Por que a Renner decepcionou mesmo os analistas pessimistas com seu resultado – e o que esperar para o futuro

Balanço da varejista mostrou que a pandemia atingiu em cheio a empresa mesmo em se tratando de menos de um mês de quarentena

Ricardo Bomfim

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SÃO PAULO – O impacto do isolamento social nas vendas de roupas em tempos de pandemia de coronavírus já era esperado. Ainda assim, o resultado das Lojas Renner (LREN3) no primeiro trimestre deste ano conseguiu decepcionar os analistas e acendeu uma luz de alerta para o futuro da companhia.

A Renner reportou um lucro líquido de R$ 10,4 milhões nos três primeiros meses de 2020, o que representa uma retração de 94% em comparação com o mesmo período do ano passado. O lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) despencou 65% para R$ 110,9 milhões e a receita caiu 6%, para R$ 1,55 bilhão.

De acordo com os analistas Victor Saragiotto e Pedro Pinto, do Credit Suisse, os resultados da varejista foram derrubados pelas circunstâncias do cenário atual, que contribuíram para uma queda de 10,7% nas vendas em mesmas lojas com perdas em crédito crescendo 175%.

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“A performance das Lojas Renner deve ser prejudicada pelo tempo que durar a pandemia, já que [a quarentena] se traduz em menos tráfego nas lojas e menor disposição dos consumidores em comprar bens discricionários”, escrevem os analistas em relatório.

Na opinião da equipe do banco, apesar das perspectivas serem positivas para a empresa no longo prazo e a execução de projetos seja historicamente exemplar, a relação risco/retorno no curto prazo não é boa.

“Nós tememos uma prolongada ‘ressaca’ no consumo enquanto os pilares da demanda estiverem enfraquecidos graças a uma taxa de desemprego mais elevada e uma confiança do consumidor em baixa”, aponta o Credit.

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A recomendação do Credit Suisse para as ações das Lojas Renner é neutra, com preço-alvo de R$ 55,00 em 12 meses, o que corresponde a uma valorização de 34,9% sobre a cotação de fechamento dos papéis LREN3 no pregão de ontem (21).

Os analistas Gustavo Piras Oliveira, Gabriela Katayama e Rodrigo Alcântara, do UBS, têm uma visão parecida sobre o resultado da Renner no primeiro trimestre. Na avaliação deles, menos de um mês de impacto de Covid-19 revelou um poder devastador maior que o esperado.

“A administração não teve tempo de ajustar sua base de Opex [capital empregado para melhorar ou garantir a manutenção dos bens físicos da empresa], o que resultou em uma contração da margem Ebitda [obtida por meio da divisão do Ebitda de uma companhia pela receita líquida dela] de 742 pontos-base, para 5,8%”, analisa a equipe do banco.

A recomendação do UBS para as ações das Lojas Renner também é neutra, com preço-alvo de R$ 40,00 para cada papel em 12 meses, o que significaria uma desvalorização de 1,89% nos preços das LREN3.

Nem tudo é tragédia

A XP Investimentos, por outro lado, tem uma visão mais otimista para a companhia. O analista Pedro Fagundes afirma que apesar da perspectiva de curto prazo ser desafiadora a empresa ainda tem boas condições de ganhar participação de mercado no médio prazo.

Não obstante a queda de vendas em mesmas lojas ter sido maior que a projetada pela XP, que esperava -9,4% na base anual, o desempenho foi afetado principalmente pelo fechamento de todas as lojas físicas a partir da segunda quinzena de março, sendo que o ritmo de crescimento até o dia 13 de março era semelhante ao do quarto trimestre de 2019 (+6,2% na base anual).

Além disso, embora a margem Ebitda tenha despencado 7,1 pontos percentuais em meio a um aumento de 12,2% nas despesas operacionais em relação ao primeiro trimestre de 2019, isso deve, na opinião do analista, ser corrigido no futuro pelas medidas de redução de despesas implementadas pela Renner a partir de abril.

Outro ponto citado pela XP é que a varejista reforçou seu caixa de maneira relevante nos últimos dois meses, com R$ 1,8 bilhão em emissões de novas linhas de crédito a taxas atrativas no cenário atual (em torno de CDI + 3%).

“Dessa forma, acreditamos que a Renner terá fôlego não só para atravessar o período mais crítico da crise, mas também para continuar investindo nas alavancas de crescimento corretas (e-commerce/multicanalidade) e fortalecendo os seus diferenciais competitivos (relacionamento próximo com fornecedores e clientes, operação de serviços financeiros e sistema de abastecimento push-and-pull)”, aponta Fagundes.

