JBS (JBSS3), Marfrig (MRFG3) e Minerva (BEEF3): Mudança de ciclos e China pesam sobre resultados no quarto trimestre

Preço do gado mais caro nos EUA pressiona margens dos frigoríficos mais expostos ao país

Vitor Azevedo

(Shutterstock)

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O quarto trimestre de 2022 não foi positivo para os frigoríficos brasileiros. Os resultados e as teleconferências da JBS (JBSS3), da Marfrig (MRFG3) e da Minerva (BEEF3) trouxeram algumas coisas em comum, como falas sobre as mudanças de ciclos e sobre a política de Covid Zero na China, mas o destaque pode ter ficado para as reações ruins das ações nos pregões seguinte aos resultados, ainda que algumas tenham encerrado as sessões longe das mínimas do dia.

Os papéis ordinários da JBS, por exemplo, caíram mais de 5% após a divulgação do balanço na mínima da sessão, mas fechando em baixa de cerca de 3%. Os da Marfrig e da Minerva, nas mínimas dos dias que sucederam a publicação, recuaram, respectivamente, 6,85% e 8,05%. Contudo, os papéis MRFG3 viraram e fecharam com ganhos de cerca de 1% a sessão pós-balanço, enquanto BEEF3 fechou o dia pós-resultado com baixa de cerca de 2%. 

“Os resultados do setor de frigoríficos foram ruins de forma geral, principalmente nas empresas de carne vermelha, como JBS, Marfrig e Minerva”, diz  Fernando Siqueira, head de research da Guide Investimentos. “O que tem acontecido é que o ciclo de gado está entrando em um momento pior nos Estados Unidos. Há menor oferta de rebanho, o preço da cabeça é maior e a margem das companhias cai. Isso ficou muito evidente no resultado da JBS, a margem caiu quase pela metade na comparação ano a ano”.

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A mudança do ciclo do gado é um movimento natural que se dá de tempos em tempos. Quando o preço da arroba do boi está alto, produtores rurais tendem a aumentar sua produção, tentando surfar o momento. Isso, porém, leva a uma oferta muito alta  e o produto acaba perdendo valor. É quando começa o movimento inverso, de corte da produção, de busca de preços melhores.

Neste momento, os Estados Unidos têm pouco gado disponível e os preços estão elevados.

O maior frigorífico do Brasil tem nos EUA a JBS Beef North America, responsável por 30% do seu faturamento no quarto trimestre, ou R$ 28,6 bilhões. A margem de lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) deste braço saiu de 21,7% entre outubro e dezembro de 2021 para 3,6% nos últimos três meses de 2022.

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Somando a Pilgrim’s Pride e a JBS USA Pork, o peso do país norte-americano no resultado da JBS é ainda maior, de mais de 60% – e as margens recuaram em todas essas frentes.

“A JBS teve seu resultado pressionado no quarto trimestre e no consolidado do ano. A companhia tem exposição alta aos Estados Unidos. Por lá, há um corte na oferta de gado, por conta do ciclo e de um cenário climático”, comenta Victor Bueno, sócio e analista da Nord Research. “Para a Marfrig, o cenário é parecido. A companhia também tem operação forte nos Estados Unidos”, completa Bueno.

Segundo o balanço deste último frigorífico, da sua receita líquida consolidada de R$ 37,3 bilhões, R$ 16,05 bilhões vieram das suas operações nos Estados Unidos. A margem Ebitda por lá saiu de 22,3% para 4,7% na comparação ano a ano.

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Ainda nessa companhia, a operação da América do Sul gerou uma receita líquida de R$ 6,6 bilhões. R$ 3,8 bilhões foram frutos das exportações, sendo 73% do valor das vendas para o exterior provenientes da China.

O gigante asiático, como já mencionado, também foi um dos motivos apontados pelos frigoríficos como causa pelos resultados fracos – uma vez que boa parte da sua população estava sendo impactada pelas restrições impostas pela política de Covid Zero.

“Dentro do que foi a performance do trimestre, claro que a gente teve a questão pontual da desabilitação, por exemplo, de uma planta para a China. Isso tem um efeito pontual no resultado”, disse Wesley Batista Filho, presidente global de operações da JBS na teleconferência de resultados.

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“Diferente dos trimestres anteriores, a Ásia não foi o principal vetor na formação de receita da nossa empresa. Isso foi reflexo natural das fortes restrições impostas pelas autoridades chinesas com a política de Covid Zero no último período do ano passado”, debateu Fernando Galletti de Queiroz, diretor executivo (CEO) da Minerva.

A Minerva é a que tem maior exposição à China, segundo analistas. Com sua produção localizada na América Latina e no Brasil, 62,9% dos seus volumes totais foram exportados, ou 190,6 milhões de toneladas. Desse número, 43% foram destinados ao gigante asiático.

Por não produzir na América do Norte e por sua exposição à China, que está reabrindo, a Minerva é a que mais deve se beneficiar no curto prazo para os analistas.

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“A Minerva tem menor exposição aos Estados Unidos. No caso do ciclo, é algo interessante. As proteínas, no Brasil, estão com um efeito de ciclo favorável. É um cenário bom para a indústria, em que as companhias tendem a capturar margens melhores”, debate Leonardo Alencar, analista da XP Investimentos. “Outro ponto importante é que a dependência de grãos para os bovinos na América do Sul não é tão relevante”.

De acordo com o especialista, outro fator que pesou na produção de gado norte-americana foi a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que fez os preços de commodities como o milho e o trigo, utilizadas em rações, dispararem, uma vez que os dois países são importantes produtores. No Brasil, a pecuária é majoritariamente extensiva, com criadores deixando o gado solto no pasto e, decorrentemente, tendo gastos menores com ração.

“As empresas mais expostas aos Estados Unidos estavam se saindo bem, as brasileiras, estavam mal. Agora está invertendo O ciclo da carne bovina nos Estados Unidos demora de três a quatro anos. No Brasil chega até a oito”, aponta Alencar. “Na América do Sul, o ciclo está favorável para a indústria. Há a questão da China, com a interrupção da exportação por conta do caso atípico de Vaca Louca. Quando reverter, será algo bom”.

Na semana passada, a autoridade chinesa General Administration of Customs of the People’s Republic of China (GACC) notificou a retomada irrestrita das exportações de carne bovina do Brasil para a China. As vendas foram suspensas voluntariamente pelas autoridades brasileiras em 23 de fevereiro por um caso de vaca louca, mas foram retomadas depois de detectado o caso atípico (sem contágio).

Por fim, a BRF (BRFS3), que atua principalmente no setor de aves e carne de porco, também teve um resultado que não agradou analistas e investidores, com prejuízo de R$ 956 milhões.

“BRF, por ser muito mais frango, frustrou porque o mercado esperava a liberação da exportação para o México e houve ainda um recuo do preço da carne. Isso com milho e trigo ainda em patamares elevados”, afirma o analista da XP.

Para o futuro, as perspectivas são que o milho e o trigo darão algum espaço para a empresa recompor suas margens, uma vez que o preço das commodities vem recuando.

“Para essa empresa, as questões principais são a reestruturação e a gripe aviária. Se a doença continuar fora do país, será bom. Ela só não pode entrar e pegar uma produção, uma granja comercial. Por enquanto, não parece ser o que vai acontecer. O intervalo de migração das aves vai até maio. Passando isso, o Brasil continuará a ser um dos únicos países com potencial de aumentar produção”, avalia.