Multimercados macro saem de exposição zero em ações para 12%, mas ainda ficam abaixo da média; por quê?

Alocação atual é inferior aos 15% verificados entre 2017 e 2021, período anterior de juro em queda e Bolsa em tendência de alta

Bruna Furlani

B3 Bovespa Bolsa de Valores de São Paulo (Germano Lüders/InfoMoney)

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Mesmo diante de um forte rali registrado na Bolsa, que subiu quase 8% no primeiro semestre, fundos multimercados demoraram um pouco para retornar com mais força para o risco – e tiveram o retorno afetado por isso.

Mas após meses mais complicados, o fluxo impulsionado por gestores de volta para a Bolsa parece ter finalmente ganhado tração – ainda que abaixo da média histórica vista em períodos de flexibilização monetária.

A alocação média dos fundos multimercados do tipo macro saiu de zero em janeiro para cerca de 12% no fim de julho – maior percentual posicionado em ações brasileiras desde fevereiro de 2022, mostra levantamento de Fernando Siqueira, chefe de research da Guide. Um ano antes, em julho de 2022, o percentual alocado na bolsa era de 3%.

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Apesar da alta, Siqueira observa que a fatia ainda está abaixo da média vista em períodos de juro em queda e mercado com tendência de alta. “Entre 2017 e 2021, essa alocação ficou perto de 15%”, afirma.

Já os fundos multimercados long bias, que tendem a registrar menor variação, viram a alocação na Bolsa brasileira ficar perto da estabilidade entre do começo do ano para cá, passando de 66% em janeiro para perto de 65% em julho – percentual que está acima da média histórica, em torno de 60%. Em julho do ano passado, era de 55%.

Siqueira analisou a correlação entre o Índice de Hedge Funds Anbima (IHFA) –  que oferece uma média dos retornos de multimercados de gestão ativa no Brasil – e o desempenho do Ibovespa no período.

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Na avaliação do analista, o aumento da alocação é reflexo da melhora no ambiente macroeconômico, com o recuo da inflação, expectativa de corte de juros pelo Banco Central e evolução mais favorável do pacote fiscal.

Otimistas cautelosos…

Uma das casas que montou uma posição em Bolsa brasileira em junho foi a Legacy – depois de zerar a alocação vendida (que se beneficia da queda) que manteve até maio, segundo as cartas da gestora.

Apesar de ter iniciado a posição recentemente, o sócio e CIO da casa, Felipe Guerra, observa que a casa está com uma posição pequena em Bolsa, diante de um otimismo mais “moderado” e “cínico” com o Brasil. A afirmação foi feita durante evento com outros gestores na última quarta-feira (9).

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O executivo afirmou que a cautela tem a ver com o fato de que o arcabouço fiscal será “testado” a partir do momento em que a atividade começar a desacelerar, perto do fim do ano.

“Temos muita dúvida se o governo não vai apertar uma série de botões, como medidas parafiscais […]; ajuste pelo lado da arrecadação é muito difícil”, disse. Guerra afirmou também que está reticente sobre a chance de o governo conseguir cumprir a meta de resultado primário no ano que vem.

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O executivo também se mostrou descrente com a ideia de que haverá uma “agenda de reformas” e não descartou a possibilidade de que novas medidas fiscais sejam anunciadas, o que poderia levar a relação dívida/PIB (Produto Interno Bruto) para perto de 90%.

Embora a queda dos juros seja positiva para a Bolsa brasileira, a avaliação do executivo da Legacy é de que haverá muita volatilidade e, por isso, vale mais a pena apostar no crédito local.

O executivo ponderou que os retornos no crédito privado estão próximos de CDI mais 3,5% ao ano, enquanto a Bolsa poderia entregar algo perto de CDI mais 10% anuais, mas com muita volatilidade durante o caminho.

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Quem também aproveitou a perspectiva de queda de juros para aumentar as posições compradas em Bolsa foi a XP, que está com uma alocação relevante – embora não seja a maior neste momento.

Bruno Marques, gestor de fundos multimercados macro da XP, afirmou no mesmo evento que o preço da Bolsa é favorável, com espaço para a valorização, embora não descarte riscos relevantes no radar.

Como exemplo, o gestor argumentou que o País ainda possui um grande ajuste fiscal a ser feito e que o governo aumentou muito a velocidade de gasto no primeiro ano de mandato – o que traz dúvidas sobre como deverá ser a postura adotada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos últimos anos de sua gestão.

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Atualmente, a maior posição da casa está em títulos públicos atrelados à inflação (NTN-Bs). Marques explica que a inflação implícita está em 4% para um prazo de três anos, o que parece atrativo em um ambiente com pressão fiscal e expectativa de mudanças na condução da política monetária pelo Banco Central.

Os mandatos dos diretores do BC Fernanda Guardado (assuntos internacionais e gestão de riscos corporativos) e Maurício Costa de Moura (relacionamento, cidadania e supervisão de conduta) terminam em 31 de dezembro deste ano. No fim de 2024, quem deve deixar o BC é o atual presidente, Roberto Campos Neto.

Com a saída de dois diretores que votaram por uma queda de 0,25 ponto percentual na Selic na última reunião do BC, a expectativa dos gestores é de que o Copom tenha uma linha mais dovish (menos inclinado ao aperto monetário) do que hawkish (mais inclinado à alta de juros) a partir do ano que vem.

…e otimistas de fato otimistas

Por outro lado, há casas mais otimista com o Brasil, explorando mais a compra de Bolsa – caso da Tenax Capital.

Vinicius Fukushiro, co-gestor do multimercado macro da casa, destacou que a perspectiva mais positiva para os ativos de risco locais tem como base três fatores: avanços na parte fiscal, início do ciclo de afrouxamento monetário e reformas.

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Do lado fiscal, Fukushiro argumenta que o governo está mostrando “alguma responsabilidade” nesse quesito, com o avanço nas negociações que levaram à aprovação do arcabouço fiscal pela Câmara. O texto ainda precisa ser discutido no Senado.

Já no quesito juros, o gestor defendeu que há bastante espaço para corte. Por isso, acredita que o processo de afrouxamento monetário será “profundo”. O executivo, porém, não detalhou as projeções da Tenax para a Selic.

Antes da divulgação da ata do Copom, na manhã da última terça-feira (8), as projeções de economistas consultados pelo BC no Relatório Focus apontavam que a Selic terminaria o ano em 11,75%, mas tem crescido a visão de que a autoridade monetária poderia aumentar o ritmo de cortes – levando a taxa básica de juros para patamares ainda mais baixos no fim de 2023.

Quanto às reformas, o gestor observou que o Congresso tem funcionado como uma espécie de “guardião” para assegurar que não haverá piora no ambiente de negócios, além do que é possível ver uma motivação do Governo em aprovar reformas importantes para o País.