O que as vitórias de Renan Calheiros no Senado e Rodrigo Maia na Câmara significariam ao governo Bolsonaro?

A despeito das boas relações mantidas entre os dois parlamentares, para o Planalto a vitória de cada um poderia trazer significados muito distintos

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – A pouco mais de duas semanas da posse dos deputados e senadores da nova legislatura e das eleições para as presidências das duas casas, a dupla Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Renan Calheiros (MDB-AL) tem amplo favoritismo para voltar a comandar os trabalhos do parlamento.

O primeiro tenta a recondução pela terceira vez seguida, ao passo que o segundo tenta voltar ao posto pela quinta vez. Os dois trabalharam conjuntamente, ocupando o comando das respectivas casas legislativas, por pouco mais de seis meses, em um momento político tumultuado, marcado pela queda de Dilma Rousseff e a ascensão de Michel Temer, o acirramento das relações entre os poderes Legislativo e Judiciário e a condução de uma agenda fiscal calcada no teto de gastos.

A despeito das boas relações mantidas entre Maia e Renan, para o governo de Jair Bolsonaro a vitória de cada um poderia trazer significados muito distintos. Embora o presidente insista que não interferirá nas disputas para o comando das duas casas, a avaliação é que as preocupações no Senado Federal tendem a ser muito maiores do que na Câmara dos Deputados. Nos bastidores, o nome do emedebista não agrada o Planalto, ao passo que Maia se distanciou dos flertes com a esquerda e já conta com o apoio formal do PSL.

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Mas, como a política tem suas complexidades, o nome do escolhido não diz tudo sobre o que pode vir por aí – o que faz com que a vitória de um mesmo parlamentar possa ter significados completamente distintos, a depender das circunstâncias em que ocorreu.

“Tão importante quanto quem sai nesse processo vai ser a maneira como será eleito. Essa é uma oportunidade para o novo governo criar essa interlocução com lideranças partidárias e usar a eleição para a Câmara e o Senado como mecanismo de relacionamento”, observou Christopher Garman, diretor da consultoria da risco político Eurasia Group [veja a íntegra da entrevista aqui].

Eis o quadro em cada casa legislativa:

Rodrigo Maia: reformas e agenda convergente

Na Câmara dos Deputados, o quadro de favoritismo para a recondução de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à presidência da casa é visto como positivo ao governo, já que há um acordo formal, desde o início do ano, entre o candidato e o PSL. Embora tenha causado alguma indisposição entre parte da base, o arranjo foi visto por analistas como positivo do ponto de vista político.

“Maia estava se consolidando como favorito, então era uma questão de deixá-lo ser eleito com apoio da esquerda ou ser eleito com o apoio do governo”, avalia Ricardo Ribeiro, analista político da MCM Consultores. Para ele, os primeiros dias da nova gestão indicaram certo distanciamento da heterodoxia na condução das atividades políticas e uma acomodação em direção a alguns métodos tradicionais.

De fato, a movimentação desconcertou parte da oposição. De um lado, o PSB definiu que a adesão do PSL à candidatura de Maia “inviabiliza completamente” o apoio da legenda à reeleição do atual presidente da casa. Do outro, a maioria do PDT decidiu indicar apoio à candidatura. Já o PT encontra-se rachado sobre a questão. Antes do acordo de Maia com o PSL, era relevante no partido a discussão sobre apoiar o demista. Hoje ficou mais difícil, já que o partido teria que ingressar no mesmo barco que o partido de Bolsonaro.

A 18 dias da disputa, Rodrigo Maia já conta com o apoio de 12 siglas: PSL (52), PSD (34), PR (33), PRB (30), DEM (29), PSDB (29), PDT (28), Solidariedade (13), Podemos (11), Pros (8), PPS (8) e PSC (8). Juntos, esses partidos somam 283 votos, ultrapassando o total necessário para a maioria absoluta (257). No entanto, dissidências são esperadas – contra e a favor. Como a votação é secreta, há maior dificuldade em assegurar a efetividade dos acordos. Da mesma forma, pode haver apoio de parlamentares de siglas que decidiram não apoiar o atual presidente.

Algumas das costuras feitas até aqui por Maia para garantir apoio à sua candidatura desagradou bancadas da oposição e do próprio “centrão”. Até aqui, ele prometeu entregar a primeira vice-presidência ao PRB e a segunda para o PSL, que também deve ficar com a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e pleiteia a CFT (Comissão de Finanças e Tributação). Já o PSD tende a ganhar a relatoria da CMO (Comissão Mista de Orçamento).

