Deflação do IGP-M morde até 35% dos dividendos de FIIs de “papel” expostos ao indicador

Embora pouco comum, fundos imobiliários têm até 22% de exposição ao índice, que acumula queda de 4,5% em 12 meses

Wellington Carvalho

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Após um período de forte elevação durante a pandemia da Covid-19, o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) acumula queda de 4,5% nos últimos 12 meses – em pelo menos oito houve deflação. O comportamento do indicador, conhecido como a “inflação do aluguel”, já reflete na receita de fundos imobiliários de recebíveis – e consequentemente nos dividendos desses FIIs.

“Assim como os demais fundos do mercado cuja carteira está majoritariamente indexada à inflação, o resultado do fundo no mês está diretamente ligado aos índices inflacionários do país”, explica o último relatório do RBR Rendimento High Grade (RBRR11). “Nesse contexto, os indexadores IGP-M e IPCA do mês de julho, que seguiram a tendência de baixa dos meses anteriores, impactaram negativamente o resultado do fundo”, complementa o texto.

Os mais de 140 mil investidores do fundo já perceberam o impacto. Os dividendos distribuídos pela carteira caíram cerca de 35%, de um patamar acima de R$ 1 por cota em junho para a casa de R$ 0,65 em novembro, como mostra a página do RBRR11 no InfoMoney.

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Fonte: InfoMoney

A gestão do RBRR11 lembra que a correção monetária da maior parte das operações considera os índices de inflação com uma defasagem de dois meses. Desta forma, acrescenta, os indicadores do IGP-M recentemente divulgados (veja mais detalhes abaixo) seguiram influenciando negativamente o resultado do fundo até novembro.

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Como funciona um FII de “papel”

Os FIIs de “papel” investem principalmente em certificados de recebíveis imobiliários (CRI), instrumento utilizado pelas empresas para captação de recursos no mercado. As companhias empacotam receitas futuras neste título de dívida e as vendem aos investidores, como os fundos imobiliários.

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Em geral, o papel embute um rendimento prefixado mensal e a correção por um indicador, que normalmente é a taxa do CDI (certificado de depósito interbancário) ou o Índice de Preços ao consumidor Amplo (IPCA).

A utilização do IGP-M como indexador não é muito comum nos CRIs investidos pelos fundos imobiliários, mas há FIIs com até 22% de exposição no índice, considerando apenas os principais fundos do mercado. Confira alguns exemplos:

Ticker Fundo Participação de títulos indexados ao IGP-M no portfólio (%) Rendimento médio prefixado (IGP-M + taxa)
BARI11 Barigui 22 9,8% ao ano
VSLH11 Versalhes Recebíveis Imobiliários 18,8 14,58% ao ano
RBRR11 RBR Rendimento High Grade 12 5,4% ao ano
OUJP11 Ourinvest JPP 6 6,6% ao ano
BTCI11 BTG Pactual Crédito Imobiliário 3 8,4% ao ano
RECR11 REC Recebíveis 3 9,3% ao ano
SNCI11 Suno Recebíveis 3 8% ao ano

Fonte: relatórios gerenciais dos fundos

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Quanto mais elevado o resultado do indexador, maior tende a ser a receita do fundo imobiliário – e consequentemente o rendimento distribuído aos cotistas. O movimento foi observado pelo próprio RBRR11 em meados de 2021 – período de forte elevação do IGP-M.

“O alto patamar de dividendo [distribuído pelo fundo] se deve, principalmente, aos resultados da estratégia tática e ao resultado acumulado desde o início do semestre nos papéis indexados ao IGP-M”, explicou relatório do RBR Rendimento High Grade em julho de 2021. O texto destacava ainda que a “inflação do aluguel” acumulava alta de 15,09% de janeiro a junho daquele ano.

Em caso de redução do índice – como ocorre atualmente –, o movimento tende a ser o contrário, ou seja, de redução da receita do fundo – e dos rendimentos repassados aos investidores.

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No caso do Barigui (BARI11), cuja exposição ao IGP-M alcança 22%, também foi observada uma redução no volume de dividendos. Apesar da recuperação vista em outubro (R$ 0,58 por cota), o patamar é inferior ao observado no primeiro semestre de 2023 (na casa dos R$ 0,90 por cota).

Fonte: InfoMoney

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O que esperar do IGP-M?

Apesar da queda acumulada em 2023 e do histórico de deflação ao longo do ano, o IGP-M registrou elevação nos últimos dois meses. Após subir 0,37% em setembro, o indicador avançou 0,50% no mês passado.

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Fonte: FGV/IBRE

Segundo André Braz, coordenador dos índices de preços da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a taxa do índice ao produtor (um dos componentes do IGP-M) continua em aceleração, influenciada pelo aumento nos preços de importantes commodities, como bovinos (de -10,11% para 6,97%), açúcar (de -2,70% para 12,88%) e carne bovina (-4,55% para 3,85%).

“Essas mudanças, que afetam parcialmente os itens que influenciaram nos preços dos produtos finais do varejo, contribuirão em breve para atenuar a deflação observada no grupo Alimentação do IPC (de -0,60% para -0,39%)”, projeta. “Esta classe de despesa tem atuado como um elemento de estabilização, impedindo que a inflação ao consumidor acelere em 2023″, explicou em nota.

Dada a defasagem das operações dos FIIs – de dois a três meses – a aceleração vista em setembro e outubro sinaliza para a recuperação dos dividendos, de acordo com a dinâmica explicada pelos gestores.

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Wellington Carvalho

Repórter de fundos imobiliários do InfoMoney. Acompanha as principais informações que influenciam no desempenho dos FIIs e do índice Ifix.