Rossi (RSDI3): Da inovação do Plano 100 à recuperação judicial, o que aconteceu com a construtora?

Construtora, na década de 90, inovou setor imobiliário para a classe media, mas exposição foi também parte de sua derrocada

Vitor Azevedo

São Paulo mostrou a desaceleração mais forte na leitura do IPC-S (Paulo Fridman/Corbis via Getty Images)

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A Rossi Residencial (RSID3) anunciou, na noite desta segunda-feira (19), que ajuizou um pedido de recuperação judicial na 1ª Vara de Falências e Recuperações da comarca da capital do Estado de São Paulo.

A criadora do Plano 100, que revolucionou o financiamento imobiliário para a classe média e que já foi uma das maiores do Brasil, agora luta para escapar da falência.

Na bolsa, a repercussão da notícia levou os seus papéis a baterem quase 20% de queda, mas as perdas foram minimizadas ao longo da tarde e suas ações fecharam com queda de pouco menos de 10%.

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Revolução do Plano 100

Com um mercado praticamente parado, no início da década de 90, a Rossi inovou ao lançar o financiamento direto para os seus clientes. Sua campanha de marketing intitulada “Plano 100” foi um sucesso.

Para se ter uma ideia, em 1992, a Rossi foi responsável por cerca de 50% dos lançamentos imobiliários da cidade de São Paulo.

A modalidade consistia na divisão do pagamento das unidades em uma centena de parcelas, com a empresa alocando seus recursos de acordo com o fluxo das prestações.

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Essa foi a alternativa encontrada na época para driblar as dificuldades de venda de imóveis para a classe média.

“O Plano 100 foi uma grande revolução do mercado. Na década de noventa, era muito difícil alcançar o financiamento imobiliário. A taxa de juros era cara e havia o risco do imóvel, uma vez que não existia ainda a Lei de Alienação Fiduciária”, contextualiza Henrique Alves, superintendente de incorporação da QGDI. “Antes disso, no caso de inadimplência dos clientes, as construtoras tinham dificuldade em conseguir os imóveis vendidos de volta”.

Modelo da Rossi copiado

A Rossi, segundo Alves, inovou ao criar um modelo de tabelas diretas, que foi, posteriormente, copiado por boa parte do setor.

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O Plano 100 consistia de oito parcelas de entrada, trinta parcelas mensais, doze na hora da entrega das chaves e o restante pago em parcelas após a entrega. Com isso, a construtora garantia o valor necessário para bancar os seus projetos, sem o risco de grandes prejuízos.

“Antes disso, ou a pessoa buscava um financiamento imobiliário muito caro, e de difícil acesso, ou a pessoa tinha de pagar todas as parcelas antes da entrega das chaves. Isso gerava muito problema de atraso e descontentamento”, contextualiza Alves.

A construtora, com seu modelo de negócio, conseguiu iniciar uma expansão nacional, indo para regiões como o Nordeste, Centro Oeste e Sul. Depois, foi para o interior de São Paulo, com destaque para as regiões de Campinas e Sumaré.

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Assim, a Rossi iniciou na década de 90 um caminho que as construtoras só começaram a trilhar após 2006, após suas respectivas aberturas de capital.

“Com seu modelo de negócio, ela se tornou, se não a maior, uma das maiores incorporadoras brasileiras”, diz o especialista.

Classe media foi parte do problema da Rossi

Se o financiamento para a classe média foi o diferencial da Rossi no passado, ele foi também, em grande parte, o motivo da derrocada da construtora.

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Isso porque a classe média é a mais afetada em momentos de crise, já que acaba tendo um orçamento mais comprometido, seja por conta da inflação ou pelo risco de perda do emprego.

“Quem trabalha com essa classe, e era o grande setor em que a Rossi atuava, acaba sofrendo mais, pois eles são os mais suscetíveis aos distratos (entrega do imóvel adquirido)”, explica Alves.

