Temporada de resultados dos EUA deve ser marcada por “recessão” nos lucros e projeções mais fracas

Balanços vão testar otimismo do investidor após rali nas Bolsas americanas em 2023

Mitchel Diniz

(Getty Images)

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As expectativas para a temporada de resultados trimestrais das companhias dos Estados Unidos não são das melhores. As previsões para os números pioraram desde o começo do ano. De acordo com as últimas projeções, compiladas pela FactSet, os analistas estimam que o lucro por ação das empresas do S&P 500 sofra uma queda de 6,8%.

Se confirmada, essa será a maior retração em uma temporada de balanços desde o segundo trimestre de 2020, período em que a Organização Mundial de Saúde (OMS) decretou estado de pandemia da Covid-19.

Além disso, seria o segundo trimestre consecutivo de retração nos lucros dessas empresas, colocando as empresas do S&P 500 em uma espécie de “recessão técnica”.

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“As recessões nos balanços, historicamente, nem sempre se traduziram em uma desaceleração da economia, mas esperamos que os fatores que levaram à degradação dos lucros – inflação e a reação do Federal Reserve ao aumento de preços – deve levar, de fato, a uma contração econômica”, diz relatório da Nuveen, gestora de ativos americana, assinado por Saira Malik, diretora de investimentos.

As perspectivas de receitas do primeiro trimestre também diminuíram do começo do ano para cá. No último dia 31 de dezembro, o mercado projetava uma alta de 3,4% no faturamento das companhias. Nas projeções mais recentes, a alta foi reduzida para 1,8%.

A margem líquida do S&P 500 nessa temporada deve ficar em 11,2%. O percentual é um pouco menor que os 11,3% do quarto trimestre de 2022 e do que a média dos últimos cinco anos, de 11,4%.

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“Apesar de ainda vermos dados de uma economia resiliente, os custos ainda elevados e arrefecimento na demanda já devem ser observados nos resultados das empresas”, afirma Gabriela Joubert, analista-chefe do Inter.

Recessão deve ser o termo mais presente nos discursos dos administradores durante as teleconferências dos resultados. E há bastante expectativa sobre atualização de projeções. Muitas empresas reduziram seus guidances na temporada de balanços do quarto trimestre de 2022 e podem fazê-lo novamente nesta temporada.

O Credit Suisse, por sua vez, acredita que os números do primeiro trimestre ainda podem surpreender positivamente. Isso porque muitas das empresas que soltaram balanços mais cedo apresentaram números que superaram as expectativas dos analistas.

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“No geral temos verificado números medíocres, corroídos pela piora no ambiente de financiamento”, diz Lucas Schwarz, analista da VG Research.

“Entretanto, o medíocre pode ser positivo: em uma conjuntura e um cenário marcado por expectativas de resultados ruins, basta um resultado mediano ou um pouco acima das expectativas para satisfazer o mercado”, complemente.

Schwarz ressalta que, apesar da piora nas projeções dos resultados, o ano tem sido marcado por forte alta nos principais índices acionários dos Estados Unidos. Até o fechamento de ontem (13), o S&P 500 acumulava alta de 8,42% em 2023. A Nasdaq, 17,13%.

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Nada de céu de brigadeiro para as big techs

William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue, observa que a arrancada dos índices está centrada nas grandes empresas de tecnologia. No entanto, ele acredita que as big techs não devem trazer resultados “tão bonitos”.

“Não vejo céu de brigadeiro para essas companhias”, afirma. “Elas devem continuar crescendo, mas em menor intensidade, o que não costuma ser bem visto”.

Castro Alves afirma que as big techs ganharam o investidor no trimestre passado ao ampliar o foco em lucratividade e retorno ao acionista. Medidas que incluíram uma leva de demissões. “Acredito que depois dessa alta toda [no ano], vai haver um ajuste de expectativa em relação a elas”, diz o estrategista.

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Até o fechamento de ontem, as ações da Apple acumulavam alta de 32,37% no ano; os papéis da Meta, dona do Facebook, haviam subido 76,65%; a Alphabet acumulava valorização de 20,55%; e as ações da Microsoft já haviam subido 20,98% no ano.

