Maquininhas em apuros? Regra do Senado prejudicaria o setor, diz Morgan

Para o Morgan Stanley, mudança na data de pagamento ao lojista seria prejudicial, mas é pouco provável

Paula Zogbi

(Divulgação)

Publicidade

SÃO PAULO – Em meio à “guerra das maquininhas”, o Itaú anunciou, em julho, um terminal de pagamentos que chacoalhou o mercado principalmente por uma característica inédita: o pagamento aos lojistas apenas 2 dias após o processamento da compra (D+2) – vantagem impressionante frente à média de 30 dias praticada pelo mercado. Agora, vêm tomando as rodas de conversa sobre o setor os rumores de que o país pode fazer deste processamento de 2 dias, padrão em outros países, uma regra a ser cumprida por todas as adquirentes.

Não é sem fundamento esta conversa: em julho, a CPI dos cartões de crédito publicou, entre as sugestões para o BC, a redução imediata de 30 para 15 dias no período de pagamento, com meta de corte a D+2 para os próximos 18 meses. Este documento tem caráter sugestivo, e não mandatório.

Sobre esta possibilidade, o Morgan Stanley publicou um relatório completamente cético no último domingo (19). Resumidamente, o banco acha extremamente improvável que o Banco Central regule o mercado de pagamentos neste sentido, por uma série de razões especificadas no texto.

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Competição

Primeiramente, os analistas veem a possibilidade de corte no período de pagamento como prejudicial à competição no mercado, o que contradiria a ação do BC em tempos recentes. “Todas as medidas regulatórias que vimos nos últimos cinco anos focaram em nivelar o tabuleiro para que os novos e menores adquirentes possam operar no Brasil”, relembram os analistas do banco.

Em março deste ano, o Banco Central definiu a diminuição da tarifa paga por credenciadoras aos bancos. De 0,82% por transação, a chamada taxa de intercâmbio média ficou limitada a 0,50%. Já a taxa máxima, antes ilimitada, e com média de 1,12%, recebeu teto de 0,80%. A medida teve intenção principal de estimular o uso do débito, mas é uma das que facilitam a entrada de novos players no mercado.

O motivo desta busca por novos players é simples: atualmente, apenas duas megaempresas (Cielo e Rede) correspondem a aproximadamente 80% do mercado. Apenas há pouco tempo novidades como a PagSeguro, a Stone e a Getnet (comprada pelo Santander) começaram a ganhar público, iniciando uma penetração maior em um mercado ainda incipiente. “Qualquer medida que reduza a capacidade de competir das das pequenas empresas pode resultar em menor competição. Isso pode ir contra o que temos visto o regulador fazer em anos recentes”, escreve o Morgan.

Continua depois da publicidade

Consumidor e inclusão financeira

Além de prejudicial à competitividade, o Morgan vê a possibilidade de diminuição do período de pagamento como potencialmente negativa para o consumidor. Isso “porque o período de 30 dias e as compras livres de juros para parcelamento estão interconectados”, já que “os bancos financiam parcialmente as compras livres de juros com o fluxo de 30 dias que possuem em todos os cartões de crédito”.

Vale lembrar que as compras parceladas em cartão de crédito no Brasil corresponderam, nos últimos 12 meses, a R$ 800 bilhões – aproximadamente 77% de todo o valor gerado em vendas no cartão de crédito. Acrescentar juros a estas operações seria claramente prejudicial ao consumidor final.

Dissuadir o consumo utilizando cartões, alíás, é a última coisa que o BC quer. Desde 2010, as mudanças realizadas pelo governo e Banco Central na indústria de pagamentos têm como objetivo promover a inclusão financeira via pagamento com cartões. Além do estímulo a favor do pagamento em débito já mencionado, o regulador estuda eliminar o limite para o pagamento no débito (hoje de R$ 5 mil), por exemplo. Em março, passou a ser obrigatório que maquininhas de cartões aceitem todas as bandeiras do mercado. Também foi implantada recentemente uma tarifa fixa para pagamentos recorrentes, como a taxa de condomínio, em dinheiro. 

“E no que diz respeito à inclusão financeira, a PagSeguro certamente se destaca”, escreve o Morgan. “A maioria de seus clientes não aceitavam cartões anteriormente. Achamos difícil acreditar na noção que o regulador poderia prejudicar a sustentabilidade da PagSeguro (e outros competidores similares) nesse estágio inicial de inclusão financeira no Brasil”, conclui.

Comerciante

Do outro lado da história, os analistas acreditam que os comerciantes sofrem pouco impacto com a demora de 30 dias para receber os pagamentos de suas vendas. Cerca de 15% do valor total em consumo no Brasil é feito em cartões de crédito, e apenas algumas grandes empresas, como companhias aéreas, têm a maior parte de suas vendas neste formato. Para os menores, a representação do crédito fica entre 5% e 10% das vendas totais.  

“É por isso que o Banco Central não lida com milhões de comerciantes fazendo lobby para um prazo mais curto de pagamento; isso reduz a pressão para agir”, escreve o Morgan. Ainda que grandes empresas reclamem – o que levou à recomendação do Senado para diminuição do prazo -, o banco acredita que ainda demorem cerca de 10 anos para chegar ao ponto em que a penetração dos cartões de crédito seja tão grande que o pagamento em D+30 signifique desvantagem a pequenos comerciantes.  

O Morgan trabalha com com preço-alvo de R$ 27,50 em 2018 para a ação da Cielo (CIEL3). Já para a PagSeguro, listada na bolsa de Nova York, o banco assume preço-alvo de US$ 38

Quer investir melhor o seu dinheiro? Abra uma conta na XP.

Paula Zogbi

Analista de conteúdo da Rico Investimentos, ex-editora de finanças do InfoMoney