Petrobras (PETR4): investimentos em eólica offshore devem impactar dividendos da estatal e afetar mais empresas da Bolsa

Estatal assinou com a Equinor carta de intenções sobre a avaliação da viabilidade de sete parques eólicos offshore, com impacto para outros setores

Felipe Moreira Lara Rizério

Energia eólica offshore (Foto: Getty Images)

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A busca da nova gestão da Petrobras (PETR3;PETR4) pela liderança na “inevitável” transição energética teve um grande passo anunciado na noite da última segunda-feira (6). A companhia assinou com a Equinor (estatal norueguesa de petróleo) uma carta de intenções sobre a avaliação da viabilidade econômica-financeira e ambiental de sete parques eólicos offshore com potencial de geração de até 14,5 GWh (Gigawatt-hora). Para fins de comparação, o Brasil encerrou o ano passado com uma capacidade instalada de 185 GWh, sendo 22,5 GWh em energia eólica.

Conforme Morgan Stanley, embora 14,5 GWh seja uma quantidade significativa de geração de energia, esses são estudos iniciais de viabilidade, e se aprovados, os projetos levariam vários anos para avançar.

No comunicado sobre o tema, o presidente da estatal, Jean Paul Prates, menciona que a alocação de capital depende de uma análise aprofundada para avaliar sua viabilidade, além de avanços regulatórios que permitirão os processos de autorização das atividades, a serem realizados pelo Governo Federal Brasileiro. Sendo assim, o banco americano não vê compromissos de capital relacionados a projetos de parques eólicos offshore – no curto prazo.

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Além disso, analistas do Morgan Stanley lembram que manter os gastos não upstream ( exploração e produção de óleo e gás) sob controle será um dos gatilhos importantes para o caso de investimento da Petrobras. Conforme declarado na primeira teleconferência liderada pelo novo CEO, na semana passada, a empresa planeja manter o capex  (investimento em capital) não relacionado a upstream em 20 a 25% de seus investimentos totais.

“Um aumento significativo no capex, especialmente em projetos de transição energética, é uma das muitas preocupações dos investidores em relação à nova administração e ao Conselho de Administração da Petrobras”, apontam os analistas do Morgan.

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A Genial Investimentos já avalia que o anúncio é negativo para tese de investimento na estatal. Isso porque, se for considerada a participação de 50% da Petrobras nos projetos apresentados, a empresa passaria a ter um comprometimento de investir até R$ 130 bilhões nos próximos anos em eólicas offshore, o que pode ser muito desafiador do ponto de vista da geração de valor aos acionistas, tendo em vista os baixos preços de energia no segmento de geração (que atualmente opera em uma sobreoferta estrutural que deve durar pelo menos 4-5 anos) e alto custo do investimento por megawatt/hora (MWh) instalado.

“Além disso, é importante citar que não estamos considerando atrasos ou explosão no orçamento de tais projetos devido à falta de expertise da empresa no desenvolvimento desse tipo de projetos”, acrescenta.

A Genial também destacou que o lucro recorde apresentado em 2022 foi derivado do trabalho no segmento em que a Petrobras demonstrou ter o seu maior diferencial competitivo: o segmento de exploração e produção de petróleo. “A empresa não apenas alcançou a sua meta de produção do ano como surfou os altos preços do brent devido as incertezas relacionadas a Guerra da Ucrânia/Rússia”, avalia a casa.

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Analistas da Genial ainda lembram que o setor de petróleo está atravessando um momento de restrição na oferta devido ao subinvestimento em exploração e desenvolvimento nos últimos anos. “E, com todas essas conquistas, não temos como desassociar as recentes decisões da corporativas a um ataque à geração de caixa e valor aos acionistas da empresa”, ponderam.

Assim, apesar da empresa negociar com desconto expressivo em relação aos pares, com um múltiplo do valor da empresa (EV) sobre o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) de 2,5 vezes, ante 4 a 5 vezes o EV/Ebitda dos pares privados, mostrando que o mercado já antecipou boa parte do fluxo de noticias negativo, a Genial Investimentos cortou a recomendação dos ativos, de neutra para venda.

“Entendemos que, se por um lado ,os efeitos das recentes decisões (investimento em renováveis, nacionalização de preços, entre outros) ainda não acertaram em cheio a geração de caixa da empresa, por outro, imaginamos que simplesmente não vale a pena esperar as ideias se manifestarem como fatos na geração de caixa da empresa – e por ser uma estatal, a empresa está exposta ao ciclo político eleitoral de pelo menos quatro anos”, comenta a Genial.

