PIB dos EUA não foi tão ruim quanto parece e não deve mudar projeção de alta de juros pelo Fed, apontam analistas

Queda foi ditada principalmente por um déficit comercial mais amplo e por uma desaceleração na acumulação de estoques empresariais, mas consumo segue forte

Lara Rizério Mitchel Diniz

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Se nas últimas semanas entrou no radar dos mercados um maior temor sobre recessão nos Estados Unidos por conta dos efeitos dos juros mais altos por lá, a primeira leitura do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre de 2022 reforçou essa percepção.

O PIB dos EUA caiu a uma taxa anualizada de 1,4% no trimestre passado, segundo informou o Departamento de Comércio em estimativa preliminar nesta quinta-feira, ante projeção Refinitiv de alta de 1,1%. A economia havia crescido a um ritmo robusto de 6,9% no quarto trimestre de 2021.

Contudo, a leitura preliminar do indicador pode mostrar um quadro equivocado sobre a atividade econômica americana. A queda foi ditada principalmente por um déficit comercial mais amplo e por uma desaceleração na acumulação de estoques empresariais em relação ao ritmo robusto do último trimestre do ano passado; juntos eles tiveram impacto negativo de cerca de 4 pontos percentuais no crescimento no trimestre.

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“O desempenho está muito contaminado pelos dados que não são necessariamente relacionados à demanda interna. Exportações líquidas foram a principal contribuição para a queda de 1,4% do PIB, ficando com, praticamente, toda a contribuição negativa”, explica Mirella Hirakawa, economista da AZ Quest.

Assim, as importações, que são uma subtração no cálculo do PIB, avançaram substancialmente no período. Por outro lado, os gastos com consumo pessoal, os investimentos em ativos fixos não residenciais e residenciais avançaram no primeiro trimestre.

O resultado no período também refletiu os impactos da variante Ômicron na economia americana, responsável pelo aumento das restrições e disrupções que afetaram o funcionamento dos estabelecimentos em diversas regiões do país. Soma-se a isso, o fim dos programas governamentais de assistência as famílias e aos estabelecimentos, que contribuíram para o resultado negativo no trimestre.

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Por outro lado, os gastos com consumo pessoal, que representam mais de dois terços da atividade, avançaram 2,7%, ante 2,5% observados no trimestre anterior, contribuindo em 1,8 ponto percentual (p.p.) para a variação do PIB anualizado. Os gastos pessoais com bens recuaram 0,1%, após expansão de 1,1% no trimestre anterior, enquanto isso os gastos com serviços avançaram 4,3% no período, acelerando 1 p.p. em relação ao número anterior.

“O PIB chama atenção para novos dados de atividades e para um acompanhamento dos impactos da guerra na Ucrânia no comércio exterior. Mas não altera o plano de voo do Federal Reserve, pois mostra, em geral, uma atividade mais forte”, complementa Mirella.

Conforme destaca Roberto Attuch, CEO da Ohm Research, o PIB veio bem melhor do que a leitura inicial parece indicar e não deve mudar os planos para a política do Federal Reserve, que deve continuar de prosseguir o aperto monetário.

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A avaliação geral do mercado é de que o Federal Reserve ainda deve aumentar os juros em 0,50 ponto percentual em sua próxima reunião de política monetária, na quarta-feira que vem, visão esta que se fortaleceu após fala de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve, na semana passada. O banco central dos EUA elevou sua taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual em março e deve começar a reduzir suas participações em ativos em breve.

O Citi também apontou não estar surpreso ou preocupado com a queda da atividade. Para os analistas, as importações em alta mostram que a demanda doméstica norte-americana segue ainda com muita força. Assim, “não esperamos outro declínio do PIB no segundo trimestre de 2022, com a economia evitando uma recessão técnica”, projeta.

A pausa no processo de recuperação econômica também não foi vista como um indicativo de que a economia americana entrou em uma recessão na avaliação de Luca Mercadante, economista da Rio Bravo. Desta forma, aponta o economista, os investidores ainda acreditam que o Fed deve permanecer no mesmo caminho de política monetária e que a autoridade monetária americana será bem-sucedida em fazer um pouso suave da política monetária.

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“A economia ainda está mostrando alguma resiliência, mas o relatório do PIB do primeiro trimestre sinaliza o início de um crescimento mais moderado neste ano e no próximo, em grande parte em resposta a taxas de juros mais altas”, disse Sal Guatieri, economista sênior da BMO Capital Markets, em Toronto. De qualquer forma, “apesar da contração, o Fed tem pouca escolha a não ser subir os juros agressivamente em maio para conter a inflação.”

A equipe de análise macroeconômica da Genial Investimentos também ressalta que a combinação entre uma forte demanda e mercado de trabalho aquecido mantêm a avaliação de que será anunciado um aumento de 0,5 p.p. na taxa de juros americana na próxima semana, ainda que a economia tenha contraído nos primeiros três meses do ano.

Em relatório com previsões sobre o PIB americano divulgado na véspera, o Credit Suisse já projetava um PIB mais fraco no primeiro trimestre por conta do déficit comercial, mas ressaltou que o consumo seguiria em alta. Olhando para frente, os analistas do banco projetaram que o crescimento do PIB acelere para 2,0% no segundo trimestre, revertendo a fraqueza nos primeiros três meses do ano.

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“Após sete trimestres negativos, esperamos que as exportações líquidas sejam um fator neutro no segundo trimestre. No entanto, o crescimento global está em desaceleração, com riscos de queda concentrados na Europa e na China – principais parceiros comerciais dos EUA. Enquanto a demanda dos EUA tiver um forte desempenho, o déficit comercial estruturalmente amplo provavelmente não será revertido tão cedo”, aponta o Credit.

Agora, o próximo indicador a ser observado de perto pelo mercado é o índice de preços de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês), que será revelado na próxima sexta-feira e é a medida preferida de inflação do Federal Reserve (Fed).

O dado de índice de preços de gastos com consumo divulgado junto com o PIB mostrou avanço de 7,0% ante 6,4% no trimestre imediatamente anterior, decorrente tanto da alta nos preços de bens (11,8%) quanto de serviços (4,6%). Por sua vez, o núcleo do índice de preços do PCE, que exclui preços de alimentação e energia, teve um aumento de 5,2%, ante 5,0% no quarto trimestre de 2021.

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“É importante destacar que, ao contrário de momentos anteriores, o gradual fim das restrições de circulação fez com que o setor de serviços também passasse a sofrer com a elevação dos preços”, afirma Matheus Pizzani, economista da CM Capital.

Para Attuch, os próximos números serão observados de perto pelos investidores, com o núcleo da inflação devendo manter a tendência de avanço de 5% na comparação anual nos próximos dois meses, mas com a percepção de que os números possam ter chegado a um pico, ainda que dependendo muito dos desdobramentos da guerra da Ucrânia e do estresse no preço de petróleo.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.