Zeina Latif: por que o Copom não deverá subir a Selic na próxima reunião (e nem neste ano)

Seria necessário aguardar os sinais de repasse cambial aos preços, primeiro os chamados efeitos primários, depois os efeitos secundários

Equipe InfoMoney

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Zeina Latif*

É praticamente unânime a expectativa de que o Copom irá manter a taxa Selic estável na reunião de quarta-feira. No entanto, alguma alta até o final do ano deixou de ter unanimidade (Selic a 6,5% este ano, no Boletim Focus, sendo 6,70% para o Top 5).

Para muitos economistas, o ajuste da taxa de câmbio e sua repercussão na inflação farão o BC iniciar a normalização das condições monetárias antes do esperado anteriormente, reduzindo o estímulo monetário atual. Tendo em vista o zelo da autoridade monetária com sua reputação, não se pode descartar este cenário, iniciando um trabalho que a próxima diretoria do BC terá que fazer de qualquer forma, cedo ou tarde.

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Uma alta da Selic este ano, no entanto, não é uma projeção óbvia, pois o repasse do câmbio a preços tem defasagens e há dúvidas quanto à sua intensidade nas condições econômicas atuais, com significativa ociosidade da economia e elevada volatilidade cambial, que reduz a visibilidade dos empresários na fixação dos preços.

Seria necessário aguardar os sinais de repasse cambial aos preços, primeiro os chamados efeitos primários, como nos preços de gasolina e bens comercializáveis, que são diretamente afetados pelo dólar (bens duráveis e alguns alimentos). Depois os efeitos secundários, que são impactados pelos efeitos primários pela pressão de custos.

O primeiro efeito, mais rápido, não deveria ser combatido com aperto monetário, pois reflete uma mudança natural de preços relativos. O segundo efeito, este sim precisa ser evitado com calibragem da política monetária. Ocorre que os efeitos secundários não serão facilmente e rapidamente observados. Pelos nossos modelos, são necessários dois trimestres.

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Estivesse a economia já em trajetória firme de recuperação e a inflação mais próxima da meta, faria sentido o BC iniciar a normalização da política monetária, sem aguardar a materialização (ou não) dos efeitos secundários. Em outras palavras, caberia uma postura preventiva. Não é o caso por ora. A ociosidade na economia está elevada, em 23% pela nossa estimativa e praticamente estagnada. No jargão dos economistas, o hiato do produto fecha-se lentamente e isso não deverá se alterar tão cedo, especialmente após os choques sobre a atividade (greve dos caminhoneiros e alta do dólar, ambos contracionistas). Já a inflação – com destaque para a inflação de serviços – deverá seguir contida tendo em vista o elevado desemprego. Pelas nossas estimativas, a inflação de preços livres, que são o foco da política monetária, deverá fechar este ano em torno de 3,2%. Para o próximo ano, 4%-4,5%, ainda que ao longo do ano possam ser registrados resultados mais elevados.

Importante ainda ponderar a importância da reorientação da política fiscal e parafiscal (bancos públicos) ocorrida nos últimos anos. No governo Dilma, devido ao excessivo estímulo feito, choques na inflação demoravam muito mais para dissipar. Não é o caso agora.

Concluindo, não vemos por ora necessidade de uma alta da Selic ainda este ano e, a depender da reputação do próximo time no BC, não seria necessário uma alta já no início de 2019.

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As incertezas no entanto recomendam cautela, sendo que o discurso do BC provavelmente não fechará as portas para altas.

*economista-chefe da XP Investimentos