Teremos sim que nos acostumar com dólar mais forte – mas BC tenta estabelecer limites para o mercado

Após forte alta do dólar com fala de Guedes, BC é testado e afirma: atuará para evitar disfuncionalidade, mas não reverterá movimentos de longo prazo

Lara Rizério

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SÃO PAULO – Corroborando as falas da semana passada de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, mas de um modo ainda mais assertivo, Paulo Guedes afirmou na noite da última segunda-feira (25) que o dólar acima de R$ 4,20 não preocupa.

“O dólar está alto. Qual o problema? Zero”, afirmou o ministro da Economia após participar em Washington do Fórum de Altos Executivos Brasil-EUA, para depois complementar: “É bom se acostumar com juros mais baixos por um bom tempo e com o câmbio mais alto por um bom tempo.”

Ao invés de gerar tranquilidade sobre o rumo do câmbio e os seus efeitos para a economia, este foi um grande gatilho para que o câmbio renovasse mais uma vez a máxima histórica intradiária em termos nominais, aproximando-se dos R$ 4,28.

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Guedes também gerou polêmica ao afirmar que não é possível se assustar com a ideia de alguém pedir o AI-5, o que gerou crítica de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados e um dos principais fiadores das reformas econômicas, mas foi a falta de preocupação com o atual patamar do dólar que mais influenciou o mercado.

Isso levou o Banco Central a atuar por duas vezes, através da venda de dólares à vista, com uma taxa de corte de R$ 4,2390. Antes disso, o BC já havia feito operação de venda à vista de dólares e de swap cambial reverso (equivalente à venda de dólar no mercado futuro).

Porém, apesar de ajudar o real a ganhar força, o alívio pós-leilões foi modesto, sendo mais sentido apenas na segunda intervenção do BC. Após chegar a subir mais de 1% na máxima do dia, o dólar comercial fechou em alta de 0,59%, a R$ 4,2398 na venda.

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Para Hideaki Iha, operador de câmbio da Fair Corretora, os investidores estão à espera do cronograma de atuações do BC no mercado para proporcionar liquidez no fim do ano.

Na sua avaliação, esse calendário, com leilões de swap (veja mais sobre as operações de swap clicando aqui), à vista e de linha (venda de dólares com compromisso de recompra), está atrasado, não promovendo a liquidez tão necessária ao mercado em um ambiente já tumultuado com as declarações de Guedes. “Enquanto o Banco Central não publicar esse programa que todo ano faz, a moeda americana vai continuar subindo, ainda que em marcha lenta”, avalia.

Enquanto isso não acontece, a atuação do Banco Central com os dois leilões à vista nesta terça-feira gerou certa confusão no mercado, uma vez que a autoridade monetária interveio quando havia sinalizado que a desvalorização do real não tem tido impacto sobre a inflação e que vem acompanhada pela melhora da percepção de risco por parte dos investidores. Uma atuação diferente só viria se houvesse piora nas expectativas para os preços, afirmou Campos Neto na terça-feira da semana passada (19).

Contudo, as declarações de Guedes da véspera parecem ter levado o dólar a um patamar que, aparentemente, gerou incômodo e fez o BC agir. Isso porque o repasse cambial para os preços existe, o que também pode levar a uma política monetária menos estimulativa e fez com que os investidores ajustassem posições.

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Porém, a falta de sinalizações mais claras do BC ao dizer em um dia que não há problema do dólar mais alto e, no dia seguinte, intervir, foi vista negativamente pelos investidores.

Os vários motivos para o dólar subir

Hideaki Iha corrobora outras análises de que o dólar está sim em um novo patamar com os juros mais baixos (que atraem menos capital estrangeiro para o Brasil em busca de diferencial de taxas e, consequentemente, menos dólares para cá). Ao mesmo tempo, a economia anda a passos bem lentos, o que ainda não atrai o capital produtivo dos estrangeiros por aqui.

