Ações mais líquidas, caixa e concentração: as estratégias dos gestores de small caps para enfrentar a crise

Ciclos econômicos anteriores apontam que ações de menor capitalização sobem antes que a média do mercado, embora sua liquidez seja um ponto de atenção

Lucas Bombana

SÃO PAULO – Pelo menor volume negociado das small caps na comparação com as blue chips da Bolsa, grandes gestoras como Bradesco Asset Management (Bram) e BNP Paribas Asset Management aumentaram a liquidez das carteiras para atravessar a crise da melhor maneira possível.

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As small caps são as ações de menor capitalização da Bolsa. O índice setorial SMLL reúne os 79 papéis mais líquidos da categoria, com Eneva, Qualicorp, Fleury e Bradespar representando o grupo com maior representatividade.

Via de regra, se tratam de empresas com a atividade mais voltada à dinâmica local. Segundo a regulação da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), para compor uma carteira de small caps, o gestor não pode incluir no portfólio uma ação que ocupe da primeira à décima posição em peso no Ibovespa.

Além disso, os papéis que ocupam o grupo da 11ª à 25ª maior contribuição no principal índice da Bolsa não podem representar, juntos, mais de 15% de um fundo de small caps.

Segundo o superintendente da Bram, Marcelo Nantes, que adota o critério da Anbima, a estratégia da casa tem sido priorizar as ações mais líquidas, diante da expectativa de que a magnitude da queda dos mercados poderia gerar uma onda de saques, o que acabou não se confirmando na gestora ou na indústria. “O investidor se mostrou mais amadurecido do que estávamos imaginando.”

De fato, os números da Anbima comprovam a clara predileção dos agentes locais pelos fundos de ações nos últimos meses. Embora em abril, até o dia 28, a classe tenha acumulado resgate líquido de R$ 139 milhões, o montante é quase irrisório se comparado à saída de R$ 63 bilhões ao incluir na conta as demais categorias de fundos.

No ano, a captação das estratégias com ações chega a R$ 45,1 bilhões, enquanto a indústria como um todo tem resgates de R$ 44,5 bilhões.

No caso das estratégias de small caps, o comportamento se repete – os resgates somam R$ 89,7 milhões em abril, até o dia 28, mas, no ano, a captação é de R$ 2,7 bilhões.

Setores e retornos

O superintendente da Bram prefere não abrir as posições especificas da carteira, se limitando a dizer que os setores com maior representatividade são os de energia elétrica, alimentos e e-commerce. “Já estávamos nesses setores, e aumentamos o tamanho das posições.” Por outro lado, o varejo perdeu espaço no portfólio da Bram.

A estratégia se mostrou acertada – em abril, o fundo de small caps da gestora subiu 18,04%, enquanto o índice setorial da Bolsa avançou 10,19%, valorização bem próxima da do Ibovespa, de 10,25%, segundo dados da Economatica. Desde o início da crise (em 21 de fevereiro), contudo, a carteira acumula uma perda de 27%.

“As small caps em geral caem mais que o mercado, mas as exportadoras de commodities sofreram bastante com a crise do petróleo”, diz Nantes, em referência ao desempenho do Ibovespa. Em sua avaliação, as small caps devem liderar a recuperação da Bolsa nos próximos meses. “Com a atividade econômica voltando, são papéis que tendem a performar melhor que a média.”

Embora em abril o desempenho dos benchmarks tenha ficado próximo, em períodos um pouco maiores, a tese de que as small caps caem mais na queda e sobem mais na alta se confirma.

Desde o inicio da crise, em 21 de fevereiro, enquanto o Ibovespa cai 29,2%, o índice de small caps recua 35,3%. E no primeiro quadrimestre, o Ibovespa perde 30,4%, contra queda de 34,1% do benchmark setorial.

Voltando um pouco mais no tempo, na última grande crise do mercado, em 2008, enquanto o Ibovespa caiu 41,2%, o índice de small caps perdeu 53,1%. Por outro lado, no ano passado, quando a Bolsa avançou 31,5%, o índice de small caps valorizou 58,2%.

Retomada à frente

Na Trígono Capital, Werner Roger, CIO da gestora, também defende que as small caps tendem a se recuperar primeiro da crise. E se vale de uma análise histórica para embasar sua expectativa. “Na crise do subprime, o Ibovespa demorou 614 pregões (quase três anos) para se recuperar, enquanto o índice de small caps demorou 381 pregões.”

