Crítico do “market timing” e cético com previsões de inflação, Howard Marks diz que “maior risco é não estar no mercado”

Em entrevista exclusiva ao podcast Outliers, cofundador da Oaktree sugere evitar operar em excesso e adotar postura "neutra" - nem agressiva, nem defensiva

Alexandre Rocha

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Considerado um dos investidores mais bem-sucedidos da atualidade, o americano Howard Marks, cofundador da gestora Oaktree Capital Management, é conhecido por defender que é preciso apostar no que outros tenderiam a evitar para obter bons retornos. Essa maneira de encarar os investimentos ajuda a entender sua visão de que o maior risco que um investidor pode correr é estar fora do mercado, independentemente do cenário.

“A maioria das pessoas diria [hoje] que o maior risco é uma queda relacionada à inflação e más notícias econômicas. Pela minha experiência, esse é um problema temporário”, disse. “Acho que o maior risco é não estar no mercado”.

Marks concedeu uma entrevista exclusiva ao podcast Outliers, apresentado por Samuel Ponsoni, gestor de fundos da família Selection na XP, com participação de Mariana De Biase, responsável pela análise de fundos internacionais da corretora. O episódio já está no ar, e você pode conferir a versão original, em inglês, bem como a versão dublada, em português, nas plataformas SpotifyDeezerSpreakerApple e demais agregadores de podcasts. Além disso, o podcast também está disponível no formato de vídeo no canal da XP no Youtube.

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A Oaktree é uma das maiores gestoras de fundos do mundo, especializada em investimentos alternativos, com mais de mil funcionários e US$ 164 bilhões em ativos sob gestão. Marks é conhecido também pelos Memos from Howard Marks, análises periódicas de mercados e investimentos que são leitura obrigatória no setor.

Defensor de estratégias de longo prazo, Marks ressalta que é muito difícil saber qual a hora certa de comprar ou vender um papel. Ele rejeita comportamentos impulsivos, a exemplo de vender ações num momento de queda por receio de recuos ainda maiores.

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“As economias e os mercados têm um tendência subjacente positiva. Sabemos que há ciclos, mas no final das contas, é positiva”, afirmou.

Para ilustrar, Marks lembra que o índice S&P 500, que reúne as principais empresas negociadas em Nova York, avançou em média 10% ao ano em 90 anos. A valorização, porém, não foi constante, houve altos e baixos. Em dez anos, por exemplo, o maiores ganhos podem ter ocorrido em 20 dias específicos.

“Se você ficar entrando e saindo, e ficar um tempo fora do mercado, pode perder estes 20 dias. Ninguém sabe quando vão ocorrer”, observou o executivo. “Se você ficar um longo tempo parado num ponto de ônibus, vai conseguir pegar um ônibus. Mas se ficar pulando de ponto em ponto, pode ser que não pegue nenhum”, acrescentou. Ele recorre com frequência a metáforas e citações.

Extremos

Para Marks, só nos “extremos” é possível ter uma visão mais clara sobre os rumos do mercado. E em sua avaliação, o momento não é de extremos, apesar das quedas acentuadas nas bolsas em 2022, da inflação e do aumento dos juros.

Com a retirada dos estímulos à economia norte-americana criados na pandemia de Covid-19, saíram de cena os “excessos óbvios”, segundo Marks, que fizeram as bolsas terem forte valorização em 2021.

Marks acrescenta que a pandemia – que ele compara a um “meteoro” – e a invasão da Ucrânia pela Rússia, iniciada em fevereiro deste ano, são fatores externos à economia, e resultaram num movimento que não se enquadra no conceito de ciclo econômico tradicional. O executivo publicou um livro sobre o tema, intitulado Dominando o ciclo de mercado.

“Especialmente por causa destes fatores, é difícil decifrar o mercado hoje”, disse. “Mas eu gostaria de destacar que é sempre difícil”.

Segundo o gestor, “não estamos tão caros que tenhamos que cair mais, mas também não estamos tão baratos a ponto de não podermos mais cair”, comentou. Marks concedeu a entrevista em 18 de maio, quando o S&P 500 recuava 15% no acumulado do ano e o Nasdaq Composite, 22%. De lá para cá, os desempenhos negativos se aprofundaram.

Neutralidade

Neste sentido, ele recomenda aos investidores uma postura “normal” em relação ao mercado, nem agressiva, nem defensiva. “Se você estiver muito preocupado em evitar flutuações para baixo, talvez você queira aumentar sua defesa um pouco, mas certamente não de maneira extremada”, observou.