Outros motivos levam ao dólar mais forte: i) cenário ainda incerto para os países desenvolvidos com baixo crescimento e as idas e vindas das negociações comerciais entre EUA-China, ii) a turbulência em diversos países da América Latina que acabam contaminando o Brasil, iii) a demora na agenda de reformas pós-Previdência e iv) o fato de não ter havido o fluxo esperado de estrangeiros no leilão da cessão onerosa.

Além disso, conforme aponta a equipe da Levante Ideias de Investimento, na segunda-feira, a moeda americana já havia se desvalorizado com a notícia de um déficit de US$ 7,8 bilhões no saldo de transações correntes de outubro, no pior resultado para este mês desde 2014, e superou até mesmo a expectativa mais pessimista entre os analistas de mercado, que previam um déficit de 6,1 bilhões.

O governo também anunciou dados parciais da balança comercial para novembro, que caminha para fechar no vermelho, o que não acontece desde novembro de 2014.

Enquanto isso, a queda forte e sustentável dos juros por aqui, além de reduzir a entrada de capital especulativo, também estimula as empresas a quitar suas dívidas em dólar e a captar recursos em reais, para evitar os riscos de mudanças no câmbio e cortar os custos dos mecanismos de hedge.

“Tudo isso são movimentos naturais da economia, mas eles atuam na mesma direção, de reduzir a oferta de dólar na praça”, afirmam os analistas.

Dólar alto, mas tão alto assim?

Assim, a tendência é de um real realmente mais fraco, mas o patamar atual é de equilíbrio? De acordo com o diretor da Wagner Investimentos, José Faria Jr., o intervalo de oscilação mais provável é entre R$ 4,10 e R$ 4,30, “ou talvez um pouco mais”.

Segundo ele, para o dólar de fato ficar fraco, deveria ser negociado abaixo de R$ 3,90, mas não há motivos neste momento para acreditar na reversão da tendência de alta.

Assim, só com a reversão da valorização da moeda americana em relação às moedas emergentes e a volta de entrada de dólares aqui, com o consequente desarme da posição dos estrangeiros na B3, é que teremos o real mais forte.

Já para Iha, o patamar de equilíbrio deve ser entre R$ 4,10 e R$ 4,20, com a tendência se estendendo para o ano que vem: “O câmbio em 2020 também vai depender muito do ambiente externo, com eleições nos Estados Unidos, enquanto o Brasil também vai ser impactado pelo início do novo governo na Argentina”, apontou, destacando que o próximo ano “também não será fácil”.

Neste cenário, grandes bancos, como o suíço UBS, estão revendo as suas projeções para a moeda brasileira. “De muitas maneiras, o real está sofrendo efeitos negativos de taxas de juros mais baixas e não os benefícios de uma economia com maior crescimento, algo que esperamos para 2020. Apesar disso, as pressões de curto prazo apontam para um equilíbrio instável e, portanto, vemos um risco para revisar a previsão do dólar até o final de 2019 para acima de R$ 4, enquanto reafirmamos a nossa previsão de dólar a R$ 3,95 ao final de 2020”, apontam.

Roberto Campos Neto e Paulo Guedes
(Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Num horizonte ainda mais curto de tempo, o Banco Central, após ser criticado sobre a sua atuação, veio a campo em busca de uma melhor comunicação com o mercado.

Após o anúncio de leilões simultâneos na próxima quarta-feira de 15.700 swaps reversos e US$ 785 milhões em dólar à vista, Campos Neto veio a público afirmar que a autoridade monetária tem atuado quando o movimento está fora do normal (o que aconteceu hoje, com a moeda brasileira se descolando das outras moedas emergentes).

Contudo, as intervenções não vão reverter os movimentos de longo prazo. Assim, sinalizou, o BC vai atuar sempre que necessário, como fez duas vezes hoje – mas não atuará de forma a reverter a tendência do câmbio, e sim de reduzir a volatilidade. Teremos que nos habituar, como disse Guedes, a termos dólar mais forte.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.