Tempestade perfeita? Petrobras passa bem por crise sem precedentes do 2º tri e reforça otimismo com ações

Analistas apontam que companhia conseguiu passar pela crise dupla no setor de petróleo com relativa tranquilidade - e veem bons catalisadores para os ativos

Lara Rizério

Petrobras (Foto: Mario Tama/Getty Images)

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SÃO PAULO – “O segundo trimestre de 2020 não foi um trimestre comum para as empresas do setor de petróleo no mundo todo. A indústria de petróleo e gás navegou em águas muitas agitadas em meio a uma crise sem precedentes. No entanto, a Petrobras fez isso com relativa tranquilidade”.

Com essas palavras, o Credit Suisse definiu o resultado do período para a Petrobras (PETR3;PETR4), em que a companhia registrou um prejuízo líquido de R$ 2,713 bilhões no segundo trimestre de 2020. No período, as petroleiras passaram por uma dupla crise – do coronavírus e também com a guerra de preços da commodity, desencadeada por Arábia Saudita e Rússia, que teve início em março, mas que também teve efeitos nas cotações nos meses seguintes. Com isso, o preço médio do contrato brent (referência para a estatal) teve uma queda de 42% no trimestre, a US$ 29 o barril (sendo que alguns contratos chegaram a operar no negativo na segunda quinzena em abril).

Os números foram fracos: à primeira vista, gerou maior frustração no mercado a receita de vendas da estatal, que caiu 29,9% na comparação anual, para R$ 50,898 bilhões, ante estimativa do consenso Bloomberg de R$ 56,32 bilhões. O dólar mais alto não foi suficiente para reverter os estragos, apesar de ajudar no desempenho das exportações.

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Contudo, mesmo com essas linhas do balanço negativas – com o prejuízo negativo sendo seguido de um resultado negativo recorde de R$ 48,523 bilhões registrado nos três primeiros meses deste ano – os pontos positivos para a estatal foram muitos, apontam os analistas, em visão também compartilhada por outros grandes bancos, que também apontaram que o pior já passou.

Vale destacar que a empresa conseguiu reduzir o prejuízo principalmente “devido à ausência de impairments no trimestre e ao ganho proveniente da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS após decisão judicial favorável, que teve um efeito de R$ 10,9 bilhões no resultado”, conformou destacou no relatório de divulgação do balanço.

Porém, esse não foi o principal destaque. Conforme apontam os analistas do Credit e do Morgan Stanley, a geração de fluxo de caixa positivo de US$ 1 bilhão foi um verdadeiro feito no trimestre mais difícil para a indústria em décadas.

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Segundo destaca o Morgan, o US$ 1 bilhão em fluxo de caixa livre positivo excedeu em muito a estimativa do banco, que era de US$ 78 milhões, sendo resultado principalmente da rápida resposta da administração à crise, com maior controle de custos e despesas e disciplina na alocação de capital.

A dívida líquida caiu US$ 2 bilhões, por sua vez, na comparação trimestral, “uma façanha memorável
em tempos difíceis, quando muitas outras empresas petrolíferas respeitáveis ​​foram vítimas da desaceleração do mercado desencadeada pela pandemia de Covid-19”, aponta o Credit.

Daniel Gasparete, Eduardo Costa e Vanessa Quiroga, analistas do Credit, também ressaltam que o lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) de US$ 3,4 bilhões foi em linha com as previsões. Contudo, quando ajustado pelas perdas não-recorrentes em hedges de US$ 476 milhões, o Ebitda recorrente, na verdade, superou em 14% as estimativas do banco suíço.

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Já o Ebitda não-ajustado foi superior a US$ 4,8 bilhões, auxiliado pela recuperação de PIS/Cofins. “Esse crédito tributário foi reconhecido no ativo circulante e, em nossa visão, será traduzido em vantagem para o fluxo de caixa nos próximos trimestres. O prejuízo líquido também foi menor do que a estimativa do Credit, que era de R$ 23 bilhões”, apontam os analistas.

Um outro ponto destacado como muito positivo foi a queda substancial nos custos de extração do petróleo, que caiu de US$ 7,50 o barril no primeiro trimestre para US$ 6,60 no segundo trimestre, provavelmente pela maior participação do pré-sal na produção total, real mais depreciado e maior economia de custos.  Naturalmente, o benefício dos custos de extração acabou sendo ofuscado no trimestre pelo preço de realização anormalmente fraco.

“O pré-sal continua sendo o motor da competitividade da Petrobras, com custo de US$ 2,40 por barril de óleo equivalente (ex-leasing)”, apontam os analistas do Morgan Stanley. Além disso, vale ressaltar que os custos de extração nos campos de águas rasas tiveram baixa de 41% para US$ 15,90 o barril, como resultado da decisão de hibernar as unidades de alto custo durante a crise.

