Light: negócios secam e debêntures são vendidas com desconto de 75% após ação para suspender pagamentos

Empresa ajuizou pedido de liminar para evitar pagar "certas obrigações financeiras"; gestores já contam que amortização prevista para 2ª não acontecerá

Mariana Segala

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A notícia de que a Light (LIGT3) – que atua na geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia – ajuizou medida cautelar com pedido de liminar para suspender o pagamento de “certas obrigações financeiras” agravou a situação já ruim dos investidores que possuem debêntures emitidas pela empresa.

O volume de negociação dos papéis, que já vinha em queda, praticamente secou nesta terça-feira (11) em diversas corretoras – e os preços de venda recuaram ainda mais.

Segundo gestores ouvidos pelo InfoMoney, apenas uma operação de cerca de R$ 3 milhões foi registrada nesta manhã entre as principais plataformas, envolvendo as debêntures sob o ticker LIGHD3, emitidas em outubro de 2021 e com vencimento em 2028.

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O negócio foi fechado a 25% do valor de face do papel – ou seja, com desconto de 75% em relação ao preço dos ativos quando foram emitidos.

“Quando o preço cai tanto, para de ter gente querendo vender, pois a perda é muito grande”, diz um gestor.

Outro gestor, que possui debêntures com vencimento em 2024 (LIGHB6), reforça que a diferença de preço (spread) entre as ofertas de venda (a 29% do valor de face nesta tarde) e de compra (a 25%) está elevada demais para que saiam negócios. “Nossa avaliação é de que o mercado exagerou nessa precificação. Não enxergamos um risco de crédito nesse nível”, diz.

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A Light é responsável pela distribuição de energia em 31 municípios do Rio de Janeiro e enfrenta um grave desequilíbrio econômico-financeiro, em meio à dificuldade para combater furtos de energia e à devolução de valores bilionários em créditos tributários aos consumidores.

A situação se agravou neste ano, conforme se aproxima o vencimento de parte importante das dívidas da companhia, ao mesmo tempo em que o futuro da sua concessão de distribuição no estado, que expira em meados de 2026, continua incerto.

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A leitura de um gestor é que a Light busca ganhar tempo com a medida cautelar ajuizada hoje – em segredo de justiça e caráter de urgência.

“É uma empresa geradora de caixa, com uma operação eficiente, mas tem uma concessão vencendo em três anos”, diz. Há, na visão do gestor, uma tentativa de forçar uma antecipação da renovação – que, no fundo, seria do interesse de todos.

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“A empresa quer a renovação, e o Ministério das Minas e Energia certamente também quer. O Rio tem uma situação complicada de roubo de energia, e a Light é a empresa mais capacitada para operar no estado, pois já conhece o mercado em que atua”, diz. Com a concessão assegurada, ela deixaria de ser uma empresa com prazo para fechar as portas e conseguiria alongar sua dívida.

A estratégia de buscar a mediação judicial para o caso se explica pela característica da dívida da Light, na visão das analistas Camilla Dolle, Mayara Rodrigues e Natalia Moura, da XP. Em relatório, elas destacam que a dívida se concentra em debêntures e bonds (títulos de renda fixa emitidos no exterior) pulverizados em milhares de investidores.

“Neste contexto, a Light pediu a instauração de procedimento de mediação coletiva com as partes em torno das obrigações financeiras”, diz o documento.

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A data escolhida para ajuizar a cautelar também não foi à toa. Na próxima segunda-feira (17), a Light tem juros semestrais de uma série de debêntures para pagar, além de uma amortização de 50% de LIGHB6. Em outras palavras, nessa data ela deveria devolver 50% do principal investido pelos compradores dessa debênture em especial – cuja emissão, em 2019, somou R$ 423 milhões.

Confira no quadro as obrigações relacionadas às debêntures da Light nos próximos meses:

Elaboração: XP

Dados da plataforma Quantum Finance indicam que os fundos de investimento possuíam aproximadamente R$ 2,4 bilhões em debêntures da Light nas carteiras em dezembro de 2022 (dado mais recente disponível). São, principalmente, papéis com vencimento em 2024, 2025 e 2028.

Entre eles estão os ativos com amortização de 50% prevista para segunda-feira. Só essas debêntures somavam R$ 285 milhões nas carteiras dos fundos na mesma data.

Agora, os gestores e investidores aguardam os desdobramentos da cautelar ajuizada hoje para entender quanto receberão – e quando. “A debênture que temos está marcada a 30% do valor de face nas carteiras, e é a esse preço que o mercado está negociando, já imaginando que empresa não pagará a amortização de segunda”, diz um gestor.

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Ele ressalta que não significa que isso não vá ser recuperado. “A empresa busca uma proteção momentânea, e por isso mercado já reprecificou os papéis. Os fundos não devem sofrer muito justamente porque os valores marcados já estão bem baixos”, diz. A expectativa é de que até sexta algum desdobramento ou decisão judicial sejam conhecidos.

Mariana Segala

Editora-executiva do InfoMoney