Juros de 17% nos prefixados e ganho real de quase 8% nos indexados à inflação; confira momentos em que os retornos dos títulos públicos ultrapassaram os níveis atuais

Aumento recente dos prêmios chamou atenção de investidores, mas taxas foram bem mais expressivas em anos como 2016, com impeachment de Dilma Rousseff

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SÃO PAULO – A combinação de aumento dos riscos domésticos relacionados principalmente à política e ao debate sobre as contas públicas, com incertezas globais quanto ao ritmo de crescimento das grandes economias diante da variante delta nas últimas semanas, levou as taxas pagas pelos títulos públicos negociados brasileiros a superarem a marca dos dois dígitos, ultrapassando os 11% no caso de prefixados, e a beliscarem um juro real de 5%, no caso de papéis com rendimentos atrelados à inflação de longo prazo.

Os níveis de remuneração atraíram a atenção de investidores, especialmente quando comparados com outros momentos de intensa volatilidade e forte abertura das taxas.

Em março de 2020, por exemplo, no momento em que a pandemia provocou os maiores estragos nos preços dos ativos, as taxas de papéis prefixados negociados no Tesouro Direto não chegaram a patamares próximos aos atuais.

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No caso do Tesouro Prefixado com vencimento em 2031, que passou a ser oferecido em fevereiro do ano passado, o prêmio atingiu 9,86% em sua máxima durante o ano de 2020 – percentual bem abaixo da remuneração de 11,02% vista no último dia 18.

O título Tesouro Prefixado com vencimento em 2026 também alcançou o maior nível de remuneração no pregão de 18 de agosto, quando o prêmio correspondeu a 10,34% ao ano. No momento mais agudo da pandemia para os mercados, em 23 de março de 2020, o retorno do papel chegou à máxima de 9,00%.

Entre os indexados à inflação, o título Tesouro IPCA+ para 2035 pagava um prêmio real de 4,92% em 18 de agosto, na máxima do ano, se reaproximando dos níveis vistos durante a pandemia – em 23 de março de 2020, o prêmio do papel chegou a 4,95%.

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Já o juro real do papel que segue o índice de preços com vencimento em 2055, maior prazo disponível no Tesouro, atingiu 4,97% em 18 agosto, na máxima do ano até aqui. O papel, que passou a ser negociado em fevereiro de 2020, chegou a pagar um retorno de 5,17% em março do ano passado.

Embora as taxas tenham chegado a níveis elevados em comparação com os últimos meses, em janelas passadas mais extensas, é possível encontrar períodos em que os rendimentos foram sensivelmente maiores.

O próprio Tesouro IPCA+ 2035, que começou a ser oferecido em março de 2010, pagou o seu maior rendimento histórico, de 7,80%, em janeiro de 2016. Na época, poucos meses antes de a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) sofrer o impeachment, a inflação rodava em 10,7% em 12 meses, com uma taxa Selic de 14,25% ao ano.

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No casos dos papéis prefixados, o investidor mais experiente deve lembrar de taxas que chegaram a 17% ao ano em 2015, quando o país teve inflação de 10,67% e uma Selic de 14,25%.

Ainda que os retornos atuais estejam distantes desses patamares de um passado não tão remoto e que seja necessário acompanhar a evolução dos riscos, no Brasil e no exterior, profissionais que acompanham o mercado assinalam que fica cada vez mais difícil ignorar as oportunidades que estão sendo oferecidas no mercado de títulos públicos, ativos considerados de menor risco disponível aos investidores.

“Penso que ainda há bastante chão para sairmos de um prêmio de 10% para 17%, mas essas são algumas das taxas mais altas que já tivemos no período mais recente”, destaca Leticia Camargo, planejadora financeira com certificação CFP.

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Francisco Levy, diretor de investimentos da Allea Wealth Management, considera exagerado os níveis em que têm oscilado as taxas dos títulos públicos, especialmente no caso dos prefixados de três a cinco anos.

Não à toa, após ficar pelos últimos dois a três anos sem carregar títulos prefixados no portfólio por considerar a remuneração oferecida pouco atrativa, Levy voltou nas últimas semanas a ter uma posição estratégica nos papéis.

