Os estrategistas que estão otimistas com uma das piores bolsas do mundo em 2020: a brasileira

Apesar do rali das últimas semanas, Ibovespa segue em forte queda no ano - e estrategistas apontam motivos para ficarem otimistas com a bolsa brasileira

Lara Rizério

(Getty Images)

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SÃO PAULO – O Ibovespa começou o mês de junho em expressiva alta após meses positivos de abril e maio, com a expectativa pela reabertura econômica dos países após a paralisia por conta do coronavírus. Porém, o índice está longe de recuperar as perdas registradas no primeiro trimestre de 2020 em meio à pandemia, especialmente a queda de 30% do mês de março.

Até o fechamento da última terça-feira (2), o Ibovespa havia caído 21,27% no acumulado do ano, enquanto o dólar avançava 30% no mesmo período, fazendo com que o benchmark da bolsa brasileira fique ainda mais barato na moeda americana.

Conforme destaca a XP Investimentos em gráfico abaixo (até o dia 25 de maio), mesmo com o rali das últimas semanas, até o final do mês passado, a bolsa brasileira era a pior entre os índices globais, assim como a sua moeda.

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Em relatório, o estrategista-chefe da XP, Fernando Ferreira, destaca que, em uma série de reuniões com investidores estrangeiros na última semana, ficou claro que o sentimento com o Brasil continua negativo, o que fica evidenciado pela saída de R$ 77 bilhões de investidores estrangeiros na B3 em 2020.

As maiores preocupações residem em três pontos: 1) política, e quais os riscos da crise política aumentar, 2) a crise do coronavírus, dado que a mídia internacional já coloca o Brasil como o epicentro da doença no mundo no momento, enquanto Europa e EUA já dão sinais de terem passado o pico do vírus, e 3) o câmbio, em meio à forte queda do real no ano.

Em um cenário de baixas expectativas, contudo, podem residir as melhores oportunidades, o que vem fazendo com que diversos estrategistas passem a ter uma posição mais construtiva para o Brasil apesar dos grandes desafios de curto prazo.

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Nos últimos dias, além da XP, Credit Suisse, Santander e Morgan Stanley apontaram uma visão mais construtiva para o Brasil, destacando principalmente o “mercado barato” no país.

O Credit Suisse, em relatório elaborado por estrategistas liderados por Andrew Garthwaite, elevou no final do mês passado a recomendação para as ações brasileiras de underweight (exposição abaixo da média) para um “pequeno” overweight (exposição acima da média do mercado) dentro do universo de mercados emergentes.

Os estrategistas do banco apontam que o call pode ser controverso. Contudo, fatores como um mercado barato ao comparar a relação entre o múltiplo de preço sobre lucro frente aos mercados globais (excluindo commodities), uma moeda atipicamente barata, a expectativa de uma queda do déficit fiscal até o final de 2021 e a participação de commodities na pauta exportadora são apontados como positivos para o mercado nacional.

A instabilidade política é citada como um ponto negativo. Contudo, Garthwaite e equipe ressaltam estarem um pouco mais otimistas no momento. “Houve críticas generalizadas ao tratamento feito pelo presidente (Jair) Bolsonaro do surto de Covid-19, bem como as demissões dos ministros da Justiça e da Saúde. No entanto, o que importa para nós é que, (Paulo) Guedes, ministro da Economia, continua em seu posto.”

Além disso, avalia, o Brasil foi um dos países emergentes que mais injetaram dinheiro para combater o Covid-19 e que, apesar de controversas medidas, a economia pode voltar um pouco mais rápido do que outros mercados.

Quatro motivos para maior otimismo

Na mesma linha, em relatório de estratégia, Renato Chanes, do Santander, destacou quatro motivos para estar positivo com a bolsa brasileira, abrindo espaço para um desempenho acima da média no curto prazo.

Em primeiro lugar, o estrategista aponta que está havendo uma alocação menor em ações brasileiras. Até fevereiro, elas eram muito mais frequentes nos portfólios da indústria local de fundos multimercados até fevereiro, cerca de 10%. A situação era a mesma para os fundos globais ativos em mercados emergentes (há 6 meses, o Brasil representava 8,5% da alocação desses investidores, contra 5,5% atualmente). Em segundo lugar, a contração da atividade econômica já está no preço.

O terceiro ponto é que o real está melhorando seu desempenho lentamente. Após saídas líquidas de capital de US$ 6,56 bilhões em março, as saídas de dólares do Brasil caíram para US$ 1,38 bilhão em abril e inverteram para o positivo nas primeiras semanas de maio. A balança comercial também está começando a entrar em ação, juntamente com a sazonalidade da colheita da safra agrícola. Além disso, o Banco Central tem sido mais ativo em intervenções cambiais e sinalizou que a próxima reunião poderá ser a última em termos de flexibilização monetária (nossa equipe econômica estima Selic em 2,25% no fim do ano de 2020), afirma.

O ambiente político, novamente, é apontado como um fator que, ainda que positivo quando comparado ao cenário de crise do final de abril, ainda tem potencial de causar estresse nos mercados. “A relação entre o presidente, governadores, o Senado e o líder da Câmara dos Deputados se tornou mais positiva recentemente, com promessas de apoio mútuo para enfrentar a crise atual. Esse tema, no entanto, continuará trazendo volatilidade aos mercados e deve ser monitorado”, avalia Chanes.