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Os analistas da casa assumiram que correm o risco de estar superestimando o fluxo de notícias aos fundamentos da empresa, “mas tendo outras opções com menor exposição a ingerência política (como 3R RRRP3 e PRIO PRIO3), não achamos por bem estar exposto ao case da nossa major nacional”.

Na avaliação do Bradesco BBI, o anúncio da véspera também vai na linha da visão de mais capex com menor retorno médio e menos dividendos para a estatal.

Os dividendos da Petrobras podem ser afetados, uma vez que a energia eólica offshore é um dos riscos de capex (investimentos) que os analistas da casa já sinalizaram em seus relatórios recentes. A referência de capex para desenvolver a energia eólica offshore na Europa é de US$ 3 milhões/megawatt (MW) de capacidade. Mas, no Brasil, pode ser maior.

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Isso significa que esse projeto pode exigir a implantação de capex de pelo menos US$ 44 bilhões a serem gastos em 5 a 7 anos. Assumindo uma parceria 50/50 com a Equinor, este projeto por si só aumentaria o programa de capex de 5 anos da Petrobras em pelo menos US$ 22 bilhões.

“De acordo com a atual política de dividendos, esperávamos que os dividendos totalizassem cerca de US$ 97 bilhões em 5 anos; portanto, este projeto por si só poderia reduzir os pagamentos esperados em pelo menos 23% neste período. Notavelmente, a Petrobras provavelmente anunciará outros projetos, como outras parcerias eólicas offshore, complexos petroquímicos, refinarias, fábricas de fertilizantes, entre outros”, avaliam os analistas.

Além disso, as Taxas Internas de Retorno (TIR) consolidadas da Petrobras provavelmente tenderão para baixo. As TIRs do negócio do pré-sal estão próximas de 30% em dólares, assumindo um preço de longo prazo do Brent de US$ 70 o barril. Por outro lado, as TIRs para novos projetos eólicos renováveis onshore estão abaixo do custo de capital para a maioria, dado que nos últimos 6 a 8 meses os preços da eletricidade despencaram devido ao excesso de oferta de geração.

“Se a Petrobras empregar tanto capital em energia eólica offshore, uma vez que a demanda/preços de eletricidade não suportarão esses novos projetos, as TIRs marginais bloqueadas pela estatal podem ser menores no futuro”, afirma o banco. O BBI destaca que a BP e a Shell, mais focadas nos esforços de transição, negociam a um múltiplo de 3,1 vezes o EV/Ebitda esperado para 2023, enquanto empresas como Exxon e Chevron (mais focadas em óleo e gás) negociam a 5,8 vezes.

O Bradesco BBI tem recomendação neutra para as ações PETR4, com preço-alvo de R$ 26 (praticamente sem upside em relação ao fechamento da véspera).

O Morgan Stanley também tem recomendação equivalente à neutra para os ADRs (recibo de ações negociados nos EUA) PBR (equivalente aos ordinários), com preço-alvo de US$ 13 (potencial de valorização de 16,5% frente o fechamento da véspera).

O banco americano espera volatilidade contínua para os ativos, à medida que a nova diretoria e o Conselho de Administração assumam o cargo e começam a compartilhar sua visão e estratégia para a estatal. “Decisões recentes de impostos sobre combustíveis e a criação de um imposto temporário sobre a exportação de petróleo levantaram a bandeira amarela do setor e aumentaram o clima de intervenção nas estatais. Achamos que é uma questão de tempo para as políticas de Petrobras mudarem, mas precisamos ter mais visibilidade sobre o quão prejudiciais elas podem ser para a lucratividade e geração de caixa, então ficamos à margem apesar da avaliação muito barata, de 1,9 vez o EV/Ebitda”, finalizou.

WEG e OceanPact beneficiadas, geradoras prejudicadas

Mas, além de Petrobras, analistas veem que outras ações podem ser impactadas – tanto positiva como negativamente.

O Itaú BBA destacou ver a WEG (WEGE3, fabricante de equipamentos elétricos, como uma possível beneficiária. Segundo os analistas, supondo que seja considerado viável, o plano de que a joint venture desenvolva 14,5 GW de capacidade, traduzindo-se em R$ 270 bilhões (US$ 50 bilhões) de capex, o Itaú BBA estima que a WEG poderia capturar receitas de R$ 1 a 2 bilhões por ano (até 2040) deste projeto.