Tais movimentações geraram mal-estar no PP, terceira maior bancada da Câmara na próxima legislatura. Insatisfeito com a perda de espaço, o deputado Artur Lira (AL), líder do partido, pode lançar sua candidatura. Na semana passada, o ex-ministro Ricardo Barros (PR) informou aos colegas que também irá disputar a presidência da casa, em uma candidatura avulsa.

O MDB (34) também está incomodado com as movimentações de Maia. O partido deve manter duas candidaturas avulsas: Alceu Moreira (RS) e Fábio Ramalho (MG). “Houve um movimento de PR, PRB e PSD para isolar o MDB. E isso não aceitamos”, afirmou Baleia Rossi (SP), líder do partido na casa, ao jornal O Globo. “Mas não tem nada a ver com o governo. Nossa bancada tem compromisso com a pauta econômica que vai resgatar os empregos de que os brasileiros tanto precisam”.

A estratégia dos adversários de Maia é lançar o máximo possível de candidaturas para levar a eleição ao segundo turno. Nesse caso, todos os adversários se uniriam em torno da candidatura opositora. No entanto, não se sabe ainda até onde vão determinadas candidaturas – se representam uma forma de pressão política em busca de novos acordos ou se vão até as últimas consequências.

A despeito do crescimento dos riscos nos últimos dias, Maia segue favorito. Uma eventual vitória do demista é positiva para Bolsonaro, já que o governo teria no comando da Câmara um parlamentar apoiador da agenda de reformas econômicas com tom liberal e poderia estar disposto a apoiar pautas relacionadas à segurança pública e aos costumes. Trata-se de aliado importante para lidar com parlamentares sensíveis às pressões de fortes corporações.

Renan Calheiros: uma pedra no caminho?

Muitas incertezas marcam a disputa pelo comando do Senado Federal pelos próximos dois anos. Com a decisão do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, de derrubar liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello, as eleições para a mesa diretora da casa deverão ter voto fechado. A notícia foi vista como positiva à candidatura de Renan Calheiros (MDB-AL), que é apontado como negativa ao Planalto.

“O governo Bolsonaro provavelmente vai ter que lidar com Renan presidente do Senado, ainda mais depois da decisão de Toffoli. Ele está fazendo acenos, então provavelmente também haverá alguma acomodação ou composição, mas Renan, mesmo que se torne eventual aliado, é alguém que demanda cuidado”, avalia Ribeiro. Para ele, o cenário-base é que, mesmo com o favoritismo do emedebista, o PSL mantenha a candidatura de Major Olímpio (SP) para o comando da casa.

Nos bastidores, Renan tem investido em acenos ao novo governo para voltar a presidir o Senado pela quinta vez. Crítico das reformas do governo Michel Temer, o emedebista agora muda o tom sobre a pauta liberal do novo governo. Apesar de alimentar antipatia entre membros do PSL, ele tenta vencer resistências indicando disposição em ajudar com a aprovação de pautas como a reforma previdenciária.

“Há um longo caminho pela frente até que a reforma previdenciária chegue ao Senado. Renan não é um personagem que se possa ler de forma binária, mas certamente é alguém que tem de ser entendido sob a ótica da busca de acordos. Se do outro lado encontrar a mesma disposição, tanto melhor para a agenda do governo”, observa a equipe de análise política da XP Investimentos.

A complexidade do perfil de Renan pode ser observada por dois episódios: durante o governo Dilma Rousseff, quando seu partido ainda estava na base aliada, devolveu ao Executivo uma medida provisória que reonerava a folha de pagamentos. Por outro lado, o mesmo senador, nada simpático à figura de Temer, ajudou na aprovação do teto de gastos – um dos pilares fiscais defendidos pelo último governo.

Com as regras de eleições fechadas mantidas, cresce o entendimento de que somente o surgimento de um nome de consenso seria capaz de derrotar o emedebista. Certamente o nome não agrada ao Planalto, agora resta saber se, mantidas tais condições, o governo buscará alguma composição ou tensionará com o presidente do Senado.

Ao contrário do quadro da Câmara, aqui o PSL não conta com uma bancada expressiva: apenas 4 assentos, 1/3 do tamanho do MDB, maior bancada. Em uma casa adepta a seguir tradições, será difícil evitar que um nome emedebista, no caso Renan, comande os trabalhos.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.