Weg: “tech” brasileira salta 100% no ano e anima por diversificação, mas preço da ação assusta analistas

Resultado do 2º trimestre confirmou o otimismo depositado por especialistas, que veem solidez nos negócios da companhia, mas apontam que ação está cara

Ricardo Bomfim

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SÃO PAULO – É praticamente unanimidade entre os analistas que o setor que mais deve crescer no pós-pandemia é o de empresas de alta tecnologia. Porém, poucos sabem que, embora não seja como investir em ações da Apple, do Netflix ou da Tesla há companhias brasileiras que estão expostas a este segmento.

Uma delas é a Weg (WEGE3), cuja ação se valorizou em mais de 200% nos últimos 12 meses e que se tornou “queridinha” dos analistas por seu perfil mais defensivo. Hoje, os papéis ordinários da companhia se tornaram vice-campeões de ganhos na Bolsa no ano, subindo 97,6%. As ações fecharam com ganhos de 13,89% a R$ 68,20.

Isso porque a empresa divulgou nesta quarta-feira (22) seu resultado referente ao segundo trimestre de 2020 e surpreendeu positivamente os analistas. O lucro líquido da Weg foi de R$ 514,4 milhões nos últimos três meses, o que representa um crescimento de 16,9% sobre o primeiro trimestre do ano e de 32,2% em relação ao segundo trimestre do ano passado.

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Também na comparação anual, as vendas subiram 24%, totalizando R$ 4,06 bilhões, enquanto o lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) somou R$ 732,2 milhões, alta de 36%. A margem Ebitda (relação entre Ebitda e receita líquida) ficou em 18% entre abril e junho de 2020.

Os analistas do Bradesco BBI projetavam um lucro de R$ 368 milhões para os meses de abril, maio e junho de 2020, bem abaixo do resultado efetivamente realizado.

Segundo a equipe de análise da XP Investimentos, os dados financeiros da Weg foram impulsionados pela valorização de 37% do dólar frente o real, pela sólida performance no mercado doméstico e pelas aquisições feitas nos trimestres passados.

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Apesar disso, diversos analistas estão preocupados com a possibilidade dos papéis estarem sobreprecificados, e hoje as recomendações de venda já superam as de compra. O preço-alvo médio das ações é R$ 40,77, o que corresponde a uma desvalorização de 39,8% sobre a cotação atual.

Recomendações*
Forte compra 1
Compra 2
Neutra 6
Venda 4

*Informações da Reuters

Para entender as razões do sucesso da Weg na Bolsa e os temores dos especialistas, é preciso primeiro entender como funciona a companhia.

O que faz a Weg?

Fundada em 16 de setembro de 1961 em Jaraguá do Sul (SC) pelos empresários Werner Ricardo Voigt, Eggon João da Silva e Geraldo Werninghaus, a companhia surgiu com a missão de fabricar motores elétricos. Porém, a partir da década de 1980, passou a produzir também componentes eletrônicos, produtos para automação industrial, transformadores de força e distribuição, tintas líquidas e em pó e vernizes eletroisolantes.

Hoje, a empresa atua em ainda mais setores como geração de energia solar, motores de veículos com eficiência energética, eletrificação de carros, além de inversores e tinta para tubulações para saneamento.

Sara Delfim, sócia-fundadora da gestora Dahlia Capital, afirmou recentemente, em entrevista ao Coffee & Stocks, que poucas pessoas enxergam a Weg como uma companhia de tecnologia, mas atualmente a empresa possui operações em qualquer área de inovação disruptiva na indústria. “Os equipamentos da planta da Tesla na Califórnia têm Weg. Automação, sensores, digitalização? Tudo isso tem Weg. Energia renovável? Também”, explicou.

Dentro dos negócios da companhia, a principal divisão está entre equipamentos de ciclo curto e de ciclo longo, algo muito relevante para entender os números do segundo trimestre.

A Weg possui operações em 11 países além do Brasil. São eles Argentina, Colômbia, México, Estados Unidos, Áustria, Espanha, Portugal, Alemanha, China, Índia e África do Sul.

No cenário doméstico, a Weg não tem concorrentes diretos em todas as suas operações, por mais que compita pontualmente no setor de indústria de bens de capital com Randon (RAPT4), Iochpe-Maxion (MYPK3) e Mahle – Metal Leve (LEVE3).

