Mesmo com decepção este ano, otimismo com Ibovespa continua em 2011

Média das projeções coloca índice em 83.200 pontos no final do próximo ano, com Petro e siderúrgicas pressionando menos

Julia Ramos M. Leite

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SÃO PAULO – Até o fechamento do dia 28 de dezembro, os índices Dow Jones, Nasdaq e S&P 500 – os principais de Wall Street –, acumulavam ganhos de 11%, 17,35%, e 12,86% em 2010, nessa ordem. Na Europa, o alemão DAX 30 subia 17% no ano e, na América Latina, o argentino Merval somava alta de 50%.

Enquanto isso, o Ibovespa, principal índice da bolsa brasileira, registrava perdas de 0,80%, desempenho mais próximo ao Nikkei 225 (-2,41%) ou ao CAC 40 (-1,97%), da França – países cuja situação econômica em 2010, ou suas perspectivas, passam longe do avanço visto pela economia brasileira no ano. 

Mas o fato de o Ibovespa não ter atingido – ou chegado perto – das projeções para 2010 parece não desanimar os analistas. Mesmo com o índice ainda abaixo do patamar dos 70 mil pontos, a maior parte do mercado ainda vê o Ibovespa acima dos 80 mil pontos em dezembro de 2011, em projeções semelhantes às feitas no final de 2009.

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Dando nome aos bois
Antes de avaliar as expectativas para o ano que vem, é importante entender o que segurou o índice em 2010, mantendo-o longe dos patamares estimados. “Nenhum argumento é suficiente”, resume Mario Felisberto, diretor de investimentos da HSBC Global Asset Management.

“Os lucros das empresas subiram e o crescimento continuou, então é difícil dizer porque a bolsa não andou”, afirma. Ele tenta, contudo, dar algumas justificativas para o desempenho ruim da bolsa brasileira em meio a um cenário econômico tão positivo. Incertezas sobre o novo governo, o fato de que a bolsa subiu mais do que outras em 2009 e a pressão dos papéis da Petrobras (PETR3, PETR4) são algumas delas. Até o fechamento de terça-feira, as ações ON e PN da estatal acumulavam baixa de 26,66% e 24,75% no ano. 

Além da estatal, Rossano Oltramari, analista da XP Investimentos, lembra que o setor siderúrgico, que também tem grande peso no Ibovespa, foi outro que decepcionou no ano. Alguns exemplos são as ações da Usiminas (USIM3, USIM5) e da Gerdau (GGBR4), com quedas acumuladas de 16,27%, 24,80% e 23,03%, nessa ordem, até o fechamento do dia 28. Juntos, os três papéis correspondem a pouco mais de 5,7% do índice. O gráfico abaixo, retirado de um relatório da Ativa, mostra as variações do índice no ano – considerando sua composição normal e separando as partes de commodities e não commodities.

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Fonte: Ativa Corretora

Esses fatores, contudo, não devem exercer tanta pressão no Ibovespa em 2011. “A Petrobras, por exemplo, tem uma perspectiva muito positiva no curto e médio prazo – achamos que o papel pode performar bem já no primeiro semestre do ano que vem”, diz Oltramari, apostando na alta do petróleo e num noticiário mais tranquilo para a estatal após o fim da capitalização.

Grande parte dos analistas também resguardam expectativas otimistas para os papéis da estatal. O mesmo, contudo, não pode ser dito para as siderúrgicas. “No caso do setor siderúrgico, depende ainda dos números começarem a melhorar – o que vai acontecer, mas não temos esse timing ainda”, completa o analista da XP.

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“As siderúrgicas claramente ficaram para trás esse ano, tanto nos papéis quanto na performance econômica.Temos uma projeção de crescimento de lucro para as siderúrgicas, que é alta. Esperamos uma recuperação mais para frente, no segundo semestre”, diz Felisberto, da HSBC Global Asset.

Cenário externo não é animador, mas não atrapalha
Outro fator que não ajudou em 2010 foi o cenário global. Entre uma recuperação em marcha lenta nos EUA, a Europa cada vez mais afundada em problemas fiscais e a China dando sinais de arrefecimento, a incerteza prevaleceu no ano. Para 2011, contudo, a questão parece não ter muito peso sobre as projeções para o índice.

“O cenário externo faz parte, porque estamos num mercado globalizado, mas acho que cada vez mais os fundamentos da economia brasileira tendem a prevalecer”, explica Oltramari, da XP. “A Europa segue trazendo algumas preocupações, mas o pior já passou”.

