Minerva (BEEF3): Crise de crédito faz companhia queimar caixa, mas impulsiona margem e ações sobem 3,5%

Com bancos oferecendo menos linhas de risco sacado, frigorífico emprestou dinheiro para fornecedores e viu sua margem melhorar

Vitor Azevedo

(Arte: Leonardo Albertino)

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A crise de crédito brasileira, desencadeada após o caso Americanas (AMER3), vem impactando outras companhias. A Minerva (BEEF3), que divulgou seu resultado do primeiro trimestre nesta terça-feira (10), trouxe, de acordo com analistas, impactos negativos por conta desse cenário, mas também viu sua margem melhorar por conta disso.

As ações ordinárias da Minerva fecharam a sessão desta quarta-feira (10) após balanço em alta de 3,50%, a R$ 9,45, após uma máxima de R$ 9,73 no dia (+6,57%).

“O fluxo de caixa ficou negativo em R$ 853 milhões, resultado de fracos números operacionais e capital de giro pior. A alavancagem [medida pela relação entre dívida líquida e lucro operacional] subiu para 2,6 vezes, de 2,2 vezes no quarto trimestre”, fala o time de analistas do Itaú BBA, chefiado por Gustavo Troyano. “Ainda não está claro para nós se o consumo de capital de giro será ou não revertido nos próximos trimestres”.

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De acordo com os executivos da Minerva, na teleconferência de resultados realizada realizada hoje, a grande mudança no fluxo de caixa aconteceu por conta da disponibilização de crédito aos seus fornecedores. Com os bancos mais receosos, a empresa teve de se movimentar.

“O crédito secou no Brasil e tivemos de usar nosso balanço. No capital de giro, independente de termos operações diferentes da Americanas, os bancos ficaram muito mais conservadores. Linhas de convênio e de risco sacado ficaram menos disponíveis. Uma parte do limite de crédito nosso é alocado para que nossos fornecedores antecipem recebíveis, com o banco assumindo nosso risco. Os bancos reduziram as linhas disponíveis para todos os setores e tivemos de financiar nossos fornecedores”, explicou Edison Ticle, diretor financeiro (CFO) do frigorífico.

De acordo com ele, porém, é esperado que o capital de giro melhore até o final do ano, requerendo mais, no máximo R$ 200 milhões.

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“Esperamos uma melhora de R$ 600 milhões. Terceiro e quarto trimestre devem ser os melhores de 2023. Em relação às linhas de crédito para financiar cadeias, elas secaram no primeiro trimestre, voltaram um pouco no segundo, mas ainda longe do que eram. Melhora virá de outras frentes”, falou.

A Minerva não pretende, por conta do resultado, mudar sua política operacional. A companhia continua de olho em possíveis expansões inorgânicas, tendo comprado o BPU, frigorífico do Uruguai, em janeiro.

“Estamos sempre de olho em M&As [fusões e aquisições, na sigla em inglês], mas por enquanto não há nada no pipeline”, disse o diretor executivo (CEO) Fernando Galletti de Queiroz. “Não é por um trimestre que tivemos um fluxo de caixa um pouco pior que mudaremos as políticas da companhia”, completou o CFO.

Gasto de caixa trouxe benefícios operacionais para a Minerva

Ainda de acordo com os executivos, contudo, o fato de a companhia ter financiado seus fornecedores abriu alguns benefícios operacionais. Fornecedores venderam gado mais barato para Minerva de olho no financiamento que a empresa forneceu.

“A gente conseguiu ter uma margem bruta melhor por conta da nossa habilidade na compra. Usamos o credit crunch para ajudar a melhorar nossa margem. Com a volta de China, a tendência é de avançar ainda mais”, falou Ticle.

“Na comparação com o consenso da Bloomberg, a receita líquida foi em linha mas o Ebitda veio 3% acima do esperado, com gastos com vendas, gerais e administrativos [SG&A, na sigla em inglês] 2% abaixo do esperado, o que deve explicar a movimentação positiva das ações no pregão”, falou o Bradesco BBI.

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A equipe da XP Investimentos destacou que, apesar do impacto negativo da China, a Minerva apresentou uma margem sólida de 8,3%, “estabelecendo uma referência elevada aos seus pares”. O país asiático fechou seu mercado para a carne brasileira por mais de um mês em fevereiro por conta de um caso atípico de Vaca Louca.

De toda forma, porém, os resultados do período entre janeiro e março foram vistos como pouco inspiradores pelos especialistas.

“Como esperado, os resultados foram amplamente afetados pela proibição de exportações para a China, levando o Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização, na sigla em inglês] a cair 18% no ano, para R$ 532 milhões, mas 3% acima da nossa projeção”, fala o time do BBA. “A Minerva apresentou resultados fracos para a divisão brasileira, amplamente esperados, com queda de 19% dos preços e de 27% da receita bruta no ano, para R$ 6,8 bilhões”.

O Santander destaca que a Minerva conseguiu, parcialmente, compensar o prejuízo do Brasil com melhores preços na Argentina e na Colômbia, bem como pelo resultado provindo da ALC – companhia que trabalha com cordeiros na Austrália adquirida em outubro do ano passado.

“Em nossa visão, o ritmo de ganhos deve começar a melhorar no segundo trimestre, impulsionado pela recuperação das exportações de carne bovina da América do Sul para a China (especialmente do Brasil, onde a disponibilidade de gado é ampla)”, falam os analistas do Santander, liderados por Rodrigo Almeida.

Companhia está otimista para restante do ano

A Minerva também vê o cenário melhorando para a sua operação até no restante de 2023.

“Com a recente retomada de exportações do Brasil para a China, a gente continua bastante confiante nas perspectivas e oportunidades desse mercado a partir do segundo e terceiro trimestres” falou Ticle.

Para além da China, os executivos enxergam que, cada vez mais, o frigorífico está menos dependente deste único país, com regiões como o Sudeste Asiático, por exemplo, ganhando espaço.

“Houve uma pressão sobre a matéria prima, olhando o que acontece nos Estados Unidos. Uma soma de fatores que tende, no mercado internacional, a nos deixar mais otimistas. A América do Sul deve tomar mais mercado”, mencionou o CFO. “Países do Sudeste asiático começaram a ter mais importância para nós. China é um importante destino, mas estamos vendo uma arbitragem de preços em outros locais”.

Para o mercado brasileiro, porém, a percepção não é a mesma. “Mercado brasileiro, por enquanto, não tem perspectiva de melhora. Inflação corroeu poder de compra e desemprego está aumentando. Apesar do ciclo positivo, com preço da arroba estável ou caindo até um pouco, a carne não vai ter muita força para subir no Brasil, seja por demanda ou por oferta”, explicou o CFO.

De qualquer forma, a Minerva vê os volumes crescendo dois dígitos em 2023, com impactos na receita, Ebitda e fluxo de caixa.

Apesar da alta das ações e da visão positiva, o Bradesco BBI apontou que gostaria de ter mais clareza sobre o consumo de caixa de R$ 853 milhões (versus R$ 173 milhões no ano passado).

“Dadas as condições de crédito restritivas, entendemos que os fornecedores (por exemplo, pecuaristas) podem enfrentar desafios para antecipar recebíveis com bancos, o que pode ter levado o Minerva a utilizar dinheiro para antecipar eles mesmos esses pagamentos”, avalia.

Essas condições resultaram em prazos de pagamento mais curtos, uma situação que não está clara quanto tempo vai durar, o que explica o consumo de caixa substancial.

Assim, embora a ação esteja sendo negociada abaixo da sua média histórica, o BBI segue com recomendação neutra, também cauteloso sobre o mercado chinês.