Melhor risco-retorno está em ações que apanharam com risco governo, diz Claritas

Gestor acredita que ações de consumo, destaque dos últimos três anos na Bovespa, agora ficaram caras e embutem um risco maior em relação aos potencial de valorização

Diego Lazzaris Borges

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SÃO PAULO – As decisões políticas que interferiram recentemente em setores importantes da economia afetaram muitos papéis de empresas listadas na bolsa de valores. O investidor não gostou de ver as regras do jogo mudando de uma hora para outra e o mercado penalizou diversas ações por conta do chamado “risco governo”.

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Setorialmente, as empresas de energia elétrica foram as que mais sofreram. As medidas que mudaram as regras para concessões de energia provocaram uma reação imediata no mercado e a maioria das ações do setor amargou perdas expressivas. O setor financeiro também foi impactado com a queda dos juros e a redução dos spreads bancários. Bancos públicos como o BB e a Caixa reduziram as taxas das principais linhas de crédito, forçando o mesmo movimento por parte das instituições privadas.

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Individualmente, a companhia mais impactada pelo risco governo foi a Petrobras – a petrolífera teria ajudado o governo a segurar o avanço da inflação, ao não repassar o aumento do preço do petróleo para o consumidor final.

No entanto, a reação negativa do mercado a todas estas intervenções pode estar no fim, uma vez que o governo começa a dar sinais de uma mudança de atitude. A opinião é do sócio-fundador da gestora de recursos Claritas, Helder Soares, responsável por gerir uma carteira de R$ 1,5 bilhão em ações. Para ele, o melhor risco-retorno está nas ações que sofreram com as intervenções estatais no passado recente.

“Estou um pouco mais positivo com as últimas medidas do governo, especialmente em relação à Petrobras. Nos últimos seis meses, tivemos reajustes no diesel e na gasolina. O último reajuste do diesel foi muito surpreendente porque não houve nenhum boato e aconteceu na véspera da reunião do Copom, com todos preocupados com inflação. Acho que este aumento foi um sinal importante de que o governo começou a se preocupar com a empresa”, disse Soares, em entrevista ao InfoMoney. A Claritas tem um investimento em Petrobras, mas por meio de opções de compra de ações – “para que uma possível perda seja limitada”, nas palavras do gestor.

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O governo também já deu sinais de que não pretende cobrar participação especial do setor de mineração, o que já começou a beneficiar as ações da Vale. “As últimas declarações do [Edson] Lobão (ministro de Minas e Energia) são na linha de que provavelmente as participações especiais não sejam cobradas e talvez royalties não subam tanto quanto mercado está esperando. Acho que agora existem menos nuvens negativas nesses papéis importantes da bolsa”, disse.

A Claritas tem uma pequena posição comprada em Vale, já que o gestor acredita que o atual preço embute um cenário muito ruim, com cobrança de royalties de 4,5% sobre o faturamento bruto do setor, participação especial e mais uma despesa de R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões com o desfecho de um julgamento no STF sobre a tributação de coligadas de empresas brasileiras no exterior.

Em relação ao setor elétrico, Soares também se mostra mais otimista, principalmente por conta da decisão da Aneel de permitir que o preço spot da energia deixe de ficar artificialmente baixo. A resolução da Aneel, que entra em vigor daqui a alguns meses, vai permitir que o preço spot reflita a situação energética mais apertada do país, que obrigou o governo a decidir utilizar todas as usinas térmicas do sistema. A decisão deve beneficiar principalmente a Cesp, que terá muita energia para vender no mercado livre a partir de 2014.

Sobre o setor de concessões de rodovias, o gestor lembra que o governo testou taxas de retorno mais baixas aos investidores – em torno de 5,5%, além de impor condições piores, como duplicações antes de cobrança de pedágios. “Nessas condições não aparecerem investidores e o governo voltou atrás. Subiram a taxas de retorno para 8%. O próprio movimento de alta de taxas de juros é uma mudança, não ideológica, mas um pragmatismo maior por parte do governo”, disse Soares.

Veja abaixo outros trechos da entrevista ao InfoMoney:

Empresas X
Não temos participações relevantes nas empresas do grupo X. Temos apenas um pouco da MMXM11 (título de remuneração variável baseada em royalties trimestrais). É difícil falar do grupo X, porque tem empresas listadas, em que você pode fazer uma avaliação e enxergar cenários. Mas tem a EBX, que é a holding, que não é listada em bolsa, então ninguém sabe qual é a exposição de dívida, qual é o vencimento. É difícil falar do grupo como um todo.

Não temos nenhuma posição em OGX, nem vendida. O aluguel é muito alto e muito caro. Não é tranqüilo ficar vendido, a volatilidade está gigante. Dizem que grande parte do short (posição vendida) são os próprios bancos querendo “hedgear” [fazer hedge – proteção] o risco de crédito. Se der alguma “zebra”, eles ganham na ponta vendida.

Consumo/shoppings centers
As ações de consumo que oferecem algum crescimento estão com P/L (relação preço/lucro) acima de 20, então estão caras. Do ponto de vista de valuation já não é uma barganha e acho que o momento de consumo está um pouco pior – dados das vendas no varejo vieram ruins nos últimos meses. Isso me deixa um pouco menos otimista nessa parte de consumo.Mas obviamente tem coisas boas ainda. Hering é uma empresa que sofreu bastante e agora está mostrando um certo turn around.

Todo mundo faz uma correlação de ações de shopping com consumo, mas na realidade é uma ação muito mais defensiva. Da receita do shopping , apenas 7% ou 8% depende de meta de vendas. O grosso é aluguel fixo, estacionamento. A BR Malls explora até marketing no shopping, tem quisques, é um negócio bem mais resiliente. Estou comprando essas ações.

Souza Cruz e Natura
A Souza Cruz está cara. Aumentou imposto na virada do ano, e eles repassaram para o preço do cigarro. O consumo caiu 24%, ainda que o lucro tenha permanecido forte. A empresa perde market share para o informal, porque sobe muito o preço, mas ganha market share dentro dos formais. A Natura é outra ação cara, dado que o lucro parou de crescer.

Bancos
No geral, o valuation não está caro para o nível de taxa de juros atual. Acho que o nível de inadimplência vai melhorar um pouco, especialmente para o Itaú, que fez o dever de casa de mudar o mix da carteira.

Os conflitos com o governo também diminuíram. A nova série de crédito do Banco Central (que abrange 96% do estoque de crédito da economia) é uma série muito melhor e mais abrangente do que a anterior. Com ela, o spread caiu de cerca de 22% para 12%, um nível mais civilizado, não muito diferente de outros países de mercados emergentes. Isso tira um pouco da pressão do governo para cair spread. O que não me deixa muito otimista é o crescimento de carteira de crédito. Também não vejo muito crescimento de lucro. Acho que deve crescer entre 5% ou 6% no caso dos bancos privados, não é grande coisa.

Diego Lazzaris Borges

Coordenador de conteúdo educacional do InfoMoney, ganhou 3 vezes o prêmio de jornalismo da Abecip