Santander (SANB11) não revela provisionamento para Americanas (AMER3), mas diz que operações de risco sacado vão continuar

Analistas calculam que banco pode já ter provisionado algo em torno de R$ 1 bilhão sobre sua exposição à varejista

Mitchel Diniz

(Shutterstock)

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A teleconferência sobre os últimos resultados do Santander Brasil (SANB11) mostrou o quanto os analistas estão ansiosos em saber sobre o impacto do caso Americanas (AMER3) nos números do banco. Mas trouxe pouco ou quase nenhum esclarecimento sobre o caso. O Santander sequer confirmou a exposição do banco ao endividamento da varejista, estimado em R$ 3,7 bilhões, de acordo com a lista de credores que a Americanas entregou à Justiça.

Questionamentos sobre o caso foram trazidos assim que a sessão de perguntas e respostas começou. Um analista fez um resumo do que o mercado está ávido por saber: perguntou sobre o percentual que já foi provisionado no quarto trimestre e como as próximas provisões vão ocorrer. Mas as dúvidas não foram sanadas.

“Não vamos comentar nenhum caso particular desse evento”, afirmou Mario Leão, CEO do banco. Ele justificou a resposta dizendo que o grupo Santander, como um todo, não comenta nomes específicos, mesmo reconhecendo a relevância do assunto. Tanto é que durante toda a teleconferência o caso foi tratado como “um evento subsequente”.

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“Já tomamos providências sobre esse provisionamento. Assim como qualquer outra provisão que fazemos em atacado e varejo, sempre olhamos a carteira como filme e não um quadro estático”, afirmou Leão. O CEO disse ainda que o banco vai fazer novas provisões relacionadas ao caso de acordo com o seu desenrolar. “Não há ainda uma decisão de como vamos prosseguir”.

Confira o calendário de resultados do 4º trimestre de 2022 da Bolsa brasileira

Ainda que não tenha detalhado o impacto do caso Americanas no balanço do Santander, Leão falou sobre como o banco deve lidar daqui para frente com as operações de risco sacado, na qual a instituição financeira antecipa os pagamentos a fornecedores de uma empresa. Esse tipo de operação é apontado como principal vetor do problema contábil das Americanas e alguns analistas chegaram a questionar o futuro dessa modalidade.

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Porém, o CEO do Santander afirmou que os empréstimos via risco sacado não só vão continuar, como serão ampliados. “Risco sacado é nosso principal negócio em clientes de atacado”, explicou Mario Leão. Segundo o CEO, esse é um produto que vem evoluindo nos últimos anos e o banco continua mantendo uma relação saudável com vários fornecedores empresas âncoras.

Ele destacou o lançamento da plataforma SX, de antecipação de recebíveis. “Acreditamos no negócio e o estamos ampliando”, afirmou.

Por outro lado, os executivos do Santander disseram que o banco vai continuar sendo conservador na concessão de crédito. Essa postura, iniciada em 2021, tem afetado o avanço das margens financeiras do banco. Ainda assim, não tem impedido que provisões e a inadimplência continuem crescimento.

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Angel Santodomingo, CFO do Santander Brasil, admite que a originação e mix de crédito foram afetados por medidas mais seletivas. Mas que o banco conseguiu ampliar a carteira de crédito mantendo riscos sob controle. 65% da carteira de crédito para pessoa física do banco, atualmente, é colateralizada.

Mario Leão afirma que a visão e o apetite do banco ainda não mudaram e que a parte mais dura do ciclo de crédito começa este ano. “Cresceremos nossa base de clientes  este ano, mas ainda mais importante que isso é fazer esses clientes serem mais ativos”, afirmou. Leão reafirmou a obsessão do Santander Brasil em reduzir custos de serviços, única estratégia possível, segundo ele, para manter abrangência de mercado de forma rentável.

Resultado do Santander no 4T22 veio pior que o esperado

O Santander Brasil reportou lucro líquido gerencial de R$ 1,689 bilhão no quarto trimestre de 2022 (4T22), cifra 46% menor do que o reportado no terceiro trimestre de 2022 e uma queda de 56% na comparação com o mesmo período de 2021. O número ficou 41,04% abaixo do consenso Refinitiv, que previa lucro líquido reportado de R$ 2,864 bilhões.

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O lucro líquido foi de R$ 12,9 bilhões em 2022 com queda de 21,0% se comparado com o mesmo período do ano anterior. O ano foi marcado pelo aumento das provisões em 72,7%, diante da maior inadimplência de clientes pessoas físicas. Além disso, as margens do Santander foram pressionadas por perdas da tesouraria, diante do impacto negativo da alta dos juros sobre a carteira de títulos do banco.

A margem financeira bruta alcançou R$ 12, 517 bilhões no quarto trimestre de 2022, com queda de -0,6% em relação ao 3T22 refletindo principalmente o menor resultado com clientes no período que apresentou queda de -2,6%.