Excluída de programas governamentais, as pessoas que compõem essa camada da sociedade acabam sendo mais expostas às oscilações do cenário macroeconômico.

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Do outro lado, no programa Casa Verde Amarela (antigo Minha Casa Minha Vida), voltado às classes mais baixas, o problema é menor, pois o financiamento é subsidiado pelo governo e as taxas, fixas.

“A classe média paga o juros cheio do mercado, enquanto a baixa tem acesso a subsídios. A classe alta, por sua vez, não precisa de financiamento bancário, pagando com recursos próprios”, detalha o superintendente da QGDI.

Caminho da recuperação judicial

Os problemas financeiros da construtora se agravam a partir da crise de 2015 – sendo que a companhia iniciou seu processo de equacionamento econômico-financeiro, que resultou na recuperação judicial, no final de 2017.

Em meio à isso, os distratos do setor dispararam.

Ademais, o próprio modelo de negócios que impulsionou a Rossi, o Plano 100, já tinha ficado obsoleto, quando os empréstimos bancários ganharam força.

“Quando houve o advento da Lei de Alienação Fiduciária, os bancos começaram a dar mais financiamentos, que se tornaram mais acessíveis. Além de um financiamento de oito anos, como o oferecido pela Rossi, os bancos passaram a oferecer financiamentos com prazo de 30 anos”, comenta o especialista.

“O modelo, que foi inovador, deixou de ser tão atrativo. Apesar da lei entrar em vigor em 1997, isso se deu principalmente a partir de 2005, pois demorou para os bancos criarem instrumentos para realizar financiamentos”, explica.

Alanvacagem operacional e crise econômica pioram situação

Por fim, a situação da Rossi ainda piorou, justamente, pela sua ambição inicial – a expansão agressiva da companhia, posteriormente, começou a se tornar um problema, algo que também foi geral no setor.

“Essas empresas começaram a buscar novas regiões de atuação, mas isso se mostrou algo difícil. O setor de construção, principalmente o focado em classe média e alta, não é um negócio de escala, mas sim de projeto a projeto”, define Ygor Altero, analista do setor imobiliário da XP Investimentos.

De acordo com o especialista, a Rossi buscou parcerias para atuar em novas regiões, mas, posteriormente, “perdeu um pouco a mão nas obras”, sem conseguir acompanhar as operações.

“Isso gerou um grande problema de custo, com estouro de orçamentos”, diz Altero.

Além disso, acrescentou, essas companhias, que eram do segmento de média e alta renda, tentaram navegar no momento de implementação do Minha Casa Minha Vida – com o Rossi Ideal, por exemplo. “Entretanto, o setor de baixa renda também é um nicho totalmente diferente e essa aventura também acabou tendo entraves”, diz o analista da XP.

Derrocada

A própria Rossi, em seu documento de recuperação judicial, assume que esses foram, em grande parte, os motivos da sua derrocada.

“A partir de 2015, o setor imobiliário brasileiro entrou em uma curva descendente significativa, devido à mudança do cenário macroeconômico e da instabilidade política”, detalhou a empresa.

No mais, o aumento da taxa básica de juros, a pressão inflacionária, a desvalorização do câmbio e o aumento da taxa de desemprego tiveram um impacto brutal na economia real e na atividade de incorporação mobiliária.

“A reversão do mercado afetou diretamente o Grupo Rossi, que tinha uma alta exposição aos setores de baixa e média renda e uma alavancagem financeira incompatível com a perspectiva futura de geração de caixa oriunda do cenário que se instalava”, pontuou.

Suspiro antes da recuperação judicial

Mesmo conseguindo refinanciar parte de suas dívidas no final de 2020, o que foi bem-avaliado por analistas, o esforço não foi o suficiente.

Com uma dívida líquida de R$ 594,5 milhões, ao final do segundo trimestre deste ano, e uma posição de caixa de apenas R$ 4,5 milhões, a empresa não conseguiu mais se sustentar. Dessa forma, nada mais restou do que pedir a recuperação judicial.

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