Gestores de fundos multimercado começam a migrar apostas para Bolsa americana

Com expectativa de retomada mais rápida da economia na crise e com maior oferta de ações, alocação em empresas de Wall Street ganha espaço nas carteiras

Beatriz Cutait

SÃO PAULO – A queda da ordem de 32% da Bolsa neste ano tem despertado, desde o início da crise gerada pela pandemia do coronavírus, dúvidas de investidores com relação ao que fazer com os investimentos. Sacar os recursos do mercado de ações, em meio a incertezas cada vez maiores e de expectativas gradualmente piores para o desempenho da economia global, em especial a brasileira? Ou aproveitar a forte baixa de preços para recompor o portfólio, de olho em uma retomada no longo prazo?

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Por ora, grandes gestores de recursos têm sinalizado cautela com suas decisões no mercado brasileiro. Quem tem caixa tem buscado as distorções de preços para comprar ações que já faziam parte de suas estratégias ou promover pequenas realocações. O foco está em companhias com negócios mais resilientes, baixo endividamento e gestão alinhada.

As maiores incertezas sobre o Brasil e os impactos mais profundos a serem sentidos na economia local impedem, contudo, posições arrojadas no mercado acionário, no momento. E as preferências se voltam para outra praça: a americana. (leia mais nesta matéria)

Diante da expectativa de uma retomada mais rápida da economia (e do mercado) na crise e com maior oferta de ações para a diversificação no novo contexto, a alocação em empresas de Wall Street tem ganhado espaço nas carteiras de grandes gestores de fundos multimercado, principalmente as do setor tecnológico, beneficiadas pelas mudanças em curso.

A Verde Asset, por exemplo, adotou, a partir do início da crise, uma estratégia de aumentar gradualmente as posições do renomado fundo Verde em ações com foco no mercado americano, tido como o mais resiliente e com possibilidade de retomada anterior a de outros países.

Em março, a Verde informou que seu fundo mantinha por volta de 20% do portfólio em ações no Brasil, mesmo percentual da exposição em ações globais.

Neste mês, a gestora reforçou que, com uma ampla gama de nomes de empresas de tecnologia à disposição, o mercado acionário americano representa hoje a melhor oportunidade para tirar proveito do ciclo de recuperação previsto. “O mercado já precificou uma brutal queda de lucratividade das empresas”, escreveram os gestores do fundo, aos cotistas.

Em meio à pandemia, as grandes empresas americanas de tecnologia despontam entre as maiores beneficiárias das mudanças de hábito estruturais geradas pelo confinamento, assinalou a Verde.

Ajustes na parcela de risco

Nos fundos multimercado da Bahia Asset, a opção para março foi trocar parte da carteira direcional comprada em bolsa no Brasil para o mercado acionário americano. A expectativa é de que as empresas do S&P 500 consigam reagir primeiramente à retomada no pós-crise.

“Ao longo do mês, seguimos implementando sucessivas reduções de risco e dando continuidade aos movimentos que vínhamos fazendo desde janeiro, diminuindo nossa exposição bruta e líquida comprada e ajustando a carteira para essa relevante mudança de cenário”, disse a gestora, em carta aos investidores.

A Legacy Capital também informou estar, “de forma paciente e cuidadosa”, aumentando progressivamente as posições compradas em ações americanas. “Por suas características de adaptabilidade, robustez e dinâmica, enxergamos a economia dos Estados Unidos como sendo a mais apta a recuperar-se com rapidez após este episódio”, diz a gestora, em sua carta mais recente aos investidores.

Na avaliação da casa, o Brasil está em uma posição particularmente frágil, diante de uma economia que já crescia a um ritmo lento antes da epidemia de coronavírus e com a expectativa de aumento da dívida pública no novo contexto.

Com um discurso de cautela e à espera de uma contração de 5% do Brasil em 2020, a SPX não tem alocações direcionais relevantes na Bolsa local. Já no mercado acionário internacional, a gestora está priorizando setores e empresas mais resilientes.

A casa tem posições compradas nos setores de consumo básico, saúde, tecnologia e em algumas empresas defensivas do setor industrial. As posições vendidas estão concentradas em índices e setores tidos como mais frágeis, como varejo, energia e automotivo.

Embora a atividade econômica chinesa mostre sinais de recuperação, a SPX assinalou, na carta aos cotistas referente ao mês de março, que há enorme incerteza quanto ao ritmo da retomada, e que há risco de a atividade global permanecer abaixo da capacidade por muitos meses.

Nos países emergentes, a SPX enxerga um desafio ainda maior. Diferentemente de 2008, a China e as commodities não serão uma fonte de ajuda, alerta a gestora. Em live realizada ao fim de março, Rogério Xavier, fundador da SPX, recomendou aos investidores tomarem cuidado, terem pouco risco, e sinalizou que o melhor, por ora, é aguardar.

Confira a seguir o desempenho dos fundos multimercado das gestoras mencionadas em março e no primeiro trimestre de 2020.

Cautela ainda é palavra de ordem

Se uma parte dos grandes gestores tem migrado as carteiras para as bolsas americanas, outra parcela segue bastante resistente à tomada de risco.

José Tovar, CEO da Truxt, ressalta que o cenário é de baixa visibilidade, dadas as incertezas com relação à data e à velocidade de saída da quarentena. E a recuperação econômica não deve ser rápida, na avaliação da gestora.

Desde o início de fevereiro, o fundo multimercado macro da casa carregava pouco risco na carteira, e pretende seguir nesta toada. “Não sabíamos que teria uma crise de pandemia, mas achávamos os mercados muito esticados, e resolvemos reduzir o risco. Saímos de Bolsa uma semana antes do carnaval”, diz Tovar. “Focamos muito em preservação de capital e, quando não vemos retornos para risco, zeramos a aposta.”

Atualmente a gestora segue sem posição em Bolsa por conta das incertezas referentes à crise, com preferência por posições defensivas.

Outra gestora de fundos multimercado com uma postura mais cautelosa é a Kapitalo, que reduziu o risco de forma generalizada, em função do forte aumento de incertezas relacionadas ao crescimento global. Em sua carta aos cotistas referente ao mês de março, a gestora contou ter diminuído “significativamente” as posições compradas em ações brasileiras e globais.

A postura conservadora decorre do prognóstico para a economia local – a Kapitalo estima queda superior a 5% do PIB brasileiro em 2020. “O governo está adotando diversas medidas fiscais e o Banco Central deverá promover novos cortes da taxa Selic com o intuito de evitar que este intenso choque negativo na atividade crie condições para o estabelecimento de um equilíbrio perverso de longo prazo.”

O grau de endividamento do país, contudo, deve impor cautela na implementação de medidas fiscais anticíclicas, diz a gestora, que também espera que a política monetária seja ainda mais afrouxada.

A Ibiuna, por sua vez, reduziu as posições mais arriscadas do multimercado Ibiuna Hedge FIC FIM em renda variável direcional, assim como a exposição a moedas emergentes. Foram ampliados, contudo, os hedges (proteções) contra cenários extremos, via aumento da posição aplicada em títulos do Tesouro americano e na compra de dólar contra real.

A visão é de que, ainda que haja oportunidades atrativas na renda variável, a elevada volatilidade dessa classe de ativos somada às incertezas, demandam prudência na alocação de risco. “Neste momento, preferimos observar de fora a correr o risco de ‘queimar a largada’ nesta que pode ser uma ótima oportunidade mais à frente”, escreve a gestora.

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Beatriz Cutait

Editora de investimentos do InfoMoney e planejadora financeira com certificação CFP, responsável pela cobertura do universo de investimentos financeiros, com foco em pessoa física.