Apesar da iniciativa ainda estar em um estágio muito inicial, analistas do BBA veem como positiva para a WEG no médio prazo. A WEG ainda não tem um produto para eólica offshore, mas eles acreditam que capacidade de inovação da empresa permitirá atender à crescente demanda por turbinas offshore (em julho passado, por exemplo, a WEG lançou o maior aerogerador atualmente no mercado brasileiro , com 7 MW de capacidade).

Segundo cálculos do banco, o projeto pode gerar uma receita de R$ 5 a 10 bilhões para WEG, traduzindo-se em R$ 1,4 bilhão de receita adicional por ano, ou 4% de sua receita em 2023 (assumindo 15 anos para o desenvolvimento completo).

O BBA mantém avaliação outperform (desempenho acima da média, equivalente à compra) para WEG e preço-alvo de R$ 44 (upside de 16%). Embora a ação pareça caro, a múltiplo de 32 vezes o preço sobre o lucro esperado para 2023, a WEG continua se destacando como um player defensivo (caixa líquido, metade da receita em dólares) que também está exposto a drivers de crescimento estrutural de longo prazo (eletrificação, nearshoring, hidrogênio verde, veículos elétricos e, agora, eólica offshore).

O Bradesco BBI também vê a OceanPact (OPCT3) como uma empresa que pode se beneficiar, já que a atividade pode aquecer ainda mais a demanda por empresas de embarcações de apoio offshore (OSV).

Por outro lado, veem efeito negativo para as empresas de geração de energia.

O BBI lembra que os preços de geração no Brasil caíram drasticamente nos últimos 6 meses (ou seja, de R$ 170-180/MWh para menos de R$ 100 para 2023-2024), refletindo o excesso de oferta que vem da construção excessiva de renováveis (alimentada por subsídios maciços) e a recuperação de reservatórios hidrelétricos.

Com base na dinâmica atual de oferta/demanda, a equipe de analistas do setor elétrico do banco estima que o excesso de oferta no Brasil de 12% (excesso de oferta antes de acionar unidades geradoras com custo marginal maior do que R$ 150/MWh) seria absorvido apenas até o final da década. Isso significa que os preços voltariam a cerca de R$ 150-160/MWh apenas em 2029-2030.

“No entanto, se a Petrobras adicionasse nova capacidade substancial, o excesso de oferta seria exacerbado e, uma vez que o custo marginal de geração de energia eólica offshore é zero, os preços da eletricidade permaneceriam baixos por muito mais tempo”, avaliam os analistas.

Assim, esse cenário seria muito negativo para geradoras como Eletrobras (ELET3;ELET6), AES Brasil (AESB3), Auren (AURE3), Eneva (ENEV3), Engie (EGIE3) e Omega (MEGA3), enquanto as concessionárias integradas com ativos de geração também seriam atingidas.

O BBI afirma que, notavelmente, um dos problemas para construir uma nova capacidade eólica offshore (ou qualquer nova capacidade) é a falta de demanda real. No entanto, o governo poderia resolver isso estabelecendo leilões específicos ancorados por empresas de distribuição que, nesse cenário, seriam forçadas a comprar o fornecimento eólico offshore.

“As distribuidoras, no entanto, já enfrentam um grande excesso de oferta que é pago pelos consumidores finais, o que significa que haveria grande oposição a tal movimento por parte dos reguladores”, apontam os analistas.

Estudos iniciais

A Petrobras deu mais detalhes sobre os projetos de geração eólica offshore nesta terça-feira. Segundo a estatal, os projetos terão estimativas oficiais de custo e retorno somente após a conclusão de análises técnicas a serem desenvolvidas por grupo interdisciplinar.

Tais projetos também deverão futuramente ser apreciados pelas instâncias de aprovação interna, de acordo com a governança da companhia, adicionou.

O projeto, segundo disse ainda o CEO da Petrobras, ficará em fase de estudos até 2028 e, se confirmado, seria composto por sete plantas eólicas com uma capacidade total de 14,5 gigawatts (GW), podendo custar US$ 70 bilhões.

O cálculo do investimento, conforme explicou o executivo, foi uma estimativa livre da Petrobras com base no atual custo do megawatt offshore, multiplicado pela capacidade instalada prevista.

As declarações de Prates ocorreram durante evento em Houston, nos Estados Unidos, na segunda-feira, onde a Petrobras e a Equinor anunciaram a assinatura de uma carta de intenções para o desenvolvimento dos estudos em conjunto. O novo acordo ampliou uma parceria entre ambas as empresas selada em 2018.

(com Reuters)