O analista ressalva que para ter certeza de que o cenário irá se concretizar é preciso que o investidor acompanhe a evolução dos resultados da companhia ao longo da retomada gradual das atividades. Também é importante ficar de olho nos indicadores de consumo ao longo dos próximos meses, como desemprego, renda e confiança do consumidor.

A XP tem recomendação de compra para Renner, com preço-alvo de R$ 50,00 por ação ao final de 2020, um upside de 22,64%.

Na mesma linha, o analista Richard Cathcart, do Bradesco BBI, ressalta que o Ebitda dos serviços financeiros só caiu 80% devido ao aumento das provisões da Renner por conta de uma visão mais cautelosa da administração da companhia em relação ao contexto econômico.

Cathcart notou ainda que agora 18% das lojas estão abertas e o comércio eletrônico está crescendo mais rápido do que no período pré-crise. Apesar disso, ele ressalva que mesmo que o e-commerce atinja mais consumidores durante a quarentena ainda é um negócio relativamente pequeno, então não tem potencial para ofuscar o impacto nos fechamentos de lojas físicas.

O veredicto do analista do Bradesco BBI é que os números ruins não devem deixar os investidores tão preocupados, uma vez que a Renner é claramente uma das empresas mais bem equipadas “navegar nas águas turvas adiante”.

A recomendação do Bradesco BBI para as ações das Lojas Renner é outperform (desempenho acima da média do mercado) com preço-alvo de R$ 45,00, o que representa uma valorização de 10,38% sobre o fechamento da véspera.

Concorrentes: o caso Riachuelo

Ontem, a Guararapes (GUAR3), controladora da Riachuelo, também divulgou seu resultado do primeiro trimestre de 2020, mostrando prejuízo líquido ficou em R$ 47,5 milhões, ante lucro de R$ 29,3 milhões apurados entre janeiro e março de 2019.

O Ebitda recuou 46,4%, para R$ 101,1 milhões, e a margem passou de 18% no primeiro trimestre do ano passado para 10% no primeiro três meses de 2020.

Richard Cathcart, do Bradesco BBI, argumenta que as vendas em mesmas lojas estavam fortes (crescimento de 12,1% em janeiro e de 12,8% em fevereiro) antes do fechamento dos pontos físicos por conta da quarentena, o que demonstra que a Riachuelo conseguiu resolver seus problemas de distribuição que impactaram negativamente os resultados do segundo semestre de 2018 e do segundo semestre de 2019.

Todavia, o isolamento social atingiu em cheio a operação da empresa, fazendo as vendas em mesmas lojas desabarem 38,4% em março. Além disso, os lucros de serviços financeiros caíram 47%, para R$ 67 milhões, bem abaixo da projeção do analista, que era de uma contração a R$ 90 milhões.

A recomendação das ações da Guararapes pelo Bradesco BBI é neutra com preço-alvo de R$ 12,00 por papel, o que representa uma queda de 4% sobre a cotação de fechamento da véspera, que foi R$ 12,50.

Por fim, os analistas Thiago Macruz, Helena Villares, Emerson Vieira e Gabriel Simões, do Itaú BBA, apontaram que o resultado foi levemente negativo, com uma queda de 71% do Ebitda causada especialmente pelo braço financeiro das operações da empresa, a Midway Financeira.

Isso ocorreu por causa do aumento de 10% na base anual das provisões para devedores duvidosos, o que reverteu a melhora observada nesta métrica no quarto trimestre de 2019.

“O lado positivo foi a sólida melhora de 180 pontos-base na comparação anual da margem bruta do varejo. Isso ocorreu apesar do mix de vendas mais fraco e dos efeitos da Covid-19, refletindo ajustes de estoques e uma coleção mais assertiva no caminho certo”, destaca a equipe do BBA.

A recomendação do Itaú BBA para as ações GUAR3 é outperform com preço-alvo de R$ 31,00, o que significaria uma valorização de 148% em relação ao fechamento da véspera.

Tanto as ações das Lojas Renner quanto as da Guararapes caíram forte nessa sessão. Os papéis LREN3 recuaram 8,34%, a R$ 37,37, e as ações GUAR3 registraram perdas de 6%, a R$ 11,75.

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Ricardo Bomfim

Repórter do InfoMoney, faz a cobertura do mercado de ações nacional e internacional, economia e investimentos.