De desespero a esperança de “se ferrar menos”: como estão as vítimas brasileiras da FTX 1 ano após colapso

Investidores ficaram otimistas após a exchange falida recuperar ativos

Lucas Gabriel Marins

(Andrey Rudakov/Bloomberg)

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Há um ano, investidores de criptomoedas tiveram uma semana para não esquecer – pelos piores motivos. A FTX, que já foi considerada uma das maiores e mais respeitadas exchanges do planeta, passou por uma corrida de saques após rumores de insolvência e, em poucos dias, entrou em recuperação judicial nos EUA.

Foi um Deus nos acuda. Quem conseguiu sacar, passou ileso, mas não foi o que aconteceu com a maioria. Muitos dos 10,8 milhões de clientes ficaram com dinheiro preso – incluindo no Brasil, onde a corretora tinha na época cerca de 135 mil contas, segundo dados do agregador CoinGecko. Estima-se um rombo de quase US$ 9 bilhões.

O cenário, no entanto, mudou nos últimos meses. O fundador, Sam Bankman-Fried, foi condenado pelo Tribunal do Júri em Nova York e pode pegar até 100 anos de prisão. E o principal: se lá atrás havia pouca expectativa de recuperar os valores pelos crimes cometidos por Bankman-Fried, hoje as vítimas estão mais otimistas.

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Desde que a corretora quebrou, a nova administração conseguiu recuperar US$ 7 bilhões em ativos (até junho deste ano) dentro do processo de falência. Além disso, veio a público que a exchange tem participação na empresa de inteligência artificial Anthropic, que chamou atenção do Google e receberá aporte de US$ 2 bilhões da gigante de tecnologia.

“Eu vejo (a situação da FTX) até com um pouco de esperança na verdade. Estou com expectativa de que a exchange devolva mais da metade do dinheiro agora, talvez até 90%”, disse o trader brasileiro André Fauth, que deixou R$ 1 milhão em ativos presos na FTX – uma perda difícil de aceitar e de acreditar, disse ao InfoMoney no ano passado.

A FTX mantinha indevidamente bilhões de dólares de investidores e da empresa nas mesmas contas, tudo com o aval dos executivos. Mais tarde, descobriu-se que Bankman-Fried usava os recursos para fazer investimentos pessoais por meio de sua outra empresa, Alameda Research.

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“Vamos nos ferrar menos”

Não é só Fauth que está mais esperançoso. Esse é também o caso do trader Daniel Duarte, professor, autor de livros sobre criptomoedas, que disse ter “uma grana boa” na FTX (ele preferiu não revelar o valor).

“Eu conto com zero reais. Daí quando voltar algo (dizem que ano que vem) vai voltar mais de 50%. Encaro como bônus. Mas me parece que dado o investimento na empresa de inteligência artificial, nós credores vamos nos ferrar menos do que o esperado”, falou ele.

O empresário brasileiro Ray Nasser, CEO da Arthur Mining, uma startup de mineração de criptomoedas, aposta na condução do novo CEO da FTX, John Ray III, alguém que ele muito “diligente” e “competente”. “A previsão do mercado (de recuperação do dinheiro) é de dois anos. Agora é esperar”.

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Nassar tem US$ 17 mil, o equivalente a R$ 85 mil na cotação de hoje, presos FTX. “Não é um valor relevante, pois não coloquei todo meu dinheiro em uma cesta só, mas vou tentar recuperar como forma de exercício. Mas considero que fui mais prejudicado indiretamente do que diretamente”, falou.

O motivo é que, na época da quebra da corretora, a sua empresa estava no meio de uma rodada de investimentos. “A gente captou somente 20% ou 30% do que conseguiríamos se não tivesse acontecido o colapso da FTX. O ocorrido assustou muito todo mundo e abalou a confiança no mercado”.

Recuperação e falência

Fauth, Duarte e Nasser tentam reaver os valores perdidos por meio do processo de falência da FTX. Os três informaram à empresa Kroll, responsável pela administração da falência, o saldo mantido junto à corretora no momento do bloqueio dos saques. O prazo para enviar informações era 29 de setembro.

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“Aqueles que deixaram de preencher, nos termos do processo, ficarão impedidos de fazer valer a sua reivindicação contra os devedores, seus bens ou propriedades”, disse Artêmio Picanço, advogado especialista em blockchain. “Mas pelo que tenho notícia, a maioria dos clientes preencheu essas informações”.

Em meados de outubro, a massa falida da FTX apresentou uma proposta para devolver até 90% dos recursos dos credores antes de sua falência no ano passado. O plano será apresentado formalmente ao tribunal de falências até o dia 16 de dezembro.

De acordo com a proposta, os clientes seriam divididos em três grupos: ativos segregados para clientes FTX.com; ativos para clientes FTX.US; e um “pool geral” de outros ativos. Clientes com liquidação preferencial de US$ 250 mil (caso dos três brasileiros citados nesta reportagem) poderiam aceitar o acordo sem qualquer perda.

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“As pessoas ainda estão se perguntando quando a gente vai receber e se vamos receber em criptomoedas ou em dólar. Eu espero que a gente seja pago em criptomoedas. Mas vamos ver se conseguimos essa resposta até o final do ano”, disse Fauth.

De acordo com o cronograma definido para a recuperação judicial da FTX, segundo Picanço, uma audiência coletiva deverá ocorrer até o final do ano. Já a audiência para discutir a informações do documento está agendada para ocorrer no primeiro trimestre de 2024.

Cuidados

Nos últimos cinco anos, golpes com criptomoedas deixaram um rastro de prejuízo de cerca de R$ 40 bilhões a cerca de 4 milhões de brasileiros. Para não cair em furadas, é unanimidade entre os especialistas que os usuários pesquisem a fundo todos os aspectos do negócio.

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“Não importam as notícias ou campanhas que você veja na internet ou de terceiros, o importante é fazer a sua própria pesquisa. Afinal de contas, são incontáveis os projetos que direcionam grandes recursos para o marketing e, no final, aquelas promessas feitas nas propagandas eram tudo mentira”, disse Picanço.

Entre os pontos a serem observados estão histórico da empresa, os currículos das pessoas por trás do negócio e as licenças que a corretora possui. Outro ponto, falou o advogado, é observar o “proof of reserves” (prova de reserva, em português), um documento que comprova a existência de reservas. Algumas exchanges já estão implementando essa medida.

Lucas Gabriel Marins

Jornalista colaborador do InfoMoney