“Melhor dos dois mundos” ou operação complexa? As oportunidades e desafios com a aquisição da Linx pela Stone

Analistas destacam que há grandes oportunidades de sinergia, mas também ressaltam grandes desafios de integração

Lara Rizério

Stone (Foto: Divulgação)

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SÃO PAULO – Depois de uma forte disparada das ações, a Stone anunciou na noite da última terça-feira (11) um acordo para a combinação de negócios com a Linx (LINX3), avaliando a empresa de software de varejo em cerca de R$ 6 bilhões.

A operação envolverá 90% do pagamento em dinheiro e 10% em ações, com a Stone emitindo US$ 1 bilhão em ações para financiamento da compra.

A visão dos analistas de mercado sobre o negócio, que unirá a empresa de software de gestão para varejo com a adquirente (que já estava em busca entrar outras soluções aos lojistas), é bastante positiva. Isso, inclusive, impulsionou os papéis de ambas as companhias na sessão da véspera (vale destacar a disparada de 31,5% dos ativos LINX3), dado o potencial de grandes sinergias entre as companhias.

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O Morgan Stanley, por exemplo, destaca o potencial de novos clientes para a Stone, além de novas soluções em software. “A Linx opera uma das mais bem sucedidas plataforma de software para varejo no Brasil, com uma participação de mercado de mais de 40%”, reforçaram os analistas do banco americano. Assim, a fusão pode acelerar o crescimento das duas empresas, ampliando o oferecimento de serviços digitais, que teve a expansão acelerada durante a pandemia.

Assim, ao adquirir a Linx, a Stone estabelecerá um ponto de contato com boa parte do setor de varejo do Brasil. A base de clientes da Linx é composta por 70 mil varejistas que a Stone pode usar para prestar serviços, além de adaptar e estender as soluções para a sua própria base de clientes e distribuição de software de forma mais eficaz.

Por outro lado, os desafios da união e a alta já expressiva dos papéis fazem com que o mercado também tenha cautela sobre quão atrativos estão os ativos após a operação.

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Conforme destaca o Credit Suisse, o preço da oferta pela Linx é atrativo para a Stone, ficando próximo ao preço-alvo estabelecido pelos analistas do banco de R$ 32, o que não reflete totalmente o valor das iniciativas ainda em estágio inicial nas frentes de banking, pagamentos e e-commerce. Além disso, o valor “não reflete, definitivamente, as potenciais sinergias de tal fusão”, ressaltam Daniel Federle e Felipe Cheng em relatório que chamou a operação de “combinação do melhor dos dois mundos” por conta da associação das empresas nas áreas de software e pagamentos.

Em relação à aprovação da oferta, os analistas esperam que não haja restrições do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e seja facilmente aprovada pelos acionistas da Stone. Contudo, avaliam, embora esse não seja o caso-base, há algum espaço para alguma surpresa em relação à aprovação dos acionistas da Linx – os fundadores que têm uma participação de 15% na companhia já afirmaram que irão aprovar – e a uma oferta competitiva potencial de um dos concorrentes da Stone.

Cabe ressaltar que, se a transação não for concluída, a Stone deverá pagar à Linx multa compensatória de R$ 605 milhões, “caso a aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para a operação não seja obtida”. Contudo, se a Linx realizar uma operação concorrente caso um terceiro que apresente uma oferta melhor, terá de pagar à Stone multa equivalente. Se a assembleia da Linx não aprovar o negócio, a empresa terá que pagar 25% da multa para a Stone.

Com relação ao preço das ações, os analistas apontam que, ao preço do negócio, a ação Linx esta negociando a 69 vezes a relação entre o preço e o lucro esperado para 2021, um prêmio em relação ao múltiplo de 46 vezes da Stone, apesar do crescimento de receita muito menor da Linx.

Apesar disso, os analistas avaliam que esse é um prêmio justo, já que não se espera que a Linx enfrente qualquer disrupção em seu modelo de negócios, enquanto a Stone provavelmente terá que lidar com uma profunda transformação no setor de pagamentos nos próximos anos. Além disso, as margens da Linx estão sendo pressionadas por investimentos em novos produtos que ainda vão contribuir pouco em 2021.

Os analistas avaliam que, embora sinergias de custo sejam esperadas, a maior parte dos ganhos deve vir de cross-selling – prática de vender um produto ou serviço adicional a um cliente existente. Eles estimam também que a venda de pagamentos para 100% (cenário irreal, na visão deles) dos clientes da Linx adicionaria aproximadamente R$ 1,5 bilhão em receitas. “Uma boa conversão pode tornar a ação da Stone atrativa”, apontam os analistas, que possuem recomendação equivalente à neutra para as duas companhias.

Desafios no radar

Por outro lado, o  Bradesco BBI considera que o negócio anunciado já foi “precificado pelos papéis a perfeição” e não reflete os desafios que se colocam à frente, reduzindo assim a recomendação para os ativos da Stone negociados na Nasdaq de “neutro” para “underperform” (desempenho abaixo da média do mercado).

“A aquisição da Linx aumenta a exposição da Stone aos negócios mais complexos de ERP [Enterprise Resource Planning, ou sistema de gestão integrado], enquanto a empresa ainda trabalha para entregar mais na frente ABC (adquirência, banking e crédito)”, destacaram, em relatório, Fred Mendes, Cristian Faria e Gustavo Tiseo, analistas do banco.

O trio de analistas ressalta que a Linx possui alto valor estratégico, considerando que possui aproximadamente 45 mil clientes no segmento de varejo, com uma participação de mercado de aproximadamente 43%. “Embora seu negócio principal tenha enfrentado alguns desafios nos últimos trimestres, especialmente em relação ao crescimento, a base de clientes da empresa oferece uma oportunidade atraente para monetização, além de apenas a receita de software”, apontam, ressaltando que a operação poderia ajudar nessa monetização de sua base por meio de um produto de pagamentos ou mesmo outras possibilidades.

Eles lembram que, em outubro de 2018, a Linx lançou o Linx Pay, que inicialmente fazia muito sentido. Mas, desde então, a monetização deste produto ficou aquém das expectativas dos analistas e, com a combinação dos negócios, essa frente poderia ganhar força, especialmente no que diz respeito à distribuição, que está entre os principais pontos fortes de Stone.

Para a Stone, o negócio também é visto como promissor de uma perspectiva tecnológica, sendo uma oportunidade para alavancar a capacidade instalada da Linx e expandir ainda mais seus negócios de pagamento. “Um fator chave é a baixa rotatividade estrutural de um software de negócios. Além disso, [a união das companhias] deve ajudar Stone a criar maior ‘aderência’ com os clientes na comparação com  uma empresa adquirente”, afirmam.

Contudo, entre outros desafios pela frente, os analistas ressaltam que, nos últimos anos, o cross-selling tem sido o principal impulsionador do crescimento orgânico recorrente, mas vem registrando uma desaceleração significativa neste produto nos últimos trimestres. “A cultura das duas empresas parece ser bem diferente e uma integração pode ser um desafio. Finalmente, o negócio de software será relativamente pequeno (cerca de 23% da empresa consolidada), com menores oportunidades de crescimento”, afirmam.

Em conclusão, os analistas do BBI ressaltam que a Stone anunciou um ótimo acordo – mas para a Linx: “embora acreditemos que a Stone deva continuar expandindo a sua rede de distribuição de alto nível e atendimento ao cliente de maior qualidade, a aquisição da Linx adiciona mais perguntas do que respostas a um case de investimento que já depende fortemente de opcionalidades. Como vemos a Stone bem posicionada no segmento de pequenas e médias empresas, preferiríamos ver uma atuação mais forte vinda da frente financeira do que de ERP”.

Eles reforçam que, nos últimos anos, a Stone tem investido em alguns segmentos-chave de software, sendo parte dos esforços da adquirente para criar uma plataforma de serviço mais integrada, que deve ajudar a reduzir o churn (índice de cancelamento de clientes).

“Embora sempre tenhamos acolhido bem essa abordagem, fomos consideravelmente mais construtivos em relação às iniciativas na chamada frente ABC. Além disso, pensamos que parcerias e não aquisições seriam o caminho a percorrer, criando uma plataforma aberta para que os lojistas acessassem uma variedade de serviços oferecidos por terceiros e distribuídos pela Stone”, avaliam.

Segundo eles, agora, com a Linx, esse pode ser exatamente o discurso (de criação de plataforma): “notamos, infelizmente, que a integração de software de pagamento e ERP tende a não ser uma tarefa fácil – já que nenhuma integração de software normalmente é. Nesse sentido, a Stone está intensificando seu foco na integração de software e implantação de ERP, da mesma forma que a competição com plataformas abertas pode se intensificar (por exemplo, Magalu, Mercado Livre e Lojas Americanas), principalmente no escopo do PIX [novo sistema de pagamentos instantâneos instituído pelo Banco Central]”.

Sobre o PIX, durante teleconferência com o mercado, a Stone ressaltou que está bem posicionada para oferecer soluções de pagamentos simplificados aos comerciantes, já que poderão vincular suas contas digitais diretamente à infraestrutura do Banco Central (SPI) e permitir transações no e-commerce.

Além disso, Thiago Piau, presidente da Stone, avaliou que a Linx acelera a estratégia da Stone de se tornar um “one stop shop” para os comerciantes de todos os tamanhos, com a combinação dos ativos e capacidades tecnológicas deixando-as bem posicionadas para capturar a revolução que está acontecendo atualmente no comércio digital no Brasil. Ele ainda reforçou que nem toda a sinergia da fusão será capturada no próximo ano, mas que o negócio já deve contribuir com o lucro da companhia.

Assim, apesar da avaliação positiva – com algumas ressalvas – sobre o negócio, o processo de integração será acompanhado de perto pelos investidores, ainda mais levando em conta a forte alta da véspera de ambas as ações. Isso se reflete nas recomendações para os papéis das companhias: as 8 casas de análise que cobrem a Linx possuem recomendação equivalente à neutra para os ativos, segundo compilação feita pela Bloomberg. A divisão é maior no caso da Stone: 7 recomendam compra, 6 manutenção e 2 casas recomendam venda.

Por enquanto, na avaliação dos analistas, o negócio já está precificado – porém, se as sinergias se acelerarem ou surpreenderem o mercado, este pode ser um bom catalisador para os ativos.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.