Globalmente, por outro lado, a empresa enfrenta a competição de gigantes como a alemã Siemens, a suíça ABB e a francesa Schneider Electric.

Preparando-se para o futuro, a empresa fez recentemente quatro aquisições relevantes que, conforme apontou um relatório da Eleven Financial Research, acrescentam know how tecnológico ao negócio.

A compra da PPI Multitask foi feita para aumentar a experiência em integração de sistemas de automação para controle de máquinas e processos industriais, com software MES (Manufacturing Execution System) proprietário.

Enquanto isso, a aquisição da V2COM, empresa de telemedição, trouxe conhecimento em monitoramento e captura de dados e negócio de sistemas de armazenamento de energia por baterias.

Outra compra foi a da Mvisia, startup focada em aplicações de captura e processamento de informações a partir de vídeos e imagens para o controle de produtividade, segurança, quantidade e qualidade dos produtos.

Por fim, a Weg adquiriu também a BirminD, empresa que oferece soluções para o setor industrial de análise, otimização de malhas de controle e avaliação do retorno financeiro de serviços por meio de técnicas de machine learning e inteligência artificial.

O resultado do 2º tri

Para Catherine Kiselar, analista do BB Investimentos, o preço das ações WEGE3 está esticado para além do valor justo obtido pelo cálculo de fluxo de caixa descontado a partir dos fundamentos da companhia. Contudo, isso não significa que o papel irá necessariamente parar de subir.

“A empresa sempre se posiciona no presente para captar mudanças no futuro. A diretoria digital quer se envolver completamente na Indústria 4.0, e isso pode gerar frutos interessantes”, comenta.

Catherine atribui parte das altas recentes ao perfil defensivo da ação, que atrai compras em momentos de aversão a risco, como o que o mercado experimentou durante o crash do coronavírus.

Isso não significa que as operações da Weg não tenham sido afetadas pela crise, já que o setor industrial sofreu bastante no período com redução na demanda e fechamento de fábricas. A questão é que o investidor atribui à empresa maior resiliência e capacidade de performar bem em períodos de atividade econômica mais fraca.

Flávia Ozawa, analista da Eleven Financial Research, diz que a receita operacional da Weg tem sido muito consistente graças ao desempenho do mercado mundial. “Mais de 50% da receita da companhia vem dos negócios lá fora, então essa diversificação geográfica tem proporcionado uma certa estabilidade”, destaca.

A analista Bruna Pezzin, da XP Investimentos, comenta que no segundo trimestre as vendas internacionais responderam por 61% da receita total da Weg, registrando uma queda de 10% na base anual em dólares, algo que foi compensado pela apreciação de 37% do dólar frente ao real no período.

Os mercados mais afetados negativamente foram África, América do Sul e Central, ao passo que as receitas na Europa cresceram 6% em dólar.

Para a equipe de análise do Credit Suisse, a questão cambial trouxe um efeito positivo não recorrente de estoque que precisa ser levado em conta ao interpretar os dados econômico-financeiros da Weg.

Na discriminação por área de atuação, Flávia explica ainda que nunca enxergou um risco muito alto da pandemia para os negócios de ciclo longo da empresa, embora os equipamentos de ciclo curto tenham sido impactados pela paralisação de fábricas. Foi justamente isso que se viu no segundo trimestre.

Dentro do mercado interno da Weg a área de eletroeletrônicos industriais (que responde por 54,6% dos negócios da empresa) teve um crescimento de receita de 32,9% no segundo trimestre de 2020 sobre o mesmo período do ano passado.

Esta expansão deveu-se ao fornecimento de equipamentos de ciclo longo, em especial os motores de média tensão e painéis de automação destinados principalmente a projetos de papel e celulose e mineração.

Já os equipamentos de ciclo curto, como motores elétricos de baixa tensão, tiveram redução na entrada de pedidos. “Os efeitos da pandemia foram sentidos principalmente na demanda por equipamentos de ciclo curto, nas áreas de motores comerciais e appliance, tintas e vernizes e também em motores industriais, cuja retração de volumes foi similar no mercado brasileiro e no mercado externo”, escreveu a empresa no release de resultados.

Entretanto, de acordo com a administração da companhia, esse movimento de queda na demanda mostrou reversão gradativa no final do trimestre, quando os pedidos pelos equipamentos de ciclo curto voltaram a chegar.