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Felisberto, da HSBC Global Asset, tem opinião semelhante. “As políticas de estímulo estão funcionando e o consumo está em níveis decentes, o continente não vai entrar em recessão. O que preocupa – e deve seguir preocupando – são os países periféricos, mas quem precisar de ajuda a terá”, afirma. Ele destaca ainda que a contribuição europeia para o crescimento global é cada vez menor, e será compensada pelos emergentes.

Cabe dizer, contudo, que a avaliação de Felisberto e Oltramari sobre a Europa não é consenso. Clodoir Vieira, da Souza Barros, vê a crise por lá se agravando, com um risco de os países abandonarem a Zona do Euro.

A China também não aparece na lista de preocupações de Felisberto. “A desaceleração por lá deve ser ordenada, porque o governo tem um grau de intervenção muito grande e experiência nisso. O risco de algo dar errado é baixo”, aponta. Já os desenvolvidos seguirão sem conseguir caminhar com as próprias pernas.

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Expectativas em alta, impulsionadas por lucros
Assim, com o cenário externo aparentemente não tirando o sono dos analistas, sobram as questões internas. Rossano Oltramari, da XP, cita um descontrole inflacionário levando a uma alta do juro como principal questão nesse sentido – já a cobrança de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) para a renda variável é praticamente descartado pelo analista.

Mas a despeito dos riscos – externos ou internos – a perspectiva para a bolsa brasileira é positiva. O principal motivo para isso é a expectativa de crescimento dos lucros das empresas. A XP, por exemplo, estima que os ganhos das companhias acompanhadas pela corretora possam crescer entre 20% e 25% em relação a 2010.

Da mesma forma, tanto a Link quanto a Ativa também dão destaque às expectativas de lucros das empresas nacionais. A primeira aposta em um avanço de 29% dos ganhos das companhias que compõem o Ibovespa em 2011 e de 13% no ano seguinte. “[a alta dos lucros] é favorecida pela atual situação financeira das companhias, cujo ciclo de desalavancagem e realização de novos investimentos será beneficiado pelo menor custo de endividamento, permitindo a continuidade de crescimento nos próximos anos”, escreve a corretora.

A Ativa é ainda mais otimista: espera que as empresas que fazem parte do benchmark vejam seus ganhos avançarem 37% no próximo ano – no caso das ações de commodities, o número salta para 40%.

Mario Felisberto e Pedro Bastos, da HSBC Global Asset, frisam ainda que a bolsa brasileira é negociada atualmente com um múltiplo P/L (Preço/Lucro) descontado em relação aos demais emergentes, de 11 vezes para 11,7 vezes – desconto esse injustificado. “A bolsa brasileira devia ser negociada com prêmio – o risco-Brasil é mais baixo do que os emergentes em geral e, em termos institucionais, a qualidade dos reguladores, do sistema financeiro, também justificariam um prêmio, e isso não se traduz na precificação de bolsa adequada”, afirma Bastos. “Se a bolsa mantiver sua tendência dos últimos 15 anos, ela é atrativa”, diz Felisberto.

75, 80, 85, 90 ou 120 mil?
“Isso é difícil dizer”, despista Luiz Augusto Pacheco, da Omar Camargo, sobre um target para o Ibovespa. “Todo mundo que falou no começo do ano, no meio do ano e em novembro errou”, lembra.

 Confira as projeções para o Ibovespa em 2011
Instituição  Projeção (em pontos)*
Ativa 82 mil
Bradesco 86 mil
Fator 75 mil
Goldman Sachs 88 mil**
HSBC Global Asset 85 mil
Interbolsa De 82 mil a 84 mil
Itaú Corretora 87 mil
JPMorgan 122 mil (cenário otimista) 
84.500 (cenário conservador)
61.500 (cenário cauteloso)
LCA Acima de 90 mil***
Link 83 mil (normal)
85 mil (bottom up) 
Morgan Stanley 80 mil**
Prosper 79.200 (cenário referencial)
85 mil (cenário nicho Brasil) 
Santander 89 mil (normal)
95 mil (bottom up) 
Souza Barros 84.500 (cenário otimista)
81.500 (cenário conservador)
78.500 (cenário pessimista)
XP Acima de 85 mil
Média 83.200
Mediana 83 mil
Moda 83 mil

Apesar disso, muitos se arriscaram a dar palpites, que vão de 75 mil até impressionantes 122 mil pontos – implicando ganhos de cerca de 80% sobre o fechamento da última terça-feira (28). Essa avaliação foi feita em novembro por Ben Laidler, do JPMorgan, e leva em conta uma alta dos fluxos estrangeiros e remoção de fatores que pesaram sobre o índice em 2010, e se baseia em um cenário robusto dos fundamentos locais. 