Em relação aos títulos indexados à inflação, o especialista afirma que o investidor deve ter mais cautela com os papéis de prazo mais curto, de dois a três anos, uma vez que os preços podem vir a sofrer uma forte desaceleração nessa janela como reflexo do aperto monetário, sendo que os prêmios oferecidos não estão assim tão altos, avalia. Já para vencimentos um pouco maiores, como 2025, 2030 e 2035, Levy considera os patamares “bem atrativos”.

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Alocação

Na hora de alocar, a planejadora financeira destaca que, se o investidor preferir comprar títulos prefixados, é importante conseguir carregá-los até o vencimento para não ficar refém da marcação a mercado, isto é, das oscilações diárias de preços. “O ideal é ter um objetivo predefinido para conseguir carregá-lo até o fim. Por exemplo, comprar uma casa, um carro em 2024, ou em 2026”, diz.

Apesar de as taxas de dois dígitos chamarem a atenção, o investidor interessado na classe precisa levar em conta também a inflação elevada esperada para os próximos meses – o relatório Focus, do Banco Central, aponta para o IPCA em 7,11% em 2021.

Frente à pressão inflacionária, Leticia não descarta a alocação em papéis atrelados à inflação. Apesar de terem subido um pouco menos na comparação com os títulos prefixados, ela afirma que “travar” um juro real próximo a 5% pode ser bastante interessante se o investidor tiver um foco maior na aposentadoria.

“Se você tem um título pagando IPCA + 5%, pode ser um bom investimento para o longo prazo, independentemente de qual for a inflação”, destaca a especialista.

Para se proteger dos mais variados cenários, em que a inflação e a taxa de juros podem subir além do esperado hoje pelo mercado, a sugestão de Leticia é que o investidor diversifique os prazos e os indexadores (atrelados à inflação ou ao CDI). Ela explica, por exemplo, que, se a inflação chegar aos dois dígitos, é importante que o investidor tenha um título como o Tesouro Selic, com uma taxa básica de juros que tende a aumentar para controlar o avanço dos preços.

A diversificação, contudo, não deve ser a única preocupação dos investidores. Para não perder oportunidades que possam surgir em meio ao avanço da campanha eleitoral e das discussões em torno do teto de gastos, a planejadora recomenda que o investidor compre os títulos aos poucos e que vá fazendo, assim, um “preço médio”.

Apesar da inflação pressionada, o gestor da Allea entende que a postura firme do Banco Central no sentido de controlar a alta dos preços pode contribuir para derrubar as expectativas dos agentes, sem que a autoridade monetária precise de fato subir tanto os juros como parte do mercado precifica. Segundo o especialista, as taxas futuras de juros precificam uma taxa Selic para o fim do ano ao redor de 8%, acima dos 7,5% previstos no Focus.

Levy diz ainda que, pelo fato de o país contar com uma robusta reserva internacional, o risco de calote por parte do governo não é hoje considerado no mercado. Entretanto, o que pode acontecer, assinala o gestor, é uma espécie de “calote indireto”, via corrosão inflacionária.

De olho no Tesouro

Embora os prêmios de papéis prefixados e indexados à inflação estejam atrativos (leia mais aqui), investidores tiveram em julho uma postura mais conservadora nas compras no Tesouro Direto.

Houve uma mudança da tendência vista desde dezembro, em que os títulos atrelados ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) se destacavam na preferência dos investidores, e o Tesouro Selic foi o papel mais demandado no mês, com participação de 44,8% nas vendas.

Com relação ao prazo de emissão dos títulos, a preferência dos investidores recaiu sobre papéis com vencimentos intermediários, com prazos de cinco a dez anos, com 50,1% das vendas. Os títulos públicos mais curtos (com prazo entre um e cinco anos) aparecem em seguida, com fatia de 35,8%. Já aqueles mais longos, acima de dez anos, ficaram com 14,1% das vendas do mês passado.

Em julho, as vendas superaram os resgates no Tesouro Direto pelo quarto mês consecutivo, com uma captação líquida de R$ 934,1 milhões – a mais alta desde abril de 2020, quando chegou a R$ 1,6 bilhão.

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