“Os resultados para o 1T23 serão decisivos para determinar se o movimento é razoável”, afirma Schwarz, da VG Research.

No quarto trimestre do ano passado, 85% das empresas de tecnologia do S&P 500 superaram as estimativas de lucro do mercado e 56% em termos de receita. Nesta temporada, porém, o setor deve apresentar uma queda de 15% nos lucros, a maior baixa entre os 11 subgrupos do índice, de acordo com a FactSet. Caso isso ocorra, será a maior retração em mais de uma década.

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A Microsoft vem chamando a atenção pelo seu protagonismo na corrida da inteligência artificial (IA), com investimentos bilionários na OpenAI, criadora do ChatGPT. No último trimestre, a empresa fundada por Bill Gates fez barulho no mercado ao anunciar que estava trazendo a funcionalidade do chatbot ao seu buscador, o Bing. Na sequência, o Google lançou o Bard, seu próprio serviço de IA.

Os investimentos nesse tipo de tecnologia, por enquanto, entram apenas na linha de despesas das big techs e ainda não geram receita. No entanto, devem trazer bons resultados para a Nvidia, fabricante de componentes para computadores e que já vinha direcionando seu negócio na fabricação de chips para inteligência artificial. Em 2023, as ações da empresa já subiram mais de 84%.

Amazon puxa previsões de consumo

Apesar de ser considerada uma big tech, a Amazon entra no grupo de empresas de consumo discricionário do S&P 500, pela classificação da FactSet. O segmento, que também inclui empresas de viagem e entretenimento – setores beneficiados pela reabertura da economia – deve apresentar o maior crescimento de lucro entre os subgrupos do índice na comparação anual, com alta de 34%.

Espera-se que a Amazon seja a empresa que mais vai contribuir com esse crescimento ano a ano. Tirando a companhia do cálculo, a previsão de alta nos lucros do segmento discricionário cai de 34% para 3,7%. No acumulado de 2023, as ações da Amazon acumulam alta de 19,32%.

Na comparação com o quarto trimestre de 2022, contudo, o grupo de consumo discricionário deve sofrer uma queda de 8,6% nos lucros, de acordo com as previsões mais recentes.

Para William Castro Alves, da Avenue, o consumo básico tende a sofrer menos. Empresas como Wall Mart e CVS devem ter crescimento de receita abaixo da inflação, mas não uma contração.

Algum alívio para a indústria

O setor industrial do S&P 500, com 73 empresas, que incluem fabricantes de aviões e companhias aéreas, não escapou da piora nas revisões para a temporada de balanços. Os analistas preveem uma queda nos lucros do grupo, de 8,8% na comparação com quarto trimestre de 2022.

Em bases anuais, a projeção é de alta de 12,6%, conforme as últimas projeções (em 31 de dezembro, estimava-se alta anual de 23,5% nos lucros dessas companhias).

Gabriela Joubert, do Inter, acredita que o grupo pode surpreender positivamente.

“Após um longo período pressionada pela crise na cadeia de suprimentos, a indústria deve se beneficiar de custos mais baixos, conforme a abertura da China retoma produção e alivia escassez, elevando margens, mesmo com demanda ainda fraca”, afirma.

Ganhos menores no setor de energia

Para Gabriela, as empresas de energia, em especial do segmento de óleo e gás, devem trazer mais um trimestre forte, com demanda ainda resiliente e preços elevados de petróleo.

Mas os analistas, de maneira geral, pontuam que o grupo já não é mais o carro-chefe em termos de contribuição de lucros para o S&P 500, como visto em trimestres recentes.

Agora, o setor enfrenta uma base de comparação mais difícil. No primeiro trimestre de 2022, as empresas de energia da Bolsa americana somaram quase US$ 200 bilhões em lucros, um recorde.

“Os lucros tendem a ser elevados, mas não na mesma magnitude que a gente observou um ano antes”, afirma Castro Alves. O compilado da FactSet aponta para uma alta de 9,2% nos lucros, na comparação anual. Contudo, na comparação com o quarto trimestre de 2022, é esperado uma queda de 9,5%.

Mitchel Diniz

Repórter de Mercados