Na mesma linha, ele revela que abordagem da Oaktree é “neutra”. “Nós investimos todos os dias, mas sempre incluímos um elemento de defesa no que fazemos, porque procuramos o que chamamos de margem de segurança”, declarou.

Isso não quer dizer que não existam boas opções nas bolsas, mas é importante procurar “pechinchas”, papéis a preços baixos com possibilidade de bons retornos . “Comparado a três meses atrás, algumas coisas foram colocadas em liquidação”, destacou.

Marks recomenda calma. Em sua avaliação, os investidores tendem a olhar as cotações todos os dias e acabam realizando operações demais. Para ele, visão de curto prazo e hypertrading – o excesso de transações no mercado – não são comportamentos vantajosos.

“As pessoas ficam animadas quando as coisas vão bem, quando os preços estão altos, e compram; e ficam deprimidas quando as coisas vão mal e vendem a preços baixos, o que é o oposto do que você deveria fazer”, disse o executivo.

Aqui e agora

Cético em relação a previsões macroeconômicas e ao chamado market timing – estratégia baseada na tomada de decisões tentando prever os melhores preços dos ativos e os momentos ideais para comprar ou vender ativos financeiros – sua recomendação é a análise fundamentalistas de empresas, setores e títulos. “Nós agimos em resposta às condições atuais do mercado, não em resposta ao que achamos que vai acontecer no futuro”, comentou.

Sua visão sobre a inflação nos Estados Unidos nos próximos cinco anos, por exemplo, é de que ficará acima do nível dos últimos 40 (“quando não conseguíamos chegar a 2%”), mas será menor do que os mais de 8%, em base anual, verificados atualmente. “Acho que vai ser talvez 3% ou 4%, mas nós não vamos fazer nada na Oaktree com base nisso”, disse. As decisões, segundo ele, continuarão a ser tomadas com base nas perspectivas para empresas e setores individualmente

“As pessoas deviam saber que quando falam de inflação, que eu acho algo muito misterioso, não deviam confiar nas suas previsões, nem nas de ninguém. Eu com certeza não tenho confiança nas minhas”, afirmou.

A mesma lógica, segundo Marks, foi adotada em outros momentos. Como exemplo, ele citou a atuação da gestora quando do estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos, em 2008, que precipitou uma crise financeira global. A empresa investiu US$ 10 bilhões em títulos de dívidas de empresas em dificuldades.

“Não porque tínhamos uma previsão otimista, mas porque vimos pechinchas, enxergamos títulos sendo despejados no mercado a preços ridiculamente baixos. A previsão era de que o sistema financeiro mundial podia entrar em colapso”, contou. Isso não ocorreu e a recuperação dos títulos rendeu US$ 6 bilhões aos clientes da Oaktree, sendo mais US$ 1,5 bilhão para Marks e seus sócios, segundo reportagens publicadas à época no jornal The New York Times.

A especialidade da Oaktree são títulos de dívidas high yield, papéis de empresas que não têm grau de investimento e com maior risco de calote, mas que pagam juros maiores – e, em tese, têm maior potencial de valorização no mercado conforme o desempenho da companhia.

Lições

A lógica de Marks consiste em ser mais agressivo em momentos em que a maioria está em pânico, “vendendo sem disciplina”, e mais cauteloso quando os outros estão eufóricos, “comprando com tudo”. “O objetivo adequado para um investidor no meu nível é buscar o que chamo de assimetria. Você quer ganhar bastante quando o mercado sobe, mas não quer perder muito quando o mercado cai”, declarou.

É o que Marks chama chama de controle de riscos, um dos princípios da filosofia de investimentos da Oaktree. No livro O mais importante para o investidor, Marks elenca entre as tarefas mais importantes entender, reconhecer e controlar o risco.

Outra lição do livro é “enxergar as coisas de forma diferente do consenso”. Para ele, para ter um desempenho superior, o investidor precisa pensar de forma diferente. Mais do que isso: deve ter o que ele chama de “percepção variante”. Grosso modo, consiste em ir além do óbvio e ter um “pensamento de segundo nível”.

“O exemplo que dou no livro é que o pensador de primeiro nível diz: ‘Esta é uma boa empresa, devemos comprar as ações’. Mas o pensador de segundo nível diz: ‘É uma boa empresa, mas não é tão boa quanto todo mundo pensa. O preço deve estar alto demais. Devemos vender as ações’”, explicou.

A entrevista completa e os episódios anteriores podem ser conferidos nas plataformas SpotifyDeezerSpreakerApple e demais agregadores de podcasts. Além disso, o podcast também está disponível no formato de vídeo no canal da XP no Youtube.

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Alexandre Rocha

Jornalista colaborador do InfoMoney