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Assim, apontam, a Petrobras mais enxuta, focada no pré-sal e com venda ou fechamento das unidades de alto custo contribuem para um maior potencial de geração de fluxo de caixa.

Já com relação à receita de vendas, a queda foi muito expressiva, mas a estatal registrou um maior controle de suas perdas também por conta do crescimento de embarques para a China, destino de 87% das exportações totais da companhia no trimestre frente a 48% no trimestre anterior. Além de estar em um momento diferente da pandemia, a petroleira também destacou que esse movimento “evidencia a nossa forte relação comercial com o país”, disse a petroleira.

Já nos derivados, Singapura foi o principal comprador da petroleira e respondeu por 49% das exportações no trimestre, contra 53% no primeiro trimestre. O segundo principal comprador foram os Estados Unidos, com 35% (31% no primeiro). As exportações de petróleo, derivados e outros atingiram R$ 14,973 bilhões no segundo trimestre, queda de 3% no ano e de 39,4% na comparação trimestral.

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Otimismo no radar

Em meio a esse cenário, os analistas do Credit destacam que o valuation das ações da Petrobras segue bastante atrativo e permanecem bastante positivos com o case de investimento.

O Bradesco BBI também viu como positivo o resultado dadas as condições do momento – ressaltando que nenhum investidor esperava que as petroleiras registrariam um bom resultado em meio a condições extremamente desafiadoras – e espera um fluxo positivo de notícias para a companhia nos segundo semestre. “Considerando o constante crescimento da produção da Petrobras, o petróleo de alta qualidade e as exportações sólidas, o Ebitda da empresa deve contrair muito menos na comparação anual em relação aos pares da América Latina”, avaliou, em relatório.

Entre os potenciais destaques positivos no restante do ano, estão: (1) o possível levantamento de liminar contra as vendas das refinarias (o que permitiria vendas de duas refinarias ainda este ano); (2) venda contínua de outros ativos importantes, como oleodutos, campos offshore e ações restantes da BR Distribuidora; e (3) continuação dos excelentes resultados na produção e nas exportações, excluindo o quarto trimestre, quando a empresa concentrará a maior parte de suas paradas programadas. A companhia informou que vai paralisar oito plataformas por 15 dias no segundo semestre.

Sobre desinvestimentos, em teleconferência com investidores, Roberto Castello Branco, CEO da Petrobras, destacou que espera assinar o contrato de venda da refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, em um ou dois meses.

A companhia ainda informou que planeja atingir sua meta de produção este ano, apesar do impacto do Covid-19. Ela destacou que está otimista em cumprir as metas de redução da dívida e buscando uma posição de caixa de US$ 3 bilhões.

“Aproximadamente US$ 1 bilhão foram levantados este ano com a venda de ativos e empresa está otimista ao concluir a primeira venda de refinaria nos próximos meses”, disse o CEO.

“A Petrobras demonstrou em números que está executando bem as diretrizes estabelecidas na sua estratégia para o quadriênio 2020-2024. Mesmo que não consiga alcançar todas as metas devido à pandemia e o cenário para o petróleo daqui para a frente, os recentes esforços demonstraram que ela conseguiu atravessar o cenário de stress de maneira bastante satisfatória, com melhorias estruturais que irão refletir positivamente no longo prazo”, aponta a Levante Ideias de Investimentos, que ressalta que a companhia está colocando em prática o seu compromisso de aumentar o retorno sobre o capital investido.

Esse cenário reforça a visão positiva dos analistas: de acordo com compilação de recomendações feita pela Bloomberg, de 13 casas de análise que cobrem o papel PETR4, 11 recomendam compra e apenas 2 apresentam recomendação neutra. O Bradesco BBI tem preço-alvo de R$ 36 (potencial de valorização de 58%), enquanto o Itaú BBA possui target de R$ 29 (upside de 27%) para os ativos preferenciais.

Na sessão desta sexta-feira (31) pós-resultado, as ações PETR3 chegaram a subir 1,97%, a R$ 23,78, enquanto os ativos PETR4 tiveram alta de 1,40%, a R$ 23,14, mas logo perderam força e passaram a registrar queda de cerca de 1%.

Entre os motivos, vale destacar, o petróleo também diminuiu fortemente os ganhos durante o dia, com os investidores ainda temerosos sobre o ritmo de recuperação econômica em meio aos dados fracos do PIB dos EUA (baixa de 32,9% em termos anualizados no segundo trimestre) e com temores de uma segunda onda de coronavírus em muitos países (principalmente do mundo desenvolvido) que conseguiram conter as infecções e reabriram, ainda que parcialmente, as suas economias.

Assim, as perspectivas são positivas para a companhia mas, no curto prazo, o noticiário sobre coronavírus (e o impacto nos preços das commodities) seguirá mexendo com as ações. A companhia mostrou ter conseguido lidar bem com a crise, mesmo que tenha saído machucada.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.