A média das projeções compiladas pela InfoMoney, que incluem 15 bancos e casas de research, ficou em 83.200 pontos. Confira na tabela ao lado as apostas para a pontuação do Ibovespa em 2011.

Vale dizer ainda que algumas corretoras, como Santander e Link, também fazem projeções “bottom up” para o índice – ou seja, considerando os preços justos calculados para as ações que compõem o benchmark. Nessas avaliações, o target do Ibovespa sobe – no caso do Santander, a projeção fica em 95 mil pontos; na Link, a variação frente à projeção tradicional é menor, ficando em 85 mil pontos.

Há também quem trace diversos cenários para o índice no ano. A Prosper, por exemplo, tem um “cenário referencial”, em que o Ibovespa atinge 79.200 pontos recompondo ganhos, mantendo a elasticidade histórica em relação ao custo de oportunidade da taxa de juros; no front macro, o cenário considera uma elevação da taxa Selic para 12,25% ou 12,50% ao ano até dezembro e a Europa ainda passando por um momento adverso.

Já no caso do cenário “nicho Brasil”, o Ibovespa chegaria a 85 mil pontos, em meio a uma melhora na economia dos EUA e da Europa, trazendo ao índice “uma elasticidade mais elevada característica de períodos com crescimento econômico real do PIB igual ou superior ao potencial”.

Uma visão mais pessimista
Apesar do otimismo ser o consenso, há também os analistas que não pintam um céu de brigadeiro para as bolsas em 2011. Caso, por exemplo, de Lika Takahashi, da Fator Corretora. Lika dá o tom de sua análise logo na abertura do relatório, com uma frase do extinto sitcom Seinfeld: “não é mentira se você acredita”.

“A demanda por ativos de risco não tem sido motivada por perspectivas de retornos altos incomuns, mas sim pelo fato do Fed tornar o caixa tão ‘feio’ que investidores se sentem forçados a tomar risco a despeito dos valuations elevados”, diz Lika em relatório.

“Os próximos meses ainda poderão ser interessantes, pois é bastante possível que os ativos de risco continuem a subir, pois muitos querem, ou precisam, surfar a onda do QE na expectativa de que terão habilidade para sair a tempo ou que, no meio tempo, as políticas de ações darão certas. Da forma que eu vejo, investidores enfrentam dois riscos principais: o de perder dinheiro e o de perder o momento. O dilema é concluir se há escolha a não ser fazer parte do comportamento perigoso”.

Apesar de reconhecer que há motivos para otimismo com os emergentes, Lika alerta que um descolamento dessas economias não deve estar na lista de expectativas dos investidores, pois “não há período onde as bolsas dos países desenvolvidos caíram muito e as dos emergentes subiram muito”.

Além disso, mesmo com uma visão majoritariamente positiva sobre a bolsa, alguns analistas também ressaltam que a volatilidade ainda deve continuar em 2011. “Taxas de juro zero, QE2, guerra cambial e altos índices de correlação entre as classes de ativos devem trazer volatilidade”, diz Ben Laidler, do JPMorgan.

Onde ir
Mesmo com todo o otimismo para o Ibovespa, “o foco deve ser em setores dentro de países, e não só em países”, ressalta o
JPMorgan. O banco tem recomendação neutra em companhias de materiais e consumo, overweight no setor financeiro e underweight no segmento de petróleo e gás.

“Recomendamos nomes domésticos e foco em financeiras e construtoras – as preferidas são Bradesco (BBDC4) e PDG (PDGR3)”, diz o JPMorgan, que aponta também Vale (VALE3, VALE5) e OGX Petróleo (OGXP3) entre suas favoritas.

A Link, por sua vez, aposta nos bancos, concessionárias de rodovias e empresas de geração de energia elétrica como veículos para se aproveitar do crescimento do País. Esse último setor ganha recomendação underweight do Goldman Sachs.

Já Pedro Bastos, da HSBC Global Asset, espera que o setor de infraestrutura se destaque em 2011. “As grandes construtoras não estão na bolsa, não têm grandes projetos sendo negociados”, diz.

Por fim, Lika Takahashi, da Fator, aponta sua preferência por bancos (Itaú Unibanco, ITUB4, é o favorito), logística (Log-In, LOGN3, Santos Brasil, STBP11, e Wilson Sons, WSON11), bebidas (AmBev, AMBV4), energia elétrica (Copel, CPLE6, Light, LIGT3, e Cemig, CMIG4) e Telecom (Vivo, VIVO4, Telesp, TLPP4, Contax, CTAX4, e as ações ordinárias da Oi, TNLP3). A analista também vê boas opções de investimento no setor de construção civil, especialmente na PDG.

Onde não ir
Já os bens de consumo, segundo o JPMorgan, não estão em seu melhor ponto de entrada – visão essa compartilhada por grande parte dos analistas. César Medina e Guilherme Paiva, do Morgan Stanley, destacam três fatores que tornam o cenário mais complicado para as empresas ligadas ao consumo nacional: o gap de produção, com o desemprego em baixa e a utilização da capacidade industrial próxima de sua máxima histórica; a aceleração da inflação e a precificação de uma alta na taxa Selic no mercado de juros futuros; e a pausa no aperto monetário até 2011, sinalizado pelo Banco Central.

O Goldman Sachs também vê valuations esticados como um problema para as ações de consumo e varejo, apesar de ainda recomendar nomes expostos à economia doméstica – setores que, projeta o banco, tenham um rali até a metade de 2011.

“Hoje, temos uma questão de precificação – quanto esses setores estão atrativos?”, diz Mario Felisberto, da HSBC Global Asset, sobre os setores ligados à economia doméstica. “ Nos parece que estão relativamente caros, mesmo com perspectivas otimistas para a economia e lucros”.

Engrossando o coro, a Link afirma que o valuation das empresas voltadas ao mercado doméstico já incorpora uma parte significativa deste crescimento esperado para o País, “seja na atual cotação de suas ações, ou na expectativa futura de crescimento”.

“Entendemos que a decisão de ‘comprar’ Brasil pelas empresas de consumo e varejo não será tão simples, pois além de não serem todos os players deste mercado que entregarão o prometido, o setor negocia com um elevado múltiplo projetado para os próximos anos”, completa a corretora.

E as commodities?
No caso das ações de commodities, a perspectiva do HSBC também é positiva, com base no crescimento global e no avanço dos emergentes. “A China, por exemplo, tem um crescimento intensivo em demanda de commodities, então a elasticidade que o crescimento chinês gera em termos de demanda de commodity é alta”, frisa Felisberto. A isso, some-se uma política monetária frouxa, taxas de juro baixas e queda do dólar – “não parece ter muito jogando contra as commodities”, completa.

A Link também espera que as companhias ligadas às matérias-primas ajudem o Ibovespa no ano, assim como o Goldman Sachs, que destaca sua preferência por minério de ferro, petróleo e papel e celulose. “Os preços devem ser sustentados por uma oferta restrita, demanda forte dos emergentes e QE2 elevando o valor das commodities, já que são medidos em dólares”, diz o banco. O Morgan Stanley também aposta nas produtoras de commodities, vendo valuations baratos.

Já Lika Takahashi não vê as empresas de commodities como as melhores apostas do ano, apesar de afirmar que gosta de Petrobras. “Parte graças ao crescimento robusto das economias emergentes, e parte ao QE, a pior queda da economia mundial desde a Grande Depressão não fez nada para mudar os argumentos favoráveis às commodities. Entretanto, a recuperação global continuará lenta e o aumento de preços de alguns produtos em 2010, como os petroquímicos, foi determinado por fechamento de capacidade, ou problemas climáticos no caso dos alimentos”, escreve em relatório.

IPOs e estrangeiros de volta
A HSBC Global Asset Management também acredita que 2011 pode ser um ano marcado pela volta dos IPOs (Initial Public Offerings) ao mercado brasileiro. “Teve um período mais eufórico, que acabou trazendo algumas experiências um pouco negativas aos investidores, e agora o mercado ficou mais seletivo”, explica Mario Felisberto.

Pedro Bastos afirma que essas ofertas de ações não devem vir de nenhum setor específico, mas aponta que a participação dos investidores brasileiros deve aumentar. “Estamos falando de empresas menores, então o mercado vai depender mais desse investidor local, da migração dos fundos para a renda variável”, ressalta.

A Link, por sua vez, destaca a expectativa de que o fluxo de investimento estrangeiro na bolsa brasileira se recupere ao longo de 2011 – consequência da retomada das aberturas de capital e também da perspectiva positiva para a economia doméstica.

“Ainda deverá contribuir para isso a redução da percepção de risco dos investidores, com a potencial estabilização da situação financeira dos bancos na Europa”afirma a corretora. “Com as grandes capitalizações e a eleição para trás, o fluxo de capital para as empresas brasileiras deve ganhar força em 2011”, completa o JPMorgan.