Guerra comercial, crise na Argentina e risco de recessão: como gestores brasileiros estão investindo?

Enquanto alguns têm optado por colocar o pé no freio, zerando a exposição em dólar diante da disparada da moeda americana, outros reforçam a importância da proteção, em meio a horizonte mais incerto

Mariana Zonta d'Ávila

Bandeiras da China e dos EUA (Crédito: Shutterstock)

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SÃO PAULO – Um cenário externo marcado pelo aumento das tensões, em meio à falta de visibilidade em relação à disputa comercial entre Estados Unidos e China, a uma maior preocupação com o ritmo de crescimento mundial (inclusive com uma nova recessão americana no radar) e a uma crise na Argentina, tem movimentado bastante o dia a dia dos gestores de recursos. O crescimento das incertezas lá fora tem ofuscado eventos domésticos e dificultado um posicionamento mais assertivo por parte dos investidores brasileiros.

Que tipo de exposição faz sentido manter no câmbio diante da disparada do dólar? O balanço da Bolsa ao longo do mês preocupa ou, pelo contrário, segue como uma oportunidade para compra? E o que esperar do mercado de juros, com maior pressão cambial?

Ao InfoMoney, gestores disseram que ou têm optado em colocar o pé no freio, zerando a exposição na moeda americana diante do nível que a cotação atingiu, ou têm mantido as mesmas posições como proteção, com um horizonte mais incerto. Nenhum dos consultados estava com posição “vendida”, isto é, apostando na queda do dólar.

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E não é à toa. A mais recente pressão compradora sobre o dólar levou a cotação da moeda americana a ultrapassar a barreira dos R$ 4,19 nos negócios de terça-feira (27), atingindo o maior patamar desde setembro de 2018.

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Mesmo com a atuação do Banco Central, a tendência parece se manter de alta em relação ao real, com uma valorização que já chega a 10,7% no mês e a 7,6% no ano (até ontem, dia 29), o que joga luz sobre outro mercado: o de juros.

A disparada do dólar e a dificuldade do governo em conter o movimento tem despertado preocupações com relação à extensão do ciclo de baixa da taxa Selic, iniciado no fim de julho, quando a taxa Selic caiu de 6,5% para 6,0% ao ano. Dólar mais apreciado adiciona pressão sobre a trajetória de inflação, atualmente contida no Brasil.

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Júlio Fernandes, gestor da XP Asset, afirma que a casa já vinha desde o começo do ano trabalhando com um cenário de dólar valorizado no mundo todo, pela visão de a economia americana estar se sobressaindo.

A XP estava comprada na divisa americana no início de agosto, mas, desde que a moeda atingiu níveis próximos a R$ 4,05, a opção foi por reduzir a posição. Atualmente, os fundos de estratégia macro da casa estão com posição neutra na moeda – o otimismo está em Bolsa e juros.

“Mesmo com o câmbio nos níveis atuais, as expectativas de inflação permanecem muito bem ancoradas, portanto acreditamos que o Banco Central ainda tem espaço para cortar a Selic até níveis próximos de 5%, mesmo que o cenário atual de câmbio possa demandar mais cautela no ritmo de flexibilização monetária depois de setembro”, afirma.

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Assim como a XP, a ARX Investimentos zerou suas posições na moeda americana. De acordo com Eduardo Canto, gestor da estratégia macroeconômica, a casa tinha uma alocação levemente comprada em dólar para fins de proteção da carteira, mas, por conta da forte alta da moeda, optou por diminuir a exposição, assim como as demais posições direcionais da carteira. Atualmente, alocações menores em juros e Bolsa compõem o portfólio da asset.

Maior cautela na Bolsa

Ainda que o Ibovespa defenda uma alta da ordem de 14% no ano, o mercado acionário brasileiro também não tem passado ileso do aumento do estresse global, pressionado ainda pelo fluxo de recursos do investidor estrangeiro, que segue negativo no ano.

Ronaldo Patah, estrategista do UBS Wealth Management, conta que, com o aumento dos riscos globais, optou por ter uma posição acima do neutro, isto é, comprada em dólar, de forma a proteger a carteira de investimentos. Em bolsas globais e juros, o UBS está “underweight” (abaixo da média do mercado, correspondente à venda). 

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Em relatório desta semana, o UBS recomendou a venda de ações para limitar a exposição à incerteza política e disse que os investidores devem se preparar para uma maior volatilidade no curto prazo. “Acreditamos que é prudente tomar uma atitude para neutralizar parte dos riscos desse evento”, escreveu a equipe de análise. 

A Western Asset, por sua vez, segue com preferência nos mercados de juros e bolsa. “Vemos mais valor após a queda recente do Ibovespa”, diz Adauto Lima, economista-chefe da Western no Brasil.

Uma recessão no horizonte? 

Principal discussão do momento, alocadores de recursos se dividem em relação à expectativa de uma recessão na maior economia do mundo. Enquanto alguns estão atentos a novos sinais de desaceleração da economia mundial, como a contração no PIB da Alemanha, e ao movimento de inversão na curva de juros nos EUA, que costuma preceder o evento, outros avaliam ainda ser cedo para trabalhar com um cenário tão pessimista.

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Em maio, a gestora americana Pimco, que detém US$ 1,8 trilhão em ativos sob gestão, já havia cantado a bola da preocupação. Na época, economistas da casa afirmaram, em teleconferência, que as chances de uma recessão global superavam os 50%, analisando um horizonte de três a cinco anos.

O Morgan Stanley tem visão parecida. Em relatório do dia 25 de agosto, o banco disse que vê os riscos de uma escalação das tensões como significativos e que, se os EUA aumentarem todas as tarifas de importados da China em 25% e os chineses responderem de forma similar por um período de quatro a seis meses, uma recessão poderá acontecer já no início de 2020.

Já Patah, do UBS, diz ver uma probabilidade de apenas 25% de uma recessão nos EUA em 2020. A visão da casa é de que a crise sequer seria uma recessão tradicional, dado que a inflação está controlada, os títulos do governo estão com as taxas nas mínimas históricas e os bancos centrais estão com políticas favoráveis. “A economia americana depende mais de consumo do que da produção industrial, e o consumo está mais resiliente por conta das novas vagas de emprego”, justifica o estrategista.

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O mesmo argumento é utilizado pela Amundi, gestora europeia responsável pela administração de 1,5 bilhão de euros. “No momento, os setores de serviços e consumo [nos EUA] estão mostrando resiliência. As condições monetárias mais acomodativas devem continuar apoiando a demanda doméstica e esta deve compensar, pelo menos em parte, o impacto negativo do comércio global no crescimento do PIB. Além disso, as políticas fiscais se tornarão ainda mais favoráveis se o crescimento estiver realmente ameaçado”, escreveram analistas, em relatório divulgado em 9 de agosto.

Pelo sim, pelo não, a equipe do Credit Suisse defende uma postura mais cautelosa em ativos de risco elevado, em especial os de países emergentes. Na visão do banco, qualquer reversão de curto prazo no cenário pode servir de oportunidade para o investidor se desfazer de posições compradas em ativos de risco e aumentar a exposição a trades defensivos.

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