Em 2010, na crise dos PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha), o fenômeno se repetiu, com o benchmark setorial retomando o patamar pré-crise em 49 pregões, contra 122 do Ibovespa. Mais recentemente, após o “Joesley Day” (em maio de 2017), enquanto o índice de small caps se recuperou em 43 pregões, o Ibovespa levou 58 sessões, diz o especialista.

“O índice de small caps é muito mais diversificado que o Ibovespa, que tem uma grande concentração em bancos e commodities”, afirma Roger. “Pela própria construção do índice, acredito que nos próximos doze meses seu desempenho irá superar o do Ibovespa.”

Poucas e boas

Para se proteger do coronavírus e aproveitar a retomada das small caps à frente dos demais, a Trígono adotou como estratégia aumentar a concentração da carteira. As principais posições do portfólio, que antes do carnaval correspondiam a cerca de 60% do total, passaram a responder por aproximadamente 80% em abril.

Compõem a maior parte do portfólio da gestora a empresa de logística JSL, a moedora de cana São Martinho e a Cia Ferro Ligas da Bahia – Ferbasa. Também estão na carteira as ações da fabricante de compressores de ar Schulz, da empresa de fundição Tupy e da armazenadora de silos Kepler Weber. “Temos dado prioridade às ações de empresas com a receita dolarizada mas com o passivo em reais”, diz o CIO.

Para aumentar a concentração em poucas ações, a Trígono se desfez de outras, como da Porto Belo e da Celesc.

“A Porto Belo fabrica porcelanatos e depende muito do desempenho do mercado imobiliário, que pode sofrer mais com a crise.” No caso da Celesc, a distribuidora de energia deve ser negativamente impactada pela redução de consumo dos setores industrial e de serviços, prevê o gestor.

Dentre as ações que fazem parte do SMLL, apenas a da SLC Agricola, com alta de 3,9%, conseguiu fechar no campo positivo, considerado o período desde o início da crise, em 21 de fevereiro, até o fim de abril. O segundo melhor desempenho foi da empresa de exploração e refino Dommo, com queda de 2,6% no período.

Na outra ponta, as aéreas Azul e Gol acumulam as maiores perdas, de 68,7% e 63,3%, respectivamente.

Como resultado das decisões tomadas, em abril, o fundo da Trígono subiu 16,71%, superando o índice de small caps da Bolsa e o Ibovespa. Roger aponta o alto grau de descorrelação da carteira com o benchmark setorial ao justificar a diferença dos resultados. “Apenas cerca de 3% do nosso portfólio tem aderência com o índice de small caps da Bolsa.”

Devido aos posicionamentos em nomes fora dos índices, em abril o fundo da gestora completou dois anos com uma alta acumulada de 50,87%, bem acima dos ganhos de 5,90% do benchmark.

“Apressado come cru”

Durante os dias de maior volatilidade, enquanto na Bram a principal estratégia defensiva foi buscar ações mais líquidas, na Trígono, a forma para se prevenir contra os resgates foi aumentar o caixa de quase zero para cerca de 5%, decisão também adotada na BNP Paribas Asset.

Ao perceber que a crise se avizinhava, o gestor Marcos Kawakami optou por aumentar a alocação em caixa de 2%, no pré-carnaval, para 8% no inicio de março.

No entanto, após adotar postura mais conservadora em um primeiro momento, o gestor da casa reconhece que acabou subestimando o impacto do coronavírus.

“Achamos que havia certo exagero nas quedas quando começaram a ocorrer os primeiros ‘circuit breakers’ de março, e nos posicionamos de uma forma um pouco mais agressiva.”

Naquele momento, a gestora se utilizou de parte do caixa feito poucos dias antes para comprar ações de companhias áreas, consumo discricionário e construtoras. Por políticas internas, a asset não abre as posições do fundo.

O problema é que, poucos dias depois da decisão, os mercados viriam a cair ainda mais. “Erramos na alocação dos recursos”, diz Kawakami.

Ao vislumbrar que o tamanho do problema era pior do que o previsto, a gestora reduziu o posicionamento mais arrojado e se voltou para nomes defensivos em elétricas, telecom e exportadoras. Com isso, em abril o fundo da casa avançou 17,22%, embora ainda perca cerca de 35% desde o início da crise.

“A postura mais defensiva não é porque estamos pessimistas com os preços atuais, mas porque ainda não temos clareza sobre quando será de fato a retomada e em que ritmo.”

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