O retorno sobre o patrimônio líquido (ROE, na sigla em inglês) foi de 8,35% no 4T22, uma queda de 7,3 pontos percentuais no trimestre. Em 2022, o índice ficou em 16,3%, 4,9 pontos percentuais abaixo em relação a 2021.

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As despesas líquidas com provisões para devedores duvidosos (PDD) ficaram em R$ 7,364 bilhões, 18,6% acima ante o trimestre anterior e 99,4% em relação ao quarto trimestre de 2021. Ao mencionar provisões, o banco não citou diretamente o caso Americanas, mas destacou um “evento subsequente” no crédito de atacado que afetou essa linha do resultado, sem mencionar o valor provisionado.

A carteira de crédito atingiu R$ 489,687 bilhões no dia 31 de dezembro de 2022, representando crescimento de 5,8% se comparado com o mesmo período do ano anterior.

A carteira de pessoas físicas, por sua vez, cresceu 8% (principalmente por Consignado, Imobiliário e Crédito Pessoal) e Pequenas e Médias Empresas subiu 7,2%. No trimestre, a carteira cresceu 1,1% com destaque para Pessoas Físicas, influenciada principalmente por movimentos sazonais de final de ano – com destaque para as linhas de Cartão de Crédito e crédito consignado por efeito principalmente do aumento da margem de consignado.

Números tiveram repercussão negativa

“Na nossa visão, o Santander apresentou resultados fracos no 4T22, sendo fortemente impactado pelo provisionamento da dívida da Americanas, que prejudicou os resultados do banco”, apontam em relatório Renan Manda e Matheus Guimarães, analistas da XP.

Os analistas apontam que, por um lado, a abordagem mais seletiva do banco na concessão de crédito ao longo de 2022 resultou em um crescimento mais lento de sua carteira de crédito (alta de 5,8% na base anual), pressionando sua margem financeira bruta (NII) no 4T22 para R$ 12,5 bilhões (queda trimestral de 0,6%). Por outro lado, essa abordagem cautelosa permitiu ao banco manter sob controle suas taxas de inadimplência, com a inadimplência aumentando ligeiramente para níveis ainda saudáveis em ​​3,1%.

O Itaú BBA avaliou que os resultados foram fracos no 4T22, mas destacou que o lucro ficou em linha com suas estimativas. Os analistas destacaram que uma leitura para outros bancos conecta principalmente o Bradesco (BBDC4), que deve apresentar desafios semelhantes, enquanto espera-se que o Banco do Brasil (BBAS3) apresente um conjunto de resultados totalmente diferente devido à diferente qualidade de crédito e dinâmica da margem de lucro.

O Credit Suisse, por sua vez, destaca que o lucro ficou 27% abaixo do esperado pela casa, estimando uma provisão de R$ 1,1 bilhão por Americanas, mas com destaque negativo principalmente para o NIM (Net Interest Margin, ou margem líquida de juros) abaixo do esperado.

O Morgan Stanley também destaca o NIM decepcionante, com queda trimestral de 1%; “a gestão da companhia apontou que a mudança de mix para empréstimos de menor risco é parcialmente culpada”, apontou o banco.

O banco americano também avalia que a empresa adicionou R$ 1 bilhão em provisões para perdas com empréstimos no trimestre, mas aponta ser difícil entender qual é a exposição real, o quanto está provisionado e até que ponto esse aumento das provisões ajuda a cobrir a exposição total.

“O salto nas provisões de fato parece ser impulsionado pela Americanas, já que o restante dos números de inadimplência parece bom: o índice de inadimplência foi de 3,1%, contra 3,0% no 3T22 e o índice de inadimplência do consumidor ficou estável em 4,3%. Os empréstimos renegociados tiveram o menor aumento trimestral dos últimos 12 meses”, avalia.

O Citi também fez suas estimativas para o “impacto Americanas” na instituição financeira e aponta que, mesmo sem ele, o ROE do Santander seria ainda um fraco 11%. Apesar dos números a princípio controlados de inadimplência, os analistas da casa destacam ser preciso ter atenção quanto ao “NPL formation” (a variação do saldo de créditos em atraso), que foi de 4,3% no terceiro trimestre para 5,6% no quarto trimestre, incluindo um portfólio vendido de R$ 600 milhões. Isso indica deterioração na qualidade dos resultados, em um ritmo mais rápido.

O Bradesco BBI acredita que o NPL do Santander foi novamente distorcido por um volume significativo de renegociações e uma venda de portfólio ativo no valor de R$ 1,4 bilhão. A casa avalia que o resultado trouxe tendências negativas, com margens financeiras pressionadas por uma abordagem mais conservadora do banco.

“Ainda que as provisões tenham tido um incremento sólido, acreditamos que as provisões adicionais no atacado poderiam ser maiores, dada a exposição de crédito do banco ao caso”, escreveram os analistas do BBI, citando Americanas.

Mitchel Diniz

Repórter de Mercados