O setor de maior destaque no trimestre, na avaliação da própria empresa, foi o de geração de energia (35,8% do faturamento), no qual a maior parte das receitas está ligada a máquinas de ciclo longo como transformadores e subestações entregues para projetos ligados aos leilões realizados nos últimos anos. Houve crescimento nas operações de transformadores principalmente nos Estados Unidos e no México.

Nesta área, o ponto negativo foi a queda no negócio de geração solar distribuída, que foi impactado no Brasil pelas restrições adotadas no combate ao coronavírus.

Em relatório assinado pelo analista Victor Mizusaki, o Bradesco BBI destaca que o ponto-chave dos resultados do segundo trimestre é que, para superar os efeitos deletérios da pandemia e encarar uma acentuada contração no faturamento, a Weg foi rápida em cortar horas de trabalho e salários, além de adiantar férias dos funcionários.

“De acordo com as nossas estimativas, essa decisão reduziu os custos com mão de obra para 14% da receita líquida, dos 16% praticados no primeiro trimestre de 2020 e no segundo trimestre de 2019”, ressalta Mizusaki.

Para o analista do Bradesco BBI, como o presidente Jair Bolsonaro sancionou a Medida Provisória 936, que estendeu as reduções de salários por mais 30 dias e as suspensões de contratos de trabalho por mais 60, as reduções no custo da mão de obra devem continuar a a manter as margens da Weg no terceiro trimestre deste ano.

Perspectivas

Falando sobre o futuro, Catherine Kiselar acredita que a Weg deve continuar performando bem graças a essa dupla diversificação – geográfica e por ramos de atuação –, que se soma ao perfil mais conservador de endividamento da empresa para garantir expectativas de avanço e previsibilidade.

“Se a Weg estivesse mais exposta a segmentos não essenciais da economia como o setor aéreo, ela teria sofrido mais na crise, mas ela está mais exposta a agronegócio e energia, ao contrário de uma Iochpe, que é totalmente focada no automotivo”, analisa. “A Weg tem aberto portas de diversificação de portfolio cada vez mais, e isso se reflete na visão que o mercado tem da empresa.”

Já o Bradesco BBI antevê que as aquisições da Mvisia e da BirminD, que oferecem soluções para a indústria 4.0, devem resultar em maior expansão do retorno sobre o capital investido (Roic) para o médio e longo prazo.

Victor Mizusaki defende ainda que a Weg pode se beneficiar da nova onda de investimentos em infraestrutura no pós-pandemia. “A Comissão Europeia aprovou a utilização de 91 bilhões de euros em investimentos para impulsionar a eficiência energética, outros 25 bilhões de euros em energias renováveis e mais 20 bilhões de euros para veículos elétricos e estações de recargas de automóveis no continente.”

Flávia Ozawa, da Eleven, enxerga ainda boas perspectivas para a empresa graças à aprovação no Congresso e sanção no governo do novo marco regulatório do saneamento, que facilita os investimentos da iniciativa privada no setor.

“A Weg já atua com motores, inversores e tinta para tubulação que vende para companhias como a Sabesp (SBSP3). Com o novo marco, a demanda da iniciativa privada por produtos da Weg deve aumentar.”

O grande ponto negativo para o investimento na ação, todavia, é o preço das ações. Catherine Kiselar ressalta que as sinergias obtidas pelas aquisições recentes já estão amplamente precificadas.

Victor Mizusaki, por sua vez, explica que manteve recomendação neutra para os papéis WEGE3 devido aos múltiplos extremamente esticados com que as ações operam. “Nossa recomendação neutra decorre principalmente do rico valuation contido em um múltiplo valor de mercado da empresa dividido pelo Ebitda de 38,2 vezes”, argumenta.

Não obstante a precificação nas alturas, nenhum dos analistas consultados é capaz de dizer com certeza que o rali das ações da Weg está terminado, uma vez que os sólidos resultados financeiros trimestrais, a perspectiva positiva para geração de energia e saneamento no cenário doméstico e os potenciais ganhos das inovações na indústria 4.0 sinalizam um futuro bastante promissor para a empresa.

Se a ação parece ter decolado sem freio, as iniciativas da empresa para se adequar a uma realidade de fortalecimento da alta tecnologia e benefícios a quem melhor sabe diversificar operações mostram que não há como ficar totalmente pessimista.

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Ricardo Bomfim

Repórter do InfoMoney, faz a cobertura do mercado de ações nacional e internacional, economia e investimentos.