No cenário base, o estrategista do Santander possui uma projeção de 91 mil pontos para o Ibovespa ao final de 2020. Contudo, em um ambiente mais positivo, o índice poderia chegar aos 105 mil pontos.

Quanto mais baixas as expectativas…

Ferreira, da XP, reforça ainda que, ao olhar para o Brasil, há um quadro de três crises: econômica, política e de saúde, com os economistas já apontando queda de pelo menos 6% do PIB, os recentes atritos entre os poderes e com o Brasil passando a ser o epicentro da pandemia de coronavírus.

Porém, pondera: “as três crises são graves e preocupantes, e os seus impactos são sem precedentes em grande parte. Porém, as expectativas hoje em relação ao Brasil já estão muito baixas. O Brasil já tem a pior Bolsa e a pior moeda do mundo em termos de performance em 2020. Qualquer melhora marginal já pode trazer bons retornos aos ativos brasileiros (ações, juros e câmbio)”.

Além disso, as expectativas de lucros [para as empresas] do Ibovespa para 2020 e 2021 já reduziram em 47% e 15%, respectivamente, desde março, indicando que o mercado já passou a precificar uma boa parte dos impactos da crise. Como exemplo disso, 38% dos resultados do primeiro trimestre vieram em linha com as expectativas do consenso.

Apontando o potencial de alavancagem operacional (em que um crescimento na receita impulsiona um crescimento ainda maior no lucro) das empresas, além do ambiente de juros baixos e a injeção de US$ 17 trilhões de estímulos monetários e fiscais no mundo, o Morgan Stanley vê um ambiente positivo para a bolsa brasileira no médio prazo. A expectativa é de que o Ibovespa chegue até os 130 mil pontos.

Porém, reforçam alguns pontos para ficar de olho: os resultados das empresas devem se deteriorar no segundo trimestre por conta dos impactos da pandemia. Além disso, os estrategistas do banco monitoram de perto a curva de infecção do coronavírus no Brasil: “nos preocupamos com o impacto potencial que o surto possa ter na dinâmica social e de crescimento local, políticas macroeconômicas e, portanto, na taxa de câmbio no curto prazo.

Sobre o tópico juros baixos, a XP ainda destaca. “Apesar da redução das estimativas dos lucros das empresas neste ano e consequentemente, do pagamento dos dividendos (em 24% até o momento), os juros continuaram em queda. Portanto, essa relação rendimento dos dividendos menos juros reais continua positiva, o que mostra a atratividade tanto da bolsa quanto dos bons pagadores de dividendos”, avalia. A equipe de análise manteve a estimativa de preço-alvo para o Ibovespa em 94 mil pontos.

A XP tem em sua carteira recomendada as ações de Iguatemi (IGTA3), EzTec (EZTC3) e Lojas Americanas (LAME4), Banco do Brasil (BBAS3), Cesp (CESP6), JBS (JBSS3), Localiza (RENT3), Suzano (SUZB3), Vale (VALE3) e Vivara (VIVA3).

Já o Santander possui em sua carteira de dez ações a Ambev (ABEV3), Bradesco (BBDC4), Carrefour Brasil (CRFB3), CPFL Energia (CPFE3), Lojas Renner (LREN3), Multiplan (MULT3), Petrobras (PETR3), além de Vale, JBS e BB, que constam na carteira da XP.

A lista de ações do Credit Suisse , por sua vez, traz as ações dos bancos Bradesco, BB, Santander Brasil (SANB11), JBS, além de BB Seguridade (BBSE3), Itaúsa (ITSA4), Telefônica Brasil (VIVT4), TIM (TIMP3) e Engie Brasil (EGIE3).

Novos alertas

Desta forma, diversos estrategistas estão otimistas com o Brasil, mas fazem a ponderação sobre os riscos. Outros fatores que entraram no radar dos investidores dos últimos dias, foram os protestos antirracistas que eclodiram nos Estados Unidos após a morte de George Floyd, um homem negro, por um policial. Já o Brasil viu neste fim de semana um conflito em plena Avenida Paulista, em São Paulo, entre torcidas organizadas que participaram de protestos a favor da democracia e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.

Contudo, os mercados seguem sustentando um expressivo rali (veja mais aqui), em meio à expectativa sobre a reabertura econômica de várias economias-chave, como de países europeus, além do início do processo de reabertura no Brasil após quarentena por conta da pandemia. Contudo, sobre isso, ainda são feitas algumas ponderações sobre se está sendo cedo ou não para fazer flexibilização.

A diretora da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Carissa Etienne, alertou ontem (2) que os países devem ser muito cuidadosos ao começar a flexibilizar as medidas de isolamento. Ela disse que uma segunda onda de contágios pelo novo coronavírus (covid-19) pode levar à perda dos esforços feitos até o momento.

Já em live recente, Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central (BC), apontou que os mercados estão neste momento otimistas com o que chamou de “cortisona monetária”, em referência à injeção de liquidez gigantesca feita em coordenação pelos maiores bancos centrais do mundo no combate aos efeitos da pandemia na economia.

“Os mercados estão contentes porque estão com uma injeção de esteroides e por conta da crença de que nós, humanos, coletivamente, vamos ganhar essa briga com o vírus. Se o mercado, com esse grau de liquidez, espelha fundamentos, são outros quinhentos”, afirmou Fraga. “O mundo está um pouco animado demais, dopado por essa cortisona monetária”, acrescentou o ex-presidente do BC.

Por enquanto, contudo, após o pânico, os investidores estão mais animados com as perspectivas para os ativos.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.