Ciclo de alta da Selic termina, mas dividendos de Fiagros devem seguir elevados; até quando vai durar?

Dos Fiagros listados na B3, 12 oferecem uma taxa de retorno com dividendos superior a 1% ao mês; analistas esperam valorização das cotas em 2023

Katherine Rivas

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Pelo menos 12 Fiagros – fundos que investem nas cadeias produtivas agroindustriais – ofereceram um retorno médio em dividendos (dividend yield) superior a 1% ao mês neste ano, no acumulado até agosto, segundo levantamento da Órama feito a pedido do InfoMoney. Um total de 23 são negociados na B3, conforme o último boletim mensal da Bolsa.

A maioria dos Fiagros hoje disponíveis são de “papel”, investindo em CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio), conhecidos por entregar os maiores dividendos. O motivo para rendimentos tão polpudos é o indexador predominante das carteiras: a taxa do CDI, principal indexador para ativos de renda fixa.

Até agosto, 91% dos Fiagros ofereciam uma rentabilidade de CDI mais juros de 4,9% ao ano, em média, enquanto apenas 9% eram atrelados a indicadores de inflação, com rentabilidade de IPCA mais 8,8% ao ano. Os dados foram levantados por Anna Clara Tenan, analista CNPI de Fiagros e FIIs da Órama,

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Com a Selic em alta, que refletiu no avanço também da taxa do CDI, estes fundos experimentaram o melhor dos mundos. A questão é o que acontece agora com os Fiagros, após o Banco Central interromper o ciclo de alta de juros e manter a Selic em 13,75% ao ano.

A visão dos analistas consultados pelo InfoMoney é unânime: embora o ciclo de alta dos juros tenha chegado ao fim, a Selic deve permanecer elevada pelo menos até o primeiro semestre de 2023, que é quando a taxa básica de juros pode experimentar os primeiros cortes. Diante disso, pelo menos no que resta de 2022, bons dividendos parecem assegurados nos Fiagros.

“Os dividendos dos Fiagros de CRAs não vão cair, mas vão ficar estacionados em um patamar e parar de crescer. Se a Selic é constante, os dividendos também devem ficar constantes”, afirma Tiago Reis, fundador da Suno Research.

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A queda dos juros – e, em consequência, dos dividend yields – já é um movimento esperado pelo mercado no futuro, destaca Anna Clara, da Órama. Mas na visão da analista, por mais que ocorram cortes a partir do segundo semestre de 2023, não se espera que a Selic volte ao patamar de 2% visto até 2021.

“O Brasil historicamente mantém juros mais altos, então a Selic não é um grande problema”, afirma Anna Clara. O impacto de futuros cortes, portanto, não deve ser muito relevante nos Fiagros. “Os dividendos vão continuar atrativos”.

A analista aponta que os Fiagros estão conseguindo captar um volume grande de recursos atualmente e, dada a gestão ativa das carteiras, muitos deles podem conseguir spreads (diferencial de juros) interessantes.  “Eles não dependem somente do carrego dos ativos. Podem fazer operações no mercado secundário, com spread, e gerar lucro adicional”, afirma.

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Fiagro: o que são e como funcionam

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Para Tiago Reis, mesmo que o rendimento caia em 2023, provavelmente deve superar o CDI, considerado a “medida de custo de capital do investidores”. “Se um investidor ganhava antes 1% ao mês no CDI e depois passa a ganhar 0,5%, enquanto um Fiagro que pagava 1,2% passa a oferecer 0,7%, os dividendos do fundo ainda são mais atrativos”, avalia.

Considerando a rentabilidade média dos Fiagros indexados ao CDI (de CDI mais 4,9% ao ano), Maria Fernanda Violati, analista de FIIs e fundos listados da XP, calcula que se a Selic se mantiver em 13,75% em 2022 o dividend yield anualizado dos Fiagros ficaria no patamar de 18% ao ano. Mesmo se os juros recuassem para 10%, o retorno dos fundos ainda estaria próximo a 15% ao ano.

E quando o indexador é a inflação?

A visão é ligeiramente diferente para os Fiagros que investem em CRAs indexados ao IPCA. Segundo os analistas, os dividendos podem recuar diante do arrefecimento da inflação. Seria, porém, um movimento natural e já precificado, segundo Anna Clara. “Inflação em patamares muito elevados poderia representar um risco de default [calote] para as carteiras, em razão do spread elevado”, diz. Seria uma redução gradual.

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Considerando a rentabilidade média dos Fiagros com a inflação como indexador (de IPCA mais 8,8% ao ano), Maria Fernanda calcula que o investidor poderia esperar um dividend yield de ao menos 15%. A conta toma como referência a projeção de inflação da XP, de 6,1% em 2022.

Para 2023, por outro lado, quando a inflação projetada está em 5,3%, o retorno dos Fiagros de IPCA se aproximaria do obtido pelos Fiagros de CDI. “Seria um cenário onde Fiagros indexados ao IPCA e ao CDI entregariam rentabilidades muito parecidas”, afirma.

Os Fiagros têm se popularizado por conta da distribuição de dividendos, segundo especialistas, já que os pagamentos costumam ser recorrentes – em muitos casos, mensais – além de isentos de Imposto de Renda.

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Confira os Fiagros que pagaram os maiores dividendos no acumulado de 2022:

Fiagro Gestão Inicio de Negociação Dividendos mensais em 2022 (média até agosto) Dividend yield mensal em 2022 (média)
Capitânia Agro Strategies (CPTR11) Capitânia Investimentos 22/06/2022 R$ 1,75 1,66%
Leste Fiagro (LSAG11) Leste 26/04/2022 R$ 1,56 1,48%
Valora CRA Fiagro (VGIA11) Valora Investimentos 15/12/2021 R$ 0,15 1,48%
FG/Agro (FGAA11) FG/A Gestora 12/01/2022 R$ 0,14 1,40%
Devant Fiagro (DCRA11) Devant Asset 08/02/2022 R$ 0,14 1,39%
Galápagos Recebíveis do Agronegócio Fiagro (GCRA11) Galapagos Capital 19/01/2022 R$ 1,36 1,34%
XP Crédito Agrícola (XPCA11) XP Asset Management 19/11/2021 R$ 0,13 1,27%
Riza Agro (RZAG11) Riza Asset Management 14/10/2021 R$ 0,12 1,18%
JGP Crédito Fiagro (JGPX11) JGP 29/11/2021 R$ 1,14 1,16%
Kinea Crédito Agro Fiagro (KNCA11) Kinea Investimentos 18/01/2022 R$ 1,22 1,14%
Vectis Datagro Crédito Agronegócio  (VCRA11) Vectis Gestão 01/07/2022 R$ 1,26 1,13%
Ecoagro I Fiagro (EGAF11) Eco Agro 28/01/2022 R$ 1,16 1,12%

Fonte: Anna Clara Tenan, da Órama. São apresentados apenas os Fiagros de CRAs com dividend yield mensal médio superior a 1%.

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Valorização das cotas como vantagem

Se, por um lado, há chances de redução dos dividendos dos Fiagros em 2023, os investidores podem ser beneficiados pela valorização das cotas. Anna Clara lembra que a queda dos juros favorece a valorização dos ativos de renda variável. O movimento já foi percebido nos fundos imobiliários em agosto. No segmento de Fiagros, também houve valorização no mês passado, de até 9,44%.

Segundo Tiago Reis, da Suno, uma futura redução da Selic também pode a estimular o crescimento do segmento, que saltou de 30,7 mil investidores em janeiro para 94,1 mil em agosto.  “A tendência é de que o preço das cotas fique próximo do valor patrimonial. Seria um preço mais próximo do justo”, afirma.

Para Anna Clara, os investidores poderiam aproveitar o cenário atual, de cotas ainda consideradas baratas, em bom ponto de entrada, para garantir essa valorização futura, aliada a dividendos robustos.

Confira os Fiagros com maior valorização nas cotas nos últimos seis meses:

Fiagro Valorização acumulada nos últimos seis meses Valorização acumulada desde a estreia na B3
Valora CRA Fiagro (VGIA11) 22,98% 24,81%
Ecoagro I Fiagro (EGAF11) 21,91% 11,60%
XP Crédito Agrícola (XPCA11) 21,49% 20,74%
FG/Agro (FGAA11) 15,68% 19,60%
Riza Agro (RZAG11) 12,60% 15,94%
Kinea Crédito Agro Fiagro (KNCA11) 10,52% 19,45%
Galápagos Recebíveis do Agronegócio Fiagro (GCRA11) 9,93% 13,29%
JGP Crédito Fiagro  (JGPX11) 9,73% 9,11%
(DCRA11) 8,97% 5,81%
NCH EQI Recebíveis do Agronegócio (NCRA11) 7,82% 1,79%

Fonte: Economatica. Considera apenas os Fiagros com no mínimo 6 meses de negociação na B3. Dados coletados em 14/09/2022.

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Novas alternativas no radar?

Segundo os analistas consultados pelo InfoMoney, o segmento de Fiagros se concentra, até aqui, naqueles que investem em CRAs. Foi o que conseguiu ganhar a atenção dos investidores, acostumados com os pagamentos mensais de dividendos dos fundos imobiliários, “primos” dos fundos do agronegócio.

Segundo levantamento da B3 a pedido do InfoMoney, os cinco Fiagros que reúnem o maior número de investidores atualmente são desta categoria.

O Riza Agro (RZAG11), por exemplo, concentra 16,7 mil dos 94,1 mil investidores em Fiagros, sendo o maior do mercado nesse quesito.

Confira os Fiagros com maior número de cotistas na B3:

Fiagros  Investidores pessoa física   Outros Investidores Total de Investidores
Riza Agro (RZAG11) 16.741 110 16.851
Valora CRA Fiagro (VGIA11) 16.472 95 16.567
XP Crédito Agrícola Fiagro (XPCA11) 15.935 36 15.971
FG/Agro Fiagro (FGAA11) 13.944 87 14.031
Kinea Crédito Agro Fiagro (KNCA11) 11.287 22 11.309

Fonte: B3

Os analistas dizem que a partir de 2023, quando acredita-se que a Selic possa cair, será possível ver uma mudança no perfil dos fundos: devem ganhar espaço os que investem em imóveis rurais, terras agrícolas e participação em empresas, em detrimento dos que compram apenas CRAs.

Para Maria Fernanda, da XP, juros em patamares menores podem fomentar os Fiagros de terras agrícolas, seguindo uma lógica semelhante à migração dos investidores dos fundos imobiliários de “papel” (que investem em títulos de renda fixa ligados ao setor imobiliário) para os fundos de “tijolo” (que investem diretamente em imóveis).

Atualmente existe apenas um Fiagro de terras agrícolas listado na B3: o fundo 051 Agro (FZDA11), da gestora 051 Capital, destinado apenas a investidores profissionais (com mais de R$ 10 milhões em ativos financeiros).

Na visão de Tiago Reis, Fiagros desse tipo têm potencial apenas no longo prazo, porque o investidor médio brasileiro não está preparado para lidar com dividendos baixos. Ele explica que as terras são negociadas no Brasil a múltiplos elevados, em comparação às riquezas que produzem. “O investidor pessoa física ainda não tem a capacidade de ver que a terra tem caráter dolarizado, que aumenta sua produção ao longo do tempo, o que permite o crescimento dos dividendos”, destaca.

Fora os Fiagros de terra, Maria Fernanda acredita que Fiagros do tipo FIP (fundos de investimento em participações) – que permitem ao investidor ter acesso a participações em empresas do setor agrícola – podem ganhar destaque em um cenário de juros em queda. Eles ainda não têm volumes elevados de aportes atualmente.

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.