Lojas Americanas em forte baixa, B2W em alta: o que explica o desempenho das ações após o anúncio da fusão?

Analistas avaliam que fusão faz todo sentido, mas se surpreenderam com estrutura da operação para manter 3G como controladora, o que explica movimento

Lara Rizério Priscila Yazbek

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SÃO PAULO – Em busca de uma integração maior entre as lojas físicas e virtuais e do conceito cada vez mais valorizado de multicanalidade em suas operações, a Lojas Americanas (LAME4) e a B2W (BTOW3) anunciaram em 19 de fevereiro o início dos estudos para a fusão entre as companhias.

Dessa forma, o anúncio da véspera de que as companhias acertaram o processo de fusão não foi exatamente uma surpresa. Mas os termos da operação, sim.

Isso porque, em vez de se tornar uma “corporation”, ou seja, uma companhia com capital difuso, sem controle definido (e que, do ponto de vista da governança, é considerada mais independente), a Lojas Americanas seguirá sendo uma companhia com dono.

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Ou seja, o famoso trio de acionistas de referência da 3G Capital, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, não deixará de ter o controle após a fusão das companhias. A operação complexa para manter esse controle, aliás, é um dos motivos de ressalva de analistas – e que também leva a uma forte disparidade do desempenho dos ativos envolvidos na sessão desta quinta-feira (29).

A mudança na estrutura acontecerá da seguinte forma: a Americanas fará a cisão de suas 1.700 lojas físicas e da fatia na Ame Digital. O valor dessa parcela cindida vale, pelo menos, R$ 6,27 bilhões.

Essas operações serão vendidas para a B2W, que será chamada posteriormente de Americanas, cujas ações serão negociadas com o ticker AMER3. A Lojas Americanas, mesmo sem os ativos, seguirá sendo negociada na B3 com os tickers LAME3 e LAME4, sendo um “veículo de investimento” dos acionistas.

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Os acionistas de Lojas Americanas vão manter suas ações e ainda receberão 0,18 ação da AMER3 para cada ativo LAME3 e/ou LAME4 que possuírem. Com isso, a B2W vai emitir 339.355.391 ações ordinárias para os acionistas da Lojas Americanas.

Com as operações, a fatia da Lojas Americanas na “ex-B2W” passará, então, dos atuais 62,5% para 38,94%. Confira na imagem abaixo as mudanças na estrutura acionária das corporações:

Elaboração: Bradesco BBI

Desconto de holding X controlada

Analistas de mercado destacam a transação, da forma como está desenhada, como complexa, ainda que positiva para a companhia como um todo. Vale ressaltar que, após os termos revelados da operação, os ativos registram um movimento diametralmente oposto na sessão desta quinta-feira: enquanto BTOW3 dispara, a sessão é de queda para os ativos LAME3 e LAME4. O papel BTOW3 saltou 7,69%, a R$ 68,33, enquanto LAME3 teve baixa de 2,74% (R$ 20,27) e LAME4 fechou com queda de 5,17% (R$ 21,46).

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O movimento é explicado por conta do desconto de holding que a Lojas Americanas passará a ter, como ocorre com algumas empresas listadas na Bolsa como Vale (VALE3) e Bradespar (BRAP4) ou Itaú (ITUB4) e Itaúsa (ITSA4). Historicamente, o desconto histórico de uma controladora frente a uma controlada é de 20% na Bolsa, uma vez que uma holding envolve despesas administrativas, impostos, o que explica a diferença.

André Machado, fundador do projeto Os 10% Escola de Traders, destaca que, ao virar uma holding os investidores passam a enxergar menos valor para os papéis da Lojas Americanas do que nos moldes atuais.

Além disso, ele afirma que a queda nas ações pode ser decorrente da percepção de que as mudanças podem gerar uma diluição da participação de minoritários com a emissão de ações. “A empresa combinada pode até dar mais lucro, mas se a participação do minoritário for diluída, isso não quer dizer que ele vai ganhar mais dinheiro”, diz. “E mesmo que a nova empresa tenha um desempenho melhor, ainda assim pode não ser tão boa quanto Magalu, por exemplo. B2W e Americanas são empresas que vêm patinando há duas décadas, ainda há muita incerteza no cenário”, avalia.

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Felipe Leão, especialista em renda variável da Valor Investimentos, acrescenta que a nova versão da Lojas Americanas (ativos LAME3 e LAME4) não agradou os investidores não só pelo desconto que a empresa passa a ter ao virar holding, mas pelo fato de ser uma holding de um só ativo. “A Lojas Americanas  passará a ser um veículo de investimento a partir da fase dois do processo, e na conferência da empresa, mais cedo, foi descartada qualquer chance de que ela seja utilizada como guarda-chuva para outros investimentos na América Latina”, afirma.

Motivos para a fusão e próximas etapas

A Levante Ideias de Investimentos, por sua vez, tem expectativa de um bom desempenho no curto prazo para as ações LAME3/LAME4 e BTOW3 por conta da fusão. Mas há diferenças para o desempenho desses ativos, segundo os analistas.

As ações PN das Lojas Americanas têm prêmio de 9% em relação ao preço das ações ON (levando em conta o fechamento da véspera) e a expectativa é de que essa diferença deva diminuir bastante. Nesta quinta, ainda que as duas classes de ações estejam caindo, LAME3 registra uma queda menos expressiva.

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Já no caso da B2W, a expectativa era de um impacto positivo, mas sendo compensado em parte pela diluição dos atuais acionistas. Por outro lado, em termos positivos, quatro pontos estão no radar: i) sinergias da operação unificada (LAME+B2W); ii) aproveitamento dos prejuízos fiscais acumulados de R$ 2,4 bilhões de reais; iii) maior agilidade no crescimento através das aquisições e; iv) listagem da holding (LAME) na bolsa dos EUA.

A expectativa também é de que, com a criação da AMER3, além de haver uma redução da complexidade tributária, haja uma análise mais positiva para os ativos da companhia uma vez que as operações serão melhores precificadas, tornando a empresa mais comparável aos seus pares.

“Em termos operacionais, a fusão faz total sentido, com as companhias envolvidas realizando um movimento já consolidado pela Magazine Luiza (MGLU3) e recentemente completada também pela Via (VVAR3) que é a integração completa da operação física com a digital, o chamado omnichannel”, avalia a Levante.

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A operação também complementa o processo de reformulação do portfólio de atuação da Americanas, após a parceria com a BR Distribuidora (BRDT3) com a utilização do AME Digital na rede de postos, além da aquisição recente da Uni.Co, dona da Puxet e Imaginarium.

Os anúncios recentes permitirão um reforço no desenvolvimento de marcas próprias, além de entrar na frente de franquias e aproveitar para ampliar o sortimento de produtos oferecidos pela rede, agregando valor aos clientes e à empresa, destacam os analistas.

Próximos passos

Com relação aos próximos passos, na primeira etapa, a expectativa é de que a incorporação da Americanas pela B2W seja feita em um prazo de 40 dias.

Em seguida, em paralelo ao processo de reestruturação, acontece a listagem nos EUA, mas ainda não está definido se a empresa abriria capital na Nasdaq ou na NYSE (New York Stock Exchange). Esta empresa listada, a ser chamada de “Americanas Inc” teria participação direta na nova companhia formada a partir da união das operações de Lojas Americanas e B2W.

Segundo as empresas, é cedo para avaliar qual seria a estrutura jurídica a ser adotada para essa eventual nova reorganização do grupo. Porém, em apresentação ao mercado, as empresas estimam que a criação da Americanas Inc e a listagem poderia ocorrer já “no início de 2022”. O objetivo da eventual listagem nos EUA seria aumentar fontes de financiamento, reduzir custo de capital e elevar a liquidez das ações, segundo fato relevante das companhias.

“O fato de que levará apenas 40 dias para concluir a primeira etapa do processo – a combinação completa dos ativos operacionais de ambas as empresas – é positivo, pois permitirá que os negócios operem com mais eficiência em breve”, avaliam os analistas do Bradesco BBI, que acrescentam que a velocidade é importante porque, apesar de ambas as empresas estarem trabalhando cada vez mais juntas nos últimos anos, há atritos em alguns pontos, o que leva a ineficiências na execução e tomada de decisões mais lentas.

Para eles, as mudanças farão da B2W um concorrente mais forte, pressionando seus pares de comércio eletrônico. Enquanto isso, a segunda etapa – uma listagem nos Estados Unidos – foi inesperada, mas os analistas veem sentido, visto que o comércio eletrônico está em destaque globalmente.

“Achamos que há espaço para as ações apresentarem desempenho superior no curto prazo, visto que tanto Lojas Americanas quanto B2W estão negociando a múltiplos abaixo de suas médias históricas, apesar das oportunidades oferecidas pela fusão e o forte início de ano na B2W”, avaliam.

Dito isso, os analistas afirmam continuam preocupados com a competição entre as principais plataformas de comércio eletrônico. Para o banco, o anúncio da B2W e as metas agressivas da Via (ex-Via Varejo) apresentadas na segunda-feira reforçam a visão de uma luta mais dura e direta por participação de mercado. Assim, a recomendação do banco para os ativos BTOW3 e LAME4 é neutra.

A fusão entre B2W e Lojas Americanas foi, a princípio, bem vista pelos analistas com a busca de mais eficiência e sinergias, contudo, a estrutura da operação não agradou. Somado ao cenário de maior concorrência, ainda há cautela sobre o quão bem-sucedida será a operação.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.