Esperando para ver: o que explica o “otimismo cauteloso” dos investidores com a Bolsa brasileira

Estrategistas e e investidores institucionais esperam visibilidade melhor em torno das reformas fiscais

Lara Rizério

(Getty Images)

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Otimismo cauteloso, esperar para ver. Apesar de seguirem esperançosos com a tese de investimentos em Brasil, uma eventual maior convicção com o país ainda está por vir, uma vez que os primeiros meses do novo governo foram conturbados.

Os estrategistas do Bank of America destacaram continuar “ligeiramente” overweight (exposição acima da média do mercado) em Brasil e underweight (exposição abaixo da média do mercado) no México em sua carteira para América Latina. Isso porque, apesar das sinalizações de que o Brasil deve adiar o seu primeiro corte nos juros, ele provavelmente será o primeiro da região a diminuir as suas taxas.

David Beker e equipe esperam que o prêmio de risco no Brasil caia, uma vez que a visibilidade melhore em torno das reformas fiscais.

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Até então, o Brasil continua a se deteriorar em meio a alto custo de carregamento, atividade mais lenta, piora das condições de crédito e revisões para baixo nos lucros. Os locais estão mais pessimistas e esperam que os ruídos políticos
e os resgates de fundos locais continuem.

O mesmo sentimento de “otimismo cauteloso” pode ser observado entre alguns investidores estrangeiros que, apesar de mais animados com a tese em Brasil do que os locais (o que explica o ingresso de capital neste ano), também veem seu leque de dúvidas aumentar com o passar do tempo.

A equipe de estrategistas do JPMorgan teve uma rodada de conversas com investidores institucionais dos EUA e levou aos seus clientes a sua tese do “copo meio cheio” (relativamente otimista) com o Brasil, saindo de lá com a conclusão de que 4 dos 18 investidores estavam muito céticos quanto à visão mais otimista do banco, se opondo abertamente a ela.

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“Mas, em geral, nossa visão é semelhante à dos investidores estrangeiros, que já trouxeram mais de US$ 2 bilhões para o Brasil no acumulado do ano, acima de US$ 20 bilhões em 2022”, apontou a estrategista Emy Shayo, que assina o relatório.

“É verdade que os resgates [de estrangeiros] começaram em 16 de fevereiro, após 12 semanas consecutivas de entrada. Ainda assim, nossa impressão geral ao final é de que, enquanto os investidores esperam para ver as reais políticas estruturais que serão implementadas para tornar o Brasil mais construtivo, as perguntas estão se tornando maiores e muita falta de direção sobre política fiscal e/ou inflação mais alta podem azedar rapidamente o clima”, avalia a estrategista. Para ela, ao contrário do que os locais pensam, não há “exuberância” na visão dos investidores estrangeiros sobre o Brasil (ainda que haja maior otimismo).

Olhando para o cenário global inicialmente, a estrategista destaca que há uma avaliação turva sobre os Estados Unidos, uma vez que há bastante incerteza sobre até onde irão as taxas de juros e se haverá um cenário de soft landing (pouso suave) ou hard landing (pouso forçado, com desaceleração forte na economia americana).

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Enquanto isso, os investidores estrangeiros tiveram retorno positivo dos investimentos recentes na China, mas não querem ficar muito tempo posicionados no país, tendo pouco conforto em manter sua exposição overweight no gigante asiático. “Nesse cenário, o Brasil parece ser mais atrativo em termos relativos do que diversos outros mercados emergentes”, avalia.

A estrategista cita a visão ainda de que, diferentemente dos ciclos anteriores, o real está relativamente bem contido, um ponto positivo para os estrangeiros que lembram que a desvalorização cambial é normalmente a primeira vítima do ruído local.

Porém, o “esperar para ver” segue no radar de muitos investidores. Enquanto alguns estão bastante posicionados no país, outros esperam por maior visibilidade para adicionar mais posições.

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“A vontade existe, a oportunidade existe, mas é preciso esperar”. Essa foi uma das leituras recorrentes.

Um dos investidores céticos fez uma observação, que “aqueles que deram o benefício da dúvida a esta administração sofreram”, citando ainda o anúncio de o imposto de exportação sobre o combustível.

A estrategista do JPMorgan também ouviu que os investidores querem  “obter evidências que digam que as políticas são racionais, mas ainda não há evidências disso”.

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Um dos argumentos citados por Emy é de que existem alguns eventos que podem trazer visibilidade significativa no futuro próximo: 1) o anúncio do arcabouço fiscal (março), 2) os nomes que serão colocados para substituir os dois diretores do banco central cujos mandatos expirou em 28 de fevereiro e 3) a reforma tributária. “Esta é a nossa teoria da alavancagem política, inspirada em nossa recente viagem ao Chile. Lá, os investidores ficaram bem mais otimistas com o mercado após a rejeição da Nova Constituição, em setembro de 2022”. Em referência a isso, um investidor disse que “o próxima pacote fiscal será o referendo do Brasil.”

“De fato, ouvimos dizer que, se o Brasil não mostrar alguma melhoria de política, pode se tornar muito difícil investir em ações, uma situação “análoga à situação do mercado chinês, pré-reabertura”, complementa.

Enquanto isso, até os investidores céticos acham que os locais são muito negativos. A palavra de ordem é que “não se vende quando o brasileiro está muito pessimista e não se compra quando os brasileiros são muito otimistas”. Houve, afirma, também uma observação muito interessante de que “a lacuna entre visões estrangeiras e locais nunca foi tão ampla quanto agora”.

Alguns mencionam que o nível de ruído político agora não é maior do que durante o governo Bolsonaro, mas o ciclo era de juros mais baixos, com a reabertura da Covid ocorrendo em todo o mundo (exceto China). Agora, há a desaceleração da atividade macro, o que torna o ruído político muito mais potente. Apesar de serem “melhores compradores”, os estrangeiros querem saber quando os locais vão comprar novamente.

A grande maioria dos investidores acha que as taxas no Brasil estão muito altas e não vê um processo de desinflação global ocorrendo. Ainda assim, um investidor observou que “talvez esse nível de taxa de juros seja o normal para o Brasil e o que vigorava antes estivesse errado, principalmente em função de uma taxa muito baixa que estava em vigor nos EUA”.

Ainda sobre as taxas, um investidor mencionou que as taxas baixas que prevaleceram durante a pandemia escondeu os problemas que as empresas têm, mas agora isso é um grande problema. Alguns investidores estavam particularmente preocupados com a atividade econômica, menos em termos de recessão, mas mais sobre quanto tempo levará para a recuperação acontecer.

Ações em destaque

A equipe de estratégia do BofA destaca gostar de nomes de qualidade e que se espera que se beneficiem de taxas mais baixas lá na frente. “Outras histórias que gostamos são construtoras voltadas à renda mais baixa e nomes defensivos em seguros/saúde/alimentação. Nós permanecemos markeweight (exposição em linha com o mercado) nos bancos brasileiros”, apontam os estrategistas.

Eles também possuem uma alocação marketweight na Vale (VALE3)  após o rali no quarto trimestre de 2022 (4T22), enquanto removeram SLC (SLCE3) da lista após seu rebaixamento para neutro, “vendo que a tese de defensividade + vantagem do crescimento é desafiada pela aquisição de terrenos recentemente sem perspectivas de crescimento, com uma potencial limitação na distribuição de dividendos devido ao capital alocado no negócio”.

Os analistas também reduziram a exposição no setor de petróleo, tirando PRIO (PRIO3) e PetroReconcavo (RECV3) da carteira, além de manter underweight (exposição abaixo da média) em Petrobras (PETR3;PETR4).

As manchetes do setor no Brasil centraram nos últimos dias sobre a nova tributação sobre as exportações da commodity crua no país nos próximos 4 meses.

Além disso, recentemente, o BofA cortou os preços médios para  o petróleo de US$ 100 para US$ 88 por barril em 2023, com a produção da Rússia superando as projeções de produção nos últimos meses devido a sanções mais frouxas da União Europeia e EUA.

Já o JPMorgan destacou que, sobre posição, uma das descobertas mais interessantes é que a maioria dos investidores estrangeiros não está overweight em bancos. “Isso é incomum porque os bancos são sempre preferidos nesse cenário. Existe a preocupação de que o ciclo de inadimplência (NPL) possa piorar considerando que o desemprego ainda é relativamente saudável e, como mencionado acima, os investidores estão pessimistas no ciclo de crescimento”, avalia a estrategista da casa.

O setor de petróleo e gás ainda é um tema importante para os investidores em mercados emergentes e assim a Petrobras (PETR3;PETR4) acaba fazendo parte das cestas, além de se beneficiar de entradas passivas no ETF (fundo de índice) brasileiro EWZ.

“Também encontramos investidores que têm opções de compra da Petrobras. Uma grande maioria dos investidores acha que o próximo ciclo é de juros mais baixos no Brasil (ninguém pensa em taxas mais altas à frente) e, portanto, é preciso começar a se posicionar para isso, especialmente se houver um pouco mais de clareza no cenário. É preciso possuir as ações que foram prejudicadas durante o ciclo de aperto [monetário]”, afirmam os analistas.

O nome mais lembrado nesse cenário é Lojas Renner (LREN3), seguido por fintechs (Nubank NUBR33, PagSeguro PAGS34, XP XPBR31). Outros nomes são Localiza (RENT3), Rumo (RAIL3), Santos Brasil (STBP3), CCR (CCRO3), Cyrela (CYRE3), Centauro (SBFG3) e Alpargatas (ALPA4). O outro lado da moeda, ou seja, ações que seriam defensivas e são amplamente lembradas pelos investidores, incluem em primeiro lugar o Assai (ASAI3), seguida pela WEG (WEGE3) e Raia Drogasil (RADL3).

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.