfil para promover um token que chegou a disparar 3.500%, mas “evaporou” dentro de algumas horas.

Esse tipo de coisa acontece porque qualquer pessoa com conhecimento básico em programação pode criar uma criptomoeda, o que abre espaço para golpes. No passado, o Brasil foi inundado de criptos de cachorro, gatos e até tartarugas. Quem colocou dinheiro, perdeu tudo. Memecoins são muitas vezes esquemas de pump and dump, tipo de fraude em que golpistas acumulam determinado ativo, inflam o valor com recomendações falsas e depois vendem para ficar com o lucro, usando investidores desavisados como liquidez.

No mundo das “apostas” em memecoins, a “casa” sempre leva vantagem. “Muito provavelmente, existe alguém com uma posição gigante em um token específico, que ele adquiriu sem custo significativo. Esse indivíduo está jogando com o mercado, observando o gráfico e tentando atrair liquidez. Periodicamente, ele pode realizar uma venda substancial, causando uma queda acentuada no preço. Isso pode levar as pessoas a perceberem o token como barato e começarem a comprar”, conta Magalhães.

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Onde as memecoins estão à venda?

Ao contrário de criptomoedas mais conhecidas, a maioria das memecoins não está disponível em corretoras. Para encontrá-las, é preciso entrar no “submundo” das finanças descentralizadas, em que usuários anônimos usam carteiras digitais como MetaMask e Phantom para navegar em sistemas sem controle central.

Atualmente, uma das ferramentas mais usadas para encontrar memecoins é a Dex Screener, que permite rastrear criptos que estão subindo mais nos últimos minutos ou horas, visualizar capitalizações de mercado, números de carteiras individuais que compraram um ativo, liquidez e preços com intervalos de tempo muito curtos, como um minuto.

“Muitos investidores usam essa ferramenta para escanear o ambiente em busca de tokens interessantes ou que mostraram uma queda significativa nas últimas 24 horas e começaram a mostrar uma tendência de alta”, conta Magalhães.

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Memecoins de destaque nos últimos meses foram criadas na rede Solana (SOL). O mais recente sucesso é a dogwifhat (WIF), uma cripto inspirada no meme de cachorro usando gorro. Empurrado por uma comunidade fiel, que recentemente arrecadou US$ 690 mil em apenas quatro dias para exibir seu mascote na arena de música Sphere, em Las Vegas, o token atingiu US$ 3,2 bilhões de valor de mercado. Recentemente, a exchange MB listou o ativo no Brasil. Só em fevereiro, a memecoin disparou 600%.

Outras duas memecoins que dispararam foram a Bonk (BONK) e a Jupiter (JUP), ambas da Solana. A BONK chegou a decolar 4.000% no ano passado, movimento que ajudou a empurrar o preço do token SOL. Já o JUP, lançado neste ano, subiu quase 90% no acumulado do mês.

Para Terranova, da Fund Research, as moedas podem ter explodido de valorização, mas questiona: “quantas outras foram a zero?” Segundo relatório do agregador Coingecko publicado no começo do ano, das 7.530 criptomoedas criadas no último ciclo de alta do setor, entre 2020 e 2011, 53,6% “morreram” – boa parte era memecoin. “A verdade é que eu nunca recomendo que alguém compre uma memecoin pensando em fazer disso seu principal meio de ganhar capital em cripto. Prefiro que as pessoas sigam o caminho dos fundamentos, que tende a ser mais consistente e lucrativo”, disse Terranova.

Lucas Gabriel Marins

Jornalista